Etarista, capacitista e totalmente sem noção. A revista britânica The Economist desta semana estampou a imagem de um andador com o selo da presidência dos Estados Unidos e a inscrição ‘sem condição de comandar um país’. O objetivo com a capa ofensiva? Pressionar o atual presidente americano Joe Biden, de 81 anos, a desistir de sua candidatura à reeleição.
“Foi uma agonia ver um idoso confuso lutando para lembrar palavras e fatos”, diz a publicação, sobre o fraco desempenho do democrata em um debate na semana anterior contra o candidato republicano, o ex-presidente Donald Trump, de 78 anos.
Biden – que estaria rouco por conta de um resfriado, segundo sua equipe – titubeou, errou informações e foi mal em várias respostas. Para a revista britânica, a equipe do presidente tenta esconder seus problemas de memória e uma suposta incapacidade de governar o país por mais cinco anos, por conta da idade avançada.
Sob o mesmo argumento etarista, os jornais The New York Times e The Wall Street Journal já haviam pedido, em editorial, que o o atual chefe da Casa Branca abrisse mão de concorrer às eleições em novembro. No entanto, o The Economist extrapolou todos os limites da ética e do bom senso.
Ao usar um andador para atacar Biden, a revista acaba revelando outro preconceito além da idade: o capacitismo, a discriminação contra pessoas com deficiência, que, infelizmente, cresce em todo o mundo e, em especial, no Brasil. A correlação da imagem com a linha editorial de extrema direita da revista despertou uma onda de críticas no mundo inteiro e o debate em torno do etarismo e agora também do capacitismo.
A publicação econômica britânica parece esquecer que um dos maiores presidentes dos EUA, Franklin Roosevelt, usava uma cadeira de rodas – ele perdeu os movimentos das pernas por conta da poliomielite, conhecida popularmente como paralisia infantil, uma doença que hoje pode ser totalmente evitada com a chamada ‘vacina da polio‘.
Festival de horrores na campanha à Casa Branca
Aliás, desde a semana passada, após o debate entre Biden e Trump, o mundo (civilizado) assiste, estarrecido, a um festival de horrores na campanha presidencial dos Estados Unidos. Na linha do tempo, os dois candidatos estão separados por uma tênue diferença de apenas três anos – Biden tem 81, Trump, 78 – o que não significa muita coisa, se ambos fossem passar pelo crivo de uma avaliação médica.
No centro do debate, está a disputa entre a extrema direita representada pelo ex-presidente republicano e uma visão um pouco mais progressista, embora capitalista, do atual presidente Biden. Fato é que as inúmeras críticas da imprensa têm impactado a opinião do eleitorado americano.
Uma pesquisa feita após o debate mostrou que um entre três americanos acha que Biden deve desistir da candidatura. Mas isso não parece não afetar a sua disposição em concorrer à reeleição. Ao longo da última semana, por diversas vezes, ele confirmou a intenção de manter-se candidato.
O que pouco se fala é que, apesar das críticas, o presidente segue praticamente empatado com seu opositor nas pesquisas de intenção de voto dos americanos, com uma pequena margem de 1,5% favorável a Trump. Ou seja, além da idade, os dois estão muito próximos na disputa pela preferência do eleitorado.
Leia mais
Lugar de velho é onde ele quiser: o etarismo e suas consequências
Capacitismo: entenda o que é e como você pode combater
Etarismo x empoderamento: o que aprendemos com Madonna?
Como transformar masculinidade tóxica em saudável?
Trump foi condenado por ‘comprar silêncio’ de ex-atriz pornô
Enquanto isso, Trump corre o risco de ser preso em plena campanha eleitoral. Esta semana, a Justiça dos Estados Unidos adiou para 18 de setembro o anúncio oficial do cumprimento da sentença por fraude fiscal a que ele foi condenado em maio. A sentença havia sido marcada anteriormente para 11 de julho.
A pena de quatro anos de prisão é decorrente de um processo envolvendo o pagamento de um suborno US$ 130 mil a Stormy Daniels, uma ex-atriz pornô com quem Trump teria se envolvido em 2006, para que ela não falasse sobre o suposto caso até depois da eleição de 2016, na qual ele derrotou a democrata Hillary Clinton.
Embora não torne o republicano inelegível, a condenação faz dele o primeiro ex-presidente dos Estados Unidos a ser considerado culpado por um crime; ele também o primeiro pré-candidato de um grande partido a se tornar um criminoso condenado. Além da esfera criminal, Trump responde por processos na esfera civil, de conduta sexual imprópria, difamação e fraude empresarial.
Negra e mulher, vice dos EUA sofre ataques misóginos e racistas
Para apimentar mais o debate, a vice de Biden, a advogada Kamala Harris, de 59 anos – apontada como substituta do presidente numa eventual desistência – passou a sofrer severos ataques misóginos por parte de aliados de Trump. A ex-senadora foi a primeira mulher negra e primeira pessoa com ascendência indiana a ser eleita vice-presidente dos Estados Unidos.
Numa eventual desistência de Biden, Kamala divide a preferência do eleitorado americano junto com outra mulher, a também advogada Michelle Obama, 60, esposa do ex-presidente americano Barack Obama. Michelle – que foi a primeira afro-descendente a ocupar o posto de primeira-dama americana – teria 13 pontos de vantagem sobre Trump e seu nome é o que teria maior apelo em relação ao eleitorado estadunidense.
Entretanto, uma possível substituição de Biden por Kamalla Harris, Michelle Obama ou qualquer outro nome, teria que passar pela convenção do Partido Democrata, marcada para 19 a 22 de agosto, Para isso, entretanto, Biden precisaria renunciar à candidatura ou o próprio partido determinar a substituição. Até lá, muita coisa pode acontecer.
Agora imagina se em 5 de novembro as urnas americanas indicarem uma mulher negra, pela primeira na história dos EUA, para a presidência da maior potência mundial? Tremei, machistas misóginos, racistas, etaristas, capacitistas e golpistas. Essa vocês terão que engolir. Kamala (ou Michelle), presidenta!
Com informações da CNN e Reuters