Uma menina de 8 anos morreu após inalar desodorante aerossol no Distrito Federal no último domingo (13). Sarah Raissa Pereira de Castro teve morte cerebral confirmada após participar do chamado “desafio do desodorante”, prática disseminada nas redes sociais que estimula crianças e adolescentes a inalarem o spray pelo maior tempo possível. Foi o segundo caso em pouco mais de um mês – o outro ocorreu em Recife (PE) e levou uma menina de 11 anos à morte.
Segundo a Polícia Civil, Sarah foi levada ao Hospital Regional de Ceilândia no dia 10 de abril, após sofrer uma parada cardiorrespiratória. Apesar de ter sido reanimada por cerca de uma hora, ela não apresentou reflexos neurológicos e teve a morte cerebral confirmada dias depois. Um inquérito foi aberto para apurar o caso e investigar os responsáveis pela divulgação do conteúdo digital.
Esse desafio que circula nas redes sociais é extremamente perigoso. Os sprays contêm gases como butano, propano e isobutano, que, quando inalados, provocam hipóxia — ou seja, falta de oxigênio no corpo — podendo causar tontura, convulsões e parada cardíaca. Há, inclusive, a chamada síndrome da morte súbita por inalante, que pode ocorrer em questão de minutos”, afirma o médico Paulo Guimarães, especialista em prevenção de acidentes domésticos e primeiros socorros a crianças e adolescentes.
Risco grave
Médica assistente do Centro de Informação e Assistência Toxicológica (CIATox), da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (Unicamp), a pediatra Camila Carbone Prado explica que a inalação indevida de produtos químicos, entre eles, os desodorantes, podem causar quadros muito graves, que podem ou não resultar na morte das vítimas.
Podem acontecer várias coisas com a pessoa. Desde arritmias cardíacas causadas pela inalação de alguns dos gases [tóxicos] existentes nestes produtos, como o butano, que podem resultar em uma parada cardíaca; a asfixia, que afeta o cérebro, comprometendo os neurônios, até, no limite, a morte”, comentou a médica, acrescentando que o uso indevido dos desodorantes spray também podem afetar os pulmões de diferentes e graves formas.
Menções ao ‘desafio do desodorante’ na internet remontam a, pelo menos, 2018. “Elas parecem inofensivas, mas não são. Há vários casos descritos de óbitos causados por este desafio, [que motiva] a exposição indevida do produto”, confirmou Camila ao se referir a sua experiência junto à equipe do CIATox.
A médica já participou do atendimento de alguns casos, tanto no Hospital das Clínicas da Unicamp, no final de 2022, quanto oferecendo apoio telefônico, em outros momentos. Segundo ela, em casos de intoxicação, quanto mais rápido uma pessoa receber atendimento médico, maiores as chances de ela ser salva, com menos sequelas.
É importante buscar socorro o mais rápido possível. Chamar uma ambulância ou, se possível, levar a pessoa o mais rapidamente para um local de atendimento de urgência. O tempo é um fator primordial.”
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Garota de 11 anos escapou por pouco de afogamento em piscina
Outro caso também chocou Brasília neste final de semana. A menina Eloá, de 11 anos, quase se afogou ao ter o cabelo sugado por um ralo de piscina. Ela brincava com os primos em uma chácara alugada na mesma região quando foi sugada para o fundo da piscina por um ralo. O cabelo ficou preso e ela engoliu muita água. Foi preciso cortar os fios para soltá-la. Sobre o caso da piscina, a família atribui o acidente à falta de manutenção do local e ao fato de a casa de máquinas estar trancada, impossibilitando o desligamento do equipamento de sucção.
Os dois casos colocam em evidência os perigos que cercam as crianças dentro de casa ou em momentos de lazer. Em comum, ambos os episódios envolvem situações que poderiam ter sido evitadas com medidas de segurança e atenção redobrada. As famílias agora convivem com o luto ou o trauma, enquanto especialistas reforçam a necessidade de prevenção.
De acordo com o Ministério da Saúde, só em 2024, 456 crianças e adolescentes de até 19 anos morreram vítimas de acidentes domésticos no Brasil. A principal causa foram riscos acidentais à respiração (213), seguidos por afogamentos e submersões (104).
Agora, se todos os dispositivos de prevenção falharem e o acidente ocorrer, é fundamental desligar imediatamente a bomba de sucção e tentar remover a criança da água o mais rápido possível. Pode-se usar uma tesoura para cortar o cabelo, tentar manter a cabeça fora d’água e, se necessário, iniciar as manobras de ressuscitação cardiopulmonar. E, claro, acionar o 192 ou 193 o quanto antes”, ”, explicou o especialista.
Para o médico, mais do que saber como agir diante de uma emergência, é fundamental que os adultos invistam na prevenção e no diálogo com os filhos: “A gente precisa estar atento ao que as crianças estão consumindo na internet. Conversar, orientar e guardar sprays e solventes fora do alcance dos pequenos pode literalmente salvar vidas.”
Entenda o caso
Envolvidos poderão responder por homicídio duplamente qualificado
A Polícia Civil do Distrito Federal instaurou inquérito para investigar as circunstâncias da morte de uma menina de 8 anos, em Ceilândia (DF). A família afirma que Sarah Raissa Pereira de Castro participou de um desafio compartilhado pelas redes sociais, chamado Desafio do Desodorante.
Segundo a Polícia Civil, a garota foi encontrada em sua casa, desmaiada, segurando um frasco de desodorante aerossol e parentes de Brenda a levaram às pressas ao hospital. A suspeita é que a menina tenha inalado o produto após assistir a uma espécie de prova, o Desafio do Desodorante, na rede social Tik Tok.
Com a instauração do inquérito policial, a 15ª Delegacia de Polícia do Distrito Federal vai tentar esclarecer se e como Sarah teve acesso à divulgação do desafio e identificar os eventuais responsáveis por sua publicação.
Os envolvidos poderão responder por homicídio duplamente qualificado (por emprego de meio capaz de causar perigo comum e por se tratar de vítima menor de 14 anos), crime cuja pena pode chegar a 30 anos de reclusão”, acrescentou a Polícia Civil, na mesma nota.
‘Desafio do desodorante’: menina de 11 anos também morreu em Recife
A morte de Sarah é a segunda de uma criança brasileira associada à divulgação do chamado ‘desafio do desodorante’ em apenas um mês. Em 9 de março, Brenda Sophia Melo de Santana, de 11 anos, faleceu no Hospital Municipal Dr. Miguel Arraes, em Bom Jardim (PE), a cerca de 100 quilômetros de Recife.
Segundo a prefeitura de Bom Jardim, a mãe de Brenda encontrou a filha quase desfalecida e a levou às pressas para o hospital. No trajeto, a menina sofreu uma parada cardiorrespiratória e desmaiou. Já na unidade de saúde, profissionais a submeteram ao protocolo de animação por quase 40 minutos, mas Brenda não resistiu.
De acordo com a prefeitura de Bom Jardim, parentes de Brenda afirmaram que a menina tinha o hábito de inalar desodorante, tendo sido advertida várias vezes. A prefeitura ainda alertou para a importância dos responsáveis orientarem as crianças sobre os riscos do uso inadequado de substâncias químicas e produtos domésticos, “bem como sobre os perigos relacionados ao uso de smartphones, internet e redes sociais, especialmente em desafios virtuais que podem comprometer a saúde e a vida dos jovens.”
Da Agência Brasil, com Assessorias