Indiscutível gênio da ciência, pesquisador obstinado e mestre na difusão de informações, Louis Pasteur fez avançar a química e a medicina no século XIX. A vida a e obra deste defensor da ciência podem ser revisitadas na exposição Pasteur, o Cientista, uma celebração à vida e à obra do francês que foi um revolucionário em muitos campos e símbolo da vacinação, por ter descoberto a vacina antirrábica (contra a raiva animal) no ano de 1885.
A mostra, que chegou ao Rio de Janeiro no último dia 30 de setembro e vai até 3 de dezembro, apresenta ao público de forma divertida e interativa, com experiências, videomapping e muita interação lúdica, as descobertas e a vida do cientista e, principalmente, valorização da ciência e dos cientistas. Na exposição, vídeos, grafismos, animações, projeções, textos e desenhos apresentam toda a sua trajetória – e não apenas a dele.
Pasteur, o Cientista faz uma permanente contextualização do tempo de Louis Pasteur, principalmente em relação aos acontecimentos da Europa e às descobertas do chamado século das invenções – em que surgiram o trem, a fotografia e o cinema, os motores a explosão, dirigíveis, telégrafo, telefone, iluminação pública e tantos outros símbolos da modernidade.
Mais que tudo, Pasteur, o Cientista traz à discussão a valorização da ciência e do ato histórico como elemento constituinte não somente da memória e da identidade, mas como a mais sólida base para o crescimento e o desenvolvimento da humanidade. A mostra apresenta o contexto em que se deram suas pesquisas, revela suas descobertas e os usos e aplicações delas, tanto no passado quanto na contemporaneidade, incluindo suas relações e contribuições para o desenvolvimento da ciência no Brasil.
Gratuita e aberta para toda a família, a mostra Pasteur, o Cientista fica em cartaz terça a sexta-feira, das 9h às 17h, e aos sábados e domingos, das 10h às 18h, na Fábrica de Espetáculos (galpão do Theatro Municipal do Rio), ao lado do AquaRio, no bairro do Santo Cristo, na Gamboa.
Com parceria da Secretaria Municipal de Saúde, será montado um posto de vacinação na mostra, atendendo à população adulta e infantil com todas as vacinas necessárias. As crianças precisam apresentar carteira de vacinação para controle. O posto vai funcionar nos dias e horários da exposição, a partir da abertura.
Ciência aplicada à vida prática
Nascido no interior da França em 1822, de uma família de curtidores de couro, lidou desde criança com vinho, leite, animais de pasto e seda. Estudou germes, vírus, fungos e demais “seres infinitamente pequenos”. Um dos criadores da microbiologia, Pasteur redefiniu horizontes ao provar que existem micro-organismos e ao definir como se reproduzem, proliferam e colonizam outros organismos, sendo em muitos casos responsáveis pelas doenças infecciosas.
Estabeleceu novos paradigmas para as ciências e novos procedimentos, inclusive para a Medicina. Foi a partir dessas descobertas, por exemplo, que médicos passaram a valorizar a assepsia nos cuidados com doentes. Antes disso, era comum que os profissionais de saúde sequer lavassem as mãos nos atendimentos.
Pesquisador respeitado entre seus pares pelo extremo rigor nos métodos, ganhou fama mundial também junto ao grande público na difusão dos resultados da vacina antirrábica, em 1885. No Brasil, tinha muitos seguidores e admiradores, entre os quais o imperador Pedro II. Oswaldo Cruz foi um dos cientistas que trabalharam na esteira de suas realizações.
Pasteur não foi o primeiro nem o único a criar uma vacina, mas sua pesquisa e a aplicação da antirrábica o transformou em símbolo da imunização. Era um cientista com visão aplicada: trabalhou na pesquisa ligada à indústria e a atividades econômicas importantes, aperfeiçoando métodos de cultivo e processamento de indústrias importantes como as do vinho, da seda e de animais de corte.
Um cientista-empreendedor que sabia comunicar suas descobertas
Louis Pasteur resolveu problemas logísticos – seu nome batiza o processo de conservação de alimentos batizado como pasteurização – e salvou atividades econômicas prejudicadas por pragas.
Foi também um brilhante comunicador – hoje, seria considerado um ser midiático. Sabia chamar a atenção da comunidade científica e da população para assegurar que suas descobertas chegassem ao maior número possível de pessoas, com demonstrações públicas e grandiloquentes de suas descobertas.
“Para provar ao público reunido na Sorbonne que as bactérias estavam por toda parte, mesmo no ar, ele direcionou um projetor de luz para iluminar os grãos de poeira”, conta Astrid Aron, museógrafa da exposição.
Era também um empreendedor, registrando patentes e criando empresas para explorar suas descobertas. “Seu principal objetivo não era reunir uma fortuna, mas assegurar fundos para prosseguir com as pesquisas”, explica o curador científico Maxime Schwartz, ex-diretor geral do Instituto Pasteur. “Podemos até dizer que Pasteur era uma espécie de precursor das start-ups de hoje”, diz Aron.
A fama conquistada pela vitória contra a raiva permitiu que levantasse fundos internacionais para fundar, três anos depois, o Instituto Pasteur, com braços pelo mundo, para disseminar a imunização. “O trabalho de Pasteur pode estimular que as crianças entendam e amem a ciência. Acho que é uma meta que devemos manter em nossas cabeças e corações”, conclui Maxime.
Por onde a exposição já passou
Concebida e realizada originalmente pela Universcience (órgão ligado ao Ministério da Cultura da França), a exposição Pasteur, o Cientista estreou no Palais de la Découverte, em Paris, em dezembro de 2017. O Brasil foi o primeiro país fora da França a receber a mostra, que passou por três cidades de São Paulo entre 2020 e 2022 e reuniu mais de 45 mil visitantes.
Em fevereiro de 2020, a exposição foi inaugurada no Sesc Interlagos, na capital paulista, mas a visitação precisou ser interrompida durante a pandemia, sendo retomada no final do ano e seguiu até o início de 2021. Entre junho de 2021 e outubro do ano seguinte, a atração também passou pelas unidades do Sesc em Campinas e Santo André.
A exposição é uma realização de Ministério da Cultura, Museu da Vida Fiocruz, Casa de Oswaldo Cruz, Fiocruz e Ponto de Produção, com o apoio da Embaixada da França no Brasil e da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado do Rio de Janeiro. O patrocínio é do Magazine Luiza e da Sanofi.
Animação e interação
Estruturada em seis atos, como uma peça de teatro, a exposição apresenta as descobertas de Pasteur em ordem cronológica: da solução de um enigma químico – cristais de ácido do vinho aparentemente iguais reagiam à luz de forma diferente – até a vitória contra a raiva, doença até então incurável.
Um busto de Pasteur recebe os visitantes e, sobre ele, é projetado um videomapping (imagens em 3D), enquanto a voz de Marie Pasteur narra a trajetória do marido. Uma curiosidade: o considerável talento artístico do pesquisador quando jovem é mostrado na reprodução de telas pintadas entre os 13 e os 20 anos.
Seguem-se ambientes em que filmes, aparelhos, mecanismos, jogos de charadas, vitrines mágicas e instrumentos de época desfilam as descobertas de Louis Pasteur na Química, no trabalho com os micro-organismos e na imunização de animais e seres humanos.
O visitante pode entender, por exemplo, a pesquisa da vacina antirrábica num filme de animação em que uma menina, espiando da casa vizinha à do laboratório, acompanha os testes de Pasteur em coelhos, e, através de um “microscópio”, como micro-organismos podem sobreviver sem oxigênio. Também espia pelo gargalo de garrafas de vinho para descobrir os segredos da fermentação da bebida e decifra junto com Pasteur o segredo dos “pastos malditos”, locais onde rebanhos inteiros morriam de antraz, entre outras atividades.
No final, um módulo especialmente produzido faz a ligação de Pasteur com o Brasil: pesquisas desenvolvidas por aqui, a admiração de D. Pedro II pelo cientista, o desenvolvimento nacional da produção de vacinas pelos Institutos Butantã e Oswaldo Cruz e seus desdobramentos na ciência contemporânea.
PRÓLOGO: Busto de Pasteur recebe os visitantes com projeções de videomapping. Um grande ciclorama pontua a história cultural do século 19.
ATO 1 – CRISTAIS E DISSIMETRIA (1847-1857): O início de tudo: aos 21 anos, Pasteur decide – e consegue – resolver um mistério da ciência. Aqui, filme, experiência ótica e jogo de classificação ajudam a entender o processo.
ATO 2 – FERMENTAÇÕES (1857-1876): Pasteur e os micro-organismos da fermentação: como o cientista inventou a pasteurização e resolveu impasses de indústrias como a da cerveja e do vinho. Aqui também começa a relacionar contaminação por micro-organismos e doenças. Microscópios e jogos proporcionam a interação nesse ato.
ATO 3 – GERAÇÕES ESPONTÂNEAS? (1859-1864): A polêmica do surgimento dos micro-organismos: de onde vêm? Pasteur enfrenta outros cientistas e prova sua teoria. O visitante descobre como foi, passo a passo, na multimídia instalada em vitrine mágica.
ATO 4 – DOENÇAS DOS BICHOS-DA-SEDA (1865-1869): Pasteur salva a indústria da seda, eliminando doenças dos insetos produtores, na sua primeira pesquisa em patologias animais. Maquetes, equipamentos de época e dioramas ilustram o método e as descobertas.
ATO 5 – DOENÇAS INFECCIOSAS E VACINAS (1876-1895): A pesquisa de Pasteur das vacinas para doenças dos animais se amplia. Galinhas e carneiros recebem vacinas em experiências bem-sucedidas. O cientista ganha fama mundial com a invenção da vacina contra a raiva. Um cenário de fazenda, jogos sobre as vacinas, filmes e maquetes contam essa história.
EPÍLOGO – PASTEUR E O BRASIL: Enquanto Louis Pasteur fazia a ciência avançar na Europa, os reflexos se suas pesquisas chegavam ao Brasil. D. Pedro II era um grande admirador do cientista, trocou correspondência com ele, tentou trazê-lo para o Brasil e fez uma grande contribuição para a criação do Instituto Pasteur. Foram fundados institutos de pesquisa e diversos cientistas e médicos brasileiros se destacaram na área, em especial Vital Brazil e Oswaldo Cruz.