Baixa vacinação ameaça novos casos graves de meningite

10% dos casos de meningite resultaram em morte em 2023 no Brasil. Grave, a doença pode ser evitada com vacinação: SUS oferece 7 imunizantes

Casos de meningite podem levar a internação hospitalar e até à morte (Foto: Freepik)
Gostou desse conteúdo? Compartilhe em suas redes!

A meningite é uma doença infecto-contagiosa grave que consiste na inflamação das meninges, membranas que envolvem o cérebro e a medula espinhal, dificultando o transporte de oxigênio às células do corpo. Além do alto risco de morte, os pacientes ainda podem sofrer sequelas importantes, como perda auditiva, de visão, da fala, motora e até ficar em estado vegetativo. 

A doença podendo ser causada por bactérias, vírus, fungos e parasitas.  No Brasil, a meningite é considerada uma doença endêmica. Ou seja, os casos são esperados ao longo de todo o ano, com a possibilidade de surtos e epidemias ocasionais. As meningites bacterianas são mais comuns no outono e no inverno, e as virais, na primavera e no verão.

As meningites virais e bacterianas são as de maior importância para a saúde pública, considerando a magnitude de sua ocorrência e o potencial de propagação. Além de ser uma doença contagiosa, ela evolui rapidamente em crianças e adolescentes – menores de 5 anos são os mais atingidos. Em princípio, pessoas de qualquer idade podem contrair meningite, que pode causar sequelas em 20% das infectadas.

O Brasil registrou 8.877 casos de meningite e 886 mortes pela doença de janeiro até 12 de setembro de 2023, segundo dados do Ministério da Saúde. O tipo viral foi o que registrou o maior número de casos, porém, a maioria dos óbitos foram causados pela meningite pneumocócica (bacteriana) e que pode atingir crianças e adultos.

Dados preliminares do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan Net) registraram 82 casos da doença e quatro óbitos no Paraná desde o início do ano. De 2019 até 2023, foram 6.402 casos e 429 óbitos pela doença no Paraná.

Cobertura vacinal muito longe da meta

Infelizmente, os cuidados com algumas doenças infecciosas transmissíveis que são passíveis de prevenção com a vacinação – como a meningite – foram deixados de lado pela população brasileira nos últimos anos, por influência de uma onda negacionista que se expandiu durante a pandemia de Covid-19 – e isso tem sido motivo de preocupação dos órgãos de saúde.

Apesar de ser a forma mais eficaz de evitar a infecção, a cobertura vacinal contra a meningite está longe da meta estabelecida pelo Ministério da Saúde, de 95% da população-alvo. Em 2022, tinha atingido apenas 47% do público-alvo no Brasil. Por meio do Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde (PNI-MS), o Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza sete imunizantes contra as principais causas da doença: meningocócica C, pneumocócica 10, 23 e 13-valente, pentavalente, meningocócica C e meningocócica ACWY. Todas são gratuitas.

No Estado do Rio de Janeiro, a cobertura da Meningo C está em 61%, longe da meta de 95% e abaixo da média nacional, atualmente em 70%. O cenário também se repete na Pneumo 10, que conta com cobertura de 69% no território fluminense, e 80% na média do país.  Já em relação à Pentavalente, as coberturas estão em 72% no Rio e em 83% no Brasil.

Levantamento feito pela Vigilância Epidemiológica da SES-RJ indica que 5.234 casos foram notificados no Estado do Rio de 2020 a 2023, período da pandemia da Covid-19, quando houve subnotificação de diversas doenças endêmicas. Ou seja, o número pode ter sido ainda maior. No mesmo período, foram registrados 522 óbitos. Muitos deles evitáveis.

“Estamos falando de uma doença grave e que pode ser prevenida de forma simples, por meio da vacina. Sabemos que ocorrem casos mesmo em vacinados, mas essa probabilidade é muito menor e, quando ocorre a infecção, as consequências tendem a ser mais brandas. As vacinas estão disponíveis no SUS e é muito importante que a sociedade civil esteja engajada nessa luta”, reforça a secretária de Estado de Saúde do Rio, Claudia Mello.
Dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação indicam que 413 pessoas foram internadas com esse diagnóstico, a maioria crianças e adolescentes, apenas neste ano. De acordo com a Vigilância Epidemiológica da SES-RJ, a taxa de letalidade da doença no Estado do Rio é, em média, de 10% ao ano.

Imunização é essencial para prevenir a doença

O Dia Mundial da Meningite (24 de abril) foi instituído pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para destacar a importância da prevenção, diagnóstico, tratamento e da melhoria das medidas de suporte às pessoas infectadas por essa doença que pode ser mortal.

Esta data é um lembrete poderoso da importância da vacinação, que é a forma mais eficaz de prevenir a meningite bacteriana, a forma mais grave da doença. As três principais são:

• Meningocócica C: pode ser administrada em crianças de 3 meses até os 4 anos de idade;
• Pneumocócica 10: pode ser administrada em crianças de 2 meses a 4 anos;
• Pentavalente: pode ser administrada a partir de 2 meses até 6 anos de idade (age contra a meningite por hemófilos).

“A meningite é transmissível na maioria dos casos. Mais comuns, as meningites bacteriana e viral ocorrem pelo contato com gotículas e secreções das vias respiratórias. Além disso, podem ser disseminadas ao entrar em contato com alimentos ou pessoas infectadas pelo vírus ou bactéria”, alerta Gisele Abud, médica e diretora técnica da UPA 24h Zona Leste, unidade gerenciada pela Pró-Saúde em Santos (SP).

Atualmente, há uma recuperação nas taxas da vacina Meningocócica C (1ª dose e reforço). No Estado de São Paulo, de janeiro a setembro de 2023, a taxa de cobertura para a vacina Meningocócica C Conjugada para crianças menores de 1 ano foi de 81,3%.  Neste mesmo período, foram registrados 3.857 casos de todas as meningites e 307 mortes.

Outras formas de driblar o contágio também incluem evitar aglomerações e locais com pouca circulação de ar, manter os ambientes ventilados, usar máscaras de proteção em locais fechados e lavar as mãos com frequência.

Conheça as vacinas contra a meningite

A meningite possui um grande potencial de disseminação entre indivíduos que compartilham objetos ou estão no mesmo ambiente. “Por isso, é crucial que todos estejam conscientes da importância da vacinação, pois esta é a única forma eficaz de prevenção”, explica a enfermeira Kátia Oliveira, especialista em vacinação da Clínica Vacinne.

“As vacinas disponíveis protegem contra a infecção bacteriana, que sempre apresenta um alto nível de gravidade. Nesses casos, a eficácia é contra a meningite meningocócica, causada por Neisseria meningitidis dos sorogrupos A, B, C, W-135 e Y; a meningite pneumocócica causada por Streptococcus pneumoniae; e a meningite causada por Haemophilus influenzae tipo b. Para as meningites virais, que são menos graves, ainda não temos vacinas”.

A vacina para os tipos ACWY, dose única que protege contra os quatro subtipos mais comuns, conhecida também como vacina conjugada quadrivalente, aprovada pela Anvisa para bebês a partir de 3 meses de idade, e a tipo B também recomendada a partir de 3 meses de idade também fazem parte do calendário vacinal para adultos.

Meningocócica C x meningocócica ACWY

Na rede privada, a vacina que abrange o tipo C é a conjugada quadrivalente ACWY. Normalmente, é administrada em três doses até 1 ano de idade, variando conforme a marca do fabricante. Também é recomendado um reforço entre os 5 e 6 anos, além de outra dose aos 11 anos. Ela pode ser aplicada em adultos, idosos e pessoas imunocomprometidas.

Meningocócica B

Apesar de estar atrás apenas do tipo C em número de casos, cerca de 20% em média, a meningocócica B só está disponível na rede privada. Ela é administrada em três doses entre 3 meses e 1 ano de idade. Segundo a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), a Meningocócica B também é recomendada para grupos de alto risco, como portadores de HIV, podendo ser aplicada em adultos até 50 anos.

Pneumocócica conjugada 13-valente (VPC13)

A vacina pneumocócica conjugada 13-valente (VPC13), que protege contra pneumonia e meningite, também está disponível na rede privada. Geralmente, é administrada em quatro doses até 1 ano e 3 meses de idade, dependendo da marca do fabricante.

Haemophilus influenzae tipo b (Hib)

A vacina conjugada contra Haemophilus influenzae tipo b (Hib) protege contra a meningite causada pela bactéria Haemophilus influenzae tipo b e pode ser aplicada individualmente, mas geralmente é administrada pela vacina hexavalente, que também protege contra difteria, tétano, coqueluche, hepatite B e poliomielite, ou pela pentavalente, que protege contra as mesmas doenças, exceto a poliomielite. Normalmente, é aplicada em crianças até 5 anos. Na rede privada, são quatro doses entre 2 meses e 1 ano e 6 meses de idade.

BCG

Além das vacinas mencionadas anteriormente, toda criança recebe uma dose única da vacina BCG ao nascer, protegendo contra a meningite tuberculosa. Essa imunização impede que o bacilo de Koch, a bactéria responsável pela tuberculose, se instale nas meninges.

O que é e quais os principais sintomas da meningite

Caracterizada por uma inflamação das membranas que revestem o cérebro e a medula espinhal a meningite é uma doença delicada e com grande potencial de gravidade e que requer intervenções rápidas, sendo que a chance de agravamento é diretamente relacionada ao tempo de detecção.

Algumas situações comuns, como dores de cabeça, rigidez na nuca, febre alta, vômito, confusão mental e manchas na pele. Nos casos de meningite bacteriana, os sintomas se intensificam rapidamente e, em apenas 24 horas, podem levar ao óbito. Nestes casos, é crucial identificar o patógeno responsável para iniciar o tratamento adequado o mais rápido possível.

Os sintomas são muito semelhantes aos da gripe e dengue: febre, mal-estar, dor de cabeça e dores pelo corpo. Se houver confusão mental, rigidez na nuca (o sintoma mais característico) e sensibilidade à luz, é recomendável procurar assistência médica urgentemente.

Alguns pontos de atenção aos sintomas devem ser considerados: casos leves apresentam sintomas como dores de cabeça, febre e rigidez na região da nuca, enquanto casos mais graves podem causar mal-estar, vômitos, dificuldade para encostar o queixo no peito e dor forte no pescoço, além de manchas avermelhadas no corpo. Importante ressaltar que o subtipo bacteriano sempre exige tratamento hospitalar, ainda que a pessoa diagnosticada apresente sintomas leves.

Como a meningite é transmitida?

Em geral, a transmissão é de pessoa para pessoa, pelas vias respiratórias – seja por gotículas (tosses, saliva e espirros, por exemplo); por contato com as mucosas e secreções do nariz e da garganta de pessoas infectadas, assintomáticas ou doentes e também por contato com objetos ou superfícies contaminadas.

Clarisse Pimentel, infectologista da Fundação Saúde, explica que o agente infeccioso causador da meningite age no Sistema Nervoso Central (SNC), podendo afetar diversas áreas do corpo.

“Por conseguir acessar o Sistema Nervoso Central, a meningite ganha potencial de afetar diversas partes do corpo e comprometer suas funcionalidades, justamente porque o SNC é responsável pelas nossas atividades, como locomoção, raciocínio e memória”, explica.
A médica esclarece que a doença meningocócica se destaca das demais por apresentar evolução mais rápida, podendo surgir manchas na pele, que nos casos mais graves se disseminam por todo o corpo.
“As meningites de todas as etiologias são doenças de notificação compulsória, e todos os casos suspeitos devem ser notificados às secretarias municipais e estaduais de Saúde. O tratamento requer o uso de antibióticos, mas, em alguns casos, mesmo com um manejo clínico adequado e em tempo oportuno, as medicações acabam não sendo eficazes e a doença progride com gravidade. Ainda assim, o diagnóstico precoce contribui para um desfecho mais favorável“, pontua.

Pergunte ao Doutor

Neurologista responde às principais dúvidas

Problema grave de saúde pública, doença acomete membranas do cérebro e medula espinhal

Dentro da área de infectologia, as meningites são uma das maiores emergências médicas, devendo ser prontamente suspeitada e reconhecida nos prontos-socorros. Informação é a principal forma de prevenir a propagação desta doença, que causa tantos danos. No Dia Mundial de Combate à Meningite, a embaixadora da Inspiralli na área de Neurologia Leticia Rebello tira dúvidas da população sobre o assunto. Confira:

O que é meningite?

É a inflamação grave das meninges, que são as membranas que revestem o cérebro e toda a medula espinhal. Pode ser causada, principalmente, por vírus e bactérias, e, em menor frequência, por parasitas ou fungos.

Quais os principais sintomas?

A doença possui uma tríade de sintomas clássica: febre; rigidez de nuca e alteração do estado mental. Além desses sintomas, pode ocorrer cefaleia e vômitos de repetição, muitas vezes com característica “em jato”. Os sintomas são, em grande parte dos casos, refratários a analgésicos sintomáticos.

Como é feito o diagnóstico?

Deve-se avaliar a presença de sinais meníngeos, sendo os principais deles a rigidez de nuca e os sinais de Kernig e Brudzinski, junto com alteração de nível e conteúdo de consciência (muitos pacientes apresentam-se mais sonolentos) e febre. Na suspeita de meningite, recomenda-se ainda a realização de exame de imagem com o objetivo de se descartar formações expansivas (exemplo: abcesso cerebral) que poderiam contraindicar a coleta do Líquido Cefalorraquidiano (LCR).

O passo seguinte na propedêutica, é a coleta imediata do LCR com o objetivo de se identificar o agente causador da meningite, e assim, guiar a escolha terapêutica. No entanto, em casos de impossibilidade de realização do LCR, não se deve atrasar o início da terapia, mesmo que de forma empírica, com amplo espectro. O atraso no início do tratamento tem relação direta com o prognóstico do paciente. Em geral, para o tratamento empírico, emprega-se antibióticos e antiviral.

Quais os tipos e principais causas existentes? Quais as diferenças?

Elas podem ser causadas principalmente por bactérias, vírus ou fungos. As meningites bacterianas e virais, em geral, têm um curso de evolução mais agudo (menor do que 7 dias), enquanto as meningites crônicas, causadas por fungos, tuberculose e sífilis, possuem um curso mais arrastado (maior do que 7 dias), muitas vezes dificultando o diagnóstico.

Como é realizado o tratamento?

O tratamento com antiviral ou antibiótico deve ser direcionado para o tipo de patógeno isolado no líquor. A antibioticoterapia pode ser escalonada a depender da condição de base do paciente (casos de imunossupressão, infecção nosocomial), severidade do quadro, além de resposta inadequada a terapia inicial.

Como a doença é transmitida?

As principais meningites podem ser transmitidas por contiguidade em casos de sinusites e otites complicadas, além de contato com pessoas infectadas, pela via aérea (gotículas de secreções do nariz e garganta).

Como prevenir a doença?

A melhor forma de prevenção das meningites é mantendo a caderneta de vacinação atualizada: vacina meningocócica C e pneumocócica 10. De fato, com a implementação da vacinação contra a meningite no calendário vacinal, a incidência da doença reduziu de forma drástica.

Quem corre mais risco de contrair a doença de forma grave?

As meningites mais graves acontecem em pacientes em extremos de idades: crianças e idosos. Uma parcela da população que merece cuidado especial são pacientes portadores de doenças que afetam o sistema imunológico, como o câncer, HIV e uso de medicamentos imunossupressores.

Meningite pode levar à morte? Em quais casos?

A meningite é uma doença grave e pode levar a morte, principalmente quando há atraso no diagnóstico e início do tratamento. Pode evoluir para duas outras formas de alta severidade e letalidade: a encefalite (quando atinge a estrutura cerebral) e a meningoencefalite (quando acomete ambos o cérebro e medula).

Além do alto potencial de letalidade, a meningite, quando complicada com encefalite, pode gerar sequelas importantes, tanto motoras, quanto de linguagem e comportamental, a depender da estrutura cerebral mais afetada. Os pacientes com maior fragilidade, múltiplas comorbidades, imunossuprimidos e extremos de idades são os casos mais graves.

A doença deixa sequelas? Quais?

Dependendo da severidade, a doença pode deixar sequelas irreversíveis. As principais são: alterações comportamentais e cognitivas (perda de memória), perdas visuais e auditivas, além de perda de força em membros e alterações de linguagem.

 

Com Assessorias

Gostou desse conteúdo? Compartilhe em suas redes!

You may like

In the news
Leia Mais
× Fale com o ViDA!