Um estudo que avalia a adoção da profilaxia pré-exposição (PrEP) injetável para evitar a contaminação por HIV indicou que as pessoas aderiram melhor a essa forma de prevenção do que aquelas que usaram a PrEP oral, atualmente disponível no Sistema Único de Saúde (SUS).Além disso, o potencial de prevenção se mostrou maior: nenhum dos pacientes testados ao longo de um ano contraíram o vírus causador da Aids.
Os resultados da pesquisa ImPrEP CAB Brasil, realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), foram apresentados há alguns dias na Conferência sobre Retrovírus e Infecções Oportunistas (Croi 2025), realizada em São Francisco, nos Estados Unidos.
Os pesquisadores avaliam que a PrEP injetável é uma ferramenta com potencial para enfrentar os desafios de adesão à medicação oral diária, particularmente entre as pessoas mais jovens, e pode ajudar o Brasil a frear o aumento de casos de HIV e a carga desproporcional de infecções entre jovens de minorias sexuais e de gênero.
O estudo foi financiado pela GSK/ViiV Healthcare, gigante da indústria farmacêutica que fabrica o medicamento usado na PrEP injetável – o cabotegravir de longa duração –e tem interesse em vender essa medicação para o governo federal. 
O Portal Vida e Ação procurou a empresa para informar por quanto pretende vender a medicação ao Sistema Único de Saúde e a diferença para o método de prevenção oral atualmente fornecido no SUS (com uso dos antiretrovirais tenofovir e entricitabina em comprimido), além do valor do investimento na pesquisa. As informações serão inseridas nesta matéria assim que recebidas. 

83% optaram pela forma injetável e nenhum foi infectado

Entre outubro de 2023 e setembro de 2024, os pesquisadores da Fiocruz, financiados pela GSK, acompanharam 1.447 pessoas que receberam a medicação em unidades públicas de saúde de seis cidades brasileiras: Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Campinas, Florianópolis e Manaus. Foram selecionadas pessoas de 18 a 30 anos que são homens cisgênero que fazem sexo com homens, pessoas transgênero e não-binárias.
O estudo avaliou a cobertura de PrEP e a incidência de HIV entre os participantes nas duas versões (oral e injetável). Os participantes do estudo nunca tinha utilizado a PrEP e procuraram esses serviços de saúde em busca do medicamento ou para fazer o teste de detecção do HIV. 
Todos puderam escolher de que forma iriam utilizar a PrEP e 83% preferiram a versão injetável, que consiste na aplicação, a cada dois meses, do medicamento cabotegravir de longa ação.  Já os 17% de participantes que preferiram utilizar a PrEP oral deveriam tomar diariamente os antiretrovirais tenofovir e entricitabina, na forma de um comprimido combinado.  Essa é a profilaxia tradicional distribuída pelo SUS desde 2017.

Dos  participantes que puderam escolher entre o cabotegravir de longa ação ou a PrEP oral, 83% (1.200 pessoas) optaram pelo cabotegravirO acompanhamento dos participantes mostrou que 94% das pessoas que optaram pela prep injetável compareceram ao serviço de saúde para tomar as injeções no tempo correto, o que garantiu que a grande maioria permanecesse protegida contra a infecção durante quase todo o tempo de estudo.

Nenhum desses pacientes testou positivo para o HIV. Já as pessoas que preferiram utilizar a PrEP oral ficaram protegidas durante apenas 58% dos dias de acompanhamento devido à menor adesão ao tratamento, com medicação oral de uso diário. Entre as pessoas desse segundo grupo, uma testou positivo para HIV.

Os pesquisadores também fizeram uma comparação com dados de cerca de 2,4 mil pessoas, de 14 cidades, que utilizam a PrEP oral pelo SUS, e identificaram que a cobertura foi ainda menor: 48%. Nesse grupo, nove pessoas foram infectadas pelo vírus.

Versão injetável ainda não disponível no SUS

cabotegravir de longa ação é um medicamento utilizado para prevenir a infecção sexual do HIV, método conhecido como Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), em adultos e adolescentes a partir de 12 anos, com pelo menos 35kg de peso, que consideram estar em risco de infecção. O método traz a comodidade da aplicação a cada dois meses e pode ser combinado com outras práticas de sexo seguro, como o uso de preservativos.

O uso da PrEP injetável no Brasil, com o medicamento cabotegravir, foi aprovado em 2023 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas ainda não está disponível no SUS.  No início de 2025, a GSK/ViiV Brasil e o Ministério da Saúde iniciaram conversas com o objetivo de viabilizar a incorporação do cabotegravir de longa ação na rede pública, mas ainda não há data prevista para a inclusão.

A incorporação no SUS está em avaliação pelo Ministério da Saúde. A pasta informou, em nota, que acompanha a realização do estudo, mas não disse se há alguma previsão de inclusão da estratégia no SUS. De acordo com o Ministério, a PrEP ─ mesmo em sua forma oral, como está disponível hoje ─ é “estratégia essencial na prevenção da infecção pelo HIV” e “uma das principais iniciativas para a eliminação da doença como problema de saúde pública até 2030.” O Brasil dobrou o número de usuários em três anos, atingindo a marca de 119 mil usuários em 2025.

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Avanços no tratamento reduzem mortalidade por HIV

Segundo dados do Ministério da Saúde, 541.759 casos de pessoas vivendo com HIV foram notificados entre 2007 e junho de 2024, no Brasil. O último boletim epidemiológico publicado no final do ano passado aponta que, somente em 2023, foram notificados 46.495 casos de infecção pelo HIV no país, cerca de 2 mil a mais do que em 2022  Um aumento de 4,5% em relação ao ano anterior, com alta incidência entre jovens de 15 a 24 anos. Mais de 40% deles ocorreram em homens de 20 a 29 anos.

Apesar disso, graças aos avanços no tratamento, entre 2013 e 2023, a mortalidade por aids caiu 32,9% no país. Houve uma redução de 32,9% na mortalidade relacionada ao HIV nos últimos dez anos, e, em 2023, a média foi de 3,9 óbitos a cada 100 mil habitantes. Em 2024, o Brasil registrou 104 mil pessoas em uso da PrEP oral (TDF/FTC), um marco desta estratégia considerada essencial para reduzir novos casos de HIV.

‘Opção de prevenção eficaz e segura’, defende fabricante

Esta é uma opção de prevenção eficaz e segura”, porém, ainda enfrenta dificuldades, principalmente, na falta de adesão ou descontinuidade do tratamentoIsso acontece por diversos fatores, como a necessidade da tomada diária dos comprimidos, o enfrentamento ao estigma e preconceito e a falta de acolhimento nos serviços de saúde”, afirma infectologista Rodrigo Zilli, diretor médico da GSK/ViiV Healthcare.

Segundo a fabricante, “o Estudo ImPrEP CAB Brasil tem como objetivo gerar evidências científicas do uso de cabotegravir injetável na vida real para a prevenção do HIV, tendo em vista que cabotegravir injetável foi superior à PrEP oral nos estudos HPTN083/084″.  Ainda de acordo com a empresa, o estudo mostrou que “melhorou significativamente a adesão da PrEP, reforçando o papel do cabotegravir na superação dos desafios de adesão enfrentados por algumas pessoas com a PrEP oral”.

Este estudo pioneiro sobre a implementação da PrEP injetável demonstrou que abordagens personalizadas de prevenção ao HIV são essenciais para empoderar as pessoas a escolherem o método de PrEP mais alinhado com seus valores e estilo de vida, aumentando as chances de adesão a longo prazo e garantindo maior efetividade na prevenção”, diz a fabricante.

Segundo Zilli, estudos científicos apoiados pela empresa para entender a efetividade desses medicamentos no mundo real reforçam que, “em diferentes localidades e populações mais vulneráveis, os injetáveis de longa duração são altamente efetivos para a prevenção do HIV, e uma opção às pílulas diárias”.

Para ele, a inclusão da PrEP injetável no SUS seria “uma conquista para todos os usuários da rede pública, além de ter o potencial para, de fato, mudar o cenário do HIV no país”. “Por isso, estamos focando nossos esforços na expansão do acesso à PrEP a todas as pessoas que buscam prevenção”, afirma.

Com informações da Agência Brasil e GSK

 

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