Se a Humanidade não conseguir reverter os efeitos das mudanças climáticas, a Terra pode sofrer uma extinção em massa, semelhante à do Período Permiano (entre 299 e 251 milhões de anos atrás), quando cerca de 90% das espécies não conseguiram sobreviver às condições drásticas. O alerta é do pesquisador Hugh Montgomery, diretor do Centro de Saúde e Desempenho Humano da University College London, na Inglaterra, e um dos autores do relatório de 2024 sobre saúde e mudanças climáticas da publicação científica The Lancet.
O estudioso abriu a programação do Forecasting Healthy Futures Global Summit, evento internacional sobre saúde e clima, que começou nesta terça-feira (8) e prossegue até quinta (10), no Sheraton Hotel, no Rio de Janeiro. O Brasil foi escolhido para sediar a conferência porque vai receber a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30), em novembro.
Montgomery ressaltou que essa extinção já vem ocorrendo ─ “a maior e mais rápida que o planeta já viu, e somos nós que estamos causando isso”, frisou. Entretanto, a morte de espécies pode chegar a níveis catastróficos se o aumento da temperatura média global chegar a 3 graus Celsius (ºC) acima dos níveis pré-industriais. Em 2024, alcançamos um aumento recorde de 1,5º C, e cientistas estimam que se as ações atuais foram mantidas, especialmente no que se refere a emissão de gases do efeito estufa, esse aumento deve chegar a 2,7 °C até 2100.
Se continuarmos golpeando a base dessa coluna instável sobre a qual estamos apoiados, a própria espécie humana estará ameaçada. No ano passado, emitimos 54,6 bilhões de toneladas de CO₂ equivalente na atmosfera — um aumento de quase 1% em relação ao ano anterior. A concentração atmosférica de CO₂ não só está aumentando, como está aumentando de forma cada vez mais acentuada”, explicou o especialista.
De acordo com Montgomery, outras consequências drásticas poderão afetar a Terra bem antes disso. “Se alcançarmos, mesmo que temporariamente, um aumento entre 1,7 °C e 2,3 °C, teremos um colapso abrupto das camadas de gelo do Ártico. Sabemos que isso também vai causar uma desaceleração significativa da Circulação Meridional do Atlântico, da qual depende o nosso clima, nos próximos 20 ou 30 anos, provocando uma elevação do nível do mar em vários metros, com consequências catastróficas”.
Ele chama atenção para outras causas do aquecimento global, como a emissão de metano, gás com potencial danoso 83 vezes maior do que o dióxido de carbono, liberado principalmente durante a exploração de gás natural. O cientista inglês também argumentou que ações imediatas de despoluição são essenciais para a própria economia mundial, que, prevê ele, deve reduzir em 20% ao ano, ou 38 trilhões de dólares, a partir de 2049, por causa dos efeitos das mudanças climáticas.
Hugh Montegomery avalia que é importante pensar em medidas de adaptação a mudanças no clima, porque elas já estão afetando a saúde da população hoje, “mas isso não pode ser feito em detrimento de uma redução drástica e imediata nas emissões, porque não faz sentido focar apenas no alívio dos sintomas quando deveríamos estar buscando a cura”.
O tema da campanha da OMS para este ano é “Inícios saudáveis, futuros esperançosos”. A ideia é instar os governos e a comunidade da saúde a intensificar esforços para acabar com as mortes maternas e neonatais e priorizar a saúde e o bem-estar de longo prazo das mulheres. Além disso, a OMS e seus parceiros compartilharão informações para apoiar gestações e partos saudáveis, bem como melhor saúde pós-natal.
A organização estima que 300 mil mulheres morrem devido à gravidez ou ao parto a cada ano, enquanto mais de 2 milhões de bebês morrem no primeiro mês de vida, e outros 2 milhões são natimortos. Isso equivale a aproximadamente uma morte evitável a cada 7 segundos.
Veja alguns dos principais destaques no primeiro dia do FFH Summit:
‘Saúde única’ em pauta: a integração entre planeta, animais e humanos
As mudanças climáticas estão prejudicando a saúde do nosso planeta, ameaçando sistemas hídricos e alimentares e expondo os seres humanos a novos patógenos. Os eventos climáticos estão expandindo rapidamente o alcance da maioria das doenças infecciosas, bem como aumentando a probabilidade de novas doenças surgirem.
Neste cenário de catástrofe ambiental, conceitos como Saúde Planetária e Saúde Única (one health) ganham força. Mas o que significaria integrar ainda mais os princípios da biodiversidade e da conservação da natureza à saúde saúde humana, todos impactados pelo aquecimento global?
Para debater esses temas, o evento promoveu na terça-feira (8) o painel Sistemas Naturais em Fluxo: Uma conversa sobre integração de sistemas para os campos do clima e da saúde’, com Joana Oliveira de Oliveira, da Rede Pan-Amazônica de Bioeconomia/WRI Brasil, e Tabinda Sarosh, CEO da Pathfinder International.
Novas soluções médicas para combater doenças infecciosas
Durante séculos, o mundo natural serviu como uma fonte essencial de inspiração para avanços médicos no controle e cura de doenças. O perigo crítico de milhões de espécies vegetais e animais coloca mais inovação científica em risco. Diante de desafios tão complexos, surgem alguns exemplos de abordagens sistêmicas bem-sucedidas.
As mudanças climáticas exigem uma nova maneira de pensar, além de financiamento para muitas intervenções em desenvolvimento. A cada dia surgem novas soluções e tecnologias médicas para retardar a propagação de doenças no contexto da mudança climática, protegendo os humanos de novos patógenos e do avanço das doenças sensíveis ao clima.
Para falar sobre o tema o painel ‘Biodiversidade e Avanços: Preservando o pipeline da natureza para soluções para doenças infecciosas’ reuniu especialistas como Fabiano Pimenta, consultor técnico da Organização Panamericana de Saúde (Opas) no Brasil; Hang Ng, gerente de Políticas da Coalizão para Inovações em Preparação para Epidemias (Cepi), e Helen Jamet, diretora adjunta da Fundação Gates.
Alívio do calor e proteção natural contra aumento das temperaturas
Diante do aumento das temperaturas em todo o planeta, quais são as fontes mais promissoras de alívio em infraestrutura, energia e soluções baseadas na natureza, e quais delas evitam o problema? Quais estratégias específicas são necessárias em resposta à migração relacionada ao calor e aos efeitos únicos do calor nas cidades?
O painel ‘Habitats e Alívio do Calor: Proteção natural contra o impacto do aumento das temperaturas’ destacou estratégias específicas em resposta à migração relacionada ao calor e aos efeitos únicos do calor nas cidades e as fontes mais promissoras de alívio em infraestrutura, energia e soluções baseadas na natureza, e quais delas evitam o problema.
Participaram especialistas como Karl Astbury, líder de Programas, Clima e Saúde da Resilient Cities Network; Lisa Beyer, gerente Sênior de Natureza para Resiliência Urbana, da World Resources Institute; Giselle Sebag, diretora executiva da Sociedade Internacional para Saúde Urbana; Adriana Velasco, gerente de Política Global e Advocacia da Malaria No More, e Madison Cole, economista sênior da Mode Economics.
Como prevenir doenças e secas em um mundo em aquecimento?
Riachos e áreas úmidas oferecem proteção natural contra os impactos da seca na saúde e reduzem o risco de doenças que sufocam o crescimento e prejudicam as economias. A poluição e a invasão populacional descontrolada estão reduzindo o acesso a esses recursos fundamentais, assim como os padrões climáticos ameaçam períodos mais longos de seca e incentivam o uso perigoso de fontes de água doce cada vez mais raras.
O painel ‘Conservação e Água Limpa: Prevenindo doenças e secas em um mundo em aquecimento’ mostrou como as fontes naturais de água podem ser preservadas, expandidas e utilizadas de maneiras inovadoras que protejam a saúde humana e as inovações no tratamento de águas residuais mais adequadas aos crescentes desafios impostos pelas mudanças climáticas.
O debate reuniu especialistas como Alex Guerra Noriega, diretor geral do Instituto Privado de Investigação sobre Mudança Climática; Alison Malmqvist, vice-presidente de Captação de Recursos e Comunicações Globais (PSI), Sofia Corradi , investigadora doutorada; e os executivos Fiona Jeffery, da Just a Drop, e Alejandro Mieses, da TerraFirma
Agricultura sustentável para impulsionar a saúde das pessoas e do planeta
Um componente essencial da resiliência climática é a saúde de comunidades vulneráveis, que depende em grande parte do acesso confiável a alimentos e nutrientes. No entanto, as mudanças climáticas estão destruindo os sistemas alimentares, a nutrição e a saúde, por meio de seu impacto na agricultura e na produção pecuária. Tais práticas em expansão, como o desmatamento para o plantio de soja para alimentar gado, levam à degradação crescente dos recursos naturais e aceleram o ritmo do aquecimento global.
Inovações na agricultura sustentável oferecem maior chance de nutrir de forma confiável populações crescentes, ao mesmo tempo em que protege as fontes de sequestro natural de carbono. Durante o painel ‘Sistemas Florestais e Alimentares: Agricultura sustentável para impulsionar a saúde das pessoas e do planeta’, foram debatidas as soluções mais críticas para um uso da terra e cadeias de suprimentos mais eficientes e sustentáveis.
O debate contou com Caetano Scannavino, coordenador do Projeto Saúde e Alegria; Marina Gavaldao, fundadora do Instituto Uba de Sustentabilidade, e Julio Alves, analista de Sistemas Alimentares Sustentáveis do World Resources Institute no Brasil. O debate foi mediado por Amanda Suarez , fundadora e diretora executiva do projeto ‘Saúde em Clima’.
Da Agência Brasil e FHF Summit