Crônica, inflamatória e autoimune. O lúpus ainda é uma doença que intriga reumatologistas mundo afora, por conta dos sintomas que se assemelham a outras enfermidades e dificultam o seu diagnóstico precoce. No Dia Mundial do Lúpus, celebrado neste sábado (10), a informação é uma das aliadas contra a doença, que atinge entre 150 a 300 mil pessoas no Brasil, principalmente mulheres em idade fértil (20 a 45 anos), segundo estimativa da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR/2024).

De acordo com o Ministério da Saúde, o lúpus eritematoso sistêmico (LES) atinge, aproximadamente, 70% dos pacientes com lúpus no Brasil, principalmente mulheres, sendo nove em dez pacientes com o risco mais elevado durante a idade fértil.

O LES ocorre quando o sistema imunológico, que normalmente protege o corpo de infecções, passa a atacar tecidos saudáveis, impactando múltiplos órgãos como pele, articulações, rins, pulmões e cérebro. Ao levar à inflamação, muitas vezes, a doença acarreta danos graves em vários órgãos e pode impactar inclusive a fertilidade nas mulheres.

Para especialistas, com diagnóstico precoce e tratamento adequado é possível ter qualidade de vida na doença, mesmo ainda sem cura. E viver plenamente é a máxima para algumas personalidades da cultura pop e do mundo artístico que foram diagnosticadas com a doença.

A cantora e atriz Selena Gomez, que realizou um transplante de rins em 2017 como parte do tratamento; a cantora Lady Gaga, que revelou que a doença é genética, mas que ainda não apresentou sintomas graves; a apresentadora Astrid Fontenelle, internada diversas vezes e diagnosticada em 2012; e a também cantora Toni Braxton, que fala abertamente sobre o assunto na mídia.

Não por acaso, a maioria das personalidades citadas acima é do gênero feminino. Segundo o Ministério da Saúde, a proporção é de nove mulheres para cada homem diagnosticado. Segundo a especialista, uma das explicações para isso são os fatores hormonais, especialmente os que envolvem o estrogênio, que têm influência sobre o sistema imunológico, além da predisposição genética em pessoas com histórico familiar de doenças autoimunes.

Nessa lista ainda se juntam os fatores ambientais como exposição solar intensainfecções virais, estresse extremo e uso de certos medicamentos que também podem desencadear ou agravar a doença em pessoas predispostas geneticamente. Sejam pacientes famosos ou desconhecidos, o diagnóstico é clínico, baseado na soma dos sintomasachados físicos e exames laboratoriais.

Sintomas, diagnóstico e tratamento

Manchas avermelhadas em formato de discos costumam aparecer na pele como sintoma inicial do lúpus, principalmente após exposição intensa ao sol (Foto: Freepik)
A causa exata ainda não é conhecida, mas sabemos que fatores genéticos, hormonais, ambientais e imunológicos estão envolvidos. A doença é até 10 vezes mais comum em mulheres, especialmente entre os 20 e 40 anos. Apesar de ser uma doença complexa, o diagnóstico precoce e o seguimento adequado melhoram muito o prognóstico e a qualidade de vida de quem convive com LES”, explica o médico reumatologista  Nelson Araujo Silva Filho, professor do Instituto de Educação Médica (Idomed) no Rio de Janeiro.
O diagnóstico é feito por reumatologistas, combinando sintomas e exames imunológicos. De acordo com especialistas, os sintomas mais frequentes incluem: manchas avermelhadas r discoides na pele, em especial no rosto (em “asa de borboleta”),que pioram com o sol, na pele; dor e inchaço persistente nas articulações; queda de cabelo difusa; febre sem causa aparente e sem infecção; úlceras orais recorrentes, fadiga intensa e alterações renais e neurológicas.

O tratamento é individualizado, devendo ser conduzido por um reumatologista. O médico poderá envolver medicamentos imunossupressores, antimaláricos, como a hidroxicloroquina, corticoides em doses cuidadosamente controladas e acompanhamento de uma equipe multidisciplinar. Medidas como evitar exposição solar, manter vacinação em dia, controlar o estresse e aderir ao tratamento são fundamentais.

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Como combater o preconceito e a desinformação

O Dia Mundial do Lúpus é uma iniciativa da World Lupus Federation que conta com apoio da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR) e da Sociedade de Reumatologia do Rio de Janeiro (SRRJ). A data chama atenção para os desafios enfrentados por quem convive com o lúpus eritematoso sistêmico (LES). Durante todo este mês, a conscientização da doença será realizada pela campanha Maio Roxo.  

Para Luiza Fuoco, reumatologista da Imuno Santos, é fundamental combater o preconceito e a desinformação. “O lúpus é uma doença séria, mas não precisa definir a vida do paciente. Com tratamento adequado e suporte, é possível estudar, trabalhar, ser mãe, viajar e viver com plenitude. O diagnóstico precoce e o acesso a medicamentos modernos são as maiores armas que temos. Por isso, informar é também uma forma de cuidar”, comenta Luiza.

De acordo com a Dra. Luiza, o maior desafio nesses casos é que o lúpus pode “imitar” muitas doenças. “Os sintomas são variados e nem sempre surgem de forma clara, fazendo com que possa ser confundido com artrite reumatoide ou síndrome de Sjögren – uma doença reumática sistêmica crônica, caracterizada pela secura excessiva dos olhos, boca e outras membranas mucosas. Mas o lúpus tem um padrão próprio de sintomas e autoanticorpos”, alerta.

Para identificar a doença, os exames mais indicados são o FAN (fator antinuclear)anticorpos anti-DNA e anti-Sm, que podem ser feitos a partir de um hemograma, além de marcadores inflamatórios e avaliação da função renal. Recentemente, pesquisas têm buscado biomarcadores mais específicos, como os interferons tipo I e células B autorreativas; e algoritmos de triagem com inteligência artificial para acelerar o diagnóstico.

Remissão ou cura?

lúpus não tem cura, mas o tratamento é cada vez mais eficaz. “Antigamente, os corticoides eram a principal ferramenta. Hoje contamos com imunomoduladores modernos e medicamentos biológicos, que ajudam a controlar a doença com menos efeitos colaterais. O objetivo é a remissão, com o paciente sem sintomas ativos”, diz a Dra. Luiza.

A reumatologista explica ainda que a remissão pode durar meses ou anos, e o objetivo do tratamento é justamente alcançar e manter esse estado, melhorando a qualidade de vida. Ainda assim, a doença pode evoluir com complicações graves, como nefrite lúpica, inflamação nos rins; infecções e até problemas cardiovasculares, como AVC e infarto, o que explica a alta taxa de internações.

Porém, o que tem ajudado ainda mais os pacientes autoimunes é que o cuidado mudou. “Agora é multidisciplinar, com controle da inflamação, prevenção de infecções, suporte emocional e acompanhamento com nefrologistas, dermatologistas e outros especialistas”, explica Fuoco.

Atenção às pacientes com lúpus durante a gravidez

Riscos aumentados de pré-eclâmpsia e trombose, diz especialista 

Durante a gravidez, o acompanhamento médico rigoroso e o planejamento são essenciais para reduzir riscos como pré-eclâmpsia, parto prematuro e complicações fetais. De acordo com Vamberto Maia Filho, ginecologista, obstetra e especialista em reprodução humana, o LES e seus tratamentos podem afetar a fertilidade.

Medicamentos como a ciclofosfamida (usada em casos graves) aumentam o risco de falência ovariana prematura, enquanto a própria doença pode reduzir a reserva ovariana. Por isso, pacientes que desejam engravidar devem discutir com seu reumatologista, que deve trabalhar em conjunto com o ginecologista responsável pelo pré-natal, para definir alternativas terapêuticas antes da concepção”, ressalta.

De acordo com o Dr. Vamberto, gestantes com lúpus têm maior probabilidade de desenvolver complicações como pré-eclâmpsia (especialmente em pacientes com anticorpos antifosfolipídicos) e trombose, associada à síndrome do anticorpo antifosfolipídico (SAF).

Estudos recentes indicam que mulheres grávidas com LES apresentam um risco significativamente maior de complicações obstétricas adversas, incluindo parto prematuro (hipertensão e pré-eclâmpsia), restrição de crescimento intrauterino e baixo peso ao nascer Por isso, o acompanhamento deve ser multidisciplinar (reumatologista, obstetra e, se necessário, nefrologista), com consultas trimestrais e exames específicos para monitorar a atividade da doença e a saúde fetal”, indica.

Além disso, há maior risco de parto prematuro e restrição de crescimento fetal, devido a disfunções placentárias. “O lúpus também pode levar a disfunções placentárias, que são um fator contribuinte para a restrição de crescimento intrauterino e outras complicações perinatais”, acrescenta o médico especialista.

Amamentação e medicamentos

A segurança do aleitamento materno em pacientes que utilizam imunossupressores depende do tipo específico de medicamento em uso, segundo o Dr. Vamberto. “De acordo com a literatura médica, alguns imunossupressores são considerados compatíveis com a amamentação, enquanto outros não são recomendados devido à falta de dados ou potenciais riscos”, resume.

Segundo o especialista, medicamentos como tacrolimus, ciclosporina, azatioprina e corticosteróides são geralmente considerados seguros durante a amamentação. “A decisão de amamentar enquanto se utiliza imunossupressores deve ser baseada em uma avaliação cuidadosa dos riscos e benefícios, considerando o tipo específico de medicamento e a disponibilidade de dados de segurança”, finaliza o médico.

Como deve ser a alimentação dos pacientes?

Segundo Anete Mecenas, nutricionista e docente da Estácio, a alimentação no lúpus eritematoso sistêmico (LES) deve ter um enfoque na autoimunidade e no processo inflamatório das pessoas que desenvolveram a doença, pois elas podem ter dislipidemias, obesidade, hipertensão arterial sistêmica e síndrome metabólica.
Desta forma, consumir alimentos com teor energético e proteico moderados, mas ricos em vitaminas, minerais (principalmente os antioxidantes) e ácidos graxos mono/poli-insaturados, auxilia o tratamento dessas comorbidades.
A nutricionista aponta uma dieta específica para quem está fazendo tratamento do LES. “Os pacientes devem aumentar o consumo de frutas, verduras, legumes e peixes, como atum, sardinha ou salmão, além de frutos oleaginosos, como castanha, amêndoa e nozes”, comenta Anete Mecenas.

Agenda Positiva

Hospital recruta pacientes para pesquisa sobre lúpus

Estudos clínicos buscam avaliar a eficácia de novos tratamentos

O Hospital Moinhos de Vento, por meio do seu Instituto de Pesquisa, seleciona pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES) para participarem como voluntários de estudos clínicos. A pesquisa busca avaliar a eficácia de novos tratamentos. Interessados em participar da pesquisa como voluntários podem se inscrever pelo link: https://redcap.link/voluntarios_hmv_lupus.

# ESTUDO 1 – Lúpus eritematoso sistêmico (LES) Inicial

Critérios de inclusão:

● Adultos com LES diagnosticado nos últimos 2 anos;

● Doença ativa e resposta insuficiente às terapias atuais.

# ESTUDO 2 – Lúpus eritematoso sistêmico (LES) Ativo

Critérios de inclusão:

● Diagnóstico de LES há pelo menos 24 semanas;

● Sintomas ativos, como artrite ou manifestações cutâneas.

# ESTUDO 3 – Lúpus eritematoso sistêmico (LES) Ativo

Critérios de inclusão:

● Adultos com LES diagnosticado há pelo menos 24 semanas;

● Doença ativa com sintomas, como artrite ou erupções cutâneas;

● Uso prévio de terapias padrão de base, com dose estável por pelo menos 4 semanas antes da inclusão.

Com Assessorias

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