O nascimento de um filho é, sem dúvida, um dos momentos mais inesquecíveis da vida de qualquer pessoa. Até pouco tempo atrás, era também um momento de “descobertas”, quando se podia, pela primeira vez, avaliar por completo a saúde da criança os exames de ultrassom, por exemplo, se popularizaram somente a partir dos anos 1970.

Hoje em dia, porém, o cuidado com a saúde do bebê começa muito antes, ainda no útero, e leva o nome de Medicina Fetal, uma subespecialidade da ginecologia e da obstetrícia focada no acompanhamento da gestação, com enfoque especial no feto.

A Medicina Fetal tem como missão evitar diversos problemas que podem ocorrer ao longo da gravidez, seja com o bebê ou com a mãe. Por meio de exames e testes, os especialistas acompanham o crescimento do feto e a gravidez inteira com o objetivo de prevenir condições e doenças diversas.

O coordenador da especialidade no Vera Cruz Hospital, Renato Ximenes, explica que existem condições que podem levar ao parto prematuro, deixar sequelas no bebê e até mesmo causar a morte da criança.

A tecnologia e o conhecimento médico atuam em conjunto para identificar os problemas o quanto antes e fornecer soluções, buscando um desenvolvimento mais saudável e completo para a criança”, pontua.

A área, em especial, tem alta relevância quando a gravidez é considerada de risco, que pode acontecer quando a mãe possui alguma doença crônica prévia à gestação, como: diabetes, doenças renais ou epilepsia; mães que tiveram uma gravidez anterior de alto risco; ou que identifiquem, ao longo dos nove meses, uma doença ou sintoma que pode oferecer algum perigo para ela ou para o bebê.

Ultrassom é grande aliado no diagnóstico

Para que as mães possam ter uma gravidez mais saudável e com menor risco, logo no início da gestação, os profissionais especializados em Medicina Fetal orientam e esclarecem as dúvidas das pacientes. Ao longo dos meses, mães e filhos são acompanhados de perto para rastrear, diagnosticar e tratar quaisquer problemas que possam surgir.

Um dos grandes aliados nesse processo é o ultrassom, uma técnica que tem evoluído muito nas últimas décadas, permitindo, hoje, que médicos identifiquem problemas antes visíveis somente após a criança vir ao mundo.

A área, em especial, tem alta relevância quando a gravidez é considerada de risco, que pode acontecer quando a mãe possui alguma doença crônica prévia à gestação, como diabetes, doenças renais ou epilepsia; mães que tiveram uma gravidez anterior de alto risco; ou que identifiquem, ao longo dos nove meses, uma doença ou sintoma que pode oferecer algum perigo para ela ou para o bebê.

Leia mais

Gestantes têm acesso a cirurgia intrauterina pelo SUS
Ácido fólico na gravidez pode prevenir a mielomeningocele
Apoie uma cirurgia intrauterina para correção da mielomeningocele

Quais as anomalias congênitas mais comuns?

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 6% dos bebês em todo o mundo nascem com uma anomalia congênita e 240 mil recém-nascidos morrem por ano pela condição. No mundo, as anomalias congênitas ocupam a quinta principal causa de mortes em crianças com menos de cinco anos de idade.

No Brasil, a estimativa do Sinasc (Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos) é que, a cada ano, aproximadamente 24 mil bebês tenham alguma anomalia congênita diagnosticada no nascimento, número que pode ser cinco vezes maior, dado que as subnotificações são muito comuns em diversas regiões do país.

Casos de bebês portadores de malformações podem ocasionar sequelas graves de desenvolvimento e até aumentar a mortalidade infantil. Estima-se que cerca de 2 a 3% dos recém-nascidos são portadores de uma ou mais malformações congênitas, sendo estas responsáveis por 20% da mortalidade neonatal e 30 a 50% da mortalidade perinatal em países desenvolvidos.

Entre as principais atuações da Medicina Fetal está a identificação, o diagnóstico e o tratamento de anomalias congênitas, que podem ser causadas por fatores genéticos, infecciosos, nutricionais, ambientais ou a combinação deles, e afetar diversos órgãos e sistemas do corpo. Entre as principais condições que podem ser tratada pela Medicina Fetal, estão:

  • mielomeningocele (espinha bífida, um defeito no fechamento da coluna vertebral);
  • transfusão feto-fetal (onde a placenta é compartilhada entre os fetos, e o sangue passa desproporcionalmente de um bebê para o outro);
  • hérnia diafragmática congênita e
  • obstrução da bexiga.

Cirurgias intrauterinas: intervenção ainda na barriga da mãe

A Medicina Fetal também é responsável por realizar correções e procedimentos enquanto o feto ainda está na barriga, como forma de auxiliar na saúde do bebê e da mãe. A cirurgia intrauterina é um procedimento de alta complexidade e raro no contexto hospitalar nacional, com poucos hospitais aptos para realização no país. Por isso, requer o trabalho de uma equipe multidisciplinar altamente qualificada.

Dentre as condições que mais frequentemente requerem cirurgias intrauterinas está a mielomeningocele fetal – atualmente conhecida como espinha bífida. Trata-se de uma má formação congênita da coluna vertebral de medula espinhal o feto que ocorre no início da gravidez, fazendo com que os ossos da coluna do bebê não se desenvolvam adequadamente.

Em resumo, não há o fechamento correto do tubo neural, área onde se origina a medula e o cérebro do feto, deixando exposta a medula, as raízes nervosas e as meninges ao líquido amniótico. A má formação do tubo neural na gestação acomete um em cada mil nascidos vivos no Brasil, podendo acarretar paralisia dos membros inferiores, restrições no desenvolvimento intelectual e severas disfunções intestinais, gênito-urinárias e ortopédicas.

A solução para esses quadros passa por acompanhamento pré-natal e correção intrauterina. Com o diagnóstico correto, o médico pode sugerir intervenções ainda durante a gestação, que melhoram as chances de sobrevida e a qualidade de vida dos pacientes acometidos. As cirurgias intrauterinas são de alta complexidade e demandam expertise de toda a equipe de saúde envolvida.

Mielomeningocele ou espinha bífida

De acordo com a Sociedade Brasileira de Neurocirurgia Pediátrica a incidência mundial dos defeitos do tubo neural é de aproximadamente 1 a 10 em 1.000 nascimentos. No Brasil, a prevalência é estimada entre 1,4 em cada 10.000 nascimentos. Entre as consequências da doença estão paralisia dos membros inferiores, atraso no desenvolvimento intelectual, alterações intestinais, urinárias e ortopédicas no bebê.

Estudos apontam que a intervenção cirúrgica realizada de forma intrauterina, ou seja, com o bebê ainda na barriga da mãe, entre 22 e 28 semanas de gestação, demonstram uma redução significativa da incidência de malformações e hidrocefalia decorrentes da mielomeningocele, melhorando ainda a qualidade de vida da criança.

O obstetra Edson Lucena, profissional da equipe de Cirurgia Materno-fetal do Hospital Oto Meireles, antiga Gastroclínica, explica que esse tipo de procedimento deve ser realizado no bebê ainda na fase precoce da gestação para melhorar o prognóstico neuropsicomotor, após o nascimento.

Entre os benefícios da correção intrauterina da mielomeningocele, podemos mencionar a redução do risco de danos adicionais à medula espinhal durante o desenvolvimento do feto, a melhoria das chances de preservação da função neurológica e motora do bebê, e potencial redução das complicações associadas à mielomeningocele, como hidrocefalia e disfunção motora”, ressalta.

Intervenções em casos de mielomeningocele

O Hospital Oto Meireles, antiga Gastroclínica, foi pioneiro na realização de cirurgias intrauterinas no Ceará, em 2019. No início de abril de 2024, o hospital realizou sua primeira cirurgia fetal para correção de mielomeningocele. O procedimento foi realizado em uma gestante de 24 semanas. Ela realiza o acompanhamento semanalmente até o momento do parto, quando será avaliada a necessidade de novas intervenções.

No Hospital e Maternidade São Luiz Anália Franco, unidade da Rede D’Or na zona Leste da capital paulista, a primeira cirurgia fetal de altíssima complexidade para tratamento de mielomeningocele foi realizada há cerca de um ano. O procedimento foi realizado com o bebê ainda no útero, na 27ª semana de gestação. A paciente recebeu o diagnóstico na 16ª semana, durante a realização do pré-natal.

A cirurgia intrauterina para correção dessa condição reduz a necessidade de colocação de uma válvula no ventrículo peritoneal após o nascimento do bebê, o que diminui o risco da principal causa de morte no primeiro ano de vida, que é a infecção desta válvula, oferendo melhor qualidade de vida e menos complicações”, destaca Carlos Alberto R. Baldo, médico e coordenador da equipe de Medicina Fetal e Cirurgia Fetal do Hospital.

No procedimento, foi utilizada uma técnica híbrida, onde exteriorizamos o útero e introduzimos aparelho de laparoscopia para tratamento da lesão na coluna do feto. “O procedimento atingiu seus objetivos e a cirurgia não teve intercorrências, com alta da paciente após três dias”, conta. Como se trata de um procedimento extremamente complexo, é essencial realizar o acompanhamento correto durante a gestação. 

Com Assessorias

Shares:

Posts Relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *