Na era da sociedade digital, ascensão do Marketing de Influência e a crescente atuação dos criadores de conteúdo, por não especialistas no mercado, ligados a segmentos de estética, dentre outros, o Conselho Federal de Medicina (CFM) atualizou suas regras para a publicidade médica. O material foi publicado nesta quarta-feira (13) e as clínicas têm até o dia 11 de março de 2024 para se adaptar às novas regras.

A nova resolução do CFM liberou que os profissionais divulguem fotos de “antes e depois”, valores cobrados por consultas, expliquem como funcionam tratamentos e mostrem o dia a dia de trabalho nas redes sociais, desde que não identifiquem os pacientes nem façam propagandas de empresas ou marcas.

As mudanças favorecem os médicos, que passam a ter direito de fazer propaganda de seus trabalhos, mas até que ponto isso beneficia os pacientes? E como os direitos deles são preservados? Especialistas ouvidos pelo Portal ViDA & Ação esclarecem.

Para o presidente da Sociedade Brasileira de Direito Médico e Bioética (Anadem), Raul Canal, as novas regras permitem mais segurança jurídica aos médicos, mas faz um alerta em relação a um possível aumento no número de processos judiciais contra estes profissionais por conta de resultados de procedimentos insatisfatórios, especialmente na área estética.

“De modo geral, as novas orientações garantem maior segurança jurídica aos profissionais médicos em relação ao julgamento de suas condutas publicitárias no âmbito dos respectivos Conselhos Regionais de Medicina. No entanto, ainda que as novas regras sejam cumpridas à risca, é necessário estarmos atentos sobre os possíveis impactos que algumas das flexibilidades trazidas podem causar a estes profissionais em processos cíveis, principalmente no que tange àqueles que discutam a insatisfação estética dos pacientes quanto ao resultado”, afirma.

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Médicos agora podem divulgar ‘antes e depois’ dos pacientes

Fotos devem respeitar anonimato do paciente

Para Andrea Ferreira, gestora de Saúde do Peck Advogados, “a norma traz maior liberdade de anúncio aos médicos, mas é fundamental agir com responsabilidade e em conformidade com demais legislações vigentes, inclusive à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD (13.709/2018)”.

“Pela nova Resolução CFM nº 2.336/23, a imagem deve ter caráter educativo e obedecer os seguintes critérios: o material deve estar relacionado à especialidade registrada do médico e a foto deve vir acompanhada de texto educativo, contendo as indicações terapêuticas e fatores que possam influenciar negativamente o resultado”, ressalta a advogada.

Ainda segundo a regra, a imagem também não pode ser manipulada ou melhorada e o paciente não pode ser identificado. Demonstrações de antes e depois devem ser apresentadas em conjunto com imagens contendo indicações, evoluções satisfatórias, insatisfatórias e possíveis complicações decorrentes da intervenção. Quando for possível, deve ser mostrada a perspectiva de tratamento para diferentes biotipos e faixas etárias, bem como a evolução imediata, mediata e tardia.

Andréa destaca ainda que a importância de seguir algumas cautelas como: i) quando as imagens forem de banco de dados do próprio médico ou serviço ao qual pertença: 1. obter autorização do paciente para o uso de sua imagem; 2. respeitar o pudor e a privacidade do paciente que cedeu as imagens; 3. garantir o anonimato do paciente que cedeu as imagens, mesmo que tenha recebido autorização para divulgação.

Em muitos casos, o paciente publica em suas redes sociais agradecimento ao profissional que o atendeu. Agora, o médico poderá repostar, em suas redes, esses elogios e depoimentos, com a recomendação de que o depoimento seja sóbrio, sem adjetivos que denotem superioridade ou induzam a promessa de resultados.

Andrea lembra também que, quando o médico usar imagens de banco de imagens, deverá citar a origem e atender às regras de direitos autorais. Quando a fotografia for dos próprios arquivos do médico ou do estabelecimento onde atua, deve obter do paciente a autorização para publicação. A imagem deve garantir o anonimato do paciente, mesmo que este tenha autorizado o uso, e respeitar seu pudor e privacidade.

Para Baps, liberação do ‘antes e depois’ beneficia paciente

A atualização das regras é uma reivindicação antiga de médicos, entidades e associações, como a BAPS (Brazilian Association of Plastic Surgeons), que surgiu no começo de 2022 com a intenção de defender a publicidade médica livre e responsável, dando maior transparência e clareza nas relações entre o médico e o paciente, além de valorizar a produção e disseminação do conhecimento científico.

“Os cirurgiões e médicos, com boa postura e boa técnica, eram limitados a se expressar em ambientes de rede social, o que fazia com que os pacientes ficassem mais expostos a profissionais menos capacitados. A publicidade médica livre reaproxima os pacientes dos médicos”, afirma David Castro, advogado da BAPS.

Dr David afirma que a BAPS sempre defendeu que a mídia social pode, por meio da educação, aumentar a conscientização e a defesa do paciente. Segundo a entidade, a antiga proibição de postar fotos de antes e depois prejudicava o paciente.

“Isso exigia que ele tivesse que pagar a consulta para descobrir se os resultados do cirurgião lhe agradam, e se o médico possui experiência com a cirurgia que ele deseja ou com seu biotipo. Agora, com a publicidade livre, isso beneficia o paciente”, argumenta o Dr. David.

Segundo ele, por meio de links de hashtag, termos de pesquisa e perfis dedicados, as redes sociais têm sido um meio central para a disseminação de procedimentos e informações médicas.

“A publicidade médica livre e responsável está intimamente ligada ao bom conhecimento e à verdade, o que gera benefícios para o paciente. A liberdade sempre foi, para nós, um dos fatores mais importantes”, esclarece o advogado da BAPS.

A associação reitera que qualquer liberdade nesse sentido tem como base a responsabilidade.

“A partir do momento em que esse cirurgião tem algo de muito valor para levar às pessoas do ponto de vista técnico, de qualidade científica, há a necessidade desse cirurgião estar mais próximo da sociedade e se apresentar de forma mais clara, transparente. Justamente para que o paciente consiga entender e distinguir de forma mais clara aquilo que ele quer ter acesso”, finaliza o Dr. David Castro.

Divulgação nas redes sociais é flexibilizada

De maneira geral, a publicidade médica visa informar e elucidar dúvidas dos pacientes e o ambiente digital, em especial, proporcionar maior acesso ao público. Os médicos contavam com uma série de limitações quanto à publicidade no Brasil, de forma que eram proibidos de postar antes e depois, por exemplo. Agora poderão divulgar tratamentos e mostrar o dia a dia de trabalho nas redes sociais.

O novo texto permitirá que o médico divulgue seu trabalho nas redes sociais, faça publicidade dos equipamentos disponibilizados no seu local de trabalho e, em caráter educativo, use imagens de seus pacientes ou de banco de fotos.

Além de permitir ao médico mostrar o seu trabalho, a nova resolução autoriza a divulgação dos preços das consultas, a realização de campanhas promocionais, o uso das imagens dos pacientes, investimentos em negócios não relacionados à área de prescrição do médico, além de outras permissões.

Segundo o Conselho Federal de Medicina, está permitido post nas redes sociais “antes e depois” desde que seja feito de forma educativa, sem manipulação na edição da imagem e que explique as possíveis complicações do procedimento. A imagem dependerá da autorização prévia do paciente.

Os profissionais também continuam permitidos a publicar fotos com famosos após procedimento e também vídeos com depoimentos, desde que não garanta ao público algum tipo de resultado. Também será possível divulgar imagens da clínica e instrumentos de trabalho, valor da consulta e tratamentos, indicar produtos medicinais de forma educativa (sem que a publicidade seja feita como venda do produto).

“O médico também poderá postar os resultados positivos do próprio trabalho e repostar marcações dos pacientes mostrando o resultado do trabalho feito”, diz o advogado da BAPS.

Outras liberações e proibições da nova resolução

Andrea explica ainda que a Resolução contempla também o direito do médico de comprar espaços publicitários utilizando qualquer meio ou canal de comunicação de terceiros para dar entrevistas, publicar artigos sobre assuntos médicos, com finalidade educativa, de divulgação científica, de promoção da saúde e do bem-estar públicos, desde que respeitadas as regras definidas pelo CFM.

Outro direito assegurado ao médico é a divulgação de sua qualificação técnica e a utilização em trabalhos e eventos científicos, destinados exclusivamente a médicos e estudantes de medicinade imagens com a aplicação de técnicas de abordagem, desde que obtenha prévia autorização do paciente ou de seu representante legal.

Quanto às proibições, os médicos não poderão: vender ou fazer comercial de qualquer tipo de produto (remédios, suplementos, ativos para emagrecimento, entre outros); desaconselhar a vacinação; garantir resultados; e se autoafirmar especialista sem o RQE (Registro de Qualificação de Especialista), registrado no Conselho Regional de Medicina.

Com Assessorias

 

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