Eu tentei até o último momento, numa confortável sala preparada para o parto humanizado na Clínica Perinatal, em Laranjeiras, onde cheguei na noite de 6 de dezembro de 2005. Mas não deu. Minha filha precisou nascer de uma cesariana, após mais de 8 horas em trabalho de parto. Havia risco de sofrimento fetal, caso insistisse num parto ‘normal’, me alertou o obstetra. Esta, porém, não é a realidade da maioria das mães que, por medo, praticidade ou até mesmo pressão dos médicos, acaba optando pela cesariana.

Dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) indicam que a antecipação do parto – que pode trazer sérios riscos à mãe e à criança – ocorre muito em épocas festivas, como Natal e Ano Novo. Mas graças a inúmeras campanhas e ações nas redes públicas e privadas, esta situação vem mudando. Uma boa notícia são os novos dados da ANS sobre partos realizados por beneficiárias de planos de saúde, divulgados no final de novembro.

Os números revelam que houve redução de cesarianas no final de dezembro e aumento no período anterior ao Natal em 2017. Naquele ano, a média de cesarianas na semana de 24 a 31 de dezembro foi 20% menor do que a média semanal do ano, enquanto a média entre 16 e 23 de dezembro foi 9% maior do que a média anual – o que indica agendamento dos partos que ocorreriam na semana entre Natal e Ano Novo. Em 2016, houve diminuição de aproximadamente 40% no número de cesáreas realizadas no período de 24 a 31 de dezembro, comparado com a média semanal de cesarianas.

Campanha pelo direito de nascer no tempo certo

O agendamento de partos e as consequências dessa decisão para a saúde da mãe e do bebê preocupam a reguladora, que acaba de lançar a campanha “A hora do bebê: Pelo direito de nascer no tempo certo”, em parceria com o Hospital Israelita Albert Einstein e o Institute for Healthcare Improvement (IHI).

O objetivo do projeto é incentivar o parto normal e conscientizar as futuras mães e toda a rede de atenção obstétrica sobre os riscos da realização de cesáreas sem indicação clínica.

A campanha #AHoraDoBebê – Pelo direito de nascer no tempo certo ressalta às gestantes e aos profissionais de saúde que o bebê tem seu tempo e que as fases da gestação devem ser respeitadas, portanto, o parto não deve ser antecipado.

Riscos para o bebê e para a mãe

Estudos científicos apontam que bebês nascidos de cesarianas são internados em UTI neonatal com mais frequência, e quando não há indicação clínica a cesariana pode aumentar o risco de morte da mãe e as chances de complicações respiratórias para o recém-nascido. Isto porque se o parto for realizado antes das 39 semanas de gestação, o nascimento pode ocorrer sem a completa maturação pulmonar do bebê.

“Não há evidências que justifiquem o agendamento de uma cesariana, salvo algum risco claro para a saúde da mãe e do bebê. É importante que a gestante tenha o apoio de médicos, enfermeiros e demais profissionais que acompanham o pré-natal, para entender as opções de parto e fazer a escolha de forma consciente”, afirma a especialista em regulação de saúde suplementar Jacqueline Torres, coordenadora do Projeto Parto Adequado.

Menos 10 mil cesarianas desnecessárias

“Ao longo de 18 meses, foram alcançados resultados transformacionais: os hospitais participantes protagonizaram a criação de um novo modelo de assistência materno-infantil para o Brasil e evitaram a realização de 10 mil cesarianas desnecessárias”, informou a ANS.

Iniciado em 2015, o Projeto Parto Adequado, desenvolvido pela ANS, surgiu da necessidade de se identificar modelos inovadores e viáveis de atenção ao parto e nascimento, que valorizem o parto normal e reduzam o percentual de cesarianas sem indicação clínica na saúde suplementar.

A proposta é oferecer às mulheres e aos bebês o cuidado certo, na hora certa, ao longo da gestação, durante todo o trabalho de parto e pós-parto, considerando a estrutura e o preparo da equipe multiprofissional, a medicina baseada em evidências e as condições socioculturais e afetivas da gestante e da família.

“A mulher tem o direito de se tornar parte ativa na decisão pelo tipo de parto e de ser bem informada sobre possibilidades, riscos e benefícios decorrentes da sua escolha. O Projeto promove a conscientização de gestantes e de toda a rede de atenção obstétrica sobre os benefícios do parto normal”, afirma Rodrigo Aguiar, diretor de Desenvolvimento Setorial da ANS.

Participam da atual Fase 2 do Projeto 137 hospitais privados, 25 hospitais públicos, 65 operadoras de planos de saúde e 73 hospitais parceiros. Na Fase 1, também denominada “piloto” o Parto Adequado contou com a adesão de 35 hospitais e 19 operadoras de planos de saúde.

Vantagens do parto ‘normal’

Pesquisas comprovam que a passagem pelo canal vaginal, na hora do nascimento, coloca o bebê em contato com bactérias naturalmente presentes nessa área do corpo da mulher, fortalecendo seu sistema imunológico.

O trabalho de parto completa o ciclo de amadurecimento do bebê: a intensificação gradual das contrações musculares do corpo da mãe favorece a prontidão para o nascimento e o contato com o mundo, uma vez que ritmo cardíaco, fluxo sanguíneo e maturação pulmonar são gradativamente trabalhados no corpo do bebê. Além disso, hormônios naturalmente atuantes durante o trabalho de partofavorecem o vínculo entre mãe e bebê, o aleitamento materno e a recuperação pós-parto.

Fonte: ANS, com Redação

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