Uma a cada 50 mil pessoas desenvolvem angioedema hereditário (AEH), uma doença genética considerada ultrarrara e potencialmente fatal. No Brasil, a Associação Brasileira de Portadores de Angioedema Hereditário (Abranghe) possui 1.700 pacientes cadastrados, porém, esse dado é subestimado em razão do atraso no diagnóstico, que pode levar até 15 anos.

Desconhecida pela maioria das pessoas e de parte da classe médica, a doença traz grandes impactos à qualidade de vida dos pacientes. Crises de edema ou inchaços, podendo ocorrer principalmente na pele, lábios, pálpebras, extremidades e genitais. Esse inchaço é bastante deformante.

Outro sintoma que está associado é o acometimento de órgãos internos, no trato gastrointestinal, com extravasamento de líquido para a cavidade abdominal, resultando em dor intensa, náuseas, vômitos e diarreia.

Ainda mais preocupante, outro sintoma menos frequente é o edema das vias aéreas, como na língua, palato e glote, podendo levar à asfixia e óbito se o paciente não tiver em mãos o medicamento para tratar a crise.

O AEH frequentemente surge na primeira década de vida, e o subdiagnóstico é frequente, refletindo em um atraso de aproximadamente 15 anos entre o início dos sintomas e diagnóstico efetivo. Por isso a importância do alerta neste Dia do Angioedema Hereditário (16 de maio).

A demora no diagnóstico acontece porque o angioedema hereditário ainda é pouco conhecido entre a classe médica do Brasil e de outros países”, explica Anete Grumach, coordenadora do Departamento Científico de Angioedema Hereditário da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai).

Diferenças entre angioedema hereditário e alergia

O AEH ocorre por uma deficiência do sistema imune, causando edemas (inchaços) pelo corpo e dores características da doença, sendo muitas vezes confundida com crises alérgicas. Anete conta que quando a pessoa chega ao pronto-socorro com inchaços em lábios e pálpebras, por exemplo, é comum suspeitarem de uma reação alérgica.

Se o sintoma associado for dor abdominal, abre-se um leque de possibilidades para outras causas, porém, é raro o médico pensar no angioedema hereditário”, conta a especialista.

A diferença entre a reação alérgica e o angioedema hereditário é que em casos de alergia, quando é administrado o anti-histamínico, os sintomas melhoram. No angioedema hereditário os antialérgicos não fazem efeito e os sintomas podem demorar de três a cinco dias para diminuir.

Impacto mental: doença pode levar a ansiedade e depressão

O angioedema hereditário é uma doença grave, que passa de pais para filhos e afeta tanto homens quanto mulheres. Além disso, apresenta incidência menor ou igual a um caso para cada 50 mil pessoas, é crônica, debilitante e pode ameaçar a vida, características que levam o AEH à denominação de doença ultrarrara.

Os sintomas podem acometer face, membros superiores e inferiores, extremidades, alças intestinais e vias respiratórias superiores – caracterizando um grave quadro de edema de laringe que pode levar a asfixia e morte. A quantidade de crises de AEH por mês e sua gravidade impactam diretamente na qualidade de vida e na produtividade dos pacientes.

O risco iminente das crises torna desafiadora a realização de atividades diárias, resultando em possíveis perdas de oportunidades profissionais, educacionais e/ou sociais. Assim, muitos pacientes com AEH vivenciam uma carga psicológica significativa, incluindo ansiedade e depressão.

Doença é confundida com apendicite e tem risco de asfixia e morte

O AEH é caracterizado por crises de inchaços que podem atingir face, membros superiores e inferiores, extremidades do corpo, alças intestinais e vias respiratórias superiores. Imprevisíveis em relação à duração, à frequência e à gravidade, as crises são dolorosas, incapacitantes e, às vezes, fatais.

Essas crises de inchaço duram em média cinco dias e podem ser desfigurantes, acometendo não só a pele, como também órgãos internos, como a mucosa do intestino, levando a uma dor intensa e a aumento do volume abdominal.

Mais de 80% dos pacientes de AEH brasileiros, ao longo da vida, apresentaram crises abdominais, caracterizadas por dor abdominal intensa, vômito e diarreia. Frequentemente esses sintomas são semelhantes a um quadro de abdome agudo (como apendicite), podendo levar a intervenções invasivas desnecessárias.

O angioedema hereditário é potencialmente fatal quando o edema acontece as vias respiratórias, havendo risco de asfixia e morte. De acordo com estudo brasileiro, 66% dos pacientes com diagnóstico de angioedema hereditário apresentam crises laríngeas em algum período da vida.

Uma doença desconhecida: o que desencadeia as crises?

O angioedema hereditário (AEH) é uma doença genética ultrarrara caracterizada por crises de edema dolorosas, incapacitantes e potencialmente fatais. Essas crises são imprevisíveis em relação à duração, à frequência e à gravidade.

A doença é causada por uma deficiência ou disfunção do inibidor de C1 esterase (C1-INH), uma protease que atua em vários mecanismos. O AEH causa acúmulo de uma substância chamada bradicinina e resulta em inchaço.

A doença faz parte do grupo dos erros inatos da imunidade (EII). Mas há ainda dificuldade de realizar alguns exames laboratoriais e genéticos.

O diagnóstico é baseado nos sintomas característicos de inchaços recorrentes que não melhoram com medicamentos antialérgicos (anti-histamínicos e/ou corticoides). Devem ser feitos exames laboratoriais específicos nesses pacientes, mas em alguns tipos de angioedema hereditário apenas a avaliação genética é definitiva”, esclarece a especialista.

Embora seja uma doença genética, diversos fatores podem desencadear as crises. “A reposição hormonal, tratamento dentário, infecções, ansiedade – já que a imprevisibilidade das crises causa insegurança e medo no paciente – além do estresse também estão entre os principais provocadores de crises”, comenta a especialista da ASBAI.

Acesso ao tratamento pelo SUS e nos planos de saúde

O manejo clínico dos pacientes com angioedema hereditário é dividido em tratamento da crise e profilaxia (de curto e de longo prazos). A profilaxia de longo prazo é indicada quando o paciente apresenta maior frequência de crises, e de maior gravidade. O objetivo terapêutico nesses casos é melhorar a qualidade de vida e reduzir a mortalidade.

Embora não haja cura para o AEH, existem opções de tratamento disponíveis para ajudar a gerenciar os sintomas e prevenir episódios futuros. Isso pode incluir o uso de medicamentos para aliviar os sintomas agudos, como inibidores do receptor de bradicinina e a própria reposição de inibidor de C1. As diretrizes brasileiras e internacionais recomendam que todo paciente com angioedema hereditário deve ter acesso a uma das medicações de resgaste aprovadas.

Para a prevenção das crises estão disponíveis o inibidor de C1 para uso intravenoso e subcutâneo e inibidores de calicreína por via subcutânea e oral. Todos estes medicamentos foram aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”, explica Dra. Anete Grumach.

SUS passará a oferecer novo tratamento para prevenir as crises

Este ano, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec/SUS) aprovou a incorporação de um novo tratamento para profilaxia de crises de angioedema hereditário (AEH) tipo I/II – , no caso, icatibanto e o inibidor de C1.

A opção terapêutica que pode atender as necessidades de pacientes que podem enfrentar três ou mais crises da doença por mês e não respondem bem ou têm contraindicação às terapias atualmente disponíveis. O Protocolo Clínico de Diagnóstico e Terapêutica (PCDT) para que a medicação possa definitivamente ser ofertada no SUS está sendo atualizado e aguardando assinatura.

Quanto aos medicamentos profiláticos, houve a incorporação de alguns deles pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). “Entretanto, foi atualizado e aguarda publicação para o fornecimento de danazol pelo Ministério da Saúde, o que infelizmente pode manter a judicialização para obtenção de outros tratamentos por parte de pacientes sem planos de saúde”, ressalta a médica.

Tratamento de longo prazo está disponível nos planos de saúde

Desde outubro de 2023, quando passou a constar do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS, Lanadelumabe tem a sua cobertura obrigatória com a vigência da atualização da Resolução Normativa, de acordo com suas diretrizes de utilização. O medicamento é indicado para prevenção, em longo prazo, de pacientes com angioedema hereditário, a partir de 12 anos.

A proposta de incorporação da tecnologia foi submetida diretamente à ANS, tendo passado pelos processos de avaliação da Agência, incluindo ampla participação social e criteriosa análise técnica, que utiliza metodologia de Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS), à semelhança de países como Inglaterra, Canadá, Austrália e Alemanha.

Novas perspectivas para a qualidade de vida dos pacientes

A “Revisão narrativa da literatura recente sobre qualidade de vida em pacientes com angioedema hereditário (do inglês, A narrative review of recent literature of the quality of life in hereditary angioedema patients), publicada em 2023 no Jornal da Organização Mundial de Alergia (World Allergy Organization – WAO). traz novas perspectivas aos médicos que já conhecem o angioedema hereditário (AEH) de melhorarem a qualidade de vida de seus pacientes, incluindo aspectos psicológicos.

Por meio de questionários específicos, focados em qualidade de vida, é possível mensurar e acompanhar a qualidade de vida do paciente. Além disso, o material serve para ampliar a conscientização sobre o angioedema hereditário. A revisão foi feita pelo médico imuno-alergista brasileiro Herberto José Chong-Neto, em parceria com a Takeda. Entre os principais achados estão:

  • Tanto o tratamento profilático quanto o de longo prazo mostraram impactos positivos na vida dos pacientes com AEH.
  • A publicação disponibiliza ferramentas específicas para avaliar a qualidade de vida dos pacientes que devem ser utilizadas na prática clínica, em substituição aos instrumentos genéricos.
  • Além do uso e/ou desenvolvimento de ferramentas capazes de identificar comprometimento da qualidade de vida em pacientes com AEH, investimentos em novos tratamentos para prevenir convulsões também devem ser considerados.
  • Os resultados apontam para a importância da avaliação rotineira do bem-estar e de aspectos psicológicos dos pacientes por meio de instrumentos adequados durante o manejo do AEH.

Objetivos dos tratamentos disponíveis

Os tratamentos disponíveis para angioedema hereditário (AEH) visam prevenir e/ou tratar as crises de AEH, reduzir a morbilidade e a mortalidade, melhorando a qualidade de vida dos pacientes.

Assim, a revisão foi realizada para consolidar informações sobre o AEH com foco na qualidade de vida, e comparar os efeitos da profilaxia aguda versus de longo prazo, bem como a prevalência de ansiedade e de depressão muito comuns nos pacientes com AEH.

Atualmente, existem duas ferramentas que avaliam a qualidade de vida dos pacientes:

  • Questionário de Qualidade de Vida de Angioedema (AE-QoL): que avalia o bem-estar de pacientes diagnosticados, mas não é específico para o AEH
  • Questionário Qualidade de Vida de Angioedema Hereditário (HAE-QoL), o primeiro usado para a condição “com deficiência de inibidores de C1 (C1-INH)”.

Esses instrumentos auxiliam na mensuração da qualidade de vida dos pacientes com AEH e no desenvolvimento de melhores estratégias terapêuticas, como ferramentas clínicas, de acordo com diretrizes internacionais.

Com Assessorias

 

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