Brasil enfrenta surtos de viroses e um aumento de praias impróprias para banho, reflexo direto da precariedade no saneamento básico. A ausência de tratamento de água e esgoto em boa parte do país contribui para o aumento de doenças gastrointestinais, como viroses e diarreia, impactando a saúde e a qualidade de vida de milhões de brasileiros.

De acordo com dados do SNIS, ano-base 2022, apenas 52,2% do esgoto produzido é tratado, resultando no despejo de 5.253 piscinas olímpicas de esgoto não tratado despejadas diariamente no meio ambiente. Em 2024, o “esgotômetro” do Instituto Trata Brasil estimou que quase 2 milhões de piscinas olímpicas de esgoto foram lançadas na natureza.

Embora o Novo Marco Legal do Saneamento estabeleça 2033 como prazo para alcançar a universalização do acesso à água potável (99%) e à coleta e tratamento de esgoto (90%), o um estudo do Trata Brasil alerta que, ao ritmo atual de evolução, a meta só será cumprida em 2070 — um atraso de 37 anos.

Com o início dos mandatos dos novos prefeitos municipais em 2025, a melhoria da infraestrutura de saneamento torna-se uma prioridade urgente. Para o instituto, “esse cenário exige que a infraestrutura básica seja tratada como prioridade pelos gestores públicos recém-eleitos”.

Prefeitos recém-eleitos têm um papel decisivo nesse cenário, já que, segundo a Política Nacional de Saneamento Básico, os municípios devem elaborar e implementar Planos Municipais de Saneamento Básico (PMSB). Esses planos são fundamentais para identificar demandas locais, planejar investimentos e captar recursos”, destaca a entidade.

O saneamento básico é essencial para o desenvolvimento e crescimento sustentável das cidades, influenciando áreas como saúde, educação, turismo, valorização imobiliária e renda. “Com a oportunidade de novos mandatos em 2025, os gestores municipais têm em mãos a responsabilidade de transformar a infraestrutura de saneamento em prioridade e catalisadora de mudanças significativas para a qualidade de vida da população”, afirma o Trata Brasil.

Palavra de Especialista

Soluções alternativas para falta de saneamento ou novos problemas?

Por Liliane Frosini*

Os casos de viroses registrados no litoral brasileiro, especialmente nas praias paulistas, têm gerado ampla discussão, assim como as possíveis causas dessas ocorrências. Entre os fatores considerados mais relevantes estão a contaminação da água do mar e de alimentos, especialmente frutos do mar expostos a essa água contaminada. 

O cenário é agravado pelo aumento significativo do turismo durante o período de férias escolares e pelas festividades de final de ano, que resultam em uma expressiva elevação da população nas regiões litorâneas, criando condições favoráveis para a disseminação dessas enfermidades.

A Baixada Santista, composta por nove municípios, incluindo Santos, Guarujá e Praia Grande, abriga uma população de 1,8 milhão de habitantes. Contudo, durante as férias deste início de ano, a região costuma receber entre 4 e 5 milhões de turistas, segundo dados das prefeituras locais. Esse aumento significativo pressiona intensamente a infraestrutura municipal, como a rede coletora de esgoto.

Atualmente, as cidades da Baixada Santista ainda não dispõem de 100% de cobertura para coleta e tratamento de esgoto. Isso significa que alguns domicílios permanecem sem atendimento adequado, sendo obrigados a adotar soluções individualizadas para o esgotamento sanitário, como tanques sépticos e filtros anaeróbios.

Entretanto, essas estruturas, mesmo quando corretamente instaladas, exigem manutenções periódicas que, na maioria dos casos, são negligenciadas ou realizadas de forma inadequada, resultando em pontos de extravasamento. 

Os córregos e a rede de drenagem das áreas litorâneas, que acabam recebendo o esgoto dos pontos de extravasamento, frequentemente desembocam no mar, transportando consigo uma carga orgânica que acaba contaminando as águas.  Essa carga contém, além de matéria orgânica, organismos patogênicos, como vírus e bactérias responsáveis por diversas doenças, incluindo viroses gastrointestinais.

Nas últimas semanas, esses casos têm sido registrados com elevada frequência na região. Os banhistas, ao entrarem em contato com a água contaminada, acabam adoecendo e, por sua vez, se tornam vetores de contaminação. Esse ciclo contribui para o aumento exponencial de pessoas infectadas, levando a níveis alarmantes de casos, causando transtornos significativos e sobrecarregando o sistema de saúde local.

A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, concessionária atuante na região, tem realizado muitas obras de saneamento e implantado redes coletoras, além de estações elevatórias de esgoto com os objetivos de melhorar a qualidade da água e consequentemente a balneabilidade das praias.  Essas interferências devem reduzir ou mitigar a ocorrência anual desses surtos, embora neste ano, tenha atingido níveis alarmantes. 

A boa notícia é que nos próximos verões, em virtude das obras realizadas para a ampliação dos sistemas de coleta e tratamento, possamos observar situações menos preocupantes relacionadas a doenças de veiculação hídrica como esta que assolou o litoral.

*Professora da Escola de Engenharia da Universidade Presbiteriana Mackenzie

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