‘Quem não gosta de samba, bom sujeito não é. É ruim da cabeça ou doente do pé’, cantava o eterno Dorival Caymmi em ‘Samba da minha Terra’. Mas para integrantes de pelo menos seis blocos de samba que desfilam no Carnaval de Rua do Rio, a letra não passa de mais uma lenda. Quem é “dodói da cabeça” também pode ser bom de gingado, rebolado e baticum, garantem integrantes dos blocos Tá Pirando, Pirado, Pirou! e Loucura Suburbana, que saem pelas ruas mostrando que insano é ser preconceituoso.

Já tradicionais na Urca e no Engenho de Dentro, os dois mais antigos blocos da turma dos enlouquecidamente apaixonados por Carnaval são formados por pacientes de unidades de saúde mental, como os institutos municipais Philippe Pinel e Nise da Silveira, do Instituto de Psiquiatria da UFRJ, e já fazem até parte do calendário oficial do Carnaval de Rua da cidade. O circuito de blocos da saúde mental do Rio começa nesta quinta-feira, dia 16, e vai até o dia 23, nas zonas Sul, Norte e Oeste.

Todos os blocos da saúde mental nascem nas atividades de terapia ocupacional desenvolvidas nas unidades. São oficinas de música, percussão, artes, pintura, artesanato, entre outras. Ao longo do ano, os pacientes em acompanhamento vão fazendo os trabalhos, descobrindo ou redescobrindo seus caminhos e identidades. Quando chega perto do carnaval, é escolher e ensaiar o samba, concluir as fantasias e se soltar nas ruas, arrastando a vizinhança, turistas e foliões em geral.

“A cultura promove a possibilidade de os pacientes desenvolverem suas potencialidades e descobrir coisas novas. Muitas vezes as famílias não entendem o processo do adoecimento, em que a pessoa se afasta daquele padrão considerado de normalidade e passa a ser vista como inútil. A arte e a música permitem que o doente mostre do que é capaz”, explica a psicóloga Ariadne de Moura Mendes, coordenadora do Loucura Suburbana,

Este ano celebrará em seu enredo os 30 anos da luta antimanicomial, abordando justamente a importância da cultura na transformação da saúde mental.

“Nós somos um bloco diferenciado, que tem a missão política de promover a integração social dos nossos pacientes. Somos um ponto de cultura e o que se vê no carnaval é o resultado do trabalho de um ano inteiro nas oficinas de arte, composição e outras”, diz o psicanalista Alexandre Wanderley, coordenador do Tá Pirando, Pirado, Pirou!

O bloco traz o enredo “Meu caro amigo Augusto Boal, o arco-íris do desejo vai brilhar no carnaval!”, homenagem ao Teatro do Oprimido. O samba é uma composição de Messias do Horizonte e Enéas Elpídeo.

Formado por pacientes do Instituto Philippe Pinel, do Instituto de Psiquiatria da UFRJ, dos centros de atenção psicossocial da Zona Sul e do Centro, o bloco funciona ao longo do ano como ponto de cultura, onde enredo, samba, alegorias e tudo o mais vão sendo discutidos e preparados nas oficinas terapêuticas das unidades de saúde. O trabalho já conquistou prêmios importantes, como o Nacional de Cultura e Saúde em 2010, concedido pelo Programa Mais Cultura, Mais Saúde, oferecido por uma parceria entre Ministério da Cultura e Ministério da Saúde; e o “Loucos pela diversidade”, da Fiocruz.

Até ano passado, o bloco tinha apoio da Petrobras mas, com a crise, a empresa cortou o patrocínio e o bloco está fazendo pela internet uma campanha para arrecadar recursos e pagar as contas do desfile, no link http://www.catarse.me/TaPirando2017
Confira os blocos dos enlouquecidamente apaixonados por Carnaval:

Loucura Suburbana – Na Zona Norte, o pioneiro Loucura Suburbana, em seu 17º carnaval, se concentra às 16h da quinta-feira antevéspera do folia, dia 23, no pátio do Instituto Nise da Silveira (na Rua Ramiro Magalhães, 521).

Se Pirar a Gente Cuida – Estreante no carnaval, o bloco Se Pirar a Gente Cuida, formado por pacientes do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) João Ferreira Silva Filho, do Alemão, sai nesta quinta-feira 16, às 15h, da Rua Engenheiro Manoel Segurado (ao lado do Caps). O enredo será uma apresentação do bloco e para o que veio.

Socorro, Maria Pirou – O bloco Socorro, Maria Pirou existe desde 2014 e em seu repertório toca diversos sambas. Os ritmistas são integrantes das oficinas terapêuticas de música desenvolvidas na unidade ao longo do ano. E as máscaras para serem usadas no desfile estão sendo confeccionadas nas oficinas de artesanato e pintura. O bloco sai na sexta-feira, dia 17, do Caps Maria do Socorro Santos, na Estrada da Gávea, 520 (na curva do S da Rocinha), com concentração a partir das 14h.

Tá Pirando, Pirado, Pirou! – Tradicional na Zona Sul, o bloco Tá Pirando, Pirado, Pirou!, que reúne pacientes e profissionais de saúde mental, vence todas as dificuldades e a crise econômica e vai para seu 13º desfile, sempre no domingo que antecede o Carnaval (este ano, dia 19), a partir das 15h, na Avenida Pasteur. O bloco se concentra ao lado da UniRio e avança por algumas ruas da Urca e Botafogo, arrastando a vizinhança, turistas e foliões em geral.

Zona Mental – Já em Bangu, no dia 21, o Zona Mental se concentra às 15h na Praça Guilherme da Silveira. O bloco, que nasceu em 2015 a partir do Fórum Intersetorial de Geração de Renda e Cultura da Zona Oeste, terá dois sambas para cantar: “Liberdade e respeito”, composto na Oficina de Carnaval do CAPS Neusa Santos Souza, e outro feito coletivamente pelos usuários do CAPSi Pequeno Hans, que atende pacientes infanto-juvenis.

Império Colonial – E na quarta-feira, dia 22, o Império Colonial se reúne a partir das 10h no jardim do Museu Bispo do Rosário (Estrada Rodrigues Caldas, 3.400). O bloco nasceu em 2014, na oficina de percussão do Centro de Convivência Pedra Branca, na antiga Colônia Juliano Moreira. O enredo tem o título de “É carnaval – Descolonizando esse carnaval; desengaiolando geral”.

Fonte: Secretaria Municipal de Saúde, com redação

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