A consulta começou em dezembro e a Anvisa deu 60 dias para a sociedade opinar sobre o texto que propõe a manutenção da proibição dos dispositivos eletrônicos para fumar no país. A proposta de norma prevê ainda proibição da fabricação, importação, comercialização, distribuição, armazenamento, transporte, publicidade e divulgação destes produtos ao público, sendo ele consumidor ou não.
O texto desta proposta de resolução está disponível no link da consulta pública nº 1.222/2023 Esta participação social – de caráter consultivo – visa ajudar a Anvisa a tomar decisões relativas à formulação e definição de políticas públicas em torno dos dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs).
Após o período de recebimento das contribuições, a Anvisa irá avaliá-las e divulgar um relatório da consulta pública no próprio portal. O processo pode durar alguns meses.
Desde 2009, é proibido, no Brasil, importar, comercializar e fazer propaganda de quaisquer tipos de dispositivos eletrônicos para fumar, por determinação da Anvisa, na Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 46/2009.
À época, a agência reguladora justificou a decisão baseada no princípio da precaução, devido à inexistência de dados científicos que comprovem as alegações atribuídas a esses produtos.
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O que são dispositivos eletrônicos para fumar?
Os dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) envolvem diferentes equipamentos, tecnologias e formatos. Há a apresentação de cigarro eletrônico descartável, mas a maioria usa bateria recarregável e refis abertos ou fechados. Estes equipamentos geram o aquecimento de um líquido para criar aerossóis (popularmente chamados de vapor) e o usuário inala o vapor.
Os líquidos (e-liquids ou juice) podem conter ou não nicotina em diferentes concentrações, além de aditivos, sabores e produtos químicos tóxicos à saúde.
Mesmo sendo proibidos, os DEFs são amplamente comercializados em espaços físicos e na internet com diferentes nomes: cigarros eletrônicos, vape, vaper, pods, pen-drive, e-cigarette, e-pipe, e-cigar, e-ciggy e tabaco não aquecido (heat not burn), entre outros.
Opas, Anvisa e Fundação do Câncer são contra
De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), jovens que usam cigarros eletrônicos têm duas vezes mais chances de se tornarem fumantes na vida adulta. A entidade aponta que estudos recentes sugerem que “o uso de vapes pode aumentar o risco de doenças cardíacas e distúrbios pulmonares. Além disso, a exposição à nicotina em mulheres grávidas pode afetar negativamente o desenvolvimento cerebral do feto.”
Em 2023, 21 países das Américas regulamentaram de alguma forma os cigarros eletrônicos. Oito deles (Argentina, Brasil, México, Nicarágua, Panamá, Suriname, Uruguai e Venezuela) proíbem totalmente sua venda, e os outros 13 adotaram parcial ou totalmente uma ou mais medidas regulatórias. Enquanto isso, 14 países não possuem nenhuma regulamentação para esses produtos, argumenta a Opas.
O Instituto Nacional de Câncer (Inca) ratifica o posicionamento. Na publicação “Não se deixe enganar pelas novidades. Dispositivos eletrônicos para fumar também matam”, o instituto afirma que nenhum dispositivo eletrônico para fumar é seguro. A Fundação do Câncer segue linha semelhante ao se colocar favoravelmente à proibição dos vapes. A entidade tem lançado campanhas informativas sobre os malefícios do dispositivo.
Pneumologistas alertam para riscos entre os jovens
Em 2022, um em cada cinco jovens de 18 a 24 anos já havia experimentado cigarro eletrônico, mas essa proporção aumentou para um em cada quatro no último ano, mesmo que os DEFs sejam proibidos no Brasil desde 2009 pela Anvisa. Para esse público, os cigarros eletrônicos têm sido a porta de entrada para o tabagismo. De acordo com a pesquisa Vigitel do ano passado, 60% dos usuários de 18 a 24 anos nunca haviam fumado cigarros convencionais.
“Esses produtos têm sabores agradáveis e design moderno. São feitos para atrair adolescentes e jovens. Assim, a indústria garante a dependência logo cedo, formando um mercado consumidor que durará por muito tempo. Os danos à saúde são imensos e têm aparecido cada vez mais cedo, quando comparados aos usuários de cigarros convencionais”, explica Mariana Pinho, coordenadora do Projeto Controle do Tabaco da ACT Promoção da Saúde.
Em posicionamento publicado na internet, a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBTP) afirma que vê com preocupação o aumento do uso desenfreado desses dispositivos, em especial entre os jovens.
“A SBTP se posiciona veemente contra a liberação da comercialização, importação e propagandas de quaisquer dispositivos eletrônicos para fumar […]. Os DEFs são uma ameaça à saúde pública, porque representam uma combinação de riscos: os já conhecidos efeitos danosos à saúde e o aumento progressivo do seu uso no país. Em especial, esses dispositivos atraem pessoas que nunca fumaram, persuadidas pelos aromas agradáveis, sabores variados, “inovação tecnológica” e estigmas de liberdade.”
Mais informações sobre cigarros eletrônicos podem ser obtidas no site da Anvisa.
#CancelaOVape: campanha apoia proibição do cigarro eletrônico
Com o objetivo de fornecer informações confiáveis e sem conflitos de interesse sobre os Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEFs), a ACT Promoção da Saúde e a Vital Strategies, em parceria com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a Fundação do Câncer, da Associação Brasileira do Estudo do Álcool e Outras Drogas (Abead) e a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), lançaram a campanha #CancelaOVape.
Desenvolvida pela agência Repense, a iniciativa também foi pensada em apoio à proposta da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) submetida à consulta pública, que recebe contribuições da população até 9 de fevereiro. Com o intuito de alcançar o público jovem, a campanha adota uma estratégia digital robusta, incluindo colaborações com influenciadores.
“Os cigarros eletrônicos têm assumido essa aura de leveza, de sabores de frutas, mas por trás dessa falsa inocência há riscos graves para a saúde dos usuários. A campanha alerta sobre esses riscos disfarçados e coloca na mão do jovem a oportunidade de participar da consulta pública da Anvisa para cancelar o vape, de verdade”, afirma Aline Leucz, diretora de Criação da Repense.
10 motivos para manter a proibição
Diante desse cenário, a Anvisa propôs uma norma mais abrangente e detalhada, fundamentada em evidências científicas e alinhada às recomendações da OMS, para substituir a regulamentação vigente. Em sintonia com esse movimento, a campanha #CancelaOVape lançou um hotsite que destaca 10 motivos para manter a proibição, juntamente com um link que oferece orientações sobre como participar da consulta pública.
Além disso, a campanha envolve a disseminação de conteúdo nas redes sociais, a mobilização de influenciadores e a veiculação de spots entre a primeira e a segunda história de todos os episódios da Rádio Novelo Apresenta. Desenvolvida pela agência Repense, a iniciativa visa alcançar principalmente formadores de opinião e o público mais jovem, que representa a principal parcela de usuários no Brasil.
Nesse contexto, a campanha utiliza a hashtag #CancelaOVape em plataformas como Instagram e TikTok, além de realizar ações específicas com influenciadores digitais nativos e criar peças de mídia que derrubam o argumento da indústria de que os dispositivos eletrônicos são mais seguros que os cigarros convencionais.
Da Agência Brasil e Repense