A frase “foi só uma brincadeira” quando se trata de um comentário sobre uma característica de alguém, esconde uma discriminação – mesmo que sem esta intenção – e impacta negativamente o desenvolvimento social e profissional de pessoas com deficiência. No Dia Internacional da Pessoa com Deficiência (3/12) – data criada em 1992 para buscar conscientização, compromisso e ações que promovam os direitos das PCDs -, ainda temos muito a aprender sobre capacitismo.

Precisamos estar repensar e mudar crenças que toleram opressão e discriminação, e adotar mentalidade e atitudes mais inclusivas de fato. O melhor caminho para isso é conviver mais com pessoas com deficiência. Criar um ambiente inclusivo é responsabilidade de todas as pessoas e colabora para uma sociedade mais inclusivas e justas para todas as pessoas”, destaca a CEO da Talento Incluir, Carolina Ignarra.

Para marcar a data, a consultoria – que já integrou mais de 9 mil pessoas com deficiência ao mercado de trabalho – aponta algumas atitudes não-intencionais, mas que discriminam a pessoa com deficiência:

  • Elogios exagerados e superestimados à pessoa com deficiência: é comum as pessoas acharem que as pessoas com deficiência não conseguem realizar metade do que realizam diariamente. Comentários exagerados que conferem “superpoderes” às pessoas com deficiência não são percebidos como elogios e desmerecem a capacidade das pessoas com deficiência.
  • Por exemplo, frases como: “Ah, você é uma heroína, uma inspiração!” As pessoas com deficiência não são heróis e heroínas por terem deficiência. Enfrentam desafios diários da mesma forma que qualquer outra pessoa. Superestimar suas realizações diárias não é um elogio, é diminuir suas capacidades reais.
  • Exaltar características além das deficiências: há uma tendência de as pessoas sem deficiência acharem que as pessoas com deficiência são “feias”, desprovidas de inteligência. Elogios referentes a essas características também são capacitistas, mostrando que sempre se espera menos das pessoas com deficiência. “Elogios exagerados como “você é tão bonito(a) para alguém com deficiência” não são nada lisonjeiros – são apenas mais uma forma de discriminação.
  • Piadas e comentários ofensivos: usar a condição do outro para fazer piadas configura crime prescrito na lei nº 13.146, artigo 88. Usar a deficiência para fazer os outros rirem é crime e, nesse caso, os capacitistas nunca estão sozinhos, porque sempre tem alguém para rir e para endossar esse comportamento, que é cruel e, antes de tudo, desumano.
  • Usar expressões com conotação negativa, que fortalecem os estereótipos da pessoa com deficiênciaexpressões como: “dar uma de João-sem-braço”, “tá parecendo cego em tiroteio”, “Não ouviu não? Tá surdo?”, “Que mancada!” entre outras, reforçam mensagens negativas sobre as pessoas com deficiência. O ideal é substituir por outras expressões não opressoras e nem agressivas.
  • Exemplo de superação: usar a pessoa com deficiência como exemplo de superação pode parecer motivador, mas na verdade reforça estereótipos que resumem suas vidas à sua deficiência. Todas as pessoas enfrentam desafios; não precisamos de rótulos.
  • Normalizar X Naturalizar a deficiência, o que é correto fazer: Carolina Ignarra reforça ‘normalizar’ é fingir que não há diferença, enquanto ‘naturalizar’ é reconhecer, conversar e conviver com ela de forma genuína. Silenciar o tema não impede o acesso à informação. O silêncio, ainda que pareça confortável, é o que mantém as barreiras para a inclusão real das pessoas com deficiência
  • Ajudar a pessoa com deficiência sem que ela peça ou sem seu consentimento é tratá-la com excesso de cuidado, atitude que, embora bem-intencionadas, silencia e restringe a autonomia.

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O silenciamento de pessoas com deficiência nas empresas

O medo de errar e o desconforto em abordar o tema da pessoa com deficiência ainda fazem do silêncio uma das formas mais sutis de capacitismo no ambiente corporativo. Acompanhe 5 dicas para romper o silêncio e promover a inclusão

Katya Hemelrijk, diretora de operações da Talento Incluir (Foto: Divulgação)

De acordo com a pesquisa “Radar da Inclusão: mapeando a empregabilidade de Pessoas com Deficiência”, 9 em cada 10 pessoas com deficiência ou neurodivergentes entrevistadas e ativas no mercado de trabalho afirmaram já ter enfrentado situações de capacitismo no ambiente corporativo.

Ainda assim, apenas 35% relataram os episódios às empresas – entre eles, 40% disseram não se sentir acolhidos. O silêncio dos demais (65%) tem explicações preocupantes: medo de retaliação ou demissão (38%) e descrença em qualquer mudança (29%), ou seja, falta de ambiente seguro.

O silêncio também é uma forma de exclusão. A falta de diálogo sobre a inclusão de pessoas com deficiência nas empresas, motivada pelo receio de errar ou pelo desconforto em abordar o tema, continua sendo um dos maiores obstáculos à inclusão verdadeira.

Quando não falamos sobre deficiência, acabamos normalizando a exclusão. O silêncio impede o diálogo, perpetua estereótipos e impede que as pessoas com deficiência participem plenamente do ambiente de trabalho”, afirma Katya Hemelrijk, diretora de operações da Talento Incluir.

O silenciamento ocorre de maneira bilateral: pessoas com deficiência muitas vezes se calam por medo de rótulos ou discriminação, enquanto empresas evitam tratar do assunto por julgá-lo delicado demais. Essa dinâmica reforça a invisibilidade e impede que a diversidade se traduza em inclusão efetiva. Entre os fatores que alimentam o silenciamento estão:

  • Rótulo – reduz a identidade da pessoa com deficiência. Por exemplo: “A PcD da minha área até que trabalhe bem”.
  • Preconceito – julgamento prévio da pessoa com deficiência por conta de sua condição. É o capacitismo que se torna discriminação quando colocado em prática. Por exemplo: “Não sei se ela vai dar conta de todo o trabalho na sua condição”
  • Crenças limitantes – ideias erradas e falta de informação sobre uma pessoa com deficiência por sua condição, o que restringe possibilidades
  • Vieses inconscientes – silenciam a pessoa com deficiência e ocorre em três formatos:
    1. Viés do estereótipo: que reduz a identidade da pessoa à deficiência;
    2. Viés da ancoragem: que orienta decisões baseadas em crenças inconscientes;
    3. Viés aversivo: que leva à evitação do tema por medo de constrangimentos.

Normalizar X naturalizar a deficiência – o que é correto fazer?

Katya Hemelrijk reforça a diferença entre normalizar e naturalizar a deficiência de uma pessoa: “Normalizar é fingir que não há diferença; naturalizar é reconhecer, conversar e conviver com ela de forma genuína. Se silenciamos o tema não temos e nem oferecemos acesso à informação.”

Essas barreiras invisíveis resultam no capacitismo velado, quando atitudes aparentemente gentis acabam por reforçar desigualdades. “Oferecer ajuda sem consentimento, evitar incluir a pessoa com deficiência ou tratá-la com excesso de cuidado são exemplos de atitudes que, embora bem-intencionadas, silenciam e restringem a autonomia”, explica a especialista

A inclusão real exige escuta ativa e ambientes emocionalmente seguros. Empresas que rompem o silêncio e tratam o tema com naturalidade colhem resultados em engajamento, retenção e produtividade. O silêncio, ainda que pareça confortável, é o que mantém as barreiras para a inclusão real das pessoas com deficiência”, conclui.

5 dicas para romper o silêncio e promover a inclusão no ambiente de trabalho

Katya Hemelrijk aponta 5 dicas para romper o silêncio e promover a inclusão no ambiente de trabalho:

  1. Crie ambientes seguros: garanta espaços onde pessoas com deficiência se sintam confortáveis para compartilhar experiências e apontar barreiras;
  2. Pergunte antes de ajudar a pessoa com deficiência: a ajuda só é inclusiva quando há consentimento. Escuta e respeito são a base de uma convivência genuína;
  3. Evite o “tokenismo”: diversidade não deve ser vitrine. Inclusão vai além da representatividade: é sobre voz, oportunidades e pertencimento;
  4. Fale sobre deficiência de forma natural: não limite o tema a campanhas ou datas específicas. Mantenha o assunto presente nas comunicações e nos diálogos dentro e fora da empresa;
  5. Invista em treinamentos contínuos: a reflexão coletiva ajuda a desconstruir crenças e comportamentos capacitistas, promovendo mudanças reais.

Com Assessorias

 

 

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