Reconhecido como a primeira causa de morte por doença em crianças (8% do total) e a segunda causa de óbito em geral, o câncer infantil está atrás apenas das mortes causadas por acidentes, no Brasil. Os dados são do Instituto Nacional do Câncer (Inca). que aponta ainda que, no triênio 2023/2025, 7.930 novos casos de câncer atingirão a população de 0 a 19 anos de idade, a cada ano no território nacional.

As leucemias – cuja conscientização é lembrada neste Fevereiro Laranja – são o principal tipo de câncer que acomete esta faixa etária. Ainda de acordo com o Inca, outros tipos mais comuns são tumores do sistema nervoso central, linfomas, neuroblastoma, sarcomas e o tumor de Wilms, neoplasia maligna originada no rim. Há ainda uma série de tumores mais raros, identificados exclusivamente nos primeiros anos da criança, como o retinoblastoma, que exigem atenção dos pais para que os sinais não passem despercebidos.

Diagnósticos de câncer são sempre difíceis para o paciente e suas famílias, principalmente em casos de tumores infantojuvenis. Apesar dessa classificação comum, vale lembrar que essas doenças se diferenciam dos casos em adultos, dadas as próprias características de desenvolvimento nessa fase da vida.

Diferente dos casos na população adulta, o tumor infantil não possui fatores de risco ou formas de prevenção; o diagnóstico precoce, por meio de investigação médica e tratamento especializado, são as principais formas de evitar a evolução. É importante destacar que 8 entre 10 crianças e adolescentes diagnosticados com câncer podem ser curados, se a doença for descoberta precocemente e tratada em centros especializados.

“As técnicas e procedimentos da oncologia pediátrica vêm evoluindo de maneira a garantir, cada vez mais, um tratamento assertivo e seguro aos pacientes. Porém, é sempre necessário reforçar que é fundamental não ignorar os sinais iniciais do câncer; dar atenção às queixas das crianças, principalmente as recorrentes; ter acompanhamento médico regular e levá-los para consulta com o pediatra caso surja alguma anormalidade”, afirma Neviçolino de Carvalho, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica (Sobope).

Por isso, o Dia Internacional do Câncer na Infância (15 de fevereiro) traz uma importante mensagem: os pais precisam ficar atentos aos sinais e sintomas, buscando apoio especializado em caso de suspeita para que a detecção da doença aconteça de maneira precoce e precisa.

Entenda os principais sintomas do câncer infantojuvenil

O pediatra Daniel Portela, professor do curso de Medicina da Faculdade Pitágoras, orienta que pais e responsáveis fiquem atentos a sinais do corpo da criança. “Sintomas como febre persistente, suores noturnos e perda repentina de peso, podem ser confundidos com outras doenças, por isso a informação pode ser aliada para que um diagnóstico precoce salve vidas”, explica o especialista.

O médico também cita algumas características específicas nos casos de neoplasias. “Geralmente surgem manchas no corpo, cansaço, dor nos ossos, anemia, dor de cabeça, falta de equilíbrio, estrabismo e inchaços. Esses quadros são comuns nos diagnósticos de câncer infantil”, diz.

Portela enfatiza que o câncer infantil não está relacionado ao estilo de vida. “Não existem fatores ambientais ou riscos de exposição associados ao surgimento de tumor infantojuvenil. A única forma de amenizar os danos causados às crianças é manter a periodicidade às consultas médicas”, conclui.

O médico destaca os principais sintomas associados a esta enfermidade:

  • Perda de peso contínua e inexplicável;
  • Dores de cabeça com vômito de manhã;
  • Aumento do inchaço ou dor persistente nos ossos ou articulações;
  • Aumento ou inchaço na região abdominal, pescoço ou qualquer outro local;
  • Pupila esbranquiçada ou alterações visuais, como estrabismo;
  • Febres recorrentes não causadas por infecções;
  • Manchas no corpo e sangramentos repentinos;
  • Cansaço exagerado;
  • Palidez.
  • Crianças e adolescentes reagem melhor ao tratamento

  • Sidnei Epelman, líder da especialidade de Oncopediatria da Oncoclínicas, afirma que, comparados com casos em adultos, os tumores na infância são muito mais agressivos e evoluem com maior velocidade. Em contrapartida, a resposta às terapias costuma ser muito mais rápida e os mais jovens tendem a ter respostas mais positivas aos tratamentos.

“Isso faz com que a maioria dos casos de câncer infantil sejam curáveis desde que haja o diagnóstico precoce e a criança seja prontamente encaminhada aos cuidados de uma equipe preparada para lidar com as especificidades da doença nos mais jovens”, explica.

O especialista reforça ainda que a jornada de combate ao câncer infantojuvenil contempla a realização de terapias em centros oncológicos dedicados ao tratamento de tumores pediátricos, a utilização de protocolos cooperativos e uma linha de cuidados de suporte, essencial para garantir um olhar plural para as necessidades de pacientes que estão ainda em fase de transformação e desenvolvimento, tanto físicos quanto emocionais.

“Os oncologistas pediátricos atuam, assim, em conjunto e integrados a equipes multidisciplinares, que contam com a colaboração de cirurgiões, radioterapeutas, patologistas, hematologistas, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas e fisioterapeutas, entre outros profissionais”, diz Epelman.

Daniel Portela também destaca a importância de realizar o tratamento numa unidade especializada, onde a criança ou adolescente irá receber apoio de uma equipe multidisciplinar. “O paciente precisa de acompanhamento de todos os profissionais; uma equipe que esteja envolvida na cura, mas também na qualidade de vida física, psicológica e social desta criança”, afirma o pediatra.

Antigamente, tratamento era igual ao dos adultos

A depender de cada caso, será realizada quimioterapia, medicação alvo, radioterapia ou cirurgia. Mas exatamente por estarem em fases de grandes transformações em seus corpos, os tumores que atingem crianças e adolescentes também se comportam de forma diferente daqueles que surgem em adultos.

“Quando falamos de câncer infantil, estamos nos referindo a um número grande de doenças, que são muito diferentes entre si. Até meados dos anos 1970, crianças e adolescentes com neoplasias recebiam o mesmo tratamento que os adultos, apesar de possuírem características biológicas e orgânicas bem distintas. Hoje, o cenário é bem diferente, com linhas de cuidado específicas para essa parcela dos pacientes, o que garante mais sucesso nos resultados”, diz Sidnei Epelman.

Ele explica que, na maioria dos casos, os tumores nessa primeira fase da vida são constituídos de células indiferenciadas, o que permite uma melhor resposta aos tratamentos. “As chances de cura, a sobrevida e a qualidade de vida são maiores quanto mais precoce e preciso for o diagnóstico, pois apenas com essas informações é possível determinar o tratamento mais efetivo para aquele paciente”, esclarece o especialista.

Os principais tipos de câncer que afetam crianças e adolescentes

Leucemia – é o tipo de câncer mais comum na infância. Acomete a medula óssea e outros órgãos fora da medula óssea, tais como sistema nervoso central, testículos e olhos;

Linfomas que atingem o sistema linfático – frequentemente afetam os gânglios linfáticos e os tecidos linfáticos, como amígdalas ou timo. Também podem afetar a medula óssea e outros órgãos.

Neuroblastoma – um tipo de tumor de células do sistema nervoso periférico, frequentemente de localização abdominal. É responsável por cerca de 6% dos cânceres infantis. Esse tipo de câncer ocorre em lactentes e bebês, sendo raro em crianças com mais de 10 anos;

Retinoblastoma – tumor que atinge a retina, ou seja, o fundo do olho. Representa cerca de 2% dos cânceres infantis. Geralmente ocorre em crianças na faixa etária de 2 anos de idade e raramente é diagnosticado após os 6 anos. Ao direcionar uma luz ao olho de uma criança, o normal é que a pupila apareça vermelha, devido ao sangue dos vasos do fundo do olho. No olho com retinoblastoma, a pupila tem o aspecto branco ou rosa. Este brilho branco no olho geralmente é percebido em fotos tiradas com flash;

Tumor do cérebro e sistema nervoso central – segundo tipo mais comum em crianças, representando 26% dos cânceres infantis. Existem muitos tipos de tumores cerebrais, com tratamento e prognóstico diferentes;

Tumor de Wilms – tem início em um dos rins, raramente afetando os dois órgãos. Mais frequentemente diagnosticado em crianças com idade de 3 a 4 anos. Representa 5% dos cânceres infantis.

Oncologia de Precisão é aliada no tratamento

Nas últimas décadas, o tratamento e as técnicas de diagnóstico evoluíram muito, pautados também pelo maior conhecimento dos mecanismos genéticos que levam ao surgimento da doença. Isso vem mudando o cenário de tratamento, com a adição de novas alternativas terapêuticas que trazem impactos positivos na qualidade de vida desses jovens pacientes oncológicos.

Segundo o oncopediatra Sidnei Epelman, novas ferramentas, tecnologias e inovações da Medicina de Precisão visam exatamente uma maior assertividade e efetividade no diagnóstico. Isso possibilita tratamentos cada vez mais personalizados, ou seja, que consigam atingir cada pessoa e sua doença da forma mais precisa possível.

O sequenciamento genético permite que seja possível conhecer detalhadamente o tumor, sua evolução e particularidades. Com isso, se torna possível pensar em soluções, inclusive pediátricas, para combater essa doença com menores efeitos colaterais e de forma mais efetiva, melhorando o prognóstico em diferentes casos e tipos de tumores.

“A análise genômica é uma das alternativas que vem sendo usada, inclusive em casos de tumores pediátricos, com bons resultados para a leucemia, o mais comum entre as crianças e adolescentes, e outros tipos de tumores que afetam essa parcela da população. Esse conhecimento científico avançado oferece um novo horizonte para a assistência integral, completa e totalmente individualizada, que respeita as necessidades e a história de vida de cada indivíduo”, pontua.

O importante é garantir que tenham uma linha de cuidado que contempla não só esse olhar para o câncer, como também para a pluralidade de desafios que a fase de crescimento representa, garantindo a essas crianças e adolescentes as condições para se desenvolverem de forma plena em todos os sentidos”, enfatiza o oncopediatra.

Esperança no tratamento da LLA em crianças e adolescentes

Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca), a Leucemia Linfoblástica Aguda (LLA) é o tipo mais comum de câncer nessa faixa etária no Brasil, com uma taxa de incidência de cerca de quatro casos a cada 100 mil crianças e adolescentes por ano. Dentre os sintomas mais comuns estão inchaço no fígado ou baço, palidez ou perda de cor da pele e das mucosas, febre, dor nos ossos, hematomas e anormalidade na quantidade de plaquetas que agem na coagulação sanguínea.

Apesar das altas chances de cura, os pacientes que apresentam recaída têm menos probabilidade de vencer a doença com os tratamentos convencionais com quimioterapia. Essa realidade agora deve mudar com a inclusão na tabela do Sistema Único de Saúde (SUS) de uma nova imunoterapia com molécula bispecífica ativadora de células T para LLA B, prevista na portaria nº 2.251/2023, sancionada pelo Ministério da Saúde no final de dezembro de 2023.

O medicamento será uma linha terapêutica recomendada para o tratamento de primeira recidiva medular de alto risco e deve beneficiar centenas de pacientes, como prevê a Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica (Sobope).

Neviçolino Pereira de Carvalho, oncologista e presidente da Sobope, ressalta que a incorporação dos anticorpos monoclonais bi-específicos associados ao transplante de células tronco gerou um aumento significativo de sobrevida para este grupo de pacientes. “O imunoterápico incorporado pelo SUS ao mesmo tempo que reconhece a célula leucêmica, ativa o sistema imunológico para destruí-las”, detalha o especialista.

Ele comenta que, no futuro, essa estratégia deverá também ser utilizada para os pacientes no primeiro tratamento e não apenas nos casos de recidiva. O medicamento diminui em média 67% o risco de reaparecimento da doença (recidiva), falha ao tratamento ou morte, em relação à quimioterapia, segundo estudos clínicos internacionais.

Os ganhos com a imunoterapia são muitos, principalmente em relação aos efeitos agudos quando comparados aos da quimioterapia, mas também não são isentos de toxicidade devendo-se ressaltar a síndrome de liberação de citocinas, que é um processo que resulta da reação imunológica das células T que atacam os blastos leucêmicos, dentre outros. É muito importante que a terapia seja supervisionada por equipe médica e multidisciplinar devidamente treinada.

Com Assessorias

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