Os números envergonham o Brasil. Ou deveriam envergonhar. Em 2020, o país registrou pelo menos 237 mortes violentas de LGBTs. Foram 224 homicídios (94,5%) e 13 suicídios (5,5%), como mostrou um levantamento da Acontece Arte e Política LGBTI+ e Grupo Gay da Bahia.

Houve um aumento, na comparação com o ano de 2019, das mortes de travestis e mulheres transexuais. Foram 161 travestis e mulheres transexuais (70%), 51 gays (22%), 10 lésbicas (5%), 3 homens transexuais (1%), 3 bissexuais (1%) e 2 homens heterossexuais confundidos com gays (0,4%) mortos no ano passado.

O levantamento identificou 74 pardos e pretos (54%) e 62 brancos (46%) entre os que morreram. O Nordeste ocupa o primeiro lugar em número de mortes com 113 casos, seguido do Sudeste, com 66. As regiões Norte e Sul totalizaram 20 mortes cada. No Centro-Oeste, 18 mortes.

Só no ano passado, segundo dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), 175 pessoas transexuais foram assassinadas no país. O número representa um aumento de 29% dos casos se comparado com o ano de 2019.

O dossiê “As histórias que ninguém conta”, elaborado pelo Grupo de Pesquisa Lesbocídio, aponta que 126 mulheres foram mortas, de 2014 a 2017, por serem lésbicas. Em 2017, 37% das mortes ocorreram no Sudeste. Do total, 55% foram executadas com armas de fogo; 23%, por facadas.

Em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero passe a ser considerada crime. Até que o Congresso Nacional publique uma lei específica, as condutas homofóbicas e transfóbicas se enquadram na tipificação da Lei do Racismo (Lei nº 7.716/1989). 

O Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ (28 de junho) marca a luta pelo reconhecimento, representatividade e respeito à diversidade. Mas o que está sendo feito para mudar essa realidade, além de datas festivas, homenagens e celebrações? Para boa parte dos militantes da causa, ainda é preciso avançar e muito não apenas para dar visibilidade, mas para apoiar essas populações excluídas.

Andrey Lemos, diretor da União Nacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais do Rio de Janeiro (UNA LGBT-Rio), afirma que os crimes contra a comunidade LGBTQIA+ têm crescido no Brasil. “Não cabe mais vivermos isso no Século 21. Lutamos pela liberdade de amar, construindo caminhos de afeto e solidariedade. Um prêmio como esse representa a valorização de quem atua no combate a esses crimes”, frisa.

No Rio de Janeiro, a Câmara de Vereadores e a Assembleia Legislativa têm apostado em políticas públicas voltadas à inclusão e à diversidade. Para celebrar a data, as duas casas promoveram uma agenda especial em homenagem a ativistas e outras pessoas que defendem a causa.

Alerj premia ativistas da causa LGBTQIA+

Ser gay e pessoa com deficiência física (PCD) é um duplo desafio, mas não impediu o jovem ator Pedro Fernandes de conquistar seu lugar na sociedade. Morador de Petrópolis, na Região Serrana do RJ, ele nasceu prematuro aos cinco meses e a falta de oxigenação no cérebro durante o parto causou a paralisia. Formado em Marketing, o estudante de Serviço Social é também formado em artes dramáticas, dirige e produz peças teatrais.

Pedro Fernandes é um dos seis escolhidos para receber o Prêmio Cidadania, Direito e Respeito às Diversidades, oferecido pelo quinto ano consecutivo pela Alerj, em homenagem ao Dia Mundial do Orgulho LGBTQIA+, durante solenidade virtual conduzida pela deputada Enfermeira Rejane (PCdoB).

A deputada Enfermeira Rejane entrega diploma a Gisela Carvalho e outros ativistas do movimento LGBTQIA+ (Foto: Rafael Wallace)

 

Esse segmento tem sobrevivido em um país intolerante, preconceituoso e homofóbico. É de suma importância realizarmos um evento que prestigie quem tem lutado com tanta determinação, garra e força para combater o preconceito e defender a diversidade. É preciso lutar pela visibilidade por oportunidades no mercado de trabalho”, comentou Rejane, autora do Projeto de Resolução 517/17 que criou o prêmio.

Entre os premiados também está a enfermeira Adriane das Neves (foto), lésbica, preta, de matriz africana, doutora em Saúde Coletiva e professora especializada em gênero, sexualidade e direitos humanos. Adriane também é coordenadora da Unegro Diversidade, em Duque de Caxias; da Aliança Nacional LGBTI+, também no município, e tornou-se referência em saúde sexual e reprodutiva de mulheres lésbicas. Foram homenageados também Diana Rodrigues, Gisela Carvalho, Neno Ferreira e Sharlene Rosa – veja mais aqui.

Legado Marielle: Rio pode ganhar mais duas datas LGBTIQA+

Sessão da Câmara de Vereadores no Dia do Orgulho LGBTQI+ (Foto: Divulgação)

Além da iluminação especial no Palácio Pedro Ernesto, sede da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, a casa organizou uma sessão colorida na plenária para celebrar a data. Companheira da vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018, a atual vereadora Monica Benicio falou sobre projetos para criação de mais duas datas especiais no calendário de celebração LGBT na cidade: o Dia da Visibilidade Lésbica (29 de agosto) e o Dia da Luta Contra a Homofobia, Lesbofobia, Bifobia e TransfobiaTransfobia (17 de maio). Ambos os projetos foram originalmente apresentados por Marielle.

De acordo com Mônica Benício, a invisibilidade das mulheres lésbicas tem consequências. “A violência contra mulheres lésbicas decorre da lesbofobia estrutural, que é reforçada pela invisibilidade. Essas violências se agravam quando associada à classe, à raça e à deficiência. Mulheres lésbicas negras estão em situação de maior vulnerabilidade, imposta pelo racismo estrutural”, destaca a vereadora.

Após as discussões, foram entregues Moções de Congratulações e Louvor a diversas personalidades que vêm se destacando na luta contra o preconceito e pela visibilidade LGBTQIA+. Uma das homenageadas foi a ex-líbero da Seleção Brasileira de Vôlei, medalhista olímpica, Fabi Alvim. “Era quase inimaginável pensar que estaríamos vivendo um momento como este há uns anos”, agradeceu a Fabi do Vôlei.

Palácio Pedro Ernesto, sede da Câmara de Vereadores, ganhou iluminação nas cores do arco-íris (Foto: Divulgação)

Campanha para estimular orgulho entre servidores

No mês em que se celebra o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ (28/6), o instituto República.org, dedicado a melhorar a gestão de pessoas no serviço público brasileiro, lançou a campanha “Servidores com Orgulho”. O objetivo é compartilhar histórias e relatos de funcionários que ajudam a combater o preconceito e trabalham por mais diversidade no serviço público.

Um desses servidores é Marcelo Velloso, assessor de economia criativa na Prefeitura de Niterói e ex-diretor geral do Museu de Arte Contemporânea (MAC). Casado há mais de 20 anos, ele nunca escondeu a sua orientação sexual e acredita que essa atitude estimula políticas públicas voltadas para o respeito à diversidade. “Eu sempre falei que sou gay e sei que isso exerce algum tipo de referência, que eu mesmo não tinha quando era novo”, lembra Marcelo. Para refletir sobre a representatividade LGBTQIA+ no serviço público brasileiro. ,

Ana Paula Pellegrino, codiretora executiva da República.org, diz que a campanha quer dar visibilidade à diversidade e pautar os desafios e as trajetórias de pessoas LGBTQIA+ no setor público. Políticas públicas, para serem efetivas, precisam ser elaboradas para e com a nossa população, que é diversa. Um corpo de profissionais públicos igualmente diverso e com capacidade de gestão é um recurso poderoso para o desenvolvimento de políticas de equidade”, disse ela.

Entenda o significado de LGBTQIA+

Lésbicas: são mulheres que se sentem afetivamente e sexualmente atraídas por outras mulheres.

Gays: são homens que se sentem afetivamente e sexualmente atraídos por outros homens.

Bissexuais: são pessoas que se sentem afetivamente e sexualmente atraídas por pessoas de quaisquer gêneros.

Trans: pessoas que possuem uma identidade de gênero diferente da do sexo biológico.

Queer: pessoas que não se enquadram em nenhum dos gêneros binários.

Intersexo: pessoas que nasceram com condições biológicas em que o gênero não é definido.

Assexual: pessoas que não sentem atração sexual e/ou afetiva por ninguém.

+ (mais): Todas as outras formas de expressão da sexualidade e do gênero que não se enquadrem no padrão heteronormativo e nos termos supracitados.

Com Assessorias, Alerj e Câmara

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