Mais de 1,7 milhão de pessoas no mundo são vitimadas pelas Doenças Tropicais Negligenciadas, ou DTNs, como são conhecidas as mais de 20 patologias que integram a lista – como Doença de Chagas. Dengue e Chikungunya Leishmaniose, Hanseníase e Raiva. O Dia Mundial das Doenças Tropicais Negligenciadas (30 de janeiro) é lembrado em todo o mundo com ações educativas e de combate efetivo à discriminação contra pessoas que sofrem com essas enfermidades.

Uma delas é a hanseníase que, no Brasil, desde 2016, conta com o Janeiro Roxo para alertar que essa doença não está controlada. Além do problema de saúde pública, as pessoas afetadas pela hanseníase, inclusive seus familiares, sofrem pesadamente com estigma e preconceito institucional, profissional e da sociedade em geral. O problema do preconceito é tão grave que afasta crianças da escola, pessoas do convívio familiar e social e trabalhadores de seus empregos.

Para tentar reduzir o impacto social e psicológico sobre as pessoas com hanseníase, a Sociedade Brasileira de Hansenologia (SBH) informou que tem se manifestado prontamente em relação a editais de concursos públicos que excluem pessoas afetadas pela hanseníase, e em manifestações públicas que utilizam a doença em contexto discriminatório.

A SBH também compilou um documento listando vários tipos de preconceito comuns no Brasil contra as pessoas afetadas pela hanseníase. O relatório foi entregue em mãos para Relatora Especial das Nações Unidas para a Eliminação da Discriminação contra Pessoas Afetadas pela Hanseníase e seus Familiares, Alice Cruz. A pasta das Nações Unidas, inclusive, é um símbolo da gravidade do problema.

Doença pode afetar qualquer pessoa e não é transmitida por ‘promiscuidade’

A hanseníase tem cura e tratamento gratuito e, em tratamento, o paciente não transmite a doença para seus comunicantes, podendo desenvolver atividades profissionais, frequentar a escola, relacionar-se socialmente, praticar esportes etc. A doença é transmitida por um bacilo que pode afetar todas as pessoas (apesar de já se saber que a maioria da população mundial tem resistência natural ao bacilo).

As populações que vivem em condições sanitárias precárias, em habitação onde todos os membros dormem num mesmo cômodo, são as mais afetadas pela doença porque as condições favorecem a circulação do bacilo. A hanseníase pode se manifestar em pessoas que tiveram convívio próximo e longo com o bacilo, não sendo, portanto, transmitida por promiscuidade, como ainda se acredita.

Por causa deste e de vários outros problemas nas esferas profissional, de direitos humanos, histórica etc., a SBH criou a campanha nacional “Todos contra a Hanseníase para criar um canal de diálogo com a sociedade. A campanha acontece durante todo o ano, com ênfase no mês Janeiro Roxo oficializado pelo Ministério da Saúde para ações de conscientização sobre a doença.

Mudança no nome da doença não contribuiu para aliviar o estigma

Na tentativa de aliviar o estigma corrente no país, o Brasil adotou “hanseníase” e palavras derivadas (hansenologia, hansenologistas etc.) para se referir à doença em comunicações oficiais da União e Estados conforme a Lei 9.010 de 29 de março de 1995.

A SBH e profissionais da saúde em geral adotaram a mesma terminologia ou “Hansen’s Disease” em pesquisas, artigos, entrevistas, e aboliram a palavra “lepra”. Alguns países, em acompanhamento ao Brasil, têm substituído “leprosy” por “Hansen’s Disease”.

O presidente da SBH, dermatologista e hansenólogo Claudio Salgado, explica que existe uma endemia oculta “altíssima” de hanseníase no Brasil todo e que regiões “silenciosas” para essa doença precisam de ações de capacitação para os serviços de Atenção Básica à Saúde e que a sociedade precisa falar sobre o problema.

“As escolas de formação de profissionais de saúde precisam incluir a hanseníase em suas grades disciplinares, as famílias devem voltar a aprender sobre sinais e sintomas da doença para estarem alertas a casos suspeitos, os professores devem ensinar sobre a hanseníase e outras doenças negligenciadas mais comuns no Brasil às crianças em idade escolar”, diz.

Principais barreiras enfrentadas pelos pacientes

As pessoas afetadas pela hanseníase ainda enfrentam barreiras como:

falta de linhas de cuidado, fazendo com que os pacientes diagnosticados não tenham acesso ao sistema de saúde;

ausência de novas drogas para tratamento, o que a caracteriza como uma doença negligenciada;

tentativa de diminuição do tempo de tratamento dos pacientes com os mesmos antibióticos usados há mais de 4 décadas, ignorando a capacidade bacteriana de se proteger para se manter viva;

uso indiscriminado de drogas imunossupressoras para o tratamento de “reações” que nunca cessam;

diagnóstico de outras doenças que podem, em algumas de suas fases, parecer com a hanseníase, dentre vários outros problemas.

Por que a doença é negligenciada?

Lamentavelmente, a hanseníase está entre as doenças com pouco interesse da indústria farmacêutica. Além disso, as escolas das áreas de saúde têm diminuído significativamente o tempo dedicado ao ensino da hanseníase, formando profissionais despreparados e inseguros para fazer diagnóstico. O tema não é tratado nas escolas como ocorreu até os anos 1990.

A SBH, com o apoio de inúmeros parceiros, tem promovido treinamentos/capacitações para profissionais da Atenção Básica à Saúde em várias regiões brasileiras, e retomou recentemente o curso de especialização para a formação de médicos hansenologistas, o que não acontecia há mais de 40 anos. Todo esse esforço conjunto tem resultado em aumento de diagnóstico nas regiões capacitadas.

Dia Mundial das Doenças Tropicais Negligenciadas

Dia 30 de janeiro é o Dia Mundial das Doenças Tropicais Negligenciadas, data lembrada em todo o mundo com ações educativas e de combate efetivo à discriminação contra pessoas que sofrem com essas enfermidades. A data foi anunciada no Fórum Reaching the Last Mile de 2019, em Abu Dhabi, que reuniu líderes globais de governos, setor privado, filantropia e pesquisa, para discutir estratégias para controlar as doenças tropicais negligenciadas.

As DTNs, como são conhecidas (ou NTD, sigla em inglês para Neglected Tropical Diseases), são doenças que debilitam as pessoas, desfiguram e podem ser fatais. Elas afetam mais comumente pessoas que vivem em condições de maior vulnerabilidade pelo mundo, fomentando e ampliando ciclos de pobreza e consumindo bilhões de dólares de países em desenvolvimento todos os anos.

As 20 DTNs classificadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) são:

  • Úlcera de Buruli
  • Doença de Chagas
  • Dengue e Chikungunya
  • Doença do Verme da Guiné
  • Equinococose
  • Trematodiases transmitidas por alimentos
  • Tripanossomíase africana humana
  • Leishmaniose
  • Hanseníase
  • Filariose linfática
  • Micetoma, cromoblastomicose e outras micoses profundas
  • Oncocercose
  • Raiva
  • Sarna e outros ectoparasitas
  • Esquistossomose
  • Helmintíases transmitidas pelo solo
  • Envenenamento por picada de cobra
  • Teníase/Cisticercose
  • Tracoma
  • Bouba

Fonte SBH

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