Conhecido por seu amor aos animais de estimação, o Brasil abriga uma população estimada em 168 milhões de pets, incluindo 68 milhões de cães e 34 milhões de gatos, segundo dados do Euromonitor de 2023. A tragédia climática que afetou o Rio Grande do Sul – lar de 7,2% da população pet do país – traz à tona a necessidade urgente de ações imediatas para mitigar riscos e minimizar os danos colaterais decorrentes de um aumento no número de animais abandonados.

Para animais resgatados de enchentes ou em outras condições debilitantes, é crucial primeiro garantir cuidados gerais, como higiene, saúde física e alimentação, para depois, cuidar da saúde emocional dos pets. “Assim como os humanos, os pets também podem sofrer traumas psicológicos que poderão trazer consequências ao seu comportamento, saúde e bem-estar”, diz a médica-veterinária e zootecnista Camila Camalionte.

De acordo com a gerente técnica da divisão de Pet Health da Elanco Brasil, o primeiro passo, logicamente, é o resgate, que visa preservar a vida do animal. No entanto, essa é apenas a etapa inicial de um longo processo, que inclui uma avaliação clínica veterinária completa e a reabilitação emocional do pet.

Após garantir a integridade física do animal, é fundamental dar atenção à sua saúde geral. O acompanhamento regular por médicos-veterinários é muito importante para monitorar a recuperação física e mental, além de manter as vacinas e vermífugos em dia.

No caso dos animais salvos das enchentes, a contaminação das águas pelas redes de esgoto e por organismos mortos submersos aumenta significativamente o risco de infecção por doenças graves, tanto em animais, quanto em humanos.

Por isso, é essencial buscar assistência veterinária imediata, que indicará as medidas necessárias, como o uso de vermífugos, parasiticidas e de outros medicamentos, conforme a necessidade individual e de acordo com o quadro apresentado por cada animal”, detalha Camila.

Animais podem sofrer transtorno do estresse pós-traumático

Cumprida essa etapa, é importante dar atenção à questão psicológica do animal. Segundo a especialista, estudos indicam que a exposição prolongada a eventos altamente estressantes, como maus-tratos, privação de água e alimento por longos períodos, pode resultar no desenvolvimento de transtornos mentais e emocionais, como o transtorno do estresse pós-traumático* (TEPT), ou ainda doenças crônicas degenerativas.

Por isso, é crucial que tutores e protetores estejam atentos ao comportamento do animal. “Sinais como agressividade, medo ou hiperatividade podem indicar estresse ou trauma. Para os tutores que reencontraram seus pets, é fundamental observar se o animal está mais isolado ou apático. Alterações no sono e no apetite também podem ser indicativos importantes de que algo não está bem”, conclui.

Para esta etapa, a médica-veterinária orienta que os animais precisarão de:

  1. Ambiente seguro, acolhedor e estabelecimento de rotinas;
  2. Socialização gradual: pode ser que o animal precise ser reintroduzido aos poucos ao convívio de outras pessoas e animais
  3. Treinamento positivo: técnicas que ajudem a reforçar o comportamento desejado, apoiando o animal na reconstrução da confiança e autoestima; 
  4. Para casos mais graves, busca de apoio especializado, como médico-veterinário comportamentalista ou adestramento especializado;
  5. Amor e paciência: como qualquer ser vivo, isso é tudo o que o animal deseja após tanto sofrimento.

Para Camila, a decisão de adotar um pet deve sempre passar por uma reflexão dos conceitos da adoção responsável, resultando em um processo que beneficiará todos os envolvidos. Para apoiar esse momento, a Elanco disponibiliza outras dicas de adoção responsável, com pontos importantes para amadurecer essa decisão e evitar traumas para o pet e para a família – veja aqui.

Atendimento em saúde deve se estender por semanas, diz veterinário

A calamidade que o Estado do Rio Grande do Sul vem enfrentando vitimou milhares de animais e, assim como com os humanos, os cuidados com eles vão além da saúde física e dos primeiros socorros e devem se estender por semanas.

Logo após o resgate, a prioridade é estabilizar os sinais vitais. A grande maioria dos animais permaneceu dias sem alimentação e água e expostos à chuva e ao frio, o que gera quadros de desidratação, hipoglicemia e hipotermia.

O tratamento varia conforme a gravidade do caso, mas geralmente envolve o aquecimento do pet e a fluidoterapia intravenosa para equilibrar os sinais vitais, acrescida de glicose e potássio caso o animal tenha dificuldades na ingestão ou absorção de alimentos.

Assim que os animais são estabilizados é preciso tomar as medidas preventivas básicas, considerando a exposição que tiveram à água e por estarem em ambientes coletivos.

O controle parasitário – pulgas, carrapatos e vermes – é primordial e básico para a recuperação da saúde. Medicamentos de ingestão oral trazem resultados mais rápidos e a colaboração de empresas e doadores tem sido essencial. Já a recuperação da imunidade se dá conforme o animal volta a receber uma alimentação de qualidade”, comenta o médico-veterinário Fabiano de Granville Ponce, diretor de operações da VetFamily Brasil.

Em relação às doenças infectocontagiosas, o veterinário ressalta a importância da quarentena para observação e tratamento imediato, caso o animal apresente doenças como cinomose, parvovirose ou, principalmente, leptospirose.

Como avaliar o trauma emocional dos animais

Esta é uma tragédia em proporção inédita para todos nós. Vimos imagens de animais que, mesmo após o resgate, continuavam a executar os movimentos de natação ou subiam nos telhados das casinhas dos abrigos. Nós, médicos-veterinários, temos o desafio de diagnosticar a proporção desse trauma emocional e observar como reagem nos dias subsequentes”, relata o veterinário.

Segundo ele, não há um tratamento específico preconizado, mas medicamentos já prescritos para controle de fobias podem colaborar, além do acompanhamento veterinário e de um comportamentalista. “Medidas como muito carinho, abrigo seguro, acolhimento, paciência e calma ao lidar com esses animais são essenciais”, pontua.

Conhecer as particularidades das espécies é ainda mais importante nesses casos. Os felinos costumam ser mais desconfiados e ainda podem apresentar sinais de traumas como medo de barulhos altos, maior necessidade de se refugiarem em lugares escuros e pequenos, agressividade ou dificuldade em usar caixas de areia.

Com os bichanos, a paciência vai fazer toda a diferença. É importante respeitar o tempo do gato, fazendo interações calmas, sem forçar que fiquem no colo ou expostos a outros animais enquanto ainda demonstrarem insegurança.

Dicas para adaptação ou readaptação de animais resgatados

De acordo com Ponce, no cenário atual não é possível oferecer o abrigo adequado para este período, mas a quarentena pode ser mantida, na medida do possível, no retorno para casa, lar temporário ou novo lar, no caso da adoção.

Em casas com mais de um animal, o ideal é mantê-los em ambientes separados e fazer o acompanhamento mais frequente com um médico-veterinário. Este tipo de cuidado é ideal em qualquer adoção ou aquisição de um pet, as medidas preventivas não devem de forma nenhuma desmotivar a adoção. “Esses animais precisam de acolhimento e cada um pode colaborar de alguma forma”, diz ele.

O especialista destaca que em toda adoção é necessário que o adotante tenha em mente que se trata de uma responsabilidade para alguns anos e deve ter consciência de que um animal demora dias ou semanas para se familiarizar com um novo lar.

Se houver outros animais na nova casa, a adaptação deve ser feita de forma gradativa assim que o pet adotado estiver liberado para interação com outros animais. O contato deve ser feito aos poucos, diariamente e com acompanhamento dos tutores, até que os animais possam ficar juntos sem brigar.

Além da atenção à socialização, é fundamental oferecer uma dieta de qualidade, ambiente confortável e companhia dos tutores. Os cães, especialmente, gostam muito de pessoas, querem estar perto dos humanos mais tempo possível”, aconselha o veterinário.

Profissionais e voluntários na ‘linha de frente’ do resgate de animais também sofrem

A preocupação com a saúde mental não se restringe aos animais e aos humanos vítimas das enchentes: os profissionais atuando na linha de frente também sofrem as consequências tristes das tragédias, especialmente quando não têm sucesso em algum resgate ou tratamento.

Somos solidários a todos os nossos colegas que estão atuando de forma direta ou indireta, grande parte pela primeira vez numa situação desse nível. É realmente emocionante constatar o desprendimento, a coragem e a empatia dos médicos-veterinários nesse momento, atuando não somente com os animais, mas colaborando com toda a sociedade”, declara o médico-veterinário Henry Berger, diretor-geral da VetFamily no Brasil. 

A VetFamily, comunidade internacional criada por médicos-veterinários para desenvolver o setor, tem como um de seus objetivos fomentar o networking e a colaboração entre seus pares e acompanha diariamente, em seus canais de comunicação, os relatos e as trocas de informações entre membros e executivos da comunidade, seja com dados, protocolos de atendimento e apoio das mais diversas formas.

A profissão do médico-veterinário já é considerada uma das que mais enfrenta desafios com a saúde mental. Precisaremos estar ainda mais atentos com nossos pares nesse momento e nos próximos meses. É importante que os veterinários não hesitem em buscar conforto com a família, os amigos e os colegas, e até mesmo, auxílio de psicólogos e profissionais de saúde”, comenta Ponce.

Desdobramentos no segmento veterinário

O mercado veterinário gaúcho também deve sofrer impacto. Clínicas e hospitais veterinários tiveram suas infraestruturas comprometidas e as que tiveram suas propriedades e equipamentos preservados devem receber maior volume de pacientes, tanto para tratamentos eletivos e emergenciais, como para cuidados com as sequelas das enchentes.

Neste sentido, clínicas, hospitais e profissionais terão trabalho extra de gestão de recursos humanos e físicos para atender as demandas ou recuperar o que foi perdido. Novos aprendizados e troca de experiências em gerenciamento e operação serão fundamentais e esperamos poder colaborar com todos, como comunidade”, completa Henry.

A tragédia também destacou a relevância da relação entre pets e tutores, a importância da atuação de voluntários e profissionais de todas as áreas, o poder das ações coletivas e a necessidade de prevenir e cuidar da saúde física e emocional de todos, incluindo os animais. “Esperamos que para o futuro, esses aprendizados, o olhar cuidadoso com os animais e a valorização dos médicos-veterinários reflitam de forma positiva no segmento”, finaliza Berger.

 

Apoio ao Rio Grande do Sul

Até o momento, a Elanco doou mais de R$ 1,7 milhão em produtos da sua linha pet, incluindo antipulgas que trataram aproximadamente 18 mil cães e gatos, além de vermífugos, antimicrobianos e medicamentos para dor. Essas doações foram destinadas a mais de 30 abrigos, ONGs e protetores de animais, como a 101 Vira-latas, Deise Falci, Instituto Paula Lopes e ULBRA. Além disso, a companhia também distribuiu produtos para bovinos e suínos.

 

Com Assessorias

 

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