Celulares, tablets e computadores são considerados, muitas vezes, aliados dos pais ou responsáveis na hora de distrair os pequenos. No entanto, o ambiente virtual pode trazer riscos quando os dispositivos possuem acesso à internet e não são supervisionados. Qualquer criança ou adolescente pode ser alvo de abuso e exploração on-line, especialmente com o uso massivo da internet.

A violência no ambiente virtual é um problema que preocupa cada vez mais famílias em todo o mundo, alerta a ChildFund Brasil, organização que atua na promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente há 57 anos no país. A ong foca a sua campanha Maio Laranja, de conscientização sobre o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes, na prevenção dessas violações na internet.

Em 2023, a Safernet registrou um recorde de casos em seus 18 anos de atuação. Foram 71.867 denúncias de imagens de abuso e exploração infantil on-line; aumento de 77,13% em relação a 2022. Naquele ano, houve 111.929 denúncias de crimes envolvendo fotos e vídeos de violência sexual contra crianças no Brasil, o que representava um aumento de 9,91% em relação ao ano anterior. O aumento de denúncias já havia sido registrado em 2020 e 2021.

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‘Toda criança está em situação de vulnerabilidade na internet’

Toda criança está em situação de vulnerabilidade na internet, independentemente da sua renda familiar, pois não tem a capacidade de saber quem está interagindo com ela no ambiente virtual, e os mecanismos de proteção não avançaram muito para criar um ambiente on-line seguro”, afirma Mauricio Cunha, diretor do ChildFund Brasil.

A Pesquisa Nacional da Situação de Violência Contra Crianças no Ambiente Doméstico, lançada pelo ChildFund Brasil, com o apoio da The LEGO Foundation, mostrou que os equipamentos eletrônicos conectados à internet foram citados de maneira recorrente pelas crianças nas entrevistas e grupos de discussão como uma de suas principais distrações.

O contato das crianças com estes aparelhos acontece de maneira intensiva e cada vez mais precoce. A pesquisa TIC Kids Online Brasil, realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), apontou que 88% das crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos que usam a internet no Brasil possuem pelo menos um perfil nas redes sociais, sendo que 78% dos entrevistados possuem smartphone e 53% acessam a internet pelo celular.

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Alerta para o mau uso da inteligência artificial

Karina (Danielle Olímpia) cai em golpe de pedófilo que usa inteligência artificial (Foto: Reprodução de internet)

Apesar de ser um tema sensível, é importante falar e alertar sobre isso, pois o cenário é preocupante. “A prevenção da violência contra crianças e adolescentes no ambiente online é urgente, pois a soma do uso intensivo de tecnologias e dos recursos de inteligência artificial pode ser extremamente perigosa para crianças e adolescentes”, afirma Maurício Cunha.

O assunto foi abordado em 2023 na novela Travessia, da TV Globo, em cenas protagonizadas pela adolescente Karina, interpretada pela atriz Danielle Olímpia, e tem gerado comoção entre os telespectadores.

Na trama, a adolescente foi enganada por um abusador que utilizou um recurso denominado deep fake, técnica de inteligência artificial que altera áudios e vídeos, para assumir a identidade de uma atriz fictícia chamada Bruna Schuller.

Deslumbrada com a possibilidade de se tornar amiga de Bruna e de conseguir um papel na televisão, Karina começou a fazer videochamadas com a suposta atriz e a lhe enviar fotos íntimas. Porém, a identidade verdadeira por trás da câmera foi revelada e o abusador iniciou uma série de chantagens com a adolescente.

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Cartilha para prevenção de abuso e exploração sexual on-line

Atento à gravidade desse cenário, o ChildFund Internacional lançou em 2023 uma cartilha para prevenir o abuso e exploração sexual on-line de crianças e adolescentes. O documento contém orientações importantes para mães, pais, crianças e outros cuidadores, além de recomendações direcionadas às organizações. Neste ano, o ChildFund Brasil elaborou uma nova cartilha em versão pocket, disponível no site da campanha.

“Nossa cartilha oferece recomendações não apenas para familiares e cuidadores, mas também para que outros atores nos ajudem nesse enfrentamento. Abusadores e outros criminosos utilizam a ingenuidade e a falta de conhecimento desses jovens de maneira cada vez mais sedutora e sofisticada”, explica o diretor do ChildFund Brasil.

A cartilha revela os perigos do grooming e do sexting. Enquanto o primeiro termo se refere ao aliciamento de menores através da internet com o intuito de assediar ou abusar sexualmente da criança no ambiente virtual, o segundo está relacionado ao ato de filmar ou tirar fotografias de si próprio com conteúdo sexual, erótico ou pornográfico e enviar estas imagens ou vídeos a uma pessoa supostamente de confiança por celular ou outro dispositivo electrônico.

Embora o sexting seja uma prática comum, quem recebe e compartilha as imagens pode viralizá-las sem o consentimento da outra pessoa. Quanto maior esse movimento, mais exposição o autor das imagens terá. Há também a possibilidade de hackear as informações pessoais do autor das fotos e vídeos.

Diálogo e atenção a mudanças de comportamento

A cartilha também alerta para a importância de prestar atenção às mudanças de comportamento das crianças e dos adolescentes. Caso eles apresentem sinais de medo, ansiedade, angústia ou isolamento, os familiares ou cuidadores podem conversar para identificar se há algum incômodo durante o uso da internet.

É necessário reforçar as relações de confiança para que crianças e adolescentes saibam a quem recorrer se forem vítimas de violência ou outras situações incômodas na internet.

“O ideal é que os cuidadores se informem sobre a gravidade e prevenção do abuso e exploração sexual on-line de crianças e adolescentes e mantenham um canal aberto de diálogo constante. Muitas vezes, os adolescentes têm suas dores negligenciadas devido a conturbadas fases emocionais características dessa fase e o que poderia ser prevenido se transforma em um grande problema para toda a família. Eles precisam ser ouvidos e acolhidos”, conclui Maurício.

Confira algumas orientações da cartilha para familiares e cuidadores 

  1. Como na vida real, fale com o seu filho sobre as regras de utilização da internet e ações que possam colocá-lo em risco, por exemplo, não conversar com estranhos ou publicar informações pessoais, como endereço, escola onde estuda e números de documento ou de telefone.
  2. Alinhe a utilização da internet em casa, tais como horários e locais. É melhor se o computador for colocado num local de acesso de toda a família.
  3. Utilize os controles parentais e crie contas em aplicações a que pais, mães e cuidadores tenham acesso, tais como YouTube Kids ou Google Kids. Se quiser informação sobre controle parental visite esta página.
  4. Crie espaços de confiança para que as crianças possam dizer se tiveram experiências desagradáveis na internet.
  5. Ensine aos seus filhos sobre o que significam os termos “público” e “privado” no ambiente on-line e os oriente a compartilhar perfil e conteúdo somente para pessoas conhecidas. Oriente seus filhos a não publicar conteúdo no modo “público” e/ou enviar fotografias on-line para pessoas desconhecidas.
  6. Encoraje os seus filhos a serem gentis e respeitosos no mundo digital e os ensine a não espalhar fofocas, partilhar histórias e/ou fotografias que possam magoar ou envergonhar outra pessoa.
  7. Crie atividades para que os seus filhos interajam positivamente com amigos, família ou sozinhos on-line e com segurança. Ajude-os a identificar publicidades ou notícias falsas divulgadas no ambiente virtual.
  8. Ensine aos seus filhos e filhas como ajustar as medidas de segurança nas suas redes sociais, com o objetivo de ajudá-los a proteger a sua identidade e as suas informações privadas.
  9. Fale com os seus filhos sobre como bloquear, reportar e denunciar conteúdos que os tornam desconfortáveis ou incomodados nas redes sociais que utilizam.
  10. Após o uso, oriente seus filhos a fechar a sessão de seus e-mails, redes sociais e contas bancárias, ter senhas fortes com pelo menos 8 caracteres e letras, símbolos e números. É melhor usar letras maiúsculas e minúsculas, mas acima de tudo, evitar usar palavras previsíveis como o seu nome ou o da sua família.

Acesso à internet precisa ter intervenção dos pais

O trabalho do ChildFund Brasil é alertar que a internet é um ambiente que precisa de ser monitorado e que as crianças necessitam de acessá-la com a supervisão de pais, mães e cuidadores. A organização quer conscientizar a população sobre a violência sexual contra crianças e adolescentes no ambiente on-line, com orientações a pais, mães, cuidadores e às crianças. 

Para diminuir os casos de violência infantil, a ONG realiza ações como a campanha Maio Laranja, destinada ao combate à exploração e ao abuso sexual contra crianças e adolescentes. Outra frente de atuação da organização se relaciona aos direitos da criança e do adolescente.

“Também faz parte do nosso trabalho incidir pela educação digital, com foco em proteção de crianças e adolescentes na internet, para que possam aprender a navegar no ambiente virtual de maneira cada vez mais segura”, complementa Águeda Barreto, coordenadora de advocacy do ChildFund Brasil.

Atuação contra Meta, Tik Tok, X, Snapchat e Discord

Nos Estados Unidos, o ChildFund International teve participação ativa na audiência do Senado, realizada em 202. Os senadores questionaram os CEOs de tecnologia da Meta (Facebook e Instagram), TikTok, X, Snapchat e Discord porque se recusavam a adotar mecanismos para acabar com a divulgação de material de abuso sexual infantil e evitar que crianças sejam extorquidas sexualmente e abusadas nas suas plataformas.

“Sentimos o poder e a força dos pais e survivors (pessoas que sobreviveram a essas violações) que estavam presentes, pois serviram como exemplos do impacto humano que a inovação tecnológica teve e continuará a ter sem mudanças nas políticas”, afirma Danielle Lilly, diretora de políticas do ChildFund International.

Além disso, a organização  realiza a campanha Take It Down, a fim de mobilizar o país pela causa.

Agenda Positiva

Maio Laranja: prevenção de violações na internet

Maio Laranja acontece pela segunda vez na história do país, com a proposta de sensibilizar toda a sociedade sobre o enfrentamento e prevenção de violência e abuso sexual infantojuvenil. A campanha foi criada através da lei federal 14.432, sancionada em 2022, graças ao trabalho do ChildFund Brasil e de outras organizações sociais no Congresso Nacional.

Neste mês, a organização realiza eventos on-line especiais sobre violência e abuso sexual on-line de crianças. Dentre os assuntos abordados, estão orientações para pais, mães, educadores, profissionais do Sistema de Garantia de Direitos e organizações do Terceiro Setor para prevenir violações na internet e entender os riscos a que crianças e adolescentes estão submetidos.

No primeiro webinar, agendado para 14 de maio, será lançado um curso on-line, voltado para crianças e adolescentes de 9 a 13 anos; nele, serão abordados os riscos que crianças e adolescentes correm na internet.

No dia 16, haverá um webinar com o médico Ailton Cezário Alves Junior, pós-graduado em Psicologia Médica, mestre e doutor em Saúde da Criança e do Adolescente pela Faculdade de Medicina da UFMG, com estudos em Neurociência (dopamina e telas digitais). Pela ChildFund Brasil, também participam Mauricio Cunha, Águeda Barreto e Cristiano Moura.

No dia 28, acontece uma live direcionada a pais, mães e cuidadores sobre os riscos que estão submetidos a violência e abuso sexual online, sem a supervisão de adultos. Sheylli participa deste evento.

Como denunciar

Casos de violência on-line podem ser denunciados à polícia pelo número 190. Outra possibilidade é fazer a denúncia pelo Disque 100 ou utilizar sites como o portal da Safernet.

Com informações da ChildFund Brasil

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