O Brasil vive um alerta epidemiológico silencioso: os casos de sífilistêm aumentado de forma consistente nos últimos 10 anos, mesmo com campanhas de prevenção e oferta gratuita de testes e tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS).  Sendo uma das infecções sexualmente transmissíveis (IST) mais comuns no mundo, a sífilis pode ser adquirida — quando há o contágio direto com a bactéria Treponema pallidum — ou ser congênita, transmitida da gestante infectada para o feto durante o parto.
Entre o público de maior incidência, estão homens entre 20 e 29 anos, que contabilizaram mais de 146 mil casos apenas em 2023, representando 37,8% dos casos, segundo dados divulgados pelo Ministério da Saúde. Dados do Boletim Epidemiológico de Sífilis 2025, divulgado esta semana, apontam uma redução dos casos de sífilis no país – nos últimos três anos, o Brasil registrou 2.093 casos a menos da doença.

Ainda assim, ao longo de 2024, foram notificados 256 mil casos de sífilis adquirida, 89 mil casos de sífilis em gestantes e 24 mil casos de sífilis congênita (quando a infecção é transmitida da mãe para o bebê durante a gestação ou durante o parto), além de um total de 183 óbitos pela doença.

Em 2024, o Estado do Rio de Janeiro registrou a maior taxa de detecção de sífilis em gestantes, com 68,3 casos por mil nascidos vivos. Já o estado do Tocantins foi responsável pela maior incidência de sífilis congênita, com 17,8 casos por mil nascidos vivos, de acordo com o boletim do Ministério da Saúde, divulgado às vésperas doDia Nacional de Combate à Sífilis e Sífilis Congênita, lembrado no terceiro sábado de outubro – este ano, cai no dia 18.

Desde 2005, foram registrados mais de 713 mil casos de sífilis em gestantes, com a taxa de detecção nacional atingindo 34 casos por mil nascidos vivos em 2023. Os dados são alarmantes também no caso da sífilis congênita. Entre 1999 e junho de 2024, foram 344.978 casos registrados em bebês com menos de um ano, com uma taxa de incidência de 9,9 por mil nascidos vivos em 2023.

Infectologista aponta falhas nas estratégias para conter a doença

Para a médica infectologista Michelle Zicker, do São Cristóvão Saúde, o grande número de casos evidencia falhas persistentes nas estratégias de contenção da doença. Ela explica que o avanço da infecção está relacionado a uma série de fatores.

A falta de conscientização sobre a sífilis, o uso inconsistente de preservativos, principalmente entre os jovens, e o estigma ainda presente em torno das Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) dificultam o diagnóstico precoce e o tratamento adequado”, aponta.

Para ampliar o diagnóstico, a pasta informou ter expandido o acesso ao teste rápido combo HIV/sífilis, que identifica simultaneamente as duas infecções. Em 2025, a oferta do exame aumentou em mais de 40%, totalizando 6,5 milhões de unidades, com investimento de R$ 9,2 milhões.

O exame é simples, rápido e gratuito, e permite o início imediato do tratamento — essencial para interromper a transmissão, inclusive durante a gestação”, destacou a pasta em nota.

Apesar da oferta de testes rápidos nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs), o Brasil ainda enfrenta barreiras no diagnóstico e tratamento. A falta de informação e de acesso adequado aos serviços de saúde impacta principalmente gestantes.

Ainda há falhas no acompanhamento pré-natal, na identificação precoce da doença nas gestantes e, principalmente, na adesão ao tratamento por parte das mulheres e de seus parceiros”, afirma a infectologista.

Pediatra chama atenção para prevenção da sífilis congênita

O médico pediatra alerta que a ausência de diagnostico e de tratamento podem causar sequelas graves para a saúde do bebê

A Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP) promove a campanha “Outubro Verde – Mês do Combate à Sífilis Congênita” para enfatizar a urgência do diagnóstico e tratamento precoce da sífilis em gestantes. A doença, transmitida da mãe para o bebê, representa um sério desafio para a saúde pública e a pediatria. O médico pediatra Antonio Turner, diretor técnico da rede de clínicas Total Kids, no Rio de Janeiro, destaca a gravidade da situação:

O agravamento do número de casos da sífilis congênita, uma doença que pode ser prevenida e que tem tratamento, é profundamente preocupante porque a falta de diagnóstico e tratamento adequado durante a gestação pode resultar em consequências trágicas, como aborto, parto prematuro, baixo peso ao nascer, assim como sequelas irreversíveis na criança, incluindo anemia, icterícia, lesões ósseas e de pele, ou até mesmo o óbito, seja intraútero ou após o nascimento. Na fase tardia, a criança pode enfrentar distúrbios auditivos, alterações oftalmológicas e dificuldades de desenvolvimento e aprendizado”, alerta o especialista.

sífilis congênita é causada pela bactéria Treponema pallidum e sua transmissão é evitada com a testagem e o tratamento eficaz da gestante durante o pré-natal. Antonio Carlos Turner reforça a necessidade da gestante fazer o pré-natal, principal ferramenta de combate à doença.

Nosso foco é alertar a população e os profissionais de saúde sobre a importância vital do acompanhamento pré-natal completo e da testagem para sífilis. Intervir o mais cedo possível não apenas trata a mãe, mas, crucialmente, impede que a infecção chegue ao feto, evitando assim complicações graves e garantindo um futuro mais saudável para o bebê. O prognóstico está diretamente ligado à rapidez com que o tratamento é instituído,” conclui.

Leia mais

Sífilis congênita: alerta para o risco da transmissão para os bebês
De mãe para filho: alerta para alta de casos de sífilis congênita
Estado do Rio alerta para alto índice de casos de sífilis

Outubro Verde: Ministério da Saúde lança campanha de enfrentamento à sífilis

O Ministério da Saúde lançou nesta quinta-feira a (16) a Campanha Nacional de Enfrentamento à Sífilis. Com o tema Sífilis tem cura – Faça o teste, trate-se e previna-se, a mobilização reforça a importância da prevenção, da testagem, do diagnóstico e do tratamento contra a doença, disponíveis via Sistema Único de Saúde (SUS).

A campanha tem como público principal jovens de 15 a 30 anos, gestantes e seus parceiros sexuais. A proposta, segundo a pasta, é utilizar linguagem leve e acessível para incentivar o autocuidado e a prevenção em meio ao Outubro Verde, mês dedicado à mobilização nacional contra a sífilis.

A programação, ao longo de todo o mês, inclui webinários abertos ao público às quartas-feiras, a partir das 10h30, abordando temas como diagnóstico, manejo clínico, prevenção e vigilância. Todas as transmissões ficarão disponíveis para acesso posterior, caso não possam ser acompanhadas em tempo real.

Traiçoeiros e subestimados, sintomas se confundem com os de outras doenças

sífilis é causada pela bactéria Treponema pallidum e pode ser confundida com outras infecções. A doença possui quatro estágios que facilitam a identificação. A primária – também chamada de cancro duro – é caracterizada pelo aparecimento de uma úlcera no local, mas de forma indolor, que desaparece espontaneamente, levando muitos pacientes a acreditarem que estão curados.

A secundária acontece semanas após ao contágio e a pessoa infectada pode apresentar sintomas como manchas pelo corpo, febre. dor de cabeça e mal estar. Já na fase latente, a bactéria está no corpo e pode ser detectada por meio de exames, mas a pessoa não apresenta sintomas.

Na fase terciária, a infecção pode permanecer assintomática por longo período e vir a se desenvolver anos depois e causar complicações graves no cérebro, coração e nos ossos, causando graves danos neurológicos e cardiovasculares.

É possível estar infectado por sífilis e não saber. A doença pode passar anos no organismo sem se manifestar de forma evidente, o que reforça a importância dos testes regulares e da prevenção”, alerta Zicker.

Uso regular da camisinha masculina ou feminina é essencial

Zicker reforça que a camisinha ainda é a principal ferramenta de prevenção. “O uso regular da camisinha masculina ou feminina é essencial. Além disso, é necessário ampliar as campanhas de educação sexual, facilitar o acesso à testagem rápida e garantir o tratamento das parcerias para evitar reinfecções”, orienta.

A especialista destaca ainda que a eliminação da sífilis congênita — considerada uma meta prioritária pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) — depende de uma abordagem mais eficiente e integrada. “Não basta ofertar o exame, é preciso garantir que ele seja feito, interpretado e que o tratamento e acompanhamento sejam seguidos corretamente até o fim”.

Enquanto isso, os números seguem crescendo. Em tempos em que outras emergências de saúde pública ganham destaque, a sífilis continua a se espalhar de forma silenciosa, cobrando um preço alto pela negligência coletiva.

Diagnóstico precoce evita complicações

Apesar de tratável com medicamentos, quando não descoberta precocemente e tratada, a sífiliz pode evoluir para casos mais graves, além de gerar novas contaminações.  A principal forma de contágio é por meio de relações sexuais, mas também é possível pela exposição de cortes na pele à bactéria, pelo contato com agulhas e sangue contaminado, durante a amamentação e pela transmissão vertical, que acontece durante a gravidez ou o parto.

Já a prevenção pode ser feita de várias maneiras, principalmente com a utilização de preservativo, mas também evitar o contato com fluídos corporais e a realização de exames regulares.   É indicado que os exames sejam feitos regularmente por pessoas com vida sexual ativa, mesmo que não haja sintomas. Gestantes durante o pré-natal também devem realizar durante o primeiro e o terceiro trimestre.

Em casos positivos, o tratamento é feito por meio de antibióticos administrados via oral ou intravenosa, dependendo da gravidade e do estágio da infecção. Entre os mais comuns, estão a penicilina benzatina, penicilina cristalina ou ceftriaxona. que os exames sejam feitos regularmente por pessoas com vida sexual ativa, mesmo que não haja sintomas. Gestantes durante o pré-natal também devem realizar durante o primeiro e o terceiro trimestre.

A identificação e o diagnóstico da infecção ocorrem por meio de exames, entre eles o teste treponêmico (FTA-ABS), o não-treponêmico (VDRL ou RPR) e o teste rápido. O VDRL é o único teste de floculação que pode ser utilizado para a pesquisa de anticorpos no líquor, uma amostra fundamental para a identificação da sífilis congênita ou da neurossífilis – uma complicação que acontece quando a doença afeta o sistema nervoso. Neste caso, o resultado positivo pode significar que a pessoa já entrou em contato com a infecção.

Com Agência Brasil e Assessorias

Shares:

Posts Relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *