PL do Veneno: Câmara dá sinal verde para mais agrotóxicos

Deputados ignoram alertas da sociedade e da ciência e aprovam projeto de lei que flexibiliza a entrada de mais agrotóxicos no Brasil

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Uma nova política sobre agrotóxicos em debate no Congresso Nacional provoca reações em todo o país. A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (9) projeto de lei que flexibiliza o controle e a aprovação de agrotóxicos no Brasil. Apresentado em 2002, o projeto é alvo de críticas de ambientalistas, que apelidam o texto de “PL do Veneno” – a discussão se arrasta há quase 20 anos no Congresso.
“Com 301 votos a favor e 150 contra, o Pacote do Veneno foi aprovado na Câmara nesta quarta (9), ignorando os alertas da sociedade e da ciência. Agora, o projeto segue no Senado e nós continuaremos vigilantes dizendo: CHEGA DE AGROTÓXICOS”, publicou o Greenpeace no Twitter.
O uso de pesticidas sintéticos para controlar insetos, larvas, fungos é associado a problemas como intoxicações e poluição de corpos hídricos, solo e atmosfera, além do prejuízo à saúde humana, segundo estudos da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O assunto, a cada dia, ganha mais destaque com a sobrecarga do ecossistema terrestre. O Brasil é um dos países que mais consome agrotóxicos no mundo. De acordo com dados do Ministério da Agricultura, em 2020, foram aprovados 493 novos agrotóxicos para uso, o número mais alto desde 2000.

Mudança do termo agrotóxico para ‘pesticida’

Apesar de a Constituição Federal chamar esses produtos de “agrotóxicos”, o projeto de lei muda o termo para “pesticidas”. Quando usados em florestas e em ambientes hídricos, os agrotóxicos passam a ser chamados pelo projeto de “produtos de controle ambiental” e seu registro caberá ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), do Ministério do Meio Ambiente.

Os dois ministérios (Agricultura e Meio Ambiente) e o Ministério da Saúde, por meio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), continuam a emitir parecer para os procedimentos de registro ou mudança do agrotóxico, mas somente o órgão registrante (Ministério da Agricultura) poderá aplicar as penalidades e auditar empresas e institutos de pesquisa.

Em relação à lei vigente, acaba ainda a limitação de se registrar apenas produto novo, com ação tóxica sobre o ser humano e o meio ambiente, que seja comprovadamente igual ou menor do que a daqueles já registrados para o mesmo fim.

Os parâmetros para essa avaliação são toxicidade; perigos relacionados à neurotoxicidade, malformação fetal, ação hormonal e comportamental e ação reprodutiva; persistência no ambiente; e bioacumulação (acumulação na cadeia alimentar).

O PL 6299/02 revoga totalmente a lei atual sobre agrotóxicos (Lei 7.802/89), mantendo alguns de seus dispositivos e revogando outros. O projeto fixa prazo para a obtenção de registro de agrotóxicos no Brasil; centraliza no Ministério da Agricultura as tarefas de fiscalização e análise desses produtos para uso agropecuário; e prevê a concessão de registro temporário se o prazo não for cumprido. 

Um dos trechos revogados lista quais entidades podem pedir a impugnação ou cancelamento do registro de um produto sob argumento de prejuízos ao meio ambiente, à saúde humana e aos animais: entidades de classe, representativas de profissões ligadas ao setor; partidos políticos com representação no Congresso Nacional; e entidades de defesa do consumidor, do meio ambiente e dos recursos naturais.

Texto exclui casos proibidos de registro de agrotóxicos

O projeto foi aprovado na forma do substitutivo do relator, deputado Luiz Nishimori (PL-PR). A partir do conceito de risco inaceitável, classificado como aquele que está presente no produto mesmo com a implementação de medidas de gerenciamento de riscos, Nishimori exclui da legislação atual casos proibidos de registro de agrotóxicos.

Entre eles estão produtos que revelem características de induzir a deformação fetal, câncer ou mutações, distúrbios hormonais e danos ao aparelho reprodutor, sempre de acordo com procedimentos e experiências atualizadas na comunidade científica.

Outras situações que deixam de ser proibidas na legislação brasileira se referem aos produtos para os quais o Brasil não disponha de antídotos ou de modos que impeçam os resíduos de provocar riscos ao meio ambiente e à saúde pública

O regulamento da lei atual determina que os testes, as provas e os estudos sobre mutação, câncer e deformação fetal devem ser realizados, no mínimo, em duas espécies animais com critérios aceitos por instituições técnico-científicas nacionais ou internacionais reconhecidas.
Essa restrição consta ainda da lei de criação da Anvisa (Lei 12.873/13) quanto à liberação emergencial de produtos em razão de estado de emergência fitossanitária ou zoossanitária. Dessa forma, caberá ao órgão registrante avaliar o nível aceitável de risco do produto que se pretende registrar no País, sem limitações de ordem específica como as atuais.

 

  • Produto deve ser usado em pelo menos 3 países da OCDE

Pelo texto, o prazo máximo para o registro varia de 30 dias (para pesquisa, por exemplo) a dois anos (produto novo ou matéria-prima nova).  Atualmente, devido à complexidade da análise dos riscos e à falta de testes em humanos, os pedidos podem demorar cerca de sete anos para terem um parecer definitivo.

Com o projeto de lei, caso o pedido de registro não tenha parecer conclusivo expedido no prazo de dois anos, o órgão registrante será obrigado a conceder um registro temporário (RT) para agrotóxico novo ou uma autorização temporária (AT) para aplicação de um produto existente em outra cultura para a qual não foi inicialmente indicado.

Para isso, basta que o produto em questão seja usado em pelo menos três países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade que congrega 37 nações com diferentes níveis de exigências sobre o assunto.

Os países indicados devem adotar o código internacional de conduta para a gestão de pesticidas, formulado pela FAO, entidade relacionada à agricultura e alimentação ligada à Organização das Nações Unidas (ONU). O código reúne normas de uso voluntário. Os órgãos no Brasil terão três anos para se adaptar às novas regras.

Embora a lei estabeleça que o processo de reavaliação deva ser concluído em 90 dias, o prazo, na prática, é bem maior. O glifosato, um dos mais usados no País, está sendo reavaliado desde 2008. Na União Europeia, sua licença foi renovada, mas continua sendo questionada por instituições de saúde. A França determinou que o produto seja proibido a partir de 2022.

Tanto na Europa quanto no Japão e nos Estados Unidos existem reavaliações periódicas dos defensivos agrícolas de acordo com as novas pesquisas científicas disponíveis.

Multas podem chegar a R$ 2 milhões

Por outro lado, o texto aumenta os valores das multas passíveis de serem aplicadas pelo desrespeito da lei. Do máximo de R$ 20 mil elas passam para R$ 2 mil a R$ 2 milhões.

Os órgãos de registro e fiscalização definirão os valores proporcionalmente à gravidade da infração. As multas poderão ser cumulativas e em dobro na reincidência. No caso de infração continuada, a multa será diária até cessar sua causa, sem prejuízo da paralisação imediata da atividade ou de interdição.

Convênios poderão ser firmados com órgãos estaduais para a fiscalização, com repasse de parte do dinheiro das multas. Quando a infração constituir crime ou lesão à Fazenda pública ou ao consumidor, cópia do auto de infração deverá ser enviada ao órgão competente para apuração das responsabilidades administrativa e penal.

Desrespeito à proteção à saúde e ao meio ambiente não será mais crime

Pelo novo projeto. acaba o crime de deixar de promover as medidas necessárias de proteção à saúde e ao meio ambiente por parte do empregador, do profissional responsável ou do prestador de serviço, que tinha pena de reclusão de 2 a 4 anos e de 1 a 3 anos se houvesse culpa.

Dois crimes são definidos pela lei, com pena de reclusão. Continua com pena de 2 a 4 anos o crime de produzir, importar, comercializar ou dar destinação a resíduos e embalagens vazias de agrotóxicos em descumprimento às exigências legais. Entretanto, a pena não incidirá mais para os casos de transporte, aplicação ou prestação de serviço relacionados às embalagens.

Com pena de 3 a 9 anos de reclusão, um novo crime é estipulado: o de produzir, armazenar, transportar, importar, utilizar ou comercializar pesticidas, produtos de controle ambiental ou afins não registrados ou não autorizados. Os agravantes variam de até 1/6 ao dobro em casos de gravidade como dano à propriedade alheia; dano ao meio ambiente; lesão corporal de natureza grave; ou morte.

Produto fitossanitário

Fica dispensada de registro a produção de pesticida biológico para uso próprio apenas em lavouras próprias, em sistemas de produção orgânica ou convencional. Para isso, a unidade própria de produção deverá ser cadastrada no órgão de agricultura, com indicação de responsável técnico; e o produto não poderá ser comercializado.

Já o produto comercial usado para a multiplicação deve ter registro, proibidos agentes de controle biológico exótico ou sem ocorrência no País. Agricultores familiares não precisarão cumprir essas regras.

Projeto volta ao Senado após mudanças

A bancada ruralista defende que as mudanças irão “modernizar” e dar “mais transparência” na aprovação das substâncias. “Quem vai ganhar com este projeto é o consumidor final e a sociedade brasileira”, afirmou o relator.

Devido às mudanças aprovadas pelos deputados, o Projeto de Lei 6299/02, do Senado, volta àquela Casa para nova votação. A última versão do parecer foi aprovada em 2018 em uma comissão especial sobre o tema.

Fonte: Agência Câmara de Notícias, com Redação

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