O nanismo promete ganhar mais visibilidade com a série do Fantástico sobre o tema, que estreia neste domingo (22). A série de reportagens especiais traz luz a histórias reais de pessoas que convivem com essa condição, ainda pouco compreendida, mas que enfrenta ainda muito preconceito na sociedade,

Um exemplo é o do médico geneticista Wagner Antonio da Rosa Baratela, do Hospital Sírio Libanês, de 42 anos, que tem uma longa história de luta e resiliência. Nascido com esta condição, ele passou por 25 cirurgias do nascimento aos 14 anos, devido à deformidade óssea característica da displasia diastrófica, e atualmente se locomove com uma scooter.

Ele conta que entrou na Medicina justamente pra entender mais da sua condição e ajudar outras pessoas. Não foi fácil, confessa, mas hoje, ele é um dos principais geneticistas do Brasil relacionado ao nanismo. Na sua infância, a informação sobre nanismo no Brasil era bastante restrita. Então, com muito esforço de sua família e apoio do médico João Thomazelli, ele buscou tratamento nos Estados Unidos.

Antigamente a Medicina diferenciava apenas dois tipos de Nanismo: a Acondroplasia, que é o tipo mais comum caracterizado por uma desproporção de membros mais importantes do que o tronco, e a Síndrome de Mórquio ou Doença de Mórquio, que era o contrário, o tronco era mais curto em relação aos membros.

Hoje já são identificados mais de 500 tipos raros de nanismo. O mais comum ainda é a Acondroplasia, que acomete 1 a cada 7 mil pacientes e 90% dessas pessoas com esse tipo de nanismo tem pais com estatura média.

Hoje, acredita que estamos em tempos de otimismo. “Estamos vendo tratamentos novos aparecendo. A gente espera que os filhos e as próximas gerações tenham menos complicações e que não precisem passar por tantas cirurgias como eu passei”, afirma.

Luta por direitos começou há 40 anos no Brasil

A luta por pessoas com nanismo começou há mais de 40 anos, quando o pai do dr Wagner Baratela, junto com outras famílias, criou a associação chamada Gente Pequena, uma cópia da Little People dos Estados Unidos.

“Foi a primeira mesmo aqui no Brasil de pacientes e familiares de pessoas com nanismo. Essa associação funcionou por um tempo e depois, sabe como são as associações, muitas divergências e a coisa acabou hibernando por muito tempo”.

Hoje, já muitas instituições, como o Instituto Nacional de Nanismo (INN), criado em setembro de 2020. A entidade nasceu anos antes, com o movimento Somos Todos Gigantes (STG), que em 2015 era apenas uma hashtag. No ano seguinte foi criado o site que se tornou o principal e até hoje único portal exclusivamente dedicado ao nanismo no Brasil.

A ideia de criar o instituto surgiu quando o casal Marlos Nogueira e Juliana Yamin, pais do gigante Gabriel, hoje com 14 anos, perceberam que as demandas não poderiam ser totalmente atendidas pelo STG. Conversando com o Gabriel e compartilhando essa preocupação, ouviram do próprio filho a ideia de transformar o STG em Instituto.

Entenda a acondroplasia, principal causa do nanismo

A acondroplasia é a principal causa de displasia óssea que leva à baixa estatura desproporcional, sendo a forma mais comum de nanismo, uma doença rara genética que acarreta outras manifestações clínicas que precisam de atenção. A condição acontece por um desenvolvimento anormal dos ossos devido a mutações no gene FGFR3.
Em razão dessa alteração, os pacientes podem apresentar o sinal mais visível, que é a baixa estatura desproporcional com pernas e braços mais curtos que o tronco. Como implica em alterações no desenvolvimento da cartilagem das placas de crescimento, o quadro resulta em baixa estatura (em média, os homens têm 1,31 m de altura enquanto as mulheres possuem 1,24 m), encurtamento de pernas e braços, cabeça e testa proeminentes e uma desproporção corpórea de limitações físicas visíveis já no nascimento.
O desenvolvimento motor é mais lento devido aos membros e pescoço curtos e à macrocefalia. A hipoplasia da face média, em combinação com hipertrofia da adenoide e das amígdalas, pode levar à apneia obstrutiva do sono. A otite média crônica é comum também nesse grupo de pacientes, assim como a perda auditiva. A estenose espinhal e lombar, com déficits neurológicos, é mais frequente na idade adulta, tal como doença cardiovascular. A obesidade também é comum.
Diante de tantas especificidades, o médico ressalta a importância do acompanhamento médico das pessoas que nascem com essa condição desde os primeiros dias de vida. “O bebê pode ter algumas complicações. Existe risco maior de desenvolver hidrocefalia e até de morte súbita. Por isso, é extremamente necessário um acompanhamento profissional”, destaca Dr Baratela.

Obesidade entre pessoas com nanismo é outro risco

O especialista ainda reforça que a obesidade é uma questão importante e comum quando se fala de acondroplasia, tendo em vista que o indivíduo possui uma limitação ortopédica e que, portanto, possui maior dificuldade em fazer atividade física e precisa optar por esportes de menos impacto.  Por ter um gasto energético menor, os acondroplásicos têm uma tendência de acumular mais calorias, logo torna-se essencial um acompanhamento médico multidisciplinar”.

“Como se sabe, segundo especialistas, a obesidade, assim como hipertensão, diabetes, problemas cardíacos e a diminuição da capacidade pulmonar, são considerados fatores de risco que levam pacientes infectados com Covid-19 a um estado grave. Por essa razão a priorização da vacinação de pessoas com doenças raras é um tópico importante”, ressalta.

Doenças respiratórias, neurológicas e cardiovasculares podem ser evitadas com acesso a diagnóstico e tratamento precoce, assim como a uma equipe médica multidisciplinar.  “Graças ao avanço da ciência esse paciente começa a ter mais opções de desenvolvimento, que levam a uma vida mais saudável e com mais qualidade”, finaliza o especialista.

Maior risco de se contaminar pela Covid-19

Diferente do nanismo pituitário, em que o indivíduo apresenta uma estatura 20% menor do que média da população – ocasionado por distúrbios metabólicos e hormonais – e ainda assim existe proporcionalidade no crescimento dos ossos e órgãos, os acondroplásicos enfrentam, por toda a vida, inúmeras complicações que vão além dos sintomas físicos mais perceptíveis.
Os indivíduos com acondroplasia lidam com a desproporcionalidade de ossos e órgãos, o que leva a mais sintomas e possíveis complicações de saúde, como ponte nasal achatada que pode gerar apneia de sono obstrutiva; compressão da medula espinal; articulações hipersensíveis; frequentes infecções de ouvido que podem levar à perda auditiva; estreitamento dos ossos do tórax e crânio frente ao tamanho dos órgãos e propensão à obesidade.
Devido à alteração genética, esses pacientes podem apresentar diminuição na caixa torácica, prejudicando o funcionamento do pulmão e, portanto, transformando estes pacientes em um grupo de risco para a infecção da Covid-19, uma doença complexa que nos casos mais graves acomete principalmente as funções pulmonares devido a uma inflamação causada no local.
“Em casos de doenças que acometem o sistema respiratório, como o coronavírus, é importante tomar um maior cuidado e reforçar o acompanhamento médico, uma vez que alguns desses pacientes possuem o tórax mais estreito, o que pode agravar o impacto do vírus nos pulmões”, afirma o médico geneticista Wagner Baratela.

Mapeamento genético pode mudar vida da pessoa com nanismo

Descobrir o tipo certo de cada paciente é um passo enorme para um tratamento adequado e personalizado. Mas isso é um desafio no Brasil porque é preciso um mapeamento genético, que é um exame caro e complexo. Wagner Baratela explica que o teste genético analisa o genoma humano como um todo, sem focar em um gene específico e identifica no DNA alguma alteração.

“Utilizamos esse tipo de teste para chegar a um diagnóstico específico. Muitas vezes, nos casos de nanismo, a gente não consegue ter certeza absoluta do tipo só vendo radiografias ou a criança. O diagnóstico definitivo nos permite identificar problemas que a criança vai ter e os tratamentos de que precisará. A família já se planeja e se prepara”, disse ele, durante palestra no 4º Encontro Nacional Somos Todos Gigantes, realizado pelo Instituto Nacional de Nanismo (INN) em 2021.

O teste pode ser feito ainda na gestação coletando material da placenta, por exemplo. Muitos laboratórios fazem o mapeamento genético, mas o problema é o custo. Esse tipo de teste pode chegar a R$ 10 mil e atualmente não está disponível no SUS. É aí que entra a importância da universalização desse tipo de diagnóstico.

“A maior parte da nossa população não tem acesso ao teste. A gente luta muito para que essa tecnologia seja incorporada ao SUS. Se a gente pensar, são doenças raras, portanto, não será oferecido para todo mundo. Sabendo usar essa tecnologia de forma racional, dá pra fazer. Não é um custo alto pro poder público. De maneira geral, a gente tem displasia esquelética em 3 a cada 10 mil nascidos”, argumentou o geneticista.

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