Sensação de cansaço constante, dificuldade para dormir ou agitação são sintomas que impactam a qualidade de vida de 72% dos brasileiros, de acordo com estudos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)O sono de qualidade não é apenas fundamental para a recuperação do corpo, mas também para a regulação hormonal e o bom funcionamento do metabolismo.  Distúrbios do sono podem afetar significativamente o bem-estar de uma pessoa, prejudicando não apenas o descanso, mas também a saúde geral.

Dormimos cerca de um terço da nossa vida, e a privação do sono tem consequências diretas na memória, concentração, humor e no ganho de peso“, alerta Edilson Zancanella, coordenador do Serviço de Distúrbios do Sono do IOU – Instituto de Otorrinolaringologia & Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Unicamp e presidente da Academia Brasileira do Sono.

Entre os problemas mais comuns que afetam a qualidade do sono estão a apneia, que pode atingir mais de 30% da população economicamente ativa, e a insônia, que impacta cerca de 25% das pessoas, sendo mais comum em mulheres no pós-climatério. Além disso, a restrição do sono é um problema generalizado devido aos hábitos modernos, como o uso excessivo de telas antes de dormir e a falta de uma rotina adequada.

Outro distúrbio conhecido dos brasileiros é a paralisia do sono. Ao acordar, muitas vezes o paciente com essa condição não consegue falar ou realizar movimentos simples do corpo. É o caso da estudante Jackie Viana, de 20 anos. Ela tem episódios frequentes desde os 12 , quando foi diagnosticada com o distúrbio. Como a condição interfere negativamente na qualidade de vida dela, a estudante passou a usar estratégias para dormir melhor. 

Normalmente, utilizo sons que me acalmam ou, em alguns casos, recorro a remédios para dormir. Para me acalmar, gosto de ler antes de dormir, pois isso me ajuda a relaxar e desacelerar a mente, conta a estudante.

Brasília (DF) 14/03/2025 - Dia Mundial do Sono, Jackie Viana, 20 anos. Foto: Jackie Viana/Arquivo pessoal

Sinal de doenças como hipertensão, diabetes, obesidade e até câncer

A relação entre sono e saúde está cada vez mais evidente na literatura científica. No sistema imunológico, o sono adequado desempenha um papel essencial na produção de citocinas inflamatórias e na proliferação de células T, fundamentais para combater infecções.

Representante da América Latina na Sociedade Mundial do Sono, Zancanella explica que a privação do sono está associada a doenças como hipertensão, diabetes, obesidade e até câncer. Além disso, a relação entre sono e saúde mental é inegável: noites mal dormidas impactam a memória, a concentração e aumentam o risco de depressão e ansiedade.

Edilson Zancanella, presidente da Academia Brasileira do Sono (Foto: Divulgação)

De acordo com Zancanella, outro sinal importante é o ronco. “Esses são os sinais de alerta que a gente sempre tenta salientar e são características que o paciente consegue perceber”, complementa.  Outros distúrbios são a insônia e a apneia do sono, que têm picos de diagnósticos algumas idades mas podem aparecer em qualquer faixa etária, de acordo com Zancanella.

“A insônia é mais frequente em mulheres pós-menopausa, influenciada por alterações hormonais relacionadas ao climatério. Já a apneia do sono é mais frequente em homens a partir dos 45 anos com sobrepeso. Mas a apneia do sono pode acontecer desde a infância, e a insônia também pode acontecer na adolescência”, explica o especialista.

A importância da saúde respiratória para uma boa noite de descanso

Otorrinolaringologista alerta sobre os impactos dos distúrbios respiratórios na qualidade do sono e na qualidade de vida.

Muitos são os fatores que podem comprometer essa qualidade, sendo as boas condições do sistema respiratório um dos mais impactantes.  Em um mundo cada vez mais agitado, onde os desafios relacionados à saúde do sono se tornam cada vez mais evidentes, a consciência sobre a importância da respiração adequada durante o descanso se torna fundamental.

O coordenador do Departamento de Sono da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORL CCF), Alexandre Ordones, alerta sobre a relação direta entre a respiração e a qualidade do sono, destacando os desafios enfrentados por quem sofre desses distúrbios e a importância de um diagnóstico precoce e tratamento adequado. Segundo o especialista, “embora o sono  seja essencial para o bem-estar, muitos ainda desconhecem como as vias respiratórias influenciam diretamente a qualidade do nosso descanso”.

O médico também observa que distúrbios do sono, como ronco e apneia obstrutiva, têm se tornado mais frequentes, principalmente devido a fatores como estilo de vida e obesidade. De acordo com Alexandre Ordones, muitos pacientes têm dificuldade em identificar que sofrem de distúrbios do sono.

Sinais de que está sofrendo com distúrbios do sono

Entre os sinais mais comuns estão cansaço excessivo, dificuldade de concentração durante o diasono não reparador, ronco e pausas respiratórias presenciadas durante o sono. “É fundamental que as pessoas procurem um especialista assim que identificarem esses sintomas, pois o diagnóstico precoce pode prevenir complicações graves, como infarto agudo do miocárdio, AVC e morte”, alerta.

A pessoa que passa a ficar esquecida, fica mal-humorada, passa a ter problemas em manter a atenção, além de ter sono durante o dia. Também é comum despertar com a sensação de que está cansado e que o sono não deu conta da sua necessidade”, elenca o médico.

Segundo Ordival Augusto Rosa, especialista em Medicina do Sono do Instituto Paranaense de Otorrinolaringologia (IPO), muitas pessoas subestimam os sinais desses distúrbios, acreditando que o ronco seja apenas um incômodo social.

O ronco frequente e intenso deve ser investigado, pois pode ser um alerta para a apneia do sono, uma condição em que há interrupções da respiração durante o descanso. Isso compromete a oxigenação do organismo e aumenta o risco de diversas doenças”, afirma.

Embora ambos os problemas afetem o sono e as vias respiratórias, suas causas e impactos são diferentes. O ronco ocorre devido à vibração das estruturas da garganta, gerando um ruído que pode variar de leve a intenso. Já a apneia do sono é mais grave, caracterizando-se por pausas temporárias na respiração por pelo menos 10 segundos, o que leva à queda dos níveis de oxigênio no sangue e a microdespertares ao longo da noite.

Além do barulho incômodo, a apneia do sono pode causar sonolência excessiva diurna, sensação de sufocamento ao dormir, fadiga ao acordar e até mesmo dificuldades cognitivas. De acordo com o Dr. Ordival, esses sintomas são um alerta para a necessidade de acompanhamento médico. “O sono deve ser restaurador. Se a pessoa acorda cansada e sente sonolência ao longo do dia, é essencial investigar a causa e buscar tratamento”, enfatiza o médico do IPO.

Quando procurar um especialista?

Sinais como sonolência diurna, ronco frequente, alterações de humor, dificuldades de memória e concentração indicam a necessidade de buscar um especialista. O alerta é claro: a detecção precoce de distúrbios do sono pode ser a chave para prevenir complicações graves e melhorar a qualidade de vida.

Nos últimos anos, o diagnóstico dos distúrbios do sono evoluiu consideravelmente. Exames domiciliares estão cada vez mais acessíveis, e os dispositivos vestíveis (wearables) estão sendo validados para auxiliar na análise do sono.

O diagnóstico é feito por meio de exames específicos, como a polissonografia, que monitora padrões respiratórios, níveis de oxigenação, frequência cardíaca e atividade cerebral durante o sono. “Esse exame pode ser realizado tanto em ambiente hospitalar quanto domiciliar, dependendo da necessidade do paciente e da avaliação médica”, explica.

Tratamento pode incluir até mesmo cirurgia

O tratamento de distúrbios do sono pode ser feito por diferentes profissionais da saúde, como psicólogos, psiquiatras, otorrinolaringologistas, neurologistas entre outros profissionais. A necessidade de recorrer a algum profissional varia de acordo com o motivo da falta de sono do paciente.

O ponto positivo é que a medicina do sono tem avançado consideravelmente nos últimos anos. Com soluções inovadoras,  é possível que pacientes tratem de forma mais eficaz suas queixas e tenham uma melhora na qualidade de sono.

Alexandre destaca as diversas inovações tanto em diagnósticos como tratamentos, sendo estes últimos cada vez mais personalizados às necessidades do paciente, como também,  alternativas ao já conhecido e amplamente divulgado dispositivo de pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP), que, segundo o especialista, nem sempre possui uma boa adesão por parte dos usuários..

No tratamento, avanços incluem novos medicamentos para insônia e narcolepsia, além de técnicas inovadoras para tratar a apneia, como a neuroestimulação do nervo hipoglosso. Os equipamentos de CPAP também estão cada vez mais sofisticados, oferecendo mais conforto aos pacientes”, destaca o médico.

O tratamento para a apneia do sono e ronco varia conforme a gravidade do quadro e das características individuais do paciente. Em muitos casos, medidas simples, como perda de peso, ajustes na posição ao dormir e a adoção de hábitos saudáveis, podem trazer melhorias significativas. “Pacientes com apneia não tratada têm maior risco de desenvolver complicações cardiovasculares e hipertensão arterial”, destaca o especialista.

Nos casos em que há alterações anatômicas que dificultam a respiração, pode ser necessária intervenção cirúrgica. “Podem ser realizadas cirurgias nasais, faríngeas ou esqueléticas, dependendo da necessidade do paciente. Em algumas situações, a correção cirúrgica pode amenizar ou até eliminar o distúrbio respiratório”, complementa o Dr. Ordival Augusto Rosa.

Dicas para ter um sono melhor

É preciso reforçar a importância de tratar o sono como um hábito saudável, assim como a alimentação equilibrada e a prática de atividades físicas. Para melhorar a qualidade do sono, é recomendado manter uma rotina de horário fixo para dormir e acordar, evitar telas antes de dormir e tratar o sono como uma prioridade para a saúde.

É importante ter regularidade no horário de deitar e no horário de levantar, tentando criar um hábito que seja adequado, ou seja, a preparação para dormir. É aquilo que você faz 30 minutos antes de deitar na cama, como desligar o celular, pôr o pijama, escovar os dentes, criar um ritual. É bom que esse ritual tenha um horário regular. O nosso organismo funciona muito bem com regularidade. E quando a gente não tem um horário fixo para deitar e para dormir, isso sempre vai atrapalhar e vai criar demandas diferentes daquilo que o organismo necessita”, orienta Zancanella.

O médico Alexandre Ordones diz que sua principal recomendação é que as pessoas realizem uma higiene do sono, ou seja,  adote hábitos em suas rotinas que favoreça sua noite de sono, dentre estes hábitos, o profissional destaca:

  • Ter um horário regular para dormir e acordar, inclusive nos fins de semana;
  • Diminuir ruídos e manter o ambiente escuro à noite – dormir em ambientes adequados, escuros e silenciosos,  e com colchão e travesseiro confortável;
  • Apostar em alimentação saudável e leve antes de dormir – evitar consumir bebidas e alimentos  estimulantes (cafeína e nicotina, por exemplo) e fazer refeições pesadas  no período noturno;
  • Praticar atividades relaxantes antes de dormir como leitura e meditação;
  • Evitar utilizar dispositivos eletrônicos ao se deitar, como celulares, tablets, notebooks – Evitar o uso de telas por pelo menos uma hora antes de dormir
Referência em distúrbios do sono


Com atendimento gratuito à população de Campinas e região, o IOU se destaca no atendimento de distúrbios do sono. Com uma equipe multiprofissional composta por otorrinolaringologistas, pneumologistas, neurologistas, dentistas, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, psicólogos e nutricionistas, oferece tratamentos completos pelo SUS.

Recentemente, o Instituto ampliou sua infraestrutura, passando a contar com oito leitos para polissonografia e o Teste de Múltiplas Latências do Sono, essencial para diagnosticar sonolência excessiva e narcolepsia, um serviço inédito na Região Metropolitana de Campinas (RMC).

A Unicamp acaba de estruturar o Núcleo do Sono e a iniciativa representa um marco para a medicina do sono no Brasil. Este serviço unifica os avanços e pesquisas de diversas áreas, como neurologia, otorrinolaringologia, pneumologia e saúde coletiva, além de fomentar a criação de uma residência médica e multiprofissional na área.

O Núcleo também se destaca pelo uso de tecnologia avançada, incluindo dispositivos vestíveis e novas técnicas de seleção de máscaras para CPAP. Além disso, o IOU está estabelecendo parcerias com instituições acadêmicas e empresas de tecnologia para o desenvolvimento de novas terapias para distúrbios do sono.

O novo equipamento abre portas para colaborações tanto nacionais quanto internacionais, permitindo avanços significativos na área”, destaca Zancanella.

Com Assessorias

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