A cantora e ex-BBB Naiara Azevedo tornou pública neste domingo (3), durante entrevista ao Fantástico, da TV Globo, denúncias contra o ex-marido que deram destaque a um tipo de violência pouco comentado e divulgado, mas que vem crescendo: a patrimonial. Segundo a artista, Raphael Cabral, que era seu empresário e sócio, controlava todo o dinheiro do casal e, nos primeiros anos de carreira, só lhe dava R$ 1 mil por mês, apesar do faturamento milionário da cantora, entre outras acusações.
De acordo com o Dossiê Mulher 2023, produzido pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) com base nos boletins de ocorrências das delegacias do estado, esse tipo de violência cresceu pelo segundo ano consecutivo, aumentando 11,7% em 2022, quando comparado ao ano anterior. Em 2022, foi registrado o maior número de mulheres vítimas de violência patrimonial desde 2015. Das 9.328 vítimas deste crime registradas no estado, a maioria era de mulheres (6.039 ou 64,7%).
Prevista no Artigo 7 da Lei Maria da Penha, a violência patrimonial é entendida como “qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades”. Ou seja: ao quebrar o celular, rasgar roupas, esconder a carteira ou impedir a mulher de ter acesso ao dinheiro de sua conta corrente, o agressor está cometendo um crime.
“Somos solidárias a Naiara, que teve a coragem de denunciar e falar publicamente sobre o seu caso, ajudando a conscientizar outras mulheres”, diz a secretária de Estado da Mulher, Heloisa Aguiar.
A superintendente de Enfrentamento à Violência contra a Mulher da Secretaria de Estado da Mulher (SEM-RJ), delegada Tatiana Queiroz, explica que em muitos casos os agressores agem para manter a dominância na relação. E destaca a importância de a mulher denunciar e pedir ajuda.
“Pelos dados do ISP que, com frequência, os agressores se recusam a entregar pertences e até documentos. Há outros que se apossam de instrumentos de trabalho, bens, valores ou recursos econômicos das vítimas. Em muitos casos, eles fazem por vingança ou para obrigá-las a continuar em um relacionamento abusivo ou violento”, explica Tatiana.
Para a diretora-presidente do ISP, Marcela Ortiz, algumas formas de violência contra a mulher são bem menos divulgadas, como é o caso da violência patrimonial. “Por isso a exposição desses dados é tão importante, não apenas para o direcionamento de políticas públicas, com base em evidências, e para o acolhimento das mulheres, mas também para mostrar que essas ações não podem ser silenciadas”.
O Dossiê Mulher também aponta que 125 mil mulheres foram vítimas de algum tipo de violência doméstica e familiar no Estado do Rio em 2022. Dessas, mais de 38 mil sofreram violência física e 111 perderam a vida, vítimas de feminicídio. Os números de violência psicológica também são alarmantes: 43.594 mulheres sofreram este tipo de agressão (119 casos a cada 24 horas). Neste cenário, a Justiça concedeu 37.741 medidas protetivas de urgência
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Dependência econômica dificulta romper com relação abusiva
Para Henri Fesa, especialista em relacionamentos e fundador da Casa de Apoio Espiritual Henri Fesa, esta é uma realidade oculta que muitas mulheres sofrem e que exige atenção, pois é uma forma de violência que visa controlar, ameaçar e prejudicar financeiramente a vítima, perpetuando um ciclo de dependência e submissão.
“Quem sofre esse tipo de violência, além da dependência financeira, possui a saúde mental ameaçada, comportamentos como isolamento social e inseguranças com relação a movimentos mais independentes, com crenças limitantes e afins”, afirma.
Segundo ele, é crucial reconhecer sua existência, entender suas implicações e agir de maneira eficaz para combater esse fenômeno.
“O casamento deve ser um ambiente seguro e suportivo para as mulheres, com igualdade e respeito. É claro que essa discussão é bem mais abrangente e possui fortes raízes misóginas, por isso é tão importante que todos e todas nós estejamos atentos desde o início das relações, podando comportamentos desse teor e estabelecendo acordos inegociáveis”, finaliza Henri.
Antes de Naiara, a modelo Luiza Brunet jogou luz a um problema que afeta milhares de mulheres: a violência patrimonial. Ao se pronunciar pela primeira vez sobre a dívida de R$ 646 mil no cartão de crédito, relacionou o problema com o vazamento de seus dados bancários. Em seu perfil do Instagram, Luiza escreveu um longo texto retalhando o Bradesco por ter aberto ao público seu sigilo bancário. A advogada com perspectiva de gênero, mentora de Feminismo e Inclusão e líder de empoderamento, Mayra Cardozo especialista em Direitos Humanos e Penal.
Confira algumas manifestações de violência patrimonial:
- Controle Financeiro: O agressor pode restringir o acesso da vítima aos recursos financeiros, limitando sua capacidade de tomar decisões autônomas;
- Destruição de Propriedade: A destruição deliberada de pertences pessoais, incluindo objetos de valor sentimental, é uma forma de minar a identidade e a autoestima da vítima;
- Fraude Financeira: O agressor pode realizar transações fraudulentas, contrair dívidas em nome da vítima ou dissipar seus bens sem o seu conhecimento ou consentimento;
- Negligência Financeira: Negar à vítima recursos necessários para a manutenção da casa, alimentação e cuidados básicos é uma estratégia de controle utilizada em muitos casos.
Como pedir ajuda pessoalmente ou pelo celular
No Estado do Rio de Janeiro, a mulher vítima de violência pode procurar uma Delegacia de Atendimento à Mulher (DEAM) e, em casos de emergência, o 190. Ela também pode procurar um Centro Especializado de Atendimento à Mulher ou usar o aplicativo gratuito Rede Mulher, desenvolvido em parceria com a Polícia Militar, que tem uma série de funcionalidades, entre elas, o botão de emergência, que liga diretamente para o 190.
No aplicativo Rede Mulher, a mulher também pode ser redirecionada para o site da Polícia Civil para fazer um registro de ocorrência on-line. Outra funcionalidade é o modo camuflado, que, quando acionado, muda de aparência e só pode ser acessado por login e senha.
Há também um passo a passo de como solicitar um pedido de medida protetiva e uma lista com os centros especializados de atendimento à mulher e endereços em todo o estado do Rio. Outro ícone importante é o Guardiões, uma rede de apoio com contato de até três pessoas que possam socorrer a vítima em situação de emergência.
Endereços e funcionamento dos centros estaduais:
CIAM Marcia Lyra
Endereço: Rua Regente Feijó 15, Centro – Rio de Janeiro
Telefones: 2332-7200, 2332-7199, 2332-8249 e (21) 99369-1159 (WhatsApp)
Horário de atendimento: de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h
CIAM Baixada
Endereço: Rua Terezinha Pinto 297, 2° andar, Centro, Nova Iguaçu.
Telefones: (21) 99370-0206, (21) 2667-8588 e (21) 2698-6008
Horário de atendimento: de segunda a sexta-feira, das 9h às 17h
CEAM Queimados
Endereço: Rua Ministro Odilon Braga 26, Centro
Telefones: (21) 99370-8773 e (21) 2665-8161
Horário de atendimento: de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h
Agenda Positiva
Caminhada pelo fim da violência de gênero
Neste domingo, 10 de dezembro, data que marca o encerramento dos 21 dias de Ativismo da Organização das Nações Unidas em defesa da causa, a Secretaria de Estado da Mulher (SEM-RJ) e o Grupo Mulheres do Brasil promovem a sexta Caminhada pelo Fim da Violência contra Mulheres e Meninas, no Aterro do Flamengo, zona sul carioca, com concentração às 9h, na altura do Monumento aos Pracinhas.
Haverá tendas com mesa de massagem e orientações sobre como agir e quem procurar em situações de violência. Juízas, delegadas, promotoras, advogadas e outras autoridades vão se unir à causa. O evento também conta com o apoio da Cantão, da Firjan e do Detran Mulher, que oferecerá atendimento gratuito para emissão de documentos.
O tema da campanha é “Una-se pelo fim da Violência contra as Mulheres e Meninas”, uma iniciativa global da ONU. O ato também vai ocorrer em várias localidades do Brasil e do mundo, com objetivo de conscientizar, educar e promover mudanças reais. No Brasil, o principal objetivo da campanha neste ano é mobilizar parcerias para investir em prevenção para garantir que cada mulher e cada menina possa viver uma vida livre de violência.
Com Assessorias