Novo estudo da Fiocruz aponta a imunização das crianças contra Covid-19 como uma estratégia importante para aumentar a cobertura vacinal da população brasileira. A pesquisa, submetida à Revista Brasileira de Epidemiologia, e disponível em formato preprint, analisa a evolução da vacinação no país e observa que a imunização no país estaria com uma tendência já próxima à estagnação.

Atualmente, cerca de 85% dos brasileiros podem se vacinar, se consideradas todas as pessoas acima de 11 anos. No entanto, os pesquisadores observaram que, desde setembro, o ritmo de vacinação da primeira dose no Brasil vem desacelerando.

E nos dois meses seguintes ao dia 9 de outubro esse ritmo caiu ainda mais a cada Semana Epidemiológica (SE), chegando perto do zero – cerca de 0,08% por dia. Para os pesquisadores, isso poderia sugerir que a vacinação já está próxima do seu limite, com 74,95% da população imunizada com a primeira dose.

Segundo o estudo, uma das formas de superar essa curva de estagnação é ampliar as faixas etárias elegíveis à vacinação, com a imunização das crianças, e criar novas estratégias para aumentar a aplicação da primeira dose em pessoas que vivem em locais remotos. Para os pesquisadores, a estagnação tem maior relação com dificuldade de acesso do que com recusa em receber a vacina.

A análise teve como base a cobertura vacinal por unidade da Federação, de acordo com as semanas epidemiológicas e tendo como data de referência o último dia de cada SE. O período de referência para a análise foi a Semana Epidemiológica 47, correspondente à última semana de novembro.

Falta de imunizantes atrapalhou início da vacinação

De acordo com o estudo, o Brasil tem quatro fases distintas na evolução temporal na aplicação da primeira dose. Houve uma fase inicial, quando a progressão foi lenta devido em parte à falta de imunizantes.

Em seguida ocorreu um período de cerca de dez semanas em que a vacinação começou a atingir as pessoas com menos de 70 anos, seguido por outro em que se observa uma velocidade no aumento da cobertura, chegando a pessoas com menos de 60 anos. E depois veio a quarta fase, que deixa claramente marcada a desaceleração.

“A grande maioria dos estados segue esta tendência, variando apenas a velocidade de aumento da cobertura, que foi sistematicamente maior nos estados das regiões Sul e Sudeste”, comenta o pesquisador do Observatório Covid-19 da Fiocruz e um dos autores, Raphael Guimarães.

O pesquisador destaca que “nas unidades da Federação em que a cobertura de primeira dose é mais alta, a diferença para a cobertura de segunda dose é menor, sugerindo que a perda de população entre doses tem sido pequena”. Os pesquisadores ressaltam que os estados do Norte têm população mais jovem, o que pode parcialmente explicar a cobertura mais baixa nessa região.

O estudo mostra que há uma grande desigualdade nacional, com Norte e Nordeste apresentando as piores coberturas, tanto de primeira quanto de segunda doses, o que deixa claro que os valores nacionais são inflacionados pelos números estatisticamente superiores dos estados do Centro-Sul. Para exemplificar: São Paulo e Amapá têm, respectivamente a maior e a menor cobertura vacinal no país.

“É importante ressaltar que, além de aspectos populacionais, questões relacionadas à logística de distribuição podem influenciar nos dados utilizados na análise”, observa Guimarães.

O estudo lembra que a estratégia de vacinação como medida de mitigação da pandemia tem sido uma medida efetiva, no Brasil e no mundo. A população, de uma forma geral, vem aderindo à aplicação do imunobiológico. E acrescentam, em relação à vacinação infantil, que há imunizantes com comprovada eficácia para este grupo etário e estudos de segurança indicam que é possível sua utilização.

Segundo os especialistas, a boa adesão à vacinação no Brasil é resultado de mais de 40 anos de construção de credibilidade do Programa Nacional de Imunizações, que garante cobertura universal ao calendário básico vacinal no país.

“Neste sentido, é razoável supor que a estagnação está mais relacionada à dificuldade de acesso do que à recusa em receber o imunizante”, diz Guimarães. De fato, de acordo com a análise, a cobertura da vacinação é menor em áreas mais carentes e entre grupos de minorias étnicas. Portanto, é fundamental fortalecer estratégias comprometidas com a redução da iniquidade de vacinação.

Guimarães ressalta que a vacinação é uma responsabilidade individual e coletiva. “Além disso, é essencial obter celeridade no processo de aquisição das vacinas que tenham comprovada segurança para crianças de 5 a 11 anos, para que este grupo fique protegido e permita uma maior cobertura vacinal total no país”.

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