O diagnóstico de câncer de mama pode ser devastador para a paciente. Além dos temores que envolvem a doença e os seus tratamentos, ela mexe com um ponto fundamental da anatomia feminina, muitas vezes conectado à identidade e à sexualidade das mulheres: os seios. Para além da perda de cabelos temporária durante a quimioterapia, o efeito mais impactante do câncer de mama costuma ser a mastectomia.
Esta cirurgia de remoção completa da mama, que quando não é acompanhada de reconstrução, pode causar um grande impacto emocional. Estudos mostram que a indicação de mastectomia causa ansiedade e problemas de autoestima entre as pacientes, principalmente diante da demora para a reconstrução mamária.
A arquiteta carioca Bruna Paudes, 40 anos, descobriu o câncer de mama em janeiro de 2020. “A primeira vez que eu ouvi da médica que teria que fazer uma mastectomia bilateral foi desesperador”.
Ela conta que fez diversos exames que mostravam que a doença não era de fator genético e a indicação era a retirada de ambas as mamas. “Da retirada até a reconstrução foi um período de adaptação e reconstrução em vários sentidos”, relembra.
A angústia de Bruna é a mesma de milhares de mulheres que receberam o diagnóstico do tumor, que tem a maior incidência no Brasil, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca). Apesar dos muitos avanços conquistados com a campanha Outubro Rosa no Brasil, muitas mulheres ainda sofrem com a falta de informações sobre a remoção e a reconstrução das mamas pós-tratamento do câncer.
Afinal, quando é necessário retirar a mama? Apenas uma ou as duas? Se eu tirar os seios, não vou ter câncer de mama? A reconstrução devolve a aparência original da mama? Toda mulher que passou pela mastectomia pode fazer a reconstrução mamária? Qual é a técnica mais indicada? Ela pode ser feita já na hora da cirurgia para remoção da/s mama/s?
Para esclarecer as mulheres, o Portal Vida e Ação reuniu alguns especialistas:
Reconstrução já faz parte do processo de cura
O câncer de mama é o segundo tipo mais comum em mulheres no Brasil, sendo responsável por 29% de novos casos de tumores anuais, como indicado pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca). Esse alto índice de diagnóstico faz com que a cirurgia reconstrutora de mama seja bastante frequente.
No entanto, é preciso considerar uma reversão quando o assunto é o tratamento para esse tipo de câncer: mais do que uma questão estética, a cirurgia de reconstrução já passou a ser parte do processo de cura.
A reconstrução é considerada hoje parte do tratamento do câncer de mama“, explica a Larissa Sumodjo, cirurgiã plástica pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP). “É um tratamento cirúrgico, associado a terapias adjuvantes, como a quimioterapia. Esse é um tratamento multimodal, e, entre as modalidades que fazem parte do tratamento integral da mulher, está a reconstrução.”
De acordo com a médica, já existem comprovações de que fazer a reconstrução da mama no mesmo momento em que é feita a cirurgia de retirada do câncer não prejudica o tratamento, o prognóstico da doença ou o processo de cura.
Por isso, temos tanta empatia por mulheres que estão passando por um câncer de mama, porque o contexto já é muito difícil. Poder trazer essa situação de sair com a mama reconstruída e simetrizada é de extrema importância”, destaca a cirurgiã plástica.
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Reconstrução mamária imediata ou após a remissão da doença?
Muitos mastologistas e oncologistas optam por fazer a reconstrução mamária imediata, ou seja, no mesmo tempo cirúrgico da ressecção tumoral. “Mas, o procedimento também pode ser feito tardiamente, após a remissão da doença. Essa decisão é tomada em conjunto médico-paciente”, diz a cirurgiã plástica.
A reconstrução mamária pode ser feita com tecido da própria paciente, com retalhos de regiões como costas e abdômen, ou com o uso de próteses e expansores. A técnica empregada depende de diferentes fatores, como localização do tumor, tipo de ressecção tumoral, etc..
A médica lembra que a reconstrução de mama é um procedimento realizado em etapas e, dependendo da técnica escolhida, podem ser necessárias, pelo menos três cirurgias. Por isso, a paciente deve sanar todas as suas dúvidas antes de se submeter ao procedimento.
Uma vez que isso foi estabelecido, a reconstrução da mama é possível e necessária para todas as mulheres”, continua. A única exceção a essa regra, diz, são mulheres em idade avançada que não suportariam uma cirurgia mais longa, por exemplo.
A recuperação tende a ser mais demorada com tecido da paciente, por envolver outros segmentos corporais. Porém, diversos trabalhos mostram os benefícios da reconstrução imediata para a autoestima, o que contribui muito na resposta do tratamento como um todo.
Há estudos que indicam que mais de 95% dos procedimentos são realizados imediatamente à mastectomia e têm resultados satisfatórios tanto em qualidade de vida quanto em estética”, diz Larissa Sumodjo.
Benefícios da reconstrução mamária também para a saúde mental
Segundo Bruno Herkenhoff, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) no Rio de Janeiro, a possibilidade de realizar o procedimento de reconstrução na mesma cirurgia em que é feita a mastectomia reduz os riscos de depressão, estresse e o desgaste emocional de pacientes.
Isso significa ganhos em termos de saúde física e emocional. Poupa as mulheres de duas idas ao centro cirúrgico e do abalo psicológico ao se ver, ainda que temporariamente, sem os seios”, explica Bruno.
Esse procedimento se torna ainda mais importante quando se considera que a mastectomia, isto é, a cirurgia de retirada dos seios cause um grande abalo emocional na paciente. A cirurgia afeta a autoestima, a estabilidade emocional e ainda traz dores e desconfortos na área operada, alteração na sensibilidade e até comprometimento do membro superior do lado operado.
A mulher saber que vai passar pela cirurgia e vai ter que ficar por um período sem mama ou sem volume traz muito desconforto dentro de um momento de vida muito dolorido – nesse processo, costuma existir uma perspectiva de quimio, com perda de cabelo, e são vários fatores que levamos em consideração”, complementa a Dra. Larissa.
Silicone com ou sem expansor
De acordo com o presidente da SBCP, Bruno Herkenhoff, a técnica mais comum para a reconstrução dos seios é a colocação de próteses de silicone. Elas podem ou não ser acompanhadas por um expansor abaixo do músculo, dependendo do volume de mama a que se quer chegar.
Alguns quadros são ainda mais complexos e exigem a retirada de muito tecido. Sendo assim, a reposição é feita através da pele e do músculo das costas e do abdômen da paciente. Apenas em seguida coloca-se o expansor e, por fim, a prótese.
A arquiteta Bruna, que passou pelo procedimento, lembra que optou por colocar um expansor antes de colocar o silicone. A técnica aplicada no caso de Bruna é uma das novidades da cirurgia plástica reparadora, que tem como objetivo garantir um resultado o mais próximo possível da aparência real da mama.
No mesmo dia fiz a mastectomia, a reconstrução e coloquei um expansor que é feito de silicone, como as próteses, mas o conteúdo, ao invés de ter silicone, vem vazio e com passar do tempo vai sendo preenchido com soro até atingir o tamanho desejado. Só depois coloquei o silicone”, relembra Bruna.
Micropigmentação na aréola
Uma novidade que vem ajudando as mulheres é a micropigmentação, que desenha a aréola dos seios. Tradicionalmente, a técnica era aplicada com fins estéticos, em pacientes que colocam próteses de silicone. Porém, nos últimos dois anos, o procedimento foi aperfeiçoado para atender às cirurgias de reconstrução da mama, que deixam uma pele muito fina e uma cicatriz muito acentuada, exigindo um trabalho mais detalhado e profundo.
Uma cirurgia de reconstrução de mamas dura em torno de três horas. Os mamilos podem ser reconstruídos de duas maneiras: com o auxílio de um enxerto, a partir da retirada de pele da parte interna da coxa, ou através da micropigmentação, que são gotinhas de pigmento que formam uma espécie de “tatuagem” na camada mais superficial da pele.
Quando é preciso remover as mamas?
A Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBCO) afirma que a indicação de cirurgia do câncer de mama depende do estágio em que a doença foi detectada. De maneira geral, a maioria das mulheres diagnosticadas passa por esse procedimento, ainda que com objetivos distintos.
Essa definição com relação ao procedimento mais indicado fica a cargo do cirurgião oncológico e de sua equipe, que avaliam cuidadosamente a extensão da doença e quais as medidas de tratamento a serem adotadas. É importante contar com o acompanhamento de profissionais qualificados, em centros oncológicos de referência para o tratamento do câncer de mama”, destaca Viviane Rezende de Oliveira, diretora de relações parlamentares da SBCO.
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Conheça os tipos de cirurgia no câncer de mama
Viviane Rezende de Oliveira explica que há diferentes tipos de cirurgia do câncer de mama. A definição ocorre de acordo com o objetivo do procedimento e com as condições — tanto da paciente quanto do tumor —, haverá uma cirurgia mais adequada.
Cirurgia conservadora da mama
Esse procedimento é conhecido como mastectomia parcial ou segmentar, mas também é chamada de lumpectomia ou quadrantectomia. A quantidade de tecido mamário removido varia de acordo com o tamanho e localização do tumor, além de outros fatores, como a probabilidade de dissipação de células tumorais.
Na prática, se dá pela retirada do segmento ou do setor da mama onde está localizado o tumor. Neste caso, o cirurgião oncológico deve extrair o tumor com uma porção de tecido saudável adjacente, como margem de segurança.
Mastectomia
Nesse procedimento é feita a retirada completa da mama, incluindo todo o tecido mamário. No caso da chamada mastectomia radical, podem ser removidos outros tecidos próximos como os músculos que se localizam abaixo da mama com os gânglios axilares – geralmente indicada para grandes tumores em que já há ínguas comprometidas ou o risco de disseminação é elevado.
Há, ainda, a chamada Mastectomia Total com utilização da pesquisa de linfonodo sentinela (a íngua que inicialmente drena estes tumores). Este procedimento é indicado, muitas vezes, para poupar a paciente de tratamentos complementares como a Radioterapia. O objetivo é minimizar os efeitos colaterais do tratamento oncológico.
Mastectomia redutora de risco
Esse procedimento, chamado de mastectomia profilática, ganhou mais visibilidade na última década, depois de adotado por algumas celebridades. O procedimento cirúrgico é indicado basicamente em duas situações:
– Alto risco de câncer de mama: mulheres com predisposição hereditária ao câncer de mama (alterações nos genes BRCA1 e BRCA2) podem fazer a remoção profilática para evitar ou minimizar os riscos de desenvolvimento de tumores, e
– Pacientes já diagnosticadas: mulheres com diagnóstico de câncer em uma das mamas —com tumores específicos que apresentem risco de bilateralidade, como o carcinoma lobular — podem optar, caso haja concordância médica, pela remoção dupla para reduzir as chances de ser acometida pela doença.
É importante ter em mente que, para pessoas sem histórico familiar de câncer nem mutação genética, detectada por rastreamento, ainda não existem estudos conclusivos sobre o benefício da mastectomia preventiva. Antes de passar pelo procedimento, é fundamental ser avaliada por um especialista em cirurgia oncológica e, ainda, estar ciente dos efeitos colaterais dessa intervenção”, afirma Dra Viviane.
Quando tirar a mama de forma preventiva?
A mastectomia subcutânea – também chamada de profilática ou preventiva – ganhou fama quando a atriz Angelina Jolie, com um forte histórico familiar de câncer de mama, retirou totalmente seus seios antes mesmo de ser diagnosticada com um nódulo maligno.
Para Bruno Herkenhoff, entretanto, nem sempre esse tipo de cirurgia é recomendado. Segundo ele, a técnica da reconstrução no pós-mastectomia subcutânea consiste na colocação de uma prótese de silicone abaixo do músculo. No entanto, trata-se de uma cirurgia um pouco mais arriscada e indicada para casos muito específicos.
Não é de forma alguma indicado que as mulheres banalizem a retirada dos seios. Após a mastectomia subcutânea, o que permanece é apenas uma fina camada de gordura. E isso causa um alto risco de necrose no seio e na aréola. Sendo assim, essa cirurgia só é indicada para aqueles pacientes que têm alterações nos genes BRAC1 e BRAC2, o que oferece grande risco de desenvolvimento da doença.”, explica
Como são os cuidados antes e depois da cirurgia?
Segundo a SBCO, o tratamento do câncer de mama não se restringe à cirurgia e envolve aspectos emocionais muito fortes, com abalo significativo da autoestima. Por esse motivo, a atenção em todos os momentos do processo de cura é realizada por uma equipe multidisciplinar.
Antes da cirurgia – É importante realizar todos os exames solicitados e conversar com os profissionais envolvidos no tratamento (de enfermeiros e psicólogos) sobre suas apreensões e dúvidas. Essa fase de esclarecimentos é essencial para passar pelo procedimento com mais tranquilidade.
Pós-cirúrgico – A recuperação da cirurgia de câncer de mama segue o padrão de boa parte dos pós-operatórios. Quando o procedimento transcorre normalmente, é comum que a paciente já possa retomar suas atividades normais no prazo de duas semanas.
Dependendo de cada caso, podem ser iniciadas terapias complementares, como radioterapia e/ou quimioterapia.
Autoexame e hábitos de vida saudáveis
Neste Outubro Rosa, Dra. Larissa destaca ainda a importância do autoexame como forma de diagnóstico precoce e lembra que é possível reduzir em até 28% as chances de desenvolver um tumor de mama ao mudar o estilo de vida, adotando:
- A prática regular de atividade física;
- Alimentação saudável;
- Não fumar;
- Evitar o sobrepeso;
- Não ingerir bebidas alcoólicas;
- Evitar uso de hormônios sintéticos em altas doses.
Com Assessorias