Nos últimos tempos, muito falamos sobre masculinidade tóxica. Mas que tal descontruir este conceito e transformá-la em saudável? Que estereótipos enxergamos e o que estamos construindo para todos nós?

Pensando nesse contexto, a psicóloga clínica Luana Menezes lança no mês das mulheres sua primeira obra “Eu só quero brincar” (Literare Books International), que visa levar reflexão sobre respeito, amor e empatia a partir da desconstrução do machismo tóxico, que ainda está muito presente na sociedade, sendo um tabu entre as famílias.

De uma forma acolhedora e lúdica, a autora fala da importância da masculinidade saudável, da sensibilidade e expressão e validação dos nossos afetos. Preconceito, violência e sexismo não devem ser normalizados e, portanto, ensinar com respeito e igualdade deve começar em casa. 

Red Pill: por que tanto ódio às mulheres?

Por Luana Menezes (*)

As mulheres enfrentam inúmeros desafios para serem reconhecidas em nossa sociedade. Com muita luta conquistaram direitos e avançaram nas políticas públicas. Porém, no primeiro semestre de 2022, o discurso mais denunciado foi o de misoginia, que é a aversão a mulheres, com mais de sete mil casos, de acordo com a SaferNet.

Nesse caso, o discurso de ódio compreende textos e imagens que incitam a discriminação ou a violência contra as mulheres. Há grupos de homens que estão promovendo discursos contra o avanço de direitos da mulher, tentando mostrar para homens e mulheres, que o homem precisa resgatar sua virilidade e a mulher a submissão.

Essa linha de pensamento que cresceu a partir da década passada, em cantos obscuros e anônimos na internet, se chama “red pill” (pílula vermelha, em inglês), que faz referência ao filme Matrix de 1999.

Nesse sentido, os “red pills” são homens que se opõem ao “sistema que favorece as mulheres”, por terem alcançado um conhecimento privilegiado sobre isso. Já os “blue pills” continuariam vivendo em ilusão e, portanto, seriam usados pelas mulheres. Esse pensamento prega que é necessário se aproveitar das mulheres e torná-las submissas para recuperar a virilidade perdida.

O que podemos analisar sobre isso? Quando necessitamos desvalorizar alguém para nos sentirmos melhor, isso fala de uma insegurança nossa. Algo que nego em mim, não olho e não trato, quero extinguir o meu incômodo através da tentativa de controlar o comportamento do outro. Em vez de eu mudar em mim, vou tentar fazer com que o outro mude.

Sendo assim, me parece que grupos de homens que vão pela corrente do red pill sofrem de complexo de superioridade.

Foi o psicólogo Alfred Adler que descreveu pela primeira vez o complexo de superioridade. Ele destacou que o complexo é um mecanismo de defesa para sentimentos de inadequação com os quais todos lutamos. Para ele, o complexo de superioridade é uma situação que se cria quando uma pessoa supercompensa o complexo de inferioridade que sente, uma maneira de encobrir sentimentos de fracasso ou falha.

E sabemos que esses homens que se enquadram no papel de macho, acreditam que devem ser fortes, protetores, provedores, autoridades e vigorosos. Portando, eles não podem demonstrar sua vulnerabilidade, pois sentir e chorar é coisa de “mulherzinha”, inferiorizando mais uma vez a mulher, que sente e se expressa.

A condição humana envolve a sensibilidade que esse homem insiste em reprimir por conta dessa cultura machista que o adoece e, consequentemente gera todo esse ódio ao feminino. Não se deve odiar ou matar o feminino, precisa haver aceitação de sua vulnerabilidade, acolher e expressar os seus sentimentos para se curar.

Assim, penso que precisamos repensar a educação de nossas crianças, trabalhando a educação socioemocional delas desde a primeira infância, as acolhendo e permitindo a expressão dos seus afetos, principalmente na tratativa de meninos, que são os que mais sofrem com a repressão dos seus sentimentos.

Lendo sobre os malefícios e toxicidade da cultura patriarcal e a importância de cuidarmos da saúde emocional, de incentivamos a expressão dos sentimentos e não diferenciarmos o que é de menino e de menina, contribui para uma cultura de prevenção de problemas mentais, cultivando a saúde emocional.

Diante dessas leituras e minha maternagem como mãe de menino, escrevi o livro “Eu só quero brincar”, que atua exatamente sobre essa temática para filhos e pais, para cada um refletir o seu lugar e atitudes dentro e fora do sistema familiar – expressão/repressão dos afetos; acolhimento dos sentimentos; repetição de padrão comportamental herdado de gerações anteriores; diálogo familiar; preconceitos e estereótipos; a importância do brincar livre; brincadeira não tem gênero.

Com leitura, conhecimento, debates, conversas, podemos contribuir para maior igualdade de gênero, proporcionando mais harmonia individual e entre si.

Masculinidade tóxica e sua influência na violência contra a mulher

Por Luana Menezes (*)

Diante do número alarmante de violência e feminicídio contra a mulher, precisamos refletir sobre as raízes que levam as mulheres a sofrer com tamanha violência. Portanto, precisamos olhar para esse homem. Qual olhar ele tem sobre a mulher? O que o leva a agredi-la?

Percebemos nesses casos de violência, por parte do homem, o sentimento de posse; a dificuldade de aceitar a liberdade de escolha da mulher; a objetificação da mulher. O homem nasceu com a tendência de machucar mulheres? É de sua natureza biológica tratá-la assim?

Evidentemente que não. Ele desenvolveu esse olhar para a mulher porque aprendeu que o seu papel de homem é mais importante que o da mulher; aprendeu que ela é inferior e, portanto, deve ser submissa a ele; aprendeu que ele é admirado por ter várias mulheres e ela deve ser difamada se estiver conhecendo pessoas; aprendeu que enquanto ela espera o príncipe encantado, ele deve se satisfazer sexualmente com a maior quantidade possível de mulheres porque ele é homem, portanto viril.

Diante disso, não estamos, na verdade, falando sobre o que é ser homem. É porque a cultura do patriarcado colocou que homem deve ser macho. Então, estamos falando de uma masculinidade tóxica construída, que faz o homem adoecer, se sentindo dominador e controlador da mulher e, portando, acredita que pode agir como se fosse seu dono.

Por sua vez, as mulheres também estão inseridas nessa cultura e por diversas vezes naturalizam comportamentos de dominação e violência por parte do homem contra elas. Quantas mães tratam seus filhos homens, reproduzindo conceitos machistas, como “homem não chora”, não deixando os meninos participarem dos cuidados da casa, aceitando também a traição, diferentemente da educação de meninas, que deve participar dos cuidados da casa, deve respeitar o namorado etc.

Quantas namoradas e esposas, se cobram para manter a paixão acesa no relacionamento e cobram do homem o pagamento das contas? Assim, como aceitam suas ausências no cuidado com a casa e com os filhos e sua agressividade?

A responsabilidade por essa mudança também é de nós mulheres, mães, avós, tias, irmãs, profissionais etc. Todas essas expectativas sobre o que é ser homem afetam não apenas de forma individual, mas também coletiva.

Muitos dos comportamentos tidos como louváveis são agressivos e levam a casos de violência entre homens e de homens contra mulheres, de acordo com o Atlas da Violência 2020, 91% das vítimas de homicídio são homens. Além disso, a tentativa de se enquadrar ou de se manter no padrão traz inúmeros prejuízos físicos e emocionais ao homem, que pode se encontrar em constante estado de pressão, culpa e solidão.

O incentivo a não mostrar fragilidade é especialmente negativo. Muitas vezes iniciado na infância, pode levar ao bloqueio emocional, quando a pessoa não consegue expressar ou trabalhar suas emoções. Eu, como mãe de menino, passei a ficar muito mais atenta a essas questões, embora já fosse psicóloga infantil.

Passei a vivenciar os reflexos da cultura machista a partir do enxoval e decoração do quarto do meu filho, vendo na maior parte das vezes por parte das lojas, sendo ofertado para meninos, objetos e cores que representam simbolicamente a força, a agressividade e racionalidade. Eu busquei também pela sensibilidade, que precisa ser preservada em todos nós seres humanos.

Esse incômodo me fez ler mais sobre o machismo tóxico e, consequentemente, senti a necessidade de escrever o livro infanto-juvenil: “Eu só quero brincar”, no qual abordo a importância da expressão dos nossos sentimentos e o cuidado que devemos ter com a repressão dos afetos, principalmente na tratativa e educação de meninos, pois são os que mais sofrem devido à essa cultura machista que é tóxica e os adoece.

Felizmente, existem muitos espaços de acolhimento e de cuidado, como é o caso da terapia, que ajudam o homem a compartilhar e demonstrar emoções positivamente; temos visto mais homens falando sobre a importância de nos desconstruir dos conceitos machistas e também vejo surgindo grupos para homens tratarem de suas masculinidades.

Todos nós, de todos os gêneros, precisamos refletir sobre os lugares que ocupamos e nos atentar à criação dos filhos e de novas gerações de modo a cuidarmos da saúde emocional e melhor convivência e respeito entre as pessoas.

Assim, preservar a sensibilidade do menino e a potência da mulher. Ambos são livres, merecem expressar seus sentimentos, merecem sonhar, amar e se relacionar se sentindo únicos e completos sozinhos.

(*) Luana Menezes – Psicóloga clínica (IBMR), especialista em psicologia infantil (IPUB/UFRJ) e Arteterapia (AVM), orientadora de carreira (AVM), palestrante, coach (SLAC) e autora do livro “Eu só quero brincar” (Literare Books International). Instagram: @luanamenezespsi

Psicóloga clínica lança livro infantojuvenil sobre masculinidade saudável

Em “Eu só quero brincar”, a autora Luana Menezes aborda de forma acolhedora, empática e lúdica o tema que é considerado ainda um tabu

Na história, o pequeno personagem Cadu é uma criança como Malu, que só quer brincar. Brincar de viver e de sonhar. Eles só querem se divertir, imaginando, criando e reproduzindo o que veem.

Até o pai de Cadu chegar e ver a cena do filho brincando com a amiga. Ao ver seu filho segurando uma boneca o assustou, pois ele mesmo não consegue exercer sua paternidade devido à educação que recebeu dos seus pais, da cultura paternalista que ainda ronda o nosso meio atualmente. Ele repete o padrão comportamental que recebeu com o filho, brigando com ele.

Porém, essa história conta com a intervenção com acolhimento e sensibilidade da mãe de Cadu, que aponta para uma reflexão, despertando a sensibilidade no pai, promovendo esperança e o desejo desse homem de construir uma história diferente com o seu filho.

A obra destaca que o ambiente onde você mora pode não ser o único fator, mas é em grande parte responsável pela formação de crianças.

Ficha técnica:

Título: Eu só quero brincar
Autora: Luana Menezes
Editora: Literare Books International
Categoria: Ficção/ Literatura infantojuvenil
Páginas: 24
Preço: R$ 42,90
Onde encontrar: Amazon e Literare Books

 

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