De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 466 milhões de pessoas no mundo (10% da população) têm surdez moderada e/ou severa – entre elas 34 milhões de crianças. A previsão é de que até 2050, 900 milhões de pessoas poderão ter algum grau de perda auditiva, o que significa um em cada 10 habitantes do planeta.
Dados de 2015 da OMS apontam que no Brasil há um total de 28 milhões de pessoas com surdez. Isso representa 14% da população. Já um estudo realizado em 2019 pelo Instituto Locomotiva e a Semana da Acessibilidade Surda revelou que existem, no Brasil, 10,7 milhões de pessoas com deficiência auditiva (5% da população), sendo que 2,3 milhões delas têm perda de audição severa.
A surdez atinge mais os homens (54%). Grande parte deles tem 60 anos de idade ou mais (57%). O mesmo estudo mostrou ainda que apenas 9% dos indivíduos com deficiência auditiva nasceram com essa condição: outros 91% adquiriram o distúrbio ao longo da vida. E o dado ainda mais assustador: dois em cada três brasileiros com perda de audição não tratada relataram enfrentar dificuldades nas atividades do dia a dia.
A gravidade da situação vem impulsionando campanhas e estratégias de Saúde Pública da OMS sobre a importância do cuidado com a saúde auditiva. Este Dia Mundial da Audição, comemorado no dia 3 de março, acende um alerta: como você cuida de sua audição? Tem consciência de que, mais cedo ou mais tarde, pode começar a sentir dificuldades para ouvir?
Com o tema “Cuidados auditivos para todos!” a data marcará o lançamento do Relatório Mundial sobre a Audição, com um apelo global aos governos e à população em geral quanto à adoção de medidas efetivas para lidar com a perda de audição e as doenças , ao longo da vida. Afinal, quanto mais cedo a perda auditiva for detectada, melhor.
A OMS recomenda que todas as pessoas chequem a sua audição, periodicamente. Entre as principais mensagens da OMS para a data estão às que se referem a decisões políticas e governamentais, entre elas, a inclusão de atendimento na área de Audiologia nos planos nacionais de saúde.
Para o público em geral, as mensagens focam na importância de uma boa audição e comunicação em todas as fases da vida e na adoção de ações preventivas ao longo da vida, como a proteção contra sons altos e boas práticas de cuidados com a audição.
Pessoas que sofrem com o problema têm vergonha
Segundo especialistas, a deficiência auditiva é um dos distúrbios mais incapacitantes, que traz grandes prejuízos à qualidade de vida dos indivíduos. Se não for tratada, a deficiência auditiva pode causar dificuldades cada vez maiores.
As pessoas que não ouvem bem têm vergonha de estar com amigos, se divertem menos e têm menos chances no mercado de trabalho. Com o tempo, as sequelas aumentam, vem o isolamento social e a tristeza, que podem levar à depressão, declínio cognitivo e demência.
Estamos enfatizando a importância de abordar e tratar a perda de audição em tempo hábil, tão logo apareçam os primeiros indícios de dificuldades para ouvir. Com isso, evitamos uma série de prejuízos na comunicação, nos relacionamentos, e as pessoas podem continuar aproveitando a vida ao máximo”, pontua a fonoaudióloga Marcella Vidal, gerente de Audiologia Corporativo da Telex Soluções Auditivas.
A profissional recomenda a realização de um exame denominado audiometria, uma vez ao ano, especialmente para pessoas acima de 50 anos, para quem tem predisposição genética ou já experimentam dificuldades para ouvir. “Também aconselho esse exame para aquelas que têm infecções frequentes na orelha, trabalham em ambientes ruidosos ou ouvem som alto por longos períodos, como ocorre atualmente entre os mais jovens com a ‘febre’ dos fones de ouvido”, conclui a fonoaudióloga.
Sintomas vai além de não ouvir direito
Escutar os sons nem sempre significa ouvir corretamente. Sintomas como cansaço, fadiga, dores de cabeça, tensão muscular podem estar relacionados a algum grau de perda auditiva, segundo a fonoaudióloga Leda Donad, da Audium Brasil e especialista em Audiologia Clínica. A especialista conscientiza sobre as causas mais comuns relacionadas a problemas auditivos, explica como identificá-los e ensina a prevenir os déficits de audição.
O ouvido médio contém três pequenos ossos que recebem as vibrações do tímpano, envia-as para a orelha interna que, por meio do nervo auditivo, leva a informação sonora para o cérebro. É um sistema bastante sensível. Qualquer alteração nesses ossos ou mesmo nos pequenos vasos dessa área, causada por fatores externos ou de saúde, pode afetar a saúde auditiva e danificar permanentemente o órgão”, explica Leda.
Crianças prematuras, grupos com exposição a ruídos intensos ou ruídos provenientes de atividades de lazer, pessoas com casos na família e idosos estão entre os grupos de maior risco para problemas auditivos. Entretanto, diversas doenças, mesmo não relacionadas ao sistema auditivo, bem como o uso de alguns tipos de medicamentos também podem levar à perda da audição.
Meningite, rubéola, doenças cardiovasculares, hipertensão e osteoporose são exemplos de doenças comuns e que, em maior ou menor grau, podem lesar as vias auditivas. O uso de medicamentos como alguns antibióticos, quimioterápicos, diuréticos e anti-inflamatórios estão entre os remédios mais tóxicos para os ouvidos e a audição. Por isso, ao menor sinal de deficiência auditiva, é importante consultar um otorrinolaringologista para evitar que o problema se agrave”, alerta Leda Donadel.
Problemas que podem levar à perda da audição
A perda ou a diminuição da capacidade de ouvir pode ser causada por uma série de fatores, como otites mal curadas ou de repetição; uso de remédios prejudicais à audição; problemas no tímpano, tumores, envelhecimento, frequentar ou trabalhar em locais barulhentos; uso contínuo de fones de ouvido em volume alto; hereditariedade, entre outros fatores, conforme explica o cirurgião otorrinolaringologista Henrique Gobbo.
No caso dos bebês, se estimulado até o sexto mês, é possível reduzir as consequências geradas pela surdez como a falta de fala e a impossibilidade de comunicação. Por isso, é importante procurar um especialista”, explica a fonoaudióloga. “Nos adultos é importante ressaltar que a perda auditiva pode vir acompanhada de graves problemas emocionais, por isso buscamos sempre as melhores soluções em reabilitação, para que a vida desse paciente seja completamente normal”, completa.
Quando buscar ajuda de um profissional
Como saber quando procurar ajuda profissional? É possível identificar os sinais da perda auditiva em crianças e adultos, lembra a fonoaudióloga. Em crianças, o atraso no desenvolvimento da linguagem oral, na aquisição da fala, desatenção constante, pedidos frequentes para repetir o que foi dito, hábito de ouvir televisão em volume muito alto são sinais importantes que podem indicar deficiência auditiva.
Nos adultos, muitas vezes os familiares identificam o problema antes do próprio paciente, quando percebem que ele pede para repetir com frequência o que foi dito, coloca o volume da TV de uma forma que incomoda os demais e um sinal muito comum é o próprio paciente relatar que ouve a fala mas não entende. A inteligibilidade afetada é um sinal importante de déficit auditivo”, explica Leda.
Para identificar o problema, é possível ainda realizar testes caseiros. Com as crianças, a emissão de sons de forma lúdica, em diferentes intensidades, sem que exista a possibilidade do campo visual para ajudar na resposta e enquanto ela estiver distraída é uma forma de observar se reage ao estímulo. “Bebês podem responder a um estímulo parando de sugar a chupeta, ou quando a criança já é um pouco maior, irá procurar com o movimento ocular a presença do estímulo sonoro”, lembra a fonoaudióloga. “No caso dos adultos, pode-se ir regulando o volume da TV para ver em qual intensidade ele se sente confortável em ouvir”, complementa.
Dicas para prevenção da saúde auditiva
Confira as principais dicas da especialista da Audium Brasil para manter a saúde auditiva:
- – Monitore os sons em casa (televisão e aparelhos sonoros); não deixe o ouvido se costumar ao som alto. Se usar aparelhos sonoros nas ruas, como fones de ouvido, tente manter o volume médio, com o qual possa conversar mesmo ouvindo música. O limite aceitável é de 85 db por 45 minutos.
- – Evite ficar próximo a caixas de som em festas, em shows de música ou trios elétricos.
- – Só escuta som alto no carro? Cuidado! O alto volume em ambientes fechados não se propaga e, acima de 85 decibéis, ainda é pior. Cuidado também com a música alta nas academias. O barulho pode chegar a 110 decibéis. Proteger a audição também é cuidar do corpo.
- – Sempre que possível, descanse sua audição em um lugar silencioso.
- – Atenção às doenças do ouvido, como as otites; qualquer sensação incômoda, procure logo um otorrinolaringologista.
- – Cuidado com medicamentos que podem causar danos à audição, como anti-inflamatórios e até aspirina que, se tomada em excesso, pode levar à perda auditiva.
- – Atenção motoqueiros! Motocicletas, principalmente as de média e altas cilindradas, emitem ruídos em torno ou acima de 95 decibéis. Não trafegue por muito tempo seguido.
- – Se estiver exposto a sons intensos no trabalho, não esqueça de utilizar equipamentos de proteção individual (protetores auriculares).
- – Limpe corretamente seus ouvidos. As hastes flexíveis devem ser usadas somente na parte externa da orelha. Nada de cutucar.
- – Assoe o nariz, de forma suave, duas vezes por dia. A medida evita a entrada de secreções que podem causar perda auditiva, dor, pressão nos ouvidos e zumbido.
- – Se possui algum familiar próximo que tenha perda auditiva, procure um especialista com antecedência. Em muitos casos a perda de audição é um fator genético.
- – Faça o teste da orelhinha no bebê logo após o nascimento, mas avalie também a audição do seu filho, novamente, na época da alfabetização.
Quando indicar o uso de aparelho auditivo
Uma das opções de tratamento da surdez ou perda auditiva é o uso de aparelhos auditivos, que irá proporcionar inúmeros benefícios para o indivíduo. Quando são identificados casos de desgaste do sistema auditivo ou deficiência diagnosticada pelo médico, pode ser indicado o uso do aparelho auditivo.
O Aparelho de Amplificação Sonora Individual (ASSI) é um dispositivo eletrônico com a função de converter as ondas sonoras em sinais elétricos e os manda diretamente a um amplificador, que eleva a potência dos sinais e os envia para o ouvido através de um receptor. Ele é recomendado somente após o diagnóstico médico e a validação com um fonoaudiólogo, que vai acompanhar o paciente no processo de reabilitação”, explica Leda.
Não existe idade mínima para o uso. Quanto menor a idade de adaptação do aparelho, melhor será o desenvolvimento auditivo, por isto a importância do diagnóstico precoce.
Para as crianças, preconiza-se a protetização antes dos 6 meses de idade, para evitar atrasos no desenvolvimento. Para os adultos, tão logo se identifique qualquer sinal de deficiência auditiva. A espera por tempo excessivo pode agravar o dano do sistema auditivo e o uso do aparelho pode não conseguir oferecer o melhor resultado. Vale informar, ainda, que nem toda a perda auditiva irá se beneficiar com o aparelho, por isso é importante a consulta com um otorrinolaringologista”, pontua.
Paciente recupera audição após cirurgia inédita
Agora posso voltar a ter uma vida social e a tocar violão. Nem acredito que vou voltar a ouvir os pássaros quando acordar. Parece um sonho”, afirmou Ana Paula, logo após se submeter a uma cirurgia ainda pouco conhecida para implante de uma prótese. “Essa redescoberta será muito importante para ela. Estamos muito gratos por essa cirurgia tão assertiva, e por todos os cuidados de cada um dos profissionais envolvidos no processo de reabilitação dela”, completa a irmã, Carla Lyra.
Prótese corrige a surdez e traz maior conforto estético ao paciente
A ativação da prótese foi realizada pela fonoaudióloga Elaine Soares, profissional fundamental para a evolução no processo de adaptação de Ana Paula. “Hoje, graças aos avanços da ciência, tanto na medicina quanto nas tecnologias, é muito raro uma perda que não possa ser reabilitada. Aparelhos como esse são nossos principais aliados”, afirmou a especialista em Audiologia.
“A ativação funciona como uma audiometria e a da Ana Paula foi realizada com 100% de sucesso. É impossível não se emocionar ao ver um paciente completamente satisfeito, ouvindo novamente”, completa. Segundo ela, o aparelho possui controle remoto, que inclui, ainda, programa de controle de ruído.
Trata-se de um implante de condução óssea ativo do modelo mais avançado que existe e que é implantado totalmente sob a pele. São próteses modernas, que trazem maior conforto ao paciente, incluindo o conforto estético, pois são praticamente invisíveis. Além disso, ainda conseguimos dar conectividade a essas próteses. Além de corrigir a surdez, ainda podem ser conectadas ao celular para o paciente ouvir música, por exemplo”, explicou o cirurgião.
Em 2014, Gobbo já havia realizado outro procedimento inédito no Vera Cruz Hospital. “Naquele ano fizemos a segunda cirurgia desse tipo e, agora, com o lançamento de um novo modelo, estamos novamente realizando o segundo procedimento no país”, celebrou o otorrinolaringologista.