Divulgada em fevereiro, a 10ª edição da Pesquisa Nacional de Violência Contra a Mulher, realizada pelo Observatório da Mulher Contra a Violência (OMV) e o Instituto DataSenado, elaborada a cada dois anos, indica que 30% das mulheres já sofreram algum tipo de violência doméstica ou familiar provocada por homem. No entanto, menos de um quarto das brasileiras (24%) afirma conhecer bem a Lei Maria da Penha.
Redução de 11% em homicídios por agressão no domicílio após Lei Maria da Penha
A Lei Maria da Penha é uma lei federal brasileira com o objetivo principal de estipular punição adequada e coibir atos de violência doméstica contra a mulher. E quais são os reais efeitos para a sociedade de uma lei que, aparentemente, tem trazido muitos benefícios?
O artigo “Crime, Punishment, and Prevention: The Effect of a Legal Reform on Violence Against Women“, realizado por pesquisadores brasileiros que atuam naUniversidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Vancouver School of Economics e Universidade de British Columbia, avalia o impacto da Lei Maria da Penha na redução da violência doméstica no Brasil.
A pesquisa mostra que a lei aumentou a pena, criou justiça criminal especializada e medidas de segurança e prestou assistência social às famílias em risco. Quando são analisados os dados sobre homicídios causados por agressão no domicílio é possível identificar que houve uma redução entre 8 e 11% após a promulgação da lei em 2006.
Os efeitos foram mais benéficos para as mulheres negras e com menor escolaridade, aquelas com maior probabilidade de ter baixos níveis de escolaridade. Entretanto, em cidades menores, onde a concentração de renda também é menor, a taxa de homicídios aumentou.
Proteção contra todas as formas de violência
Reconhecida mundialmente, a lei passou por diversas atualizações, com as mais significativas ocorrendo entre 2023 e 2024. Através do Projeto de Lei nº 1.604/22, de autoria da então senadora Simone Tebet, foi sancionada a Lei nº 14.550/23. Esta nova legislação assegura proteção contra todas as formas de violência em contextos domésticos, familiares e íntimos de afeto, abrangendo a integridade física, psicológica, sexual, patrimonial e moral das vítimas.
As violências contra todas aquelas que se identifiquem com o sexo feminino podem acarretar na aplicação de sanções imediatas, necessárias ao rompimento do ciclo da violência, consistentes nas denominadas medidas protetivas de urgência, além de estarem sujeitas a penas endurecidas pela legislação”. destaca a advogada criminalista Marilia Faria.
Filhos de mulheres vítimas de feminicídio terão direito a pensão do governo
Lei destinada à famílias carentes foi publicada nesta nesta quarta-feira no Diário Oficial da União e abrange crimes retroativos
Estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública demonstra que as mais de 1.300 mulheres vítimas de feminicídio em 2021 deixaram cerca de 2.300 órfãos. Para atender essas crianças e adolescentes, foi publicada no começo de novembro de 2023, no Diário Oficial da União (DOU) a Lei 14.717 que concede uma pensão especial aos dependentes de baixa renda menores de 18 anos de vítimas de feminicídio.
De iniciativa da deputada Federal Maria do Rosário (PT-RS), o projeto de lei 976/2022 foi aprovado no senado no dia 3 de outubro e sancionado na última terça-feira (31) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O texto estabelece que o benefício será concedido aos órfãos cuja renda familiar mensal per capita seja de até 25% do salário mínimo. A pensão instituída, no valor de um salário mínimo, será dividida entre os filhos, biológicos e adotivos, ou dependentes da vítima.
O advogado previdenciarista Jefferson Maleski, que integra o escritório Celso Cândido de Souza Advogados, dá detalhes sobre a nova lei. “Irá auxiliar crianças que não são assistidas pela Previdência Social. São famílias onde a mãe não era assegurada, pois nesse caso poderia pedir a pensão por morte, e o pai também não era, pois nesse caso poderia solicitar o auxílio reclusão”, explica o especialista.
Ele ainda complementa. “Vai abarcar crianças totalmente desassistidas, pois perdem a mãe e o pai e acabam sendo criadas por parentes. Se essa família for carente, não tiver condições de criar a criança, ela receberá essa pensão especial paga pelo governo”, diz destacando que a família não pode receber outros benefícios. “O único que não é vetado pela lei é o benefício de prestação continuada (BPC), esse pode ser acumulado pela criança”, conta.
Jefferson Maleski ressalta ainda que a lei abrange casos retroativos. “O dependente não receberá retroativamente, mas vale para crimes que aconteceram antes da aprovação da lei. E não é preciso ter o processo já transitado em julgado, pode ser um processo apenas com indícios de feminicídio. Se no final ficar provado que não houve um feminicídio, cessa o pagamento e a criança não precisa devolver o valor”, salienta.
Contudo, o advogado reforça que falta a definição de alguns detalhes. “Como a lei foi recém sancionada, ainda faltam serem definidos alguns procedimentos técnicos para regulamentar, como por exemplo, em qual órgão o benefício será solicitado e quais os documentos que deverão ser apresentados. Outra questão que precisa ser regulamentada é quem seria considerado ‘dependente’ da vítima e que poderia solicitar a pensão além dos filhos: o dependente previdenciário? o dependente financeiro? ou o dependente que aparece na declaração de imposto de renda?”, ressalta.
Pauta do STJ e proteção das mulheres
Entre os processos pautados para o segundo semestre de 2024, o STJ irá julgar casos que podem redefinir a aplicação da Lei Maria da Penha em situações específicas, incluindo a proteção das vítimas durante a apuração dos crimes.
No início deste ano, o presidente Lula determinou que o nome da vítima seja mantido em sigilo durante a investigação de crimes praticados contra a mulher, reforçando a segurança e confidencialidade das denunciantes.
As denúncias podem ser feitas em Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher (DEAM) ou pelo telefone 180, que funciona 24 horas por dia. Instituições como a Casa da Mulher Brasileira oferecem suporte crucial às vítimas, incluindo tratamentos psiquiátricos, moradia e orientações legais.
O número de casos de violência contra a mulher no Brasil destaca a importância de fortalecer e evoluir constantemente a legislação e as políticas públicas para garantir a proteção e o bem-estar de todas as mulheres no Brasil.
A Lei Maria da Penha tem sido um instrumento vital na luta contra a violência doméstica. No entanto, é crucial continuarmos evoluindo e reforçando as políticas públicas para garantir a proteção e o bem-estar de todas as mulheres no Brasil,” conclui Marilia Faria.
Com Assessorias