O abuso sexual ainda é um tabu e um crime silencioso. Há registros de que a cada hora, cinco crianças e adolescentes são vítimas de violência sexual no Brasil. E isso é somente a ponta do iceberg, já que o crime é altamente subnotificado.

Dados da 17ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança mostram que houve um aumento de 8,6% do estupro de vulnerável, passando de 52.057 casos em 2021 para 56.820 em 2022. O estudo mostra ainda que a maioria das vítimas (61,4%) tinha no máximo 13 anos, sendo 10,4% com idade entre 0 e 4 anos; 17,7% entre 5 e 9 anos e 33,2% entre 10 e 13 anos.

De acordo com o último relatório da Childhood Brasil, organização fundada há mais de 20 anos pela Rainha Silvia da Suécia, vergonha e medo corresponde a 53% dos principais motivos para a vítima não denunciar os casos de violência sexual. Os dados também apontam que 64,8% possuem vínculo familiar ou são conhecidos da vítima.

Por isso, ouvir nossas crianças e procurar ajuda é o primeiro passo para a prevenção. É dever da sociedade proteger as crianças e adolescentes. É preciso agir agora. Uma realidade que precisa ser urgentemente transformada por toda a sociedade. A reforça a importância de proteger as crianças e adolescentes e de promover uma ampla discussão sobre o tema.

Quanto menos a sociedade fala sobre o assunto, maior é o silêncio em volta dos casos. E quanto maior o silêncio, maior é o sofrimento e o impacto da violência em suas vítimas, e maior a dificuldade de enfrentar o problema adequadamente.

“Uma parte importante do problema da violência sexual contra crianças e adolescentes é a falta de conversa a respeito. Precisamos ouvir as vítimas e entender que, muitas vezes, meninos e meninas se expressam para além da voz, seja por meio de gestos, desenhos, comportamentos e até mesmo com o silêncio. Jogar luz sobre o tema é fundamental para que a sociedade reflita sobre como enfrentar essa questão urgente”, ressalta Laís Peretto, diretora executiva da Childhood Brasil.

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A importância do diálogo em caso de suspeita

O primeiro passo para proteger crianças e adolescentes do abuso sexual é a informação. A educação é uma das formas mais eficazes de prevenir e enfrentar problema. “Acreditamos na arte e no poder transformador do filme. Trabalhamos incansavelmente para que as vítimas possam falar, que encontrem suas vozes para se libertar dos traumas e que tenham uma escuta respeitosa e atenta”, afirma Laís.

Ensinar desde cedo e com abordagens apropriadas para cada faixa etária conceitos de autoproteção, consentimento, integridade corporal, sentimentos e a diferença entre toques permitidos e desagradáveis é fundamental para aumentar as chances de proteger crianças e adolescentes de possíveis violações.

Laís ressalta que o diálogo deve acontecer desde os primeiros anos da infância já que o abuso sexual pode acontecer em todas as faixas etárias.

“Estudos mostram que informações sobre o corpo humano e a sexualidade podem tornar crianças e adolescentes menos vulneráveis à violência sexual. Além disso, fornecem habilidades para que eles procurem ajuda em situações de risco”.

Segundo ela, o abuso sexual afeta crianças e adolescentes de diferentes classes sociais, gênero e raça e é importante observar possíveis mudanças bruscas de comportamento, ou que possa indicar algo fora do normal.

Em caso de suspeita, os pais e responsáveis devem ter um olhar cuidadoso e atento para identificar sinais de violência sexual no comportamento das crianças e adolescentes.

Mudanças bruscas de comportamento sem explicação aparente, mudanças súbitas de humor, baixa autoestima, insegurança, comportamento sexuais inadequados para a idade e até mesmo desenhos podem ser sinais silenciosos de que algo não está bem.

“Precisamos cada vez mais prestar atenção nas crianças e entender que, muitas vezes, meninos e meninas se expressam para além da voz, seja por meio de gestos, desenhos, comportamentos e até mesmo com o silêncio. Em quase todos os casos a vítima tenta se manifestar da sua própria maneira”, diz Laís.

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‘Eu tenho uma voz’: filme incentiva denúncia

Para ajudar a quebrar esse silêncio, em parceria com o Canal Futura e Unicef, a organização disponibiliza a série audiovisual Crescer Sem Violência, que traz temas sobre o conhecimento do próprio corpo, exposição na internet, discussões sobre gênero, empoderamento, puberdade e a importância da autoproteção de modo informativo, atraente e lúdico.

No Maio Laranja no Brasil – mês de conscientização e prevenção ao abuso e a exploração sexual contra crianças e adolescentes – a organização leva seu curta-metragem “Eu tenho uma Voz” aos Centros Educacionais Unificados (CEUs) da cidade de São Paulo, até o final de 2024, para fomentar o debate sobre o tema em diversos territórios do município.

Lançado em maio de 2023, o musical de 8 minutos reforça um dado estatístico: o abuso sexual ocorre em sua maioria por pessoas próximas à vítima.  O filme visa desmistificar o abusador como um único perfil: ele pode ser o parente próximo, um jovem, um idoso, etc.

A canção é a espinha dorsal da história em contraste com os acontecimentos trágicos do abuso. Gabi é a personagem principal e sua história é apresentada em três idades diferentes: 8, 13 e 32 anos, para que o público entenda como a violência marcou a sua vida. O acolhimento também é um importante fio condutor da obra.

Roda de conversa com especialistas

Após a exibição do filme, é realizada uma roda de conversa, uma vez por mês com as especialistas Patricia Kelly Ferreira, que atua há 25 anos na área de atendimento, defesa e proteção de crianças e adolescentes, e Marilda dos Santos Lima, que tem mais de 30 anos na coordenação de programas sociais com foco na proteção de crianças e adolescentes.

“Entendemos que conhecimento e informação é um dos caminhos para a prevenção das violências sexuais e o projeto consiste em proporcionar uma roda de conversa sobre o assunto a partir da exibição do filme. Acreditamos na arte e no poder transformador do filme. Trabalhamos incansavelmente para que as vítimas possam falar, que encontrem suas vozes para se libertar dos traumas e que tenham uma escuta respeitosa e atenta”, afirma Raquel de Paula Oliveira, gerente da Childhood Brasil.

A primeira exibição ocorreu em 9 de maio, no CEU Inácio Monteiro, no bairro de Guaianazes. Já em 20 de junho, o curta-metragem será exibido no CEU Vila Formosa. Não é necessário fazer inscrição para participar, somente ir até o CEU na data e hora da apresentação. A iniciativa conta com a parceria do Instituto ABIHPEC, braço social da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos.

A produção é comandada por Clara Verdier, Gustavo Cabral e Mauricio Rodrigues. A direção é da dupla Impalas – Barbara Ramoz e Juliana Albuquerque. Já o elenco conta com Clara Verdier, Bia Brumatti, Isabella Bertozzi, Rafaela Mandell, Ivo Müller, Eike Duarte e Maximiliana Reis. No total, mais de 70 profissionais integraram diversas áreas do projeto.

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Lei da Escuta Protegida

Nos últimos anos, a Childhood Brasil tem trabalhado ativamente para dar mais segurança às vítimas e ampliar as estatísticas de responsabilização dos agressores. Um exemplo é a criação e implantação da Lei 13.431/2017, mais conhecida como Lei da Escuta Protegida.

Esse procedimento visa garantir maior proteção para crianças e adolescentes ao relatar o caso em um ambiente acolhedor e com o depoimento gravado uma única vez ao longo da investigação, evitando o processo de revitimização. A lei inova ainda por estabelecer mecanismos e princípios de integração das políticas de atendimento.

Como denunciar

A denúncia é essencial para proteger crianças e adolescentes. Se você suspeitar ou tiver conhecimento de um caso de violência sexual, Disque 100 ou mande Whatsapp para (61) 99656-5008 para registrar a denúncia que é gratuita e pode ser anônima. É nosso dever DENUNCIAR, acolher sem culpabilizar e oferecer segurança e apoio incondicionalmente.

Com informações da Childhood Brasil

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