O Transtorno do Espectro Autista (TEA), condição que envolve cerca de 70 milhões de pessoas no mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é caracterizado por diferenças no desenvolvimento neurológico que afetam principalmente a comunicação, a interação social e o comportamento de uma pessoa. Muitas vezes, o autismo pode estar presente, mas não ser percebido — e é justamente esse o maior desafio para milhares de famílias.

Neste Abril Azul, mês de conscientização do autismo, especialistas reforçam a importância de olhar com atenção para o chamadoautismo invisível”: casos em que os sinais são sutis, muitas vezes atribuídos a traços de personalidade ou fases do desenvolvimento.

Quanto mais cedo o diagnóstico, maiores as chances de intervenções eficazes que melhorem a qualidade de vida da criança e da família. O cérebro infantil é altamente plástico nos primeiros anos de vida, e intervenções precoces podem fazer toda a diferença”, explica a psicóloga e neuropsicóloga Tatiana Serra.

Muitas vezes, crianças com autismo leve ou com boas habilidades verbais passam despercebidas nos primeiros anos escolares. “Essas crianças podem sofrer silenciosamente com dificuldades de socialização, crises sensoriais ou hiperfoco, sem receber apoio adequado”, afirma a especialista em saúde mental em todas as fases da vida, que atua na capital paulista

Por isso ela ressalta que o diagnóstico não deve ser temido, mas compreendido como um passo fundamental para o desenvolvimento da criança. “Saber é o primeiro passo para acolher. Quando a família entende o que está acontecendo, pode buscar estratégias que respeitem e fortaleçam a individualidade da criança. Quando enxergamos além do comportamento, começamos a ver o ser humano por inteiro”.

Rastreamento ocular: novo exame promete detectar o TEA em minutos

Muitas famílias ainda enfrentam dificuldades para encontrar apoio adequado após o diagnóstico de TEA. Por isso, o mês de abril reforça que conscientizar é também democratizar o acesso à informação, ao diagnóstico e ao cuidado.

Embora o diagnóstico precoce ainda enfrente barreiras — tanto pela dificuldade de acesso a profissionais especializados quanto pela escassez de instrumentos objetivos — um novo avanço traz esperança, no ano passado, uma técnica de rastreamento ocular recebeu aprovação do FDA (a agência reguladora dos EUA) como ferramenta diagnóstica oficial para o TEA.

O exame, indicado para crianças de 16 a 30 meses, consiste na apresentação de uma sequência de vídeos infantis enquanto um computador rastreia 120 vezes por segundo os movimentos oculares da criança. A tecnologia analisa para onde o olhar é direcionado em cada cena e compara com os padrões de crianças típicas da mesma idade. A partir dessa análise, é possível identificar em minutos se há padrões de atenção característicos do espectro autista.

Para Tatiana, este é “um avanço promissor porque permite um diagnóstico menos subjetivo, baseado em evidências visuais e comportamentais, que muitas vezes escapam mesmo aos olhos mais atentos dos pais ou professores”.

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Crianças que têm irmãos autistas correm mais risco

De acordo com estudo publicado no American Journal of Human Genetics, aproximadamente 10% a 20% dos casos de TEA têm uma origem genética identificável.  Uma publicação feita pela revista americana Pediatrics, revelou que crianças que têm irmãos autistas correm um risco significativamente maior de também desenvolverem a condição, com uma probabilidade de 20% – sete vezes maior do que a de crianças sem esse histórico familiar.

Os dados foram coletados em 18 locais diferentes pelo Consórcio de Pesquisa de Bebês Irmãos do Autismo, uma rede internacional dedicada ao estudo das primeiras manifestações do TEA. Nesse estudo, 1605 bebês com um irmão mais velho autista foram acompanhados desde o nascimento até os 3 anos de idade, quando foram avaliados e classificados como tendo ou não o transtorno.

Um estudo coordenado pelo Hospital for Sick Children (SickKids) – reconhecido como uma das principais instituições de assistência médica pediátrica do mundo – identificou uma ligação entre o gene DDX53 e o TEA, especialmente em meninos, sugerindo uma explicação para a predominância masculina observada.

outro estudo, publicado na Translational Psychiatry em 2025, investigou a relação entre alexitimia (dificuldade em identificar e descrever emoções) e sintomas sensoriais em pessoas autistas. A investigação científica concluiu que a alexitimia poderia ser um fator transdiagnóstico, influenciando a experiência sensorial em pessoas com TEA.

Novos exames genéticos ajudam a direcionar terapias para o TEA

Avanços em pesquisas norteiam o acompanhamento personalizado e multidisciplinar no tratamento infantil do TEA

Nos últimos anos, a compreensão do TEA tem sido aprimorada também por descobertas no campo da genética, permitindo uma detecção mais precisa e, consequentemente, a personalização do acompanhamento. Em alguns casos, conhecer a causa genética pode ajudar a direcionar terapias específicas e evitar abordagens ineficazes.

Identificar as causas do transtorno também pode auxiliar no aconselhamento genético para famílias, especialmente se houver mais de um caso de TEA na família. Muitos avanços fornecem novas perspectivas para identificação e acompanhamento dos casos.

Entender as bases genéticas do TEA não só aprimora a identificação, mas também abre caminho para o acompanhamento mais direcionado e eficaz, ajudando a oferecer uma abordagem mais centrada nas necessidades específicas de cada pessoa”, explica Roberto Giugliani, especialista em genética e coordenador de doenças raras na Dasa Genômica.

Testes genéticos para identificação do TEA e outras síndromes

Para a médica geneticista Fernanda Soardi, assessora técnica em genética e genômica do Laboratório Lustosa, “a decisão de realizar um exame genético para dar suporte às terapias do TEA deve ser tomada pelos especialistas responsáveis pelo caso, que avaliarão a necessidade e a adequação do exame para cada paciente”

Ainda segundo ela, uma equipe multidisciplinar é fundamental para garantir que a criança com TEA receba o suporte e os recursos necessários para alcançar seu máximo potencial. “Além disso, é comum que crianças apresentem outros transtornos associados, como TDAH, o que torna o acompanhamento ainda mais desafiador e reforça a importância de uma abordagem integral”, finaliza.

Algumas síndromes genéticas também podem incluir características do espectro autista, como a Síndrome do X Frágil, a Síndrome de Rett, a Síndrome de Angelman e a Síndrome de Phelan-McDermind. Deleções e duplicações no cromossomo 16p11.2 também estão associadas ao TEA.

Entre os testes que podem ser realizados, destacam-se Cariótipo, MLPA, CGH-array, Exoma Completo e Painel NGS para autismo sindrômico. O cariótipo avalia alterações estruturais grandes nos cromossomos, enquanto o MLPA detecta pequenas deleções e duplicações.

Já o CGH-array identifica microdeleções e microduplicações associadas ao TEA e o Exoma Completo analisa todas as regiões codificantes dos genes, para identificar mutações associadas.

Outra opção é o painel NGS que investiga mutações em genes relacionados a condições autísticas específicas, como a Síndrome de Rett, que afeta o desenvolvimento do cérebro, causando atraso intelectual e físico, principalmente em meninas.

Com Assessorias

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