A partir de agora, o medicamento deferiprona para o tratamento da sobrecarga de ferro em pacientes com doença falciforme estará disponível no Sistema Único de Saúde (SUS). Em nota nesta quinta-feira (3), o Ministério da Saúde destacou que, com a incorporação, qualquer pessoa que precise de tratamento para acúmulo excessivo de ferro no organismo, independentemente da causa, terá acesso a todas as alternativas terapêuticas disponíveis na rede pública.
Segundo o ministério, o excesso de ferro é uma condição comum em pessoas que convivem com a doença falciforme em razão da necessidade de transfusões sanguíneas frequentes, realizadas para controlar crises de dor e outras complicações.
O acúmulo de ferro no organismo, se não tratado, pode causar danos graves a órgãos vitais como coração, fígado e glândulas endócrinas”, alertou o comunicado.
De acordo com a pasta, a deferiprona é um quelante de ferro – substância que se liga ao ferro em excesso no corpo e facilita sua eliminação pela urina. “Além de reduzir os riscos por conta do acúmulo de ferro, o medicamento tem melhor posologia em relação a outras opções, facilitando na adesão ao tratamento.”
Até então, o uso da deferiprona no SUS era restrito a pacientes com talassemia maior que não podiam utilizar a desferroxamina devido a contraindicações, intolerância ou dificuldades de administração.
Os médicos ainda têm pouco conhecimento sobre a doença, que é repleta de estigmas por afetar majoritariamente pessoas negras e pode levar à morte”, explica a Profa. Dra. Ester Sabino, que se dedica a pesquisas sobre o tema há mais de uma década.
O Ministério da Saúde estima que, no Brasil, cerca de 60 mil a 100 mil pessoas vivam com a doença falciforme, que tem maior prevalência em pessoas negras. O tratamento inclui o controle dos sintomas, a prevenção de complicações e, em muitos casos, transfusões sanguíneas regulares.
Segundo dados da pasta, entre 2014 e 2020, a média anual de novos casos de crianças diagnosticadas com anemia falciforme no teste do pezinho foi de 1.087, o que representa uma incidência de 3,75 casos a cada 10 mil nascidos vivos.
Uma doença cercada por preconceito
A anemia falciforme é uma doença hereditária que deforma os glóbulos vermelhos, que passam a ter formato de foice, comprometendo a circulação sanguínea e provocando dores intensas, anemias, infecções e complicações graves em diversos órgãos. Apesar de ser uma das condições genéticas mais comuns no Brasil, é ainda cercada por preconceitos e desinformação.
Com o objetivo de aumentar o conhecimento e a compreensão do público sobre a doença e os desafios vivenciados pelos pacientes, seus familiares e cuidadores a respeito da Doença Falciforme, o médico hematologista do Hospital Edmundo Vasconcelos (HEV), Vitor Fernandes Paiva, esclarece que a enfermidade é uma condição genética que afeta a forma e a função dos glóbulos vermelhos do sangue.
Ao invés de serem redondos e flexíveis, os glóbulos vermelhos doentes assumem uma forma de foice, que dá origem ao nome falciforme. Essa forma anômala dificulta a circulação do sangue, podendo obstruir os vasos sanguíneos e causar diversos problemas de saúde”, detalha o médico.
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Sequenciamento genético de três mil pacientes
Recentemente, pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) alcançaram um marco científico inédito no país: o sequenciamento genético de três mil pacientes com anemia falciforme. Esse estudo representa um avanço significativo no tratamento da condição, que afeta principalmente a população negra.
O estudo faz parte do Projeto Dandara, que busca possibilitar transfusões de sangue mais seguras por meio da genotipagem tanto de pacientes quanto de doadores, reduzindo reações adversas e promovendo maior compatibilidade. Um dos desdobramentos desse esforço é a emissão do Cartão Fenotcard, um documento emitido pela Fundação Pró-Sangue que reúne informações genéticas detalhadas dos pacientes para orientar futuras transfusões.
O projeto é desenvolvido em parceria com o programa de Estudo de Epidemiologia de Doadores de Retrovírus (REDS III, da sigla em inglês, Retrovirus Epidemiology Donor Study) e com a Fundação Pró-Sangue, hemocentro de São Paulo. Outros quatro hemocentros do país também participam da pesquisa sobre o genoma completo: Hemope (PE), Hemominas (MG), Hemorio (RJ) e Hemoam (AM).
O Projeto Dandara estabelece a conexão entre o REDS III e as pessoas com anemia falciforme, que recebem o Cartão Fenotcard. Esse documento contém informações sobre a constituição genética dos pacientes”, detalhou o diretor-presidente da Fundação Pró-Sangue, Prof. Dr. Vanderson Rocha.
Principais sintomas e tratamentos da Doença Falciforme
O hematologista aponta que os sintomas da doença falciforme variam de pessoa para pessoa, mas os mais comuns incluem dor intensa nos ossos e articulações, episódios frequentes de fadiga, palidez e icterícia (amarelamento da pele e dos olhos), além de uma maior propensão a infecções.
O diagnóstico da doença falciforme é feito por meio de um exame de sangue chamado eletroforese de hemoglobina, que detecta a presença da hemoglobina S, característica dessa doença. Esse exame é atualmente realizado em recém-nascidos através do teste do pezinho, permitindo um diagnóstico precoce e início do tratamento desde cedo, mas pode ser realizado a qualquer momento ao longo da vida”, afirma o hematologista do HEV.
O especialista esclarece que a doença falciforme não tem cura universalmente disponível. No entanto, segundo ele, o transplante de medula óssea e a terapia gênica podem ser a cura para alguns pacientes, embora sejam procedimentos complexos e restritos a um grupo específico.
Para a maioria dos pacientes, o tratamento inclui medicamentos para controlar a dor, prevenir crises, transfusões de sangue regulares e o uso de hidroxiureia para reduzir a frequência das crises dolorosas”, detalha Vitor Fernandes Paiva.
Para o hematologista do HEV, a principal forma de prevenção é o aconselhamento genético para casais que têm história familiar da doença e estão planejando ter filhos. “Esses casais podem fazer testes sanguíneos para avaliar o risco de transmitirem a doença para os filhos. Além disso, o diagnóstico precoce e acompanhamento adequado são fundamentais para a gestão da doença e a melhoria da qualidade de vida dos pacientes”, orienta o especialista
Com Agência Brasil e Assessorias
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