Antes tímido e mais isolado, Henrique, de 9 anos, autista nível 2 de suporte, hoje conversa com os colegas e até canta em sala de aula. A evolução comemorada não só pela comunidade escolar, mas pela mãe, Miria Rodrigues Nunes, 41, revela a importância de um atendimento ainda pouco difundido no Brasil, mas que tem feito toda a diferença quando o assunto é educação inclusiva: o serviço do Profissional de Apoio Escolar (PAE), também chamado de cuidador de alunos com deficiência.
É ele quem auxilia os estudantes com deficiência na rotina diária, como na alimentação, locomoção e higiene, com objetivo tornar o ambiente escolar mais digno, seguro e confortável. A presença desses profissionais nas escolas é prevista pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva, vigente desde 2008, e reforçada na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI) e na Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista.
Em São Paulo, Estado e alguns municípios têm investido nesse apoio. E a escola estadual na qual Henrique estuda, na Vila Antonieta, região Leste da Capital, é uma das contempladas pelo atendimento, que dada sua importância merece destaque neste Abril Azul, mês da Conscientização Mundial sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA).
O diagnóstico chegou aos 3 anos, o Henrique aprendeu a dizer mãe e pai, mas não engajava na fala e tinha crises de nervoso. Ele passou por outros tratamentos, mas eu chegava a chorar de preocupação ao deixá-lo na escola, porque, embora ele consiga fazer tarefas sozinho, como se alimentar e ir ao banheiro, por exemplo, há várias limitações. E as crianças de hoje em dia são muito arteiras, né?”, comenta Miriam.
Mas tudo mudou com a chegada da cuidadora escolar Bruna Padoveze, de 33 anos. Ela conta que o garoto, antes isolado e até considerado não verbal, passou a interagir com os colegas e a fazer mais atividades.
A professora mesmo fala que, do ano passado para cá, ele evoluiu bastante, passou a conversar e interagir mais. Chega a ser emocionante, ele até tem cantado na sala de aula, músicas em inglês e português”, comenta a cuidadora.
Miria, a mãe, agradece. “Ele é outra criança, falante e adora ir pra escola. A chegada dela foi Deus agindo na nossa vida. Hoje vejo que é essencial os alunos autistas terem um acompanhamento assim, atencioso e próximo”, contou.
Inclusão escolar é uma realidade
Henrique representa um dos 636 mil alunos com TEA no Brasil, segundo o Censo Escolar 2023, divulgado em 2024. Para fins comparativos, em 2022, havia 429 mil estudantes com a condição, o que evidencia um aumento de 48% de matrículas do tipo em apenas um ano no País. Houve um aumento de 280% de estudantes autistas matriculados em escolas, tanto públicas quanto particulares, no intervalo de 2017 a 2021.
Esse dado revela a crescente necessidade de medidas que promovam o conforto e assegurem a segurança das crianças portadoras do transtorno, seja no ambiente escolar, residencial ou qualquer local público. E a projeção é de os números relacionados ao TEA continuem crescendo. Isso porque acredita-se que 1 a cada 36 crianças tenham algum grau de autismo, conforme aponta estudo realizado, também em 2023, pelas startups Genial Care e Tismoo.me.
“A inclusão escolar vai muito além de abrir as portas da escola. É preciso garantir que os alunos tenham o suporte adequado para se desenvolverem plenamente. Quando um estudante com autismo conta com esse apoio de qualidade, ele se sente mais acolhido e tem mais oportunidades de interagir e aprender”, aponta Maíra Pizzo, diretora da Conviva Serviços, instituição privada especializada em apoio escolar aos alunos com deficiência.
A prova disso está nos inúmeros relatos recebidos pela Conviva não só de Miria, mas de mães e também educadores das centenas de escolas, especialmente nos estados de São Paulo, Espírito Santo e Mato Grosso.
Vimos vários casos de estudantes com autismo, dependentes de suporte e não verbais, evoluindo e ganhando autonomia São crianças que deixam de ter crises ao frequentar escola, alunos que não demonstravam afeto e passaram a demonstrar carinho não só com cuidadores, mas também com os colegas. Crianças que não se comunicavam de forma verbal e passaram a falar, tivemos até um aluno autista que passou a deixar a cadeira de rodas para se locomover após incentivo da cuidadora”, complementa Maíra.
A Conviva Serviços conta com 2,8 mil cuidadores e está presente, atualmente, em escolas públicas de São Paulo nas regiões Centro, Centro-Oeste, Leste e Norte. E nas cidades de Osasco, Cabreúva, Carapicuíba, Taboão da Serra, Itapecerica da Serra, Suzano, Itapevi, Mogi das Cruzes, Caieiras, Itaquaquecetuba, Guarulhos e Igaraçu do Tietê. São mais de 5 mil alunos atendidos em 1 mil escolas.
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Cuidado também dentro de casa
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição de desenvolvimento atípico da capacidade de comunicação e interação, em que o indivíduo apresenta um repertório limitado de interesses e manifesta padrões comportamentais repetitivos e estereotipados.
Projeções feitas a partir de estudos divulgados pelo Center for Disease Control and Prevention (Centro de Controle de Doenças e Prevenção – CDC), nos Estados Unidos, com base em dados levantados em 2022, revelaram que a taxa do número de diagnósticos é de 1 a cada 44 crianças, o que totalizaria mais de 4 milhões de brasileiros.
Com melhor treinamento profissional e maior disponibilidade de conhecimento sobre a condição, o número de diagnósticos é crescente, conduzindo a rotina da sociedade a adaptações que garantam o bem-estar do portador em todo e qualquer ambiente.
Diante dessa necessidade, aumenta a procura por cuidadores especializados em atendimento a pessoas com autismo. O papel do profissional é de amenizar as dificuldades diárias enfrentadas pelo portador do transtorno, facilitando sua inclusão e viabilizando sua mobilidade em diferentes ambientes.
Para os cuidadores de crianças, é feita uma avaliação acerca da rotina, cuidados específicos, alimentação, sono, estímulos e utilização ou não de aparelhos eletrônicos”, afirma Vitor Hugo de Oliveira, médico e CEO da Acuidar, uma franquia especializada em serviços no segmento do cuidado.
A ideia é que o cuidador não altere a rotina da criança, mas sim a entenda e saiba como potencializar a socialização e realização de atividades que proporcionem melhor qualidade de vida a ela. Esse amparo individualizado é fundamental para o desenvolvimento da criança, tornando-a capaz de realizar tarefas com a assistência necessária.
De acordo com o médico, é notório que com estímulos como músicas, pinturas, desenhos as crianças que possuem o transtorno se comunicam mais e compreendem melhor a interação de maneira visual, mais do que propriamente pela fala.
A comunicação deve ser estimulada também com atividades que foquem na parte de concentração, brincadeiras, tudo para demonstrar, além de outras formas, carinho, atenção e apoio para que essa criança se sinta amada, bem cuidada e sinta confiança nesse cuidador”, afirma.
A presença de um cuidador também passa a ser benéfica a família, visto que a partir do convívio e participação em momentos sensíveis, cria-se um vínculo, em que o profissional passa segurança a ambos. Esse laço é essencial para um melhor desenvolvimento neuropsicomotor e social do portador da condição.
Com Assessorias