Pop, samba, rock de um lado do corredor. Gospel do outro. Todos os gêneros na porta ao lado. É assim que os hospitais têm humanizado os prontuários dos pacientes internados nas UTIs, com informações sobre o gosto musical, atividades de lazer, apelido que prefere ser chamado e até fotos dos amores da vida de cada um. A ideia é ir além do prontuário convencional, que foca em questões técnicas da saúde do paciente, como alergias e medicamentos, horários das refeições e troca dos lençóis.
O prontuário afetivo, como é chamado, já é usado em UTIs e enfermarias no Brasil e o objetivo é acolher os pacientes e familiares por meio de um atendimento mais humanizado. No Hospital Universitário Cajuru, que atende pacientes 100% pelo SUS em Curitiba (PR), o prontuário foi implementado tendo em vista esse momento de pandemia, em que as visitas de familiares são mais restritas.
“Esse modelo é bem simples, mas tem um impacto muito grande para o paciente, principalmente àquele que está sedado ou saindo de uma sedação. Chamar o paciente pelo apelido ou colocar uma música que ele gosta, estimula áreas do cérebro e resgata memórias positivas, além de ser um acolhimento para os próprios familiares que ficam como acompanhantes quando possível”, conta o psicólogo Sidnei Evangelista, e integrante da pastoral do Hospital Universitário Cajuru.
O paciente Felipe da Silva Maia, de 27 anos, sofreu um acidente de moto e ficou sedado por 10 dias. A mãe, Regina Isabel da Silva, conta que o prontuário afetivo e a equipe foram muito importantes nesse momento. “A gente preencheu o prontuário com as músicas que ele mais gostava. Sertanejo e eletrônica. E esse simples gesto me deixou muito mais segura, sabendo que o meu filho estaria em boas mãos. Como eu não podia estar com ele na UTI, a equipe fazia videochamada com um tablet para que eu pudesse ver como estava meu filho. Isso foi extremamente importante para mim e tenho certeza que para meu filho também. Hoje ele já está acordado e se recupera bem”, comenta.
A psicóloga do hospital, Maria Eduarda Pianaro Chemin, conta que o prontuário beneficia tanto os pacientes quantos os familiares e profissionais da saúde. “O prontuário afetivo surge com esse objetivo de poder apresentar para a equipe quem é esse paciente que está aqui conosco e como é a vida dele fora do hospital. Essa é uma estratégia de humanização que no nosso hospital está em uma fase de projeto piloto, mas já temos conseguido resultados bem positivos. Para a equipe, que percebe a influência no tratamento do paciente, podendo conversar e abordar temas que ele gosta; para a família, que se sente mais confortável sabendo o atendimento humanizado que seu ente querido está recebendo; e também para o paciente, que se sente mais acolhido e apresenta uma melhor recuperação”, diz.
O que importa para você?
Outra iniciativa que tem acolhido os pacientes no ambiente hospitalar é o dia do “O que importa para você?”, uma campanha mundial celebrada em junho que busca incentivar o diálogo entre profissionais da saúde e pacientes, criando mais empatia e aprimorando o cuidado centrado na pessoa.
O gaúcho Fábio José de Oliveira passou em torno de 50 dias internado no Hospital Marcelino Champagnat, devido a complicações da Covid-19. Ficou 19 dias entubado e, embora tenha dado entrada lúcido, disse que demorou cinco dias para se situar a respeito da cidade em que estava. Com um filho de 5 anos, que é a sua paixão, ele conta que deixou de trabalhar no início da pandemia para cuidar do garoto e que o melhor momento da internação para ele foi quando liberaram a entrada do menino.
“Foram apenas alguns minutinhos. Só que ver é diferente de abraçar e, quando eu receber alta médica, a primeira coisa que eu quero fazer é abraçar meu filho e minha esposa. A família é a coisa mais importante. Filho, esposa, mãe e pai são nosso alicerce, é o que dá esperança de sair o quanto antes”, conta.
Mas nem sempre visitas assim são possíveis, mesmo que o paciente não esteja no hospital internado pelo coronavírus. Por isso, algumas atitudes simples e diárias dão conforto a cada pessoa internada. A nutricionista do Grupo Marista, Patrícia Conter Lara Prehs, é responsável pelo setor de Nutrição e Dietética dos hospitais Marcelino Champagnat e Universitário Cajuru.
Ela conta que a equipe conversa sempre com os pacientes para conhecer seus gostos alimentares e fazer adaptações, respeitando a dieta alimentar de cada um. “Algumas coisas simples acabamos adequando no dia a dia, quando o paciente quer um arroz com ovo ou que viu um familiar comendo um pudim em uma chamada de vídeo e ficou com vontade. Mas também já chegamos a servir refrigerante para um paciente que havia ficado longo tempo entubado, após a evolução da dieta, assim como batata frita, pizza e hambúrguer. Claro, que com a liberação médica”, exemplifica.