O tamanho das orelhas incomodava o estudante Hugo Henrique Mello da Silva, 10 anos, que sofria com as brincadeiras inadequadas dos colegas da escola. Por isso, pediu à mãe, Karina Barbosa da Silva, para operar. A cirurgia foi realizada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Hospital Municipal Getúlio Vargas Filho (Getulinho), em Niterói.

Foi ele mesmo que quis fazer a cirurgia, mas sentiu medo na primeira vez e hoje estamos aqui novamente para resolver. Ele está todo feliz e animado, puxa até a orelha para trás mostrando para mim como vai ficar. Eu achei que a marcação dessa cirurgia fosse demorar, mas foi tudo muito rápido e já estamos aqui. Estou ansiosa! Temos que confiar porque o hospital é excelente e agora está na mão de Deus e dos médicos. Eu falo para ele ver no espelho como é que vai ficar e imaginar como ficará depois da cirurgia”, contou a mãe do menino.

Referência em cirurgia plástica infantil, o Getulinho realiza diversos tipos de procedimentos reparadores, que visam solucionar deformidades congênitas e problemas que podem causar restrições incapacitantes em crianças e adolescentes, na faixa etária de 0 a 15 anos incompletos.

Desde a década de 60, a cirurgia plástica tem atendido pacientes que necessitam de procedimentos reparadores que visam corrigir deformidades congênitas, de nascença, ou adquiridas ao longo dos anos. As cirurgias com maior demanda são:

  • orelha de abano (otoplastia), que corrige o formato e a posição das orelhas no rosto;
  • freio de língua (frenectomia), que corrige uma pequena prega de tecido que une a língua à base da boca;
  • dedos unidos (sindactilia), uma malformação congênita que provoca a fusão de dois ou mais dedos das mãos ou dos pés; e
  • dedo múltiplo ou extranumérico (polidactilia), anomalia óssea com surgimento de dedos adicionais nas mãos ou nos pés.

Melhora da autoestima dos pacientes

O cirurgião plástico José Augusto Peçanha explica que, em geral, são as mães que detectam algum problema nos filhos ou o próprio pediatra durante a consulta na rede municipal de saúde e encaminham para o Hospital Getúlio Vargas Filho.

A manicure Analice de Oliveira Moreira estava acompanhando o filho, o pequeno Wanderson José de Oliveira, 5 anos, que foi retirar um dedo extra na mão direita.

Ele fez os exames de sangue e todos os procedimentos e marcaram essa cirurgia. Então ele vai retirar um dedo a mais na mão e já deu tudo certo. Daqui a pouco ele terá alta. Eu espero que dê tudo certo e resolva logo para a gente poder ir embora o mais rápido possível para brincar com os irmãozinhos que estão esperando a gente”, contou a mãe.

Também são realizados outros tipos de procedimentos para casos de lesões de pele, como queimaduras e queloides, além de ginecomastia, uma hipertrofia do tecido mamário que afeta os meninos na adolescência. Segundo o cirurgião plástico Olímpio Peçanha, “quanto mais cedo os pais buscarem resolver esses problemas é melhor para o desenvolvimento da criança e do adolescente”.

O ideal é que a gente opere dentro de um tempo razoável para que não se prolongue muito, não cause nenhum trauma emocional na criança, porque nessa fase tem muito bullying nas escolas. Então, a criança pode passar da melhor maneira possível por esse período para se desenvolver como um adulto normal

Cirurgias reparadoras: como ter acesso

As consultas no ambulatório acontecem às terças e quintas-feiras, onde são tratadas diversas patologias. O serviço de cirurgia plástica funciona com atendimento multiprofissional que inclui, além dos procedimentos médicos, apoio de psicólogo para ajudar os pacientes a fortalecerem a autoestima e o bem-estar de crianças e adolescentes.

Para ter acesso, os pais ou responsáveis devem levar o paciente, primeiramente, em um médico pediatra no posto de saúde, que identificará a necessidade da cirurgia e poderá encaminhar a criança ou adolescente para a consulta no Getulinho.

O hospital conta com várias especialidades que muitas dessas patologias necessitam de um atendimento multidisciplinar. Esse atendimento é todo feito dentro do hospital para que essas crianças tenham o maior conforto e passem por esse processo cirúrgico da maneira mais prazerosa possível..

A gente faz o primeiro atendimento no ambulatório, solicita todos os exames necessários para a cirurgia, que é realizada com a maior segurança possível, com anestesista e sob sedação. Após o procedimento, os pacientes seguem sendo acompanhados no ambulatório e a gente observa que eles ganham qualidade de vida e passam a fazer coisas que não faziam antes, interagem mais com os coleguinhas, porque realmente a cirurgia traz esse bem-estar”, diz o médico.

Projeto Bem-Te-Vi

Em 2024, o Hospital Getulinho realizou um mutirão batizado de Projeto Bem-Te-Vi, abrangendo as áreas da cirurgia plástica, dermatologia clínica e cirúrgica e psicologia. A ação contemplou cerca de 600 crianças de 1 mês e 14 anos de idade, com casos como orelha de abano, retirada de nevos, verrugas, lipomas, queloide, fibrose pós queimadura, dedo extranumerário, cistos, avaliação dermatológica, acne, entre outros.

O projeto surgiu para apoiar crianças e adolescentes na aceitação de sua imagem pessoal, oferecendo ferramentas emocionais e sociais para lidar com dificuldades relacionadas à aparência”, explica a diretora.

Inspiração de pai para filhos

Os cirurgiões plásticos Olímpio Augusto Peçanha, 47 anos, e José Augusto Peçanha, 46 anos, atuam juntos fazendo as cirurgias infantis da unidade, transformando a vida dos pequenos pacientes há mais de dez anos.

Eles são filhos do também cirurgião plástico Olympio José Peçanha, 73 anos, e seguiram os passos e a carreira do pai que trabalhou por 30 anos no Hospital Getulinho e é professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), com atuação no Hospital Universitário Antônio Pedro, em Niterói.

Serviço começou com incêndio em circo na década de 60

O Hospital Getúlio Vargas Filho foi inaugurado em 29 de setembro de 1954 e, de acordo com registro histórico, o hospital surgiu como o primeiro local especializado em atendimento pediátrico no Estado do Rio de Janeiro, seguindo até hoje como referência na especialidade.  O nome Getulinho foi dado carinhosamente em homenagem ao filho do ex-presidente do Brasil Getúlio Vargas, que faleceu ainda jovem, aos 23 anos de idade, devido à paralisia infantil.

A história do Getulinho tem uma relação estreita com a história de Niterói. Dentre essas histórias, tem a participação do hospital nos cuidados das crianças que foram vítimas do incêndio do Gran Circo Norte-Americano, ocorrido em dezembro de 1961, que matou 503 pessoas e deixou mais de 800 feridos, a maioria crianças.

O serviço de cirurgias reparadoras, que é totalmente gratuito, começou na década de 1960. Na época, o serviço de cirurgia plástica atuou nas cirurgias reparadoras das vítimas encaminhadas para cá”, conta a diretora do hospital, a pediatra Julienne Martins.

Um milhão de crianças atendidas em 12 anos de reabertura

O hospital foi municipalizado em 1992 e, apesar de ser o único especializado em atendimento pediátrico para Niterói, São Gonçalo e adjacências, teve a emergência fechada em 2011 por falta de condições de funcionamento. O prefeito Rodrigo Neves reabriu a emergência no seu primeiro mandato, no dia 4 de janeiro de 2013. Em 2016, após reforma, o prefeito inaugurou o novo centro cirúrgico.

Já foram atendidas 1 milhão de crianças nesses 12 anos de reabertura da emergência do Hospital Getulinho. Depois de reabrir, construímos a nova emergência do hospital, que está linda e que não deixa nada a desejar a nenhuma clínica privada. Aliás, é melhor do que muita clínica privada porque atende com dignidade o nosso povo”, disse o prefeito, ressaltando a importância do atendimento pediátrico 24 horas.

Hoje, 70% dos atendimentos de cirurgia plástica são de moradores de Niterói, 20% de São Gonçalo e os outros 10% são residentes encaminhados por outros municípios da Região Metropolitana 2, como Itaboraí, Tanguá, Silva Jardim, Maricá e Rio Bonito. Em 2024, foram realizadas 133 cirurgias. Em 2025, 78 crianças e adolescentes já passaram por procedimentos plásticos entre janeiro e abril.

Fotos: Bruno Eduardo Alves e Lucas Benevides
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