“Se não pode ser presencial, que seja virtual, que seja uma mensagem simbólica”. Essa é a recomendação da psicanalista Andrea Ladislau para celebrar a data de 22 de maio, o Dia do Abraço. Enquanto todos estão distantes, na tentativa de diminuir as contaminações por coronavírus em meio a uma pandemia, um pequeno gesto pode contribuir para a saúde física e mental. Na falta de contato físico, achar soluções para dar um abraço representa muito, para quem recebe e para quem transmite.
Não se pode dar um abraço agora em todo mundo que a gente gosta, em quem a gente ama, por conta da pandemia. Mas levar o seu carinho, sua empatia, também é uma demonstração importante. Mesmo sem contato físico, um abraço virtual leva a essência do abraço, que é mostrar ao outro o quanto ele é valioso, que ele é uma pessoa que está no seu radar, por quem você tem afeto”, explica a psicóloga. E completa: “A gente pode até não perceber, mas muitas vezes é exatamente isso que o outro está precisando. De um gesto, um abraço”.
O poder do abraço pode ser explicado por fatores sociais e científicos. Segundo Andrea, as implicações do abraço estão refletidas na evolução humana, já que somos seres afetuosos e sociáveis. A partir do estímulo de substâncias  em nosso corpo, podemos demonstrar comportamentos de empatia, generosidade, confiança, acolhimento e pertencimento.
Quando a gente abraça, estimula a produção de um neurotransmissor do cérebro. Libera-se, então, a ocitocina, hormônio que influencia nas relações sociais e também na reprodução, conforme os estudos apontam”, diz a especialista.
As únicas contraindicações para os abraços estão ligadas às nossas restrições atuais por causa dos cuidados nos tempos de isolamento. No entanto, assim que for possível e seguro, vale a pena abraçar novamente. A falta do afeto pode levar a complicações de saúde.
“Normalmente, a falta de contato dá respostas ligadas ao estresse, ansiedade e depressão, por exemplo”, alerta Andrea Ladislau.

O resgate do afeto após a pandemia

Por Andrea Ladislau*

Muitas evidências sinalizam que o mundo e o homem não serão os mesmos após o Covid 19. O vírus virou o epicentro e nos igualou. Dentro do caos, constatamos o que sempre soubemos, mas não valorizávamos, ate sermos apresentados a ele: somos seres finitos e pequenos.  Limitados na auto suficiência.
A pandemia potencializou nossas fragilidades e reforçou a dependência do outro. Hoje, vivendo em isolamento, estamos saudosos dos abraços, dos beijos  do carinho e da aproximação calorosa que sempre foi nossa marca, enquanto seres sociáveis. Somos afetuosos e criados para a conexão.
Estamos reaprendendo, forçadamente,  a nos conectar com o mundo pelas redes. Buscando a proximidade virtual com os que amamos através das telas. Sim, é um teste à nossa intimidade, trazendo profunda alteração das relações humanas. Gestos tão familiares, como um aperto de mão ou um beijo no rosto, tornaram-se obsoletos e hoje são condenados por serem potenciais condutores do tão temido vírus.
O corona criou novos modelos de cumprimento: toques de cotovelo e acenos de longe. Fabricou personagens paramentados para uma guerra, com máscaras, luvas e armados de potes de álcool em gel. Aliás, este item tornou-se protagonista da prevenção e do cuidado, assim como a lavagem das mãos que deve durar o tempo de dois “parabéns à você ” inteiros. Marcas profundas deixadas nas pessoas em todo o mundo. No Irã,  por exemplo, o lema atual é: ” Não aperto sua mão porque te amo”.
E quando tudo isso passar, teremos uma vida sem toque? Se entendermos que o homem é um ser que, por sua racionalidade, sabe explorar a necessidade das adaptações, podemos nos deparar com um amanhã onde a distância seja normal e aceitável.
Historicamente, as próximas gerações poderão estar tão habituadas às novas modalidades de afeto que, podem levantar dúvidas de que um dia, ao nos encontrarmos,  os cumprimentos eram recheados por beijo no rosto, abraços ou apertos de mão, que simbolizavam nossa satisfação ao ver um amigo no shopping.
A sensação de perda do mundo, de uma forma inédita e forçada, nos obriga a repensar valores primários, diálogos, união e intimidade. Nosso modo de estar no mundo não é mais o mesmo. O medo de tudo e do externo, do que vem de fora, cria a couraça da proteção e demarca fronteiras nos laços sociais.

Deixamos de ser o centro do mundo

Olhando o cenário, temos um narcisismo abalado, onde deixamos de ser o centro do mundo. Somos incentivados a colocar em prática a humildade para reconhecer que podemos falhar.  Aceitar que não somos fortes o tempo todo e nem super heróis invencíveis. E tudo bem por isso.
Não tenho ideia como o mundo será após a pandemia.  Ninguém tem. Mas fortes indícios levam a crer que o toque não será o mesmo. A relação interpessoal não será a mesma. O diálogo com a natureza também será modificado. A valorização em geral, certamente, sofrerá mudanças profundas, pois os pequenos detalhes passarão a ser mais perceptíveis. Poderemos valorizar mais o que antes não tinha importância.
Enfim, apesar de amarmos a proximidade e o contato humano, a pandemia veio para mostrar que alguns resgates estão sendo feitos e, de forma necessária, tirando o homem de sua zona de conforto.  Resta saber se quando tudo isso passar, sairemos mais humanos do que quando tudo começou.
Ao experimentarmos a sensação, mesmo que inconsciente,  da finitude e da perda do mundo, somos levados a rever nosso papel no universo.  E é essa reflexão que irá nortear nossos próximos passos e fortalecer hábitos e mudanças que poderão ser corriqueiras e normais às gerações futuras. Gerações que encontrarão nos livros de história o Covid 19 como epicentro do marco das transformações de toda uma humanidade.
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