Pai de um menino de 7 anos e torcedor do Vasco da Gama, o jornalista esportivo Bruno Otto Guedes, de 40 anos, luta desde abril de 2021 contra um tumor cerebral que revirou a sua vida do avesso e a de toda a família e seu caso tem mobilizado centenas de pessoas na internet. Enquanto trava uma batalha pela vida, Bruno precisa enfrentar a burocracia dos planos de saúde e dificuldades no acesso a tratamentos que podem representar uma esperança no seu caso.
Atualmente, a família move dois processos judiciais contra a SulAmérica: um para conseguir o sunitinibe, um medicamento quimioterápico que custa R$ 24 mil cada caixa (ele precisa de seis para concluir o tratamento, o que totaliza R$ 144 mil), e outro para cobrir as despesas hospitalares da segunda cirurgia do jornalista, que já passam de R$ 51 mil. Procurada pelo Portal ViDA & Ação, a operadora informou que “já liberou os medicamentos necessários para o tratamento e está comprometida em agilizar a sua entrega o mais rápido possível”.
Na corrida contra o tempo, a família lançou uma ‘vaquinha’ online para levantar ao menos o valor necessário para duas caixas do medicamento e poder oferecer mais dignidade a Bruno nesta fase do tratamento. Até o final da manhã desta segunda-feira (11), a campanha já havia conseguido arrecadar pouco mais de R$ 38 mil dos R$ 48 mil que necessita para dar início ao tratamento. As doações vieram de 585 pessoas, entre amigos e familiares e desconhecidos que se sensibilizaram com a causa.
“As coisas estão bem difíceis, além de todo esse trâmite lento e demorado (para a liberação do medicamento), temos processo contra eles (Sulamérica), pois também não pagaram a cirurgia do meu irmão, e o hospital vem nos cobrando um valor absurdo. Então, estamos com muita luta em relação a esse plano de saúde”, contou a irmã do jornalista, Juliana Otto Guedes, 37, ao ViDA & Ação.
Remédio pode combater novos focos do tumor e evitar metástase
De acordo com Juliana, exames realizados após a segunda cirurgia identificaram novos focos do tumor, que são controláveis, mas para isso Bruno precisaria utilizar o Sunitinibe. A medicação pode inibir o crescimento do tumor e a criação de metástases (a propagação das células cancerígenas para outros órgãos), além de controlar os efeitos colaterais das sessões de radioterapia.
Logo que Bruno recebeu a indicação médica para o novo tratamento, a família buscou a Sulamérica para obter a medicação, mas não conseguiu e teve que recorrer à Justiça, que concedeu liminar determinando a liberação imediata do remédio. Na última sexta-feira (9), o plano de saúde informou a familiares que deverá fornecer o medicamento.
“Saiu a penhora na quinta passada e nos comunicaram que até dia 13/12 a medicação estará com a gente”, disse Juliana. “Com a vaquinha, ele já tá desde sábado tomando, seria quase mais uma semana de espera. Complicado, mas graças a Deus as coisas estão caminhando devido a nossa luta”.
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Bruno passou pela primeira cirurgia de urgência para tratar o tumor cerebral em abril de 2021. A família teve que entrar na Justiçar para garantir o procedimento pela Amil, seu plano de saúde na época. No pós-cirúrgico, o jornalista teve dificuldades para receber acompanhamento médico por conta das medidas de proteção ao novo coronavírus. Mesmo assim, passou por uma semana de radioterapia.
Passados quase dois anos da primeira cirurgia, os médicos detectaram que o tumor voltou a crescer e fizeram nova indicação de cirurgia, marcada para março deste ano, já pela Sulamérica. Foi então que começaram os problemas com o plano. A operadora negou a utilização do neuronavegador (uma nova técnica que garante mais eficácia em cirurgias delicadas no cérebro – saiba mais abaixo), mas a cirurgia foi realizada mesmo assim, diante do risco de vida do paciente, justificado pelo médico na época.
Três dias depois da cirurgia, veio a resposta oficial da Ouvidoria da operadora, confirmando a negativa para o exame, sob alegação que a tecnologia de neuronavegação não fazia parte do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). No entanto, o hospital em que Bruno foi operado ameaça cobrar judicialmente a família pela conta dos equipamentos e de todas as despesas porque o plano se recusou a pagar e a dívida de R$ 51 mil.
“Optamos pela vaquinha para poder conseguir comprar pelo menos uma caixa para começar de imediato e não perder mais tempo porque a Justiça é muito lenta. A ‘vaquinha’ tomou uma proporção muito grande, e graças a Deus, nos deu esperança de conseguir resolver porque é muito injusto a pessoa com todas essas dificuldades ter que passar por isso”, contou Juliana, ao jornal ‘O Dia’ .
Jornalista teve que se afastar do trabalho e entrou em depressão
Nascido em Petrópolis, Bruno é jornalista formado em Comunicação Social pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Trabalhou em veículos de imprensa da Região Serrana e como repórter no site do jornal O Dia. Também produziu conteúdo e atuou como comentarista de coberturas para o site da ESPN Brasil. Focando sua carreira no jornalismo esportivo, ele vinha atuando como redator e editor de texto na Agência EFE.
Cheio de planos na carreira e dedicado à família, Bruno teve uma boa melhora após a segunda cirurgia e chegou a voltar ao trabalho em junho, mas semanas depois começou a apresentar um quadro de depressão e perda de memória recente. Em julho, novamente teve que se afastar, passando a contar com um pequeno benefício do INSS, por prazo indeterminado.
“Entramos com o primeiro pedido para o plano, mas negaram. Depois entramos com o segundo pedido de medicamento e o plano negou novamente. A gente recorreu à Justiça. Já temos a liminar, e a cada dia que o plano não cumpre a liminar, paga uma multa diária”, disse Juliana.
Na expectativa da liberação imediata do medicamento após a decisão judicial, os médicos que tratavam Bruno reduziram as doses de corticoide, mas o seu quadro de saúde começou a se agravar. Em meio à angústia pela demora na liberação da medição, a família de Bruno vê seu estado de saúde se deteriora.
“Meu irmão ficou muito debilitado e teve uma piora no quadro dele, mas com o aumento da medicação e ele usa e a chegada da nova estamos com fé que as coisas melhorem. Ele tem dias que parece mais disposto, e outros nem tanto, mas com dificuldades na locomoção, um pouco na fala, sente um pouco de dores de cabeça”, contou.
Medicação esperada por jornalista é um dos avanços contra o câncêr
O sunitinibe – medicação de que Bruno necessita – faz parte da classe de quimioterápicos orais para tratamento de câncer incorporados ainda antes da pandemia pela rede pública e saúde suplementar, assim como o pazopanibe, indicado em 2018 para o câncer renal. Tratam-se de duas terapias-alvo importantes para aumentar as chances na sobrevida de pacientes oncológicos.
De acordo com o Instituto Oncoguia, a terapia alvo é um tipo de tratamento que usa drogas ou outras substâncias para identificar e atacar especificamente as células cancerígenas, provocando pouco dano às células normais. Esses medicamentos são eficazes no tratamento de tumores, principalmente quando estes não respondem aos quimioterápicos convencionais.
O sunitinibe, geralmente, diminui o tamanho do tumor ou retarda seu crescimento. O alvo do sunitinibe são as proteínas KIT e PDGFRA, além de outras proteínas que não são alvo do imatinibe.
Apesar das promessas, nenhuma terapia para o câncer está totalmente livre de reações adversas ou efeitos colaterais. Segundo o Instituto Oncoguia, os efeitos colaterais mais comuns do sunitinibe incluem fadiga, diarreia, irritação da boca e alterações na cor da pele e do cabelo. Outros efeitos mais graves podem incluir aumento da pressão arterial, sangramento, inchaço, problemas cardíacos e problemas hepáticos.
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Novas ferramentas tecnológicas empregadas na chamada “Oncologia de Precisão” têm proporcionado diagnósticos mais precisos e tratamentos mais eficazes. Um exemplo disso é a neuronavegação, uma série de técnicas que auxiliam os neurocirurgiões a encontrar diversas patologias no cérebro, por meio de exames de imagem feitos antes da cirurgia, como a ressonância magnética.
“A ideia é ir direto ao ponto na doença, de forma a causar o mínimo de dano nos tecidos saudáveis adjacentes”, explica Feres Chaddad Neto, neurocirurgião da BP – A Beneficência de São Paulo.
Segundo ele, a técnica auxilia na realização de biópsias ou ressecção (retirada total ou parcial de um órgão/tecido) de lesões do sistema nervoso central por meio de imagens pré-operatórias, como ressonância magnética e tomografias computadorizadas.
“O neuronavegador funciona como uma espécie de sistema GPS, e possui basicamente duas estruturas: um monitor, alimentado por imagens do paciente, e um probe – material que se assemelha a uma caneta grande, conectado em pequenas esferas”, explica o médico. “A taxa de erro nessa representação é menor do que 3 milímetros, ou seja, é fundamental para realizarmos o acesso cirúrgico mais adequado, respeitando os limites da lesão”, completa Chaddad.
Neuronavegador torna cirurgias neurológicas mais precisas
A capacidade do neuronavegador de obter uma projeção com profundidade em 3D no monitor, em tempo real, a partir de um ponto da superfície do crânio do paciente, na profundidade do encéfalo, soluciona dois desafios na neurocirurgia. O primeiro deles é a anatomia, que pode variar de indivíduo para indivíduo e o segundo, as lesões cerebrais, principalmente os tumores.
“Eles podem provocar grandes alterações anatômicas, desviando-se e invadindo estruturas neurovasculares importantes e sensíveis, que não devem ser afetadas para evitar complicações inesperadas e sequelas permanentes”, explica o cirurgião Feres Chaddad Neto.
A técnica também é empregada no diagnóstico de tumores intracranianos. Um estudo recente, intitulado Evolução da Neuronavegação na Cirurgia de Glioma (o tipo mais comum de tumor intracraniano originado no sistema nervoso central), publicado em uma revista científica internacional, avaliou 35 pacientes internados para realização de biópsias assistidas por neuronavegação.
Foi constatado um resultado de mais de 94% de acurácia na execução do procedimento. Apenas 5,7% das pessoas que apresentaram pequenos sangramentos pós-operatórios tinham problemas hepáticos, uma condição conhecida por aumentar o risco de hemorragia.
Entenda o drama de Bruno e a via-crúcis da família
10/04/2021: Internação devido a um tumor na cabeça que exigia cirurgia de urgência.
04/05/2021: Realização da primeira cirurgia, um mês após a internação, devido à liminar que autorizou o uso do neuronavegador, já que o plano de saúde (Amil) não permitia inicialmente.
Período pós-primeira cirurgia (2021): Dificuldades durante o período pós-cirúrgico devido às restrições da Covid-19 no hospital, impedindo acompanhamento constante, além de questões fora do hospital que precisavam ser resolvidas. Visitas diárias foram feitas.
20/03/2023: Segunda cirurgia realizada, desta vez com plano de saúde Sulamérica. O plano negou a utilização do neuronavegador, mas a cirurgia foi realizada mesmo assim. A confirmação da negativa chegou três dias após a cirurgia. O hospital não recebeu pagamento pelo uso do equipamento e ameaçou cobrança judicial. Processo em andamento contra o hospital e o plano. Valor em disputa de aproximadamente R$ 51 mil.
23/03/2023: A resposta da Ouvidoria justificou a negativa com base no fato de que a tecnologia de “Neuronavegação” não fazia parte do rol de procedimentos da ANS, mesmo três dias após a segunda cirurgia, devido ao risco de vida justificado pelo médico na época.
28/04/2023: Após a segunda cirurgia, início da radioterapia que durou uma semana, encerrando em 28/04/23.
20/06/2023: Retorno ao trabalho por quase um mês após a radioterapia.
15/07/2023: Recaída, com quadro de depressão e perda de memoria recente levando ao afastamento do trabalho e início do benefício do INSS por prazo indeterminado.
Após 15/07/2023: Realização de exames específicos e solicitação de remédios especiais pelos médicos, com negativas do plano de saúde, alegando que tais procedimentos não faziam parte do rol da ANS.
Com informações de O Dia, assessoria da BP e familiares