A pergunta que dá título à matéria pode parecer absurda, mas é isso mesmo: você teria coragem de dar a seu filho uma solução à base de uma fórmula química altamente tóxica, a pretexto de “curá-lo” de um transtorno mental que ainda não tem explicação científica?
Como mãe, eu diria “é claro que não”, mas impossível julgar pais e mães que, desesperados em busca de uma solução definitiva para seus dramas familiares, acabam acreditando em falsas promessas de cura milagrosa para a condição de seus filhos, que pode representar dificuldades de convívio social para o resto da vida dos seus filhos.
Uma solução química baseada em duas substâncias altamente cáusticas poderia tratar um transtorno como o autismo? Em busca dessa resposta, uma reportagem exibida no domingo (26) pelo Fantástico, da Rede Globo, mostrou que o MMS (Mineral Miracle Solution, em inglês) não passa de uma farsa potencialmente agressiva ao organismo.
Sem propriedade medicinal comprovada e com venda proibida no Brasil, a fórmula que vem sendo propagandeada em redes sociais e aplicativos de conversas pode causar efeitos devastadores no organismo humano, principalmente de crianças. A falsa promessa de cura para esta condição que afeta uma em cada 59 pessoas em todo o mundo desafia e divide opiniões entre autoridades sanitárias, médicos, cientistas e profissionais de saúde que atuam com terapias complementares no Brasil.
PROIBIÇÃO NOS EUA
A fórmula foi criada pelo americano Jim Humble há mais de 20 anos. Ex-membro da Cientologia, uma espécie de seita, ele defende o uso do composto para tratar uma série de doenças. Nos últimos anos, popularizou-se o uso do MMs para o autismo em todo o mundo.
Desde 2010, o Departamento de Saúde dos Estados Unidos adverte os consumidores sobre os danos graves que a solução pode causar e alerta que, no caso de tratamento para autismo, o produto não se mostrou seguro ou eficaz. Mas mesmo assim, sua utilização foi propagada por diversos países.
PROIBIÇÃO NO BRASIL
No Brasil, uma portaria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária proibiu a comercialização, a distribuição e o uso dessa substância para este fim desde junho de 2018. A Anvisa também bloqueou mais de 200 sites que vendiam o produto. Mesmo correndo o risco de terem seus registros cassados, muitas farmácias de manipulação continuam oferecendo o produto, a preços que variam de R$ 50 a R$ 120.
Para o Conselho Federal de Medicina (CFM), quem prescrever o composto pode estar incorrendo em crime contra a saúde pública. O CFM afirma que os médicos podem ser notificados a prestar esclarecimento nos conselhos estaduais, que podem abrir sindicância e avaliar se há infração ética. As denúncias também podem ser feitas aos conselhos regionais.
COMO DENUNCIAR
A jornalista Andrea Werner, mãe de um menino com autismo, lidera um movimento para levar a questão à Justiça. É possível denunciar tanto profissionais quanto sites que indiquem o uso da substância ao Ministério Público.
Veja aqui o vídeo completo da reportagem do Fantástico
Mais sobre o MMS
O composto é dividido em duas substâncias químicas: o clorito de sódio, equivalente a água sanitária, só que 10 vezes mais concentrado usado para branquear produtos, descolorir madeira, celulose, papel, e o ácido clorídrico, usado na indústria qui[imica para obtenlão de tintas e corantes, para extrair petróleo ou para polir metais,
A mistura dessas substâncias gera outro composto, o dióxido de cloro, usado como descolorante e desinfetante. Os pacientes são instruídos a ingerir o produto diluindo na água. Maurico Yonamine, professor de Toxicologia da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, alerta que a mistura pode causar irritação local e até no esôfago. “|sso é material tóxico, não é medicamento”, disse ele, ao Fantástico.
Na reportagem do Fantástico, um toxicologista também alerta que a manipulação de dois produtos cáusticos em casa não é recomendado – a toxicidade depende da quantidade que for diluída.
O dióxido de cloro pode causar enjoos, vômitos, diarreia, lesão renal, lesão das células sanguíneas que carregam oxigênio e insuficiência respiratória. Estudos também apontam outras complicações, como anemia, desidratação e choque hemorrágico.
Há ainda indicações de que o MMS deve ser introduzido pelo reto, por conta do forte odor de cloro, o que acaba acarretando em problemas ainda mais graves, como lesões corrosivas na parede de proteção do intestino delgado e grosso.
Terapia comportamental
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é a deficiência que mais afeta o neurodesenvolvimento em crianças. Os indicadores norte-americanos têm apontado um aumento no número de casos, passando de 1 em cada 166 pessoas em 2002 para 1 em cada 59 pessoas em 2018. uma pesquisa americana, os fatores ligados ao ambiente externo estão relacionados a pelo menos 50% da responsabilidade pelo transtorno.
Esses dados refletem a necessidade de se investir não apenas em pesquisas para descobrir suas causas, mas também em tratamentos que reduzam os sintomas”, salienta a psicóloga Giulianna Kume, do Cerne, um centro especializada em TEA.
Para especialistas, o que funciona mesmo na melhora dos quadros de autismo é a terapia comportamental. Criadora do espaço Aprendendo a Brincar na Mesma Roda, que reúne pais e crianças com autismo, a fonoaudiológa Danielle Damasceno explica que o tratamento de ser individualizado. “É preciso muita sensibilidade para ouvir os pais nas suas mais profundas tristezas e receios em relação ao futuro dos seus filhos”, observa a autora do livro “O autismo entre nós”,
inclusão social de crianças autistas
De acordo com a fonoaudióloga, uma gama de características deve ser levada em consideração para o diagnóstico. “Ao mesmo tempo que ir ao shopping pode ser uma agressão’ visual e auditiva para uma criança com o transtorno, para outra pode ser o máximo, já que esta interação pode auxiliar a aprendizagem de uma forma geral”, explica a fonoaudióloga.
Outro ponto ressaltado pela profissional está no fato de que o autismo não é uma disfunção num equipamento mecânico ou elétrico que possua um manual para repará-lo, sendo que uma das maiores dificuldades que a família da criança autista enfrenta é a inclusão na sociedade.
“As pessoas não sabem conviver com o diferente, a sociedade não está preparada para isso. Isso precisa mudar”, diz ela, que faz uma avaliação específica para traçar um tratamento terapêutico individual.
O tratamento de uma criança autista é feito por uma equipe multidisciplinar composta por psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagogo, terapeuta ocupacional, psicomotricista, educador físico e, em algumas situações, pode haver intervenção medicamentosa sob a orientação de um neurologista ou psiquiatra.
4 MITOS SOBRE AUTISMO
Diante de um transtorno que vem aumentando significativamente, é imprescindível que a sociedade esteja mais informada para identificar precocemente os sintomas e desenvolver mecanismos de intervenção para que autistas possam participar ao máximo da vida em sociedade, possibilitando maior independência e autonomia.
1) O comportamento do autista é imutável.
Errado. O TEA é caracterizado por um déficit na comunicação e interação social, além de apresentar comportamentos restritos. Essas dificuldades afetam não apenas a plena participação da pessoa na sociedade, mas sobretudo o processo de aprendizagem. Atualmente, têm sido ofertados diversos tipos de terapias e tratamentos para minimizar o impacto do TEA na vida dos indivíduos.
2) Não há comprovação científica para o tratamento do autismo.
Errado. A análise do comportamento aplicada (ABA) tem sido a terapia mais indicada e com maior comprovação científica de eficácia no tratamento do TEA. Ela consiste na aplicação dos princípios da Ciência na análise do comportamento em contextos de intervenção social. Utiliza-se de procedimentos para aumentar e refinar o repertório comportamental.
3) É preciso esperar a criança crescer para iniciar o tratamento.
Errado. Um fator importante no tratamento é a precocidade. Quanto antes for realizado o diagnóstico e a intervenção melhores são os resultados e a resposta da criança. Isso devido ao desenvolvimento neurológico, que permite maior aprendizagem, e aos atrasos menores em relação a indivíduos neurotípicos de mesma idade.
4) Crianças não respondem tão bem ao tratamento.
Errado. O modelo Denver é uma terapia com embasamento em ABA para intervenção precoce de crianças com TEA. É o tratamento com melhor taxa de resposta para crianças com idade de 12 a 60 meses. Em 2012, foi eleito pela revista TIME uma das 10 maiores descobertas na área médica. Seu maior objetivo é ensinar a criança a partir do fortalecimento da interação social em jogos e brincadeiras, simulando um ambiente muito próximo ao natural.
Com Assessorias