‘E agora?’ Essa costuma ser a primeira pergunta que as pessoas se fazem ao serem diagnosticadas com algum tipo de câncer, segunda maior causa de mortes por doença de brasileiros, depois das cardiovasculares e é o principal problema de saúde pública no mundo, já está entre as quatro principais causas de morte prematura (antes dos 70 anos) na maioria dos países.
Cerca de 704 mil casos novos de câncer devem ser registrados por ano no Brasil entre 2023 e 2025, segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca). Recém divulgados na publicação “Estimativa 2023 — Incidência de Câncer no Brasil”, os dados norteiam as estratégias na área oncológica brasileira e chegam a público pouco antes do Dia Mundial do Câncer, no dia 4 de fevereiro, numa iniciativa que tem por objetivo aumentar a conscientização sobre a doença e influenciar a mobilização pelo seu controle.
Se os números assustam, os avanços científicos têm potencializado os resultados positivos na medicina oncológica. Existem várias opções de tratamento e de prevenção, sendo a genética uma aliada importante para o sucesso.
O sequenciamento genético é um dos avanços científicos que têm contribuído de forma significativa para o enfrentamento da doença, capaz de realizar o diagnóstico de síndromes de predisposição hereditária ao câncer, proporcionando a possibilidade de acompanhamento e tratamento individualizados e mais eficientes, com recomendações específicas para as condições detectadas.
“Por muitos anos a medicina ficou às cegas, com medidas de prevenção genéricas, mas hoje temos o aconselhamento genético, que é de extrema importância para uma prevenção guiada e para descobrir precocemente a doença, antes de virar um tumor”, detalha Maria Cunha Ribeiro Amorelli, especialista em hereditariedade do câncer pelo Hospital Albert Einstein.
“Com o advento da genética já somos capazes de fazer este diagnóstico através de uma consulta de aconselhamento oncogenético”, revela a hematologista e hemoterapeuta pelo Inca, que atende na clínica AngioGyn, no centro clínico do Órion Complex, em Goiânia. Ela explica que o câncer é uma doença multifatorial e fatores ambientais como tabagismo, obesidade e sedentarismo são os maiores riscos.
“No entanto, já se sabe que quase 20% dos cânceres diagnosticados atualmente têm uma origem familiar. Destes, 10% apresentam uma síndrome de hereditariedade do câncer com presença de mutações genéticas que são passadas através das gerações”, destaca a médica.
Influência familiar
A ocorrência de vários casos de câncer em uma única família pode estar relacionada a mutações que aumentam o risco de desenvolvimento da doença. A oncogenética tem um papel fundamental, não apenas na prevenção como na investigação precoce e no seu tratamento.
“O diagnóstico de uma variante genética na família nos dá a oportunidade de saber a quais tumores aquela família está exposta e proteger não só ao paciente, mas também seus filhos, netos, primos. O objetivo é realizar exames de prevenção específicos com regularidade e impedir que um câncer se instale”, explica a especialista.
Ela revela que quando alguma mutação genética é detectada em uma pessoa, exames são recomendados para toda a família, além de consultas anuais de prevenção. A hematologista conta que com o aconselhamento genético é possível descobrir mutações que podem causar outras doenças e diz que a medicina cada vez mais será guiada pela genética.
“Nossos genes escondem segredos não só das doenças que estão em risco, mas também dos medicamentos com melhor resposta, guiando o tratamento. Isto porque cada pessoa é única, assim como todo tumor é único. Este tratamento de precisão, é diferente do tratamento convencional que atinge não só as células tumorais, mas todo o organismo”, afirma.
O que considerar ao buscar aconselhamento oncogenético
Maria Amorelli lista pontos que devem ser analisados para saber se é preciso buscar um aconselhamento oncogenético.
- Presença de três ou mais parentes com diagnóstico de câncer, ou dois parentes de primeiro grau.
Se você possui mais de três familiares com diagnóstico de câncer, sejam eles pais, avós, mas também tios, primos é possível que você necessite de uma avaliação. - Tumores em idade jovem.
Se você ou algum parente próximo apresentou um tumor em idade jovem, abaixo da faixa etária habitual, por exemplo um câncer de mama antes dos 35 anos, deve ser avaliado. - Tumores incomuns.
O diagnóstico de um tumor incomum ou raro como Carcinoma Medular de Tireóide ou Feocromocitoma por exemplo, deve ser investigado. - Tumores bilaterais.
Câncer de mama ou ovário bilaterais junto ao diagnóstico precisam de uma avaliação mais detalhada. - Sexo não usual.
Tumores de mama em homens são bastante incomuns, mas podem ocorrer e, quando presentes, necessitam de investigação. - Associação com malformações ou síndromes genéticas
A presença de malformações como alterações vasculares, malformações de membros, face ou órgãos podem ter associações com mutações genéticas que podem predispor ao câncer. - Lesões Cutâneas
Algumas lesões na pele, algumas vezes já presentes ao nascimento, como por exemplo as manchas café-com-leite, que são bastante comuns, quando estão em grande número ou tamanho aumentado podem ter associações com alterações genéticas.
Medicina genômica auxilia na identificação precoce da doença
Para Carlos Dzik, diretor de oncologia do Hospital Nove de Julho e diretor regional São Paulo da Dasa Oncologia, os testes genéticos são, atualmente, parte importante na jornada dos pacientes com câncer. Eles proporcionam um tratamento personalizado e potencializam as suas chances de cura.
“A evolução da medicina contribui para que o paciente tenha a terapia mais assertiva. A genética, por exemplo, pode ainda auxiliar no rastreio precoce de neoplasias”, explica o especialista. “Na Dasa Genômica, braço genômico da rede Dasa, existem mais de 300 tipos de exames genômicos para câncer, ou seja, testes realizados no tumor e direcionados para as necessidades de cada paciente”.
Os painéis NGS (Next Generation Sequencing), por meio da análise do DNA, buscam identificar variantes nos genes. Tais exames são realizados a partir de uma simples coleta de sangue ou swab bucal e podem ser úteis para orientar tanto a prevenção, quanto o tratamento de pacientes.
“A partir daí, o médico ou médica pode indicar a melhor opção. Em alguns casos, opta-se por cirurgias redutoras. Em outros, a quimioterapia ou imunoterapia, ou seja, cada caso é analisado de forma individual, potencializando as chances de sucesso do tratamento. Nenhum diagnóstico é uma sentença”, diz o especialista.
Além de definir condutas médicas para os pacientes, o painel de câncer hereditário também é importante para o acompanhamento dos seus familiares. Se for identificado um fator genético, é possível testar também os parentes e acompanhá-los mais de perto, ajudando a prevenir novos casos.
O especialista ressalta a importância do avanço da medicina genômica para o tratamento de neoplasias. As novas tecnologias permitem que determinadas terapias sejam direcionadas para pacientes com cânceres específicos, proporcionando qualidade de vida e maiores chances de cura. “Dessa forma, seguimos no caminho de uma medicina cada vez mais preditiva e personalizada”, finaliza.
Novidade em genética para tumores cerebrais
A Dasa Genômica acaba de trazer ao Brasil o teste MethylBrain, uma ferramenta poderosa no auxílio ao diagnóstico dos tumores cerebrais, possibilitando sua classificação de forma mais precisa, refinada e capaz de fornecer informações muito importantes para auxiliar nas decisões de tratamento e seguimento desses pacientes. Cristovam Scapulatempo Neto, diretor médico de patologia e genômica da Dasa, explica como funciona.
“Trata-se de um ensaio molecular que indica o padrão de metilação do tumor de cada paciente testado. Com esses dados, o algoritmo irá auxiliar na indicação do diagnóstico mais provável daquela neoplasia, além de proporcionar uma predição sobre o estado de metilação da região promotora do gene MGMT, um parâmetro importante para avaliar a sensibilidade dos tumores cerebrais a uma droga muito usada em neuro-oncologia, a temozolamida”, afirma.
Além disso, outros dados moleculares podem ser inferidos a partir dos dados obtidos. Estas variáveis são fundamentais para o diagnóstico e graduação de determinados tumores.
“Por meio da interpretação conjunta de todos os dados clínicos, da tradução de imagem, das características morfológicas do tumor ao microscópio, além dos resultados de outros exames moleculares, é possível a realização de um diagnóstico integrado para tumores do sistema nervoso central”, completa o especialista.
Este processo envolve médicos patologistas, biólogos moleculares, neuro-oncologistas, oncopediatras, neurocirurgiões e outros profissionais envolvidos na cadeia de cuidado do paciente neuro-oncológico. Este teste também pode ser utilizado para a classificação de tumores sinonasais e sarcomas.
História familiar de câncer é fundamental
Para o coordenador de genômica do Grupo Sabin, Gustavo Barra, é inegável os benefícios que a genômica tem trazido para o paciente oncológico e também para seus familiares. Por isso, a equipe tem intensificado seus investimentos e trabalho no sequenciamento genético de doenças raras, entre elas os cânceres hereditários.
“Temos buscado ampliar o número de genes analisados de maneira a beneficiar cada vez mais pessoas em suas jornadas de saúde ao longo da vida. A medicina de precisão é hoje a melhor estratégia para o tratamento de câncer e os testes moleculares, tanto aqueles realizados no tumor quanto aqueles que informam sobre a constituição genética do paciente, são indispensáveis para a realização dessa abordagem”, conclui Gustavo.
Antes da realização dos exames genéticos germinativos — que podem permitir o diagnóstico de síndromes de predisposição hereditária ao câncer -, existem alguns critérios que devem ser avaliados pelo médico que acompanha o paciente. A história familiar de câncer — que pode incluir neoplasias como câncer de mama, ovário e pâncreas — é um desses critérios de avaliação para investigação genética.
“Em casos como o câncer de mama, por exemplo, o diagnóstico da síndrome de predisposição genética para o câncer pode modificar inclusive as recomendações para rastreamento ao longo da vida, aumentando as chances de detecção precoce de possíveis tumores, além de permitir até mesmo condutas preventivas”, explica a médica geneticista do Grupo Sabin, Rosenelle Araújo.
Os benefícios incluem ainda a definição de protocolos mais adequados em função do risco genético e conforme a indicação em diretrizes, procedimentos como cirurgias redutoras de risco e a quimioprofilaxia também podem ser possíveis em alguns casos e podem reduzir o risco de desenvolvimento da doença. “Por isso é importante discutir com o médico, tanto a indicação do exame quanto as condutas a partir do seu resultado”, destaca a médica.
Medidas preventivas do câncer
“Câncer é uma doença que assusta, e com razão. Mesmo em casos de desfecho positivo com cura, o tratamento é longo e bastante impactante sobre a vida do indivíduo. Por isso é sempre bom lembrar, que ter uma predisposição hereditária não determina que um indivíduo vai ter a doença. Sabemos que o câncer não tem uma causa única”, esclarece a Dra Rosenelle.
Segundo ela, há diversas causas tanto externas – presentes no meio ambiente e também associadas aos hábitos de vida – quanto internas – como hormônios, condições imunológicas, além das genéticas. Esses fatores podem interagir de diversas formas, dando início ao câncer.
Este nome é dado a um conjunto de doenças que têm em comum o crescimento descontrolado de células, que dividindo-se rapidamente, determinam a formação de tumores, que podem ocorrer em qualquer região do corpo. Os diferentes tipos de câncer têm com origem os vários tipos de células que formam o corpo.
“No entanto, existem fatores que atuam na prevenção do câncer e que todo mundo pode e deve fazer: manutenção do peso corporal, prática regular de atividades físicas, priorizar uma dieta balanceada e saudável e evitar o etilismo e o tabagismo. São medidas acessíveis para todos e fundamentais para quem busca saúde e bem-estar ao longo da vida”, conclui a médica.
Com Assessorias