As favelas brasileiras têm cor, idade e sexo. Nas comunidades, a proporção de pessoas pretas e pardas é maior do que no resto do Brasil. Já a presença de brancos é menor que a proporção na população geral. Essas constatações fazem parte de um suplemento do Censo 2022, divulgado nesta sexta-feira (8) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Quando se olha apenas para as favelas, os pretos são 16,1%; e os pardos, 56,8%. Somados, alcançam 72,9%. Já no Brasil em geral,  pessoas pardas representam 45,3% do total da população brasileira. Os pretos são 10,2%. Juntos, somam 55,5%.  Os brancos, que são 43,5% da população brasileira, respondem por apenas 26,6% dos moradores de favelas.
O censo revelou que a população das favelas é mais jovem que a brasileira. O IBGE apresenta o índice de envelhecimento, que faz uma relação entre idosos de 60 anos ou mais e um grupo de 100 crianças de até 14 anos. Quanto maior o índice, mais envelhecida é a população.

No Brasil, o índice para a população total foi 80 em 2022. Ou seja, havia 80 idosos para cada 100 crianças. Especificamente dentro das favelas, o marcador foi de 45 idosos para cada 100 crianças, indicando uma população proporcionalmente muito menos envelhecida.

Ao todo, o Brasil tem 16,390 milhões de pessoas que moram em 12,3 mil favelas, distribuídas por 656 municípios. Isso representa 8,1% do total de 203 milhões de habitantes no país, ou seja, de cada 100 pessoas, oito vivem nesses locais. A pesquisa apontou que há 12.348 favelas em 656 municípios Brasil afora. As três maiores favelas são Rocinha (Rio de Janeiro), Sol Nascente (Brasília) e Paraisópolis (São Paulo) – veja o ranking abaixo.

Desigualdade racial mais acentuada nas favelas

Os dados mostram mais aspectos da desigualdade racial no país. De todas as pessoas que se declararam brancas, 4,9% moravam em favelas. Entre os pretos, essa marca chegou a 12,8%, ou seja, de cada 100 pessoas pretas, praticamente 13 moravam em comunidades. No universo dos pardos, a relação era de 10 a cada 100 (10,1%).

Entre os indígenas, a proporção foi de 8%, tendo alcançado a maior marca no Amazonas (17,9%). O segundo maior percentual é entre os indígenas no Rio de Janeiro (12,7%). Os amarelos (asiáticos) são 0,4% da população geral e 0,1% das favelas. Os indígenas representam 0,8%, tanto na população geral, quanto nas favelas.

O IBGE explica que o somatório dos grupos pardos, pretos, brancos, amarelos e indígenas supera 100% no censo, pois foi facultado a moradores de áreas indígenas se identificarem como indígenas, mesmo que sejam de outras cores. Por exemplo, uma pessoa parda que mora em um território demarcado pôde se considerar indígena.

Mais jovens e mulheres

A idade mediana da população residente no Brasil, em 2022, era 35 anos, ou seja, metade da população possuía mais de 35; e a outra metade, menos de 35. Analisando apenas o universo de moradores de favelas, a idade mediana cai para 30 anos. “Um indicador de que esses territórios são formados, proporcionalmente, por população mais jovem que a totalidade da população residente no país”, escreve o IBGE.

Quando se olha para o gênero, no entanto, não há muita diferença em relação ao resto do país: 48,3% dos moradores das favelas são homens; e 51,7%, mulheres. “Esses valores não apresentaram diferença expressiva em relação ao percentual de pessoas do sexo masculino e feminino na população geral, 48,5% e 51,5%, respectivamente”, assinala o IBGE.

Outro indicador importante para traçar as características demográficas de determinada população é a razão de sexo. Quando esse número é igual a 100, indica o mesmo número de pessoas dos dois sexos. Caso a razão de sexo seja menor que 100, a população analisada possui mais mulheres que homens. No Brasil, a razão de sexo da população total era de 94,3 homens para casa 100 mulheres, em 2022. Nas favelas, baixava para 93,4 homens para cada 100 mulheres.

Como o IBGE classifica ‘favela’

Os pesquisadores do IBGE consideram favelas e comunidades urbanas localidades com características como insegurança jurídica da posse, ausência ou oferta precária ou incompleta de serviços públicos, padrões urbanísticos fora da ordem vigente e ocupação de áreas com restrição ou de risco ambiental.

Até o Censo anterior, de 2010, o instituto adotava a expressão “aglomerados subnormais” para se referir às favelas. Em 2010, o IBGE tinha identificado 11,4 milhões de pessoas em 6.329 aglomerados subnormais, o que equivalia a 6% da população.

Os pesquisadores advertem que é preciso cuidado ao fazer a comparação entre 2010 e 2022, pois nesse intervalo de tempo aconteceram melhorias tecnológicas e metodológicas na identificação dos recortes territoriais.

A analista do IBGE Letícia de Carvalho Giannella explica que os avanços técnicos resultaram no mapeamento de áreas não identificadas anteriormente e no ajuste de limites. Dessa forma, ressalta ela, “a comparação entre o resultado das duas pesquisas apresenta limitações e não deve ser realizada de forma direta”.

Quando a gente olha a variação de população, o aumento de território, sem essa crítica, o que pode parecer como um simples crescimento demográfico pode ser fruto, na realidade, de uma melhoria do mapeamento, das condições de classificações dessas áreas”, completa.

Jovens da Rocinha participam do 1º Mutirão de Plantio De Olho no Lixo
Jovens da Rocinha durante atividade cultural (Foto: Divulgação/Secretaria de Estado do Ambiente)

Maioria dos moradores de favelas estão no Sudeste

O IBGE detalhou que 43,4% dos moradores de favelas estão na região Sudeste. São 7,1 milhões. No Nordeste estão 28,3% (4,6 milhões); no Norte, 20% (3,3 milhões); no Sul, 5,9% (968 mil); e no Centro-Oeste, 2,4% (392 mil).

O estado de São Paulo tem a maior população de residentes em favelas, 3,6 milhões, seguido por Rio de Janeiro (2,1 milhão) e Pará (1,5 milhão). Os três estados juntos respondem por 44,7% do total de habitantes de comunidades do país. A maior favela é a Rocinha, no Rio de Janeiro, com 72.021 moradores.

Brasília (DF), 07/11/2024 - Arte para a matéria Censo das favelas. Arte/Agência Brasil
O IBGE detalhou que 43,4% dos moradores de favelas estão na região Sudeste. Arte/Agência Brasil

Em proporção, o Amazonas tem a maior parcela de pessoas morando em favelas (34,7%). Isso equivale dizer que praticamente um em cada três moradores do estado vive em alguma comunidade.

O Amapá aparece na sequência com proporção de 24,4%. Pará (18,8%), Espírito Santo (15,6%), Rio de Janeiro (13,3%), Pernambuco (12%), Bahia (9,7%), Ceará (8,5%), Acre (8,3%) e São Paulo (8,2%) completam a lista de estados em que a proporção é maior que a média nacional (8,1%).

O Mato Grosso do Sul tinha a menor parcela de pessoas vivendo em favelas (0,6%), seguido por Goiás (1,3%) e Santa Catarina (1,4%).

Fenômeno urbano

O Censo observou que nas 26 grandes concentrações urbanas do país – espécie de região metropolitana que tenha mais de 750 mil habitantes – viviam 83,6 milhões de pessoas. Dessas, 13,6 milhões residiam em favelas, ou seja, 16,2%, o dobro da proporção de todo o país (8,1%).

O IBGE destaca também que os moradores das 26 grandes concentrações urbanas eram 41,2% do total da população brasileira, enquanto os moradores de favelas dessas regiões específicas somavam 82,6% do total de residentes em comunidades Brasil afora.

De acordo com a analista Letícia Giannella, a comparação é uma demonstração de que as favelas são um fenômeno marcadamente urbano. “É um indicativo que mostra a concentração dessas áreas e dessas populações nas regiões mais urbanizadas”, pontua.

As grandes concentrações urbanas com maior proporção de habitantes morando em comunidades eram Belém (57,1%), Manaus (55,8%), Salvador (34,9%), São Luís (33,2%), Recife (26,9%) e Vitória (22,5%). A concentração do Rio de Janeiro figurava na 11ª posição (14,8%); e a de São Paulo na 13ª (14,3%).

Já as grandes concentrações urbanas com os percentuais mais baixos eram Campo Grande (0,9%), São José dos Campos/SP (1%), Goiânia (1,5%) e Sorocaba/SP (1,8%).

Rio de Janeiro - Comunidade da Rocinha, após confrontos entre grupos de traficantes rivais pelo controle de pontos de venda de drogas (Fernando Frazão/Agência Brasil)
Comunidade da Rocinha se confirma como a maior do Brasil (Fernando Frazão/Agência Brasil)

Domicílios

O Censo 2022 identificou que 72,5% das favelas brasileiras tinham até 500 domicílios, enquanto 15,6% possuíam de 501 a 999, e 11,9% tinham mais de 1 mil domicílios. Ao todo, o IBGE contou 6,56 milhões de domicílios nas favelas brasileiras, o que representava 7,2% do total de lares do país. Desses, 5,56 milhões foram classificados como domicílios particulares permanentes ocupados (DPPO), onde moram 99,8% da população de favelas.

A pesquisa mostra que o número médio de moradores dos domicílios em favelas era de 2,9 pessoas, levemente acima da média do total da população brasileira, 2,8. Em 2010, a média nas favelas era 3,5 pessoas; e a do país como um todo, 3,3.

Os recenseadores identificaram que 96,1% dos domicílios em favelas são casas, incluindo as de vila ou em condomínios. No total da população brasileira, a proporção é de 84,8%.

O IBGE coletou informações sobre as condições dos lares em favelas. Em relação ao abastecimento, identificou que 89,3% dos domicílios particulares permanentes ocupados tinham ligação com rede geral de distribuição. No total do país, esse percentual é menor, 87,4%.

Os pesquisadores fazem a ressalva de que o total do país inclui áreas rurais, que podem dispor de formas próprias de abastecimento de água, esgotamento e coleta de lixo, fazendo com que números relativos a características dos domicílios das favelas sejam melhores que o do total nacional.

Em relação ao esgotamento, 61,5% dos domicílios nas favelas tinham ligação com rede geral ou pluvial e fossa séptica ou filtro ligada à rede. No total do país, o percentual é de 65% nessas condições. Praticamente todos os lares em favelas (99%) tinham banheiro de uso exclusivo.

Enquanto no total do país 83,1% dos lares possuem coleta de lixo no domicílio, nas favelas o percentual cai para 76%. Para outros 20,7%, a destinação do lixo é via depósito em caçambas.

As favelas brasileiras possuíam 958 mil estabelecimentos em 2022. A grande maioria, 616,6 mil, era classificada como “outras finalidades”, o que inclui atividades como comércio e serviço. Havia 50,9 mil estabelecimentos religiosos; 7,9 mil de ensino;  2,8 mil de saúde e 995 agropecuários. Cerca de 280 mil estavam em construção ou reforma.

Censo revela quais são as 20 maiores favelas do país; veja a lista

Com mais de 72 mil moradores, a comunidade da Rocinha, na zona sul do Rio de Janeiro, é a maior favela do país. Se a Rocinha fosse uma cidade, seria a 459ª maior do Brasil. Em 2022, o país tinha 5.570 municípios, ou seja, a Rocinha tinha mais habitantes que 5.112 cidades.

As 20 maiores favelas brasileiras agrupam 858,6 mil moradores, representando 5,2% do total da população residente em comunidades pelo país. Dessas mais populosas, oito estavam na região Norte; sete, no Sudeste; quatro no Nordeste; e uma no Centro-Oeste.

Veja a lista das 20 maiores em quantidade de moradores:

1) Rocinha – Rio de Janeiro (RJ), 72 021
2) Sol Nascente – Brasília (DF), 70 908
3) Paraisópolis – São Paulo (SP), 58 527
4) Cidade de Deus/Alfredo Nascimento – Manaus (AM), 55 821
5) Rio das Pedras – Rio de Janeiro (RJ), 55 653
6) Heliópolis – São Paulo (SP), 55 583
7) Comunidade São Lucas – Manaus (AM), 53 674
8) Coroadinho – São Luís (MA), 51 050
9) Baixadas da Estrada Nova Jurunas – Belém (PA), 43 105
10) Beiru / Tancredo Neves – Salvador (BA), 38 871
11) Pernambués – Salvador (BA), 35 110
12) Zumbi dos Palmares/Nova Luz – Manaus (AM), 34 706
13) Santa Etelvina – Manaus (AM), 33 031
14) Baixadas da Condor – Belém (PA), 31 321
15) Colônia Terra Nova – Manaus (AM), 30 142
16) Jacarezinho – Rio de Janeiro (RJ), 29 766
17) Vila São Pedro – São Bernardo do Campo (SP), 28 466
18) Cidade Olímpica – São Luís (MA), 27 326
19) Chafik / Macuco – Mauá (SP), 26 835
20) Grande Vitória – Manaus (AM), 26 733

O G10 Bank, instituição financeira criada em Paraisópolis, favela da zona sul paulistana, vai abrir agências físicas em quatro estados. Foto: Espaço do Povo Paraisópolis
Paraisópolis, favela localizada na zona sul paulistana (Foto: Espaço do Povo Paraisópolis)

Domicílios

O Censo também traz o ranking das 20 maiores favelas em número de domicílios particulares permanentes ocupados. Elas representam 5,3% do total de 295.009 domicílios nas comunidades espalhadas pelo país.

Novamente, a Rocinha lidera o ranking com mais que o triplo de domicílios da 20ª colocada (Colônia Terra Nova, Manaus). Apenas as paulistas Vila São Pedro, Chafik/Macuco e Jardim Oratório não estão localizadas em capitais.

Veja a lista das 20 maiores em quantidade de domicílios:

1) Rocinha – Rio de Janeiro (RJ), 30 371
2) Rio das Pedras – Rio de Janeiro (RJ), 23 846
3) Sol Nascente – Brasília (DF), 21 889
4) Paraisópolis – São Paulo (SP), 21 442
5) Heliópolis – São Paulo (SP), 20 205
6) Coroadinho – São Luís (MA), 16 741
7) Cidade de Deus/Alfredo Nascimento – Manaus (AM), 15 872
8) Beiru / Tancredo Neves – Salvador (BA), 15 618
9) Comunidade São Lucas – Manaus (AM), 15 469
10) Pernambués – Salvador (BA), 14 649
11) Baixadas da Estrada Nova Jurunas – Belém (PA), 13 077
12) Jacarezinho – Rio de Janeiro (RJ), 10 936
13) Vila São Pedro – São Bernado do Campo (SP), 10 273
14) Zumbi dos Palmares/Nova Luz – Manaus (AM), 9 720
15) Baixadas da Condor – Belém (PA), 9 638
16) Santa Etelvina – Manaus (AM), 9 301
17) Jardim Oratório – Mauá (SP), 9 189
18) Chafik / Macuco – Mauá (SP), 9 158
19) Cidade Olímpica – São Luís (MA), 8 923
20) Colônia Terra Nova – Manaus (AM), 8 692

Extensão

O IBGE apontou também as favelas com maiores extensões territoriais. Nesse ranqueamento, o Censo ressalta que “não existia uma relação direta entre as áreas territoriais das favelas e comunidades urbanas e o número de residentes e de domicílios nesses territórios”.

Ou seja, ter mais área não significa necessariamente ter mais casas, assim como ter mais casas não é certeza de ter mais moradores. A Rocinha, por exemplo, apesar de ter o maior número de domicílios e de moradores, sequer consta na lista das 20 maiores favelas em extensão territorial.

Veja a lista das 20 maiores em área (quilômetro quadrado):

1) 26 de Setembro – Brasília (DF), 10,5
2) Sol Nascente – Brasília (DF), 9,2
3) Morro da Cruz I e II – Brasília (DF), 5,9
4) Invasão Água Limpa – Itabirito (MG), 5,7
5) Valéria – Salvador (BA), 5,5
6) Coroadinho – São Luís (MA), 5,4
7) Santa Etelvina – Manaus (AM), 4,8
8) Parque Estrela – Magé (RJ), 4,6
9) João de Barro – Boa Vista (RR), 4,6
10) Jardim Progresso – Natal (RN), 4,5
11) Cidade de Deus/Alfredo Nascimento – Manaus (AM), 4,3
12) Baía do Sol – Belém (PA), 4,2
13) Residencial Tiradentes – São Luís (MA), 4,2
14) Gapara – São Luís (MA), 4,1
15) Vila Nestor – São Luís (MA), 4,1
16) Nacional – Porto Velho (RO), 4,1
17) Santa Rita – Feira de Santana (BA), 4,0
18) Barra Alegre – Ipatinga (MG), 3,9
19) Comunidade São Lucas – Manaus (AM), 3,8
20) Água Boa – Belém (PA), 3,8

Com informações da Agência Brasil

 

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