O câncer começa e termina nas pessoas, disse, certa vez, a cientista britânica June Goodfield. Para ela, em meio as abstrações científicas, essa verdade fundamental pode acabar sendo esquecida. “Médicos tratam doenças e também pessoas e esta precondição de existência profissional, por vezes, a empurra em duas direções ao mesmo tempo”. Goodfield está certa, assim como estavam chineses, indianos e tantos outros há mais de séculos: é preciso olhar o todo.

Ainda hoje o tratamento contra o câncer é muitas vezes difícil e quase sempre é preciso tratar a doença e também as pessoas de uma forma global, fortalecendo-as física, mental e, por que não, espiritualmente para que estejam prontas para encarar a doença. Não é por acaso que, cada vez mais, em centros oncológicos existem áreas reservadas para tratamentos como reike (foto), acupuntura, musicoterapia, yoga, suporte emocional, psicologia e tantos outros tratamentos bem ao lado das salas com equipamentos de alta-precisão. Isso porque cuidar do paciente com câncer é mais que um tratamento multifuncional, ele deve ser integrativo.

“A medicina integrativa não é uma especialidade médica, é uma forma de exercer a medicina. Um olhar que entende que a pessoa que está doente tem um conjunto de sintomas físicos e emocionais. Tem também o contexto familiar em que ela vive, a casa, o trabalho. E para que a gente tenha sucesso no tratamento é preciso abordar o paciente como um todo”, disse Regina Chamon, hematologista e médica especializada em medicina integrativa do Centro Paulista de Oncologia (CPO) .

Tempo e atenção

As consultas de medicina integrativa duram em média uma hora, onde se aborda a história pessoal do paciente e como a doença está impactando a vida dele. “Além disso, trabalhamos alimentação, atividade física, fadiga, sono e também alteração do humor. Só depois de seguir esse caminho é que criamos um plano de autocuidado. Assim, conseguimos lançar mão das terapias complementares”, explica a Dra. Regina. “Muitas dessas práticas estão associadas ao relaxamento, que é exatamente a outra ponta da ansiedade muito comum durante um tratamento de câncer”, frisa.

Chamadas antes de alternativas, as terapias complementares são cada vez mais estudadas na oncologia e na medicina em geral. Tanto que hoje sabe-se que é de extrema importância que o paciente se sinta mais ativo, mesmo durante o tratamento. Com os grupos, eles percebem que mesmo com a doença, eles podem encontrar momentos de saúde e tomar as rédeas do tratamento. A lógica é que quando se estimula uma resposta de relaxamento, imediatamente há queda de adrenalina. Quando isso acontece há aumento de imunidade, fazendo com que a incidência da infecção seja menor, a alimentação, o sono e o humor sejam melhores.

Maria Lúcia Martins Batista, oncologista do NOB, em Salvador, conta sobre a área para o cultivo de um jardim existente na clínica. Pode parecer inusitado, mas ela garante a importância do local. Lá pacientes podem conviver, trocar experiências e refletir enquanto fazem o tratamento. “Sou oncologista há mais de 30 anos e percebi que é preciso tratar o paciente como um todo. Focar na doença e em seus efeitos colaterais é algo sistemático demais. É preciso focar no todo, em como o paciente poderá se fortalecer para enfrentar a doença, pois eu acredito que a doença e a cura estão dentro das pessoas. E quem pode alavancar isso? O médico. Mas para isso é preciso uma troca, uma convivência para conhecer a força e a fraqueza de cada paciente”, diz a Dra. Maria Lúcia .

Ela explica que a grande maioria dos estudos sobre medicina integrativa mostra uma resposta muito boa no controle da ansiedade, estresse, modulação da dor, distúrbios do humor, do sono. São ferramentas que permitem que a pessoa olhe para si, passo importante para a qualidade de vida, principalmente durante um tratamento. Isso porque, muitos pacientes subestimam quão dramaticamente o câncer pode afetá-los, seja do ponto físico ou emocional.

“O paciente precisa estar preparado para receber o tratamento, tomar as rédeas da situação. Ele não deve ter uma posição passiva, sem protagonizar aquele momento, sem entender ou refletir o que está acontecendo com ele”, comenta Daniela Moraes, médica acupunturista, nutróloga e médica antroposófica do Oncocentro, de Minas Gerais.

Um não exclui o outro

O cuidado integrativo tem duas camadas. Em primeiro lugar, os tratamentos convencionais atacam a doença em si. Ao mesmo tempo, as terapias baseadas em provas científicas ajudam a combater os efeitos colaterais relacionados ao câncer. Os dois juntos, tratamentos convencionais contra o câncer e terapias de suporte, devem ser oferecidos simultaneamente por uma equipe colaborativa de clínicos.

“Uma abordagem não exclui a outra. A medicina vem para somar. Se eu não olhar o que está por trás da dor eu vou sempre tomar um remédio. A gente fala muito em sustentabilidade, precisamos falar também da sustentabilidade da saúde e é aí que entra a medicinaintegrativa, de se cuidar. A gente está sempre olhando para fora e são poucos os momentos que olhamos para dentro. A medicinaintegrativa faz isso”, finaliza a Dra. Regina Chamon.

Fonte: Centro Paulista de Oncologia (CPO)

 

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