Parecia mentira, mas o agente comunitário de saúde Bernardo Xavier – que nunca havia feito uma viagem internacional na vida – chegou em Londres justamente no dia 1º de abril para apresentar o o cuidado com os pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), nas clínicas da família e centros municipais de saúde do Rio de Janeiro. Ele chamou atenção na capital britânica com seu uniforme de trabalho único e representativo de sua cidade e país: cores azul e branco simbolizando o SUS.
Rodeado por pesquisadores de diferentes culturas do mundo (Canadá, África do Sul, Arábia Saudita e, inclusive, o Reino Unido), Bernardo vivencia a rotina de cooperação entre o ResiliSUS – Laboratório Integrador de Tecnologia, Informação e Resiliência em Saúde Pública), da Fiocruz, e o Departamento de Saúde Pública do Imperial College London para desenvolver estratégias que fortaleçam a resiliência dos sistemas brasileiro e britânico como um todo.
O agente comunitário contou que sua missão foi levar a experiência e os resultados da Atenção Primária à Saúde (APS), da Estratégia Saúde da Família, e o impacto do trabalho no SUS. A ideia é inspirar um projeto de pesquisa acadêmica do médico britânico Matthew Harris – que já trabalhou no Brasil, em Pernambuco – que tenta implantar em Londres o trabalho dos Community Health Workers and Wellbeings (CHWWs), na tradução para o português, os agentes comunitários de saúde e bem-estar.
Reino Unido não tem trabalho universal como no SUS
Existe esse trabalho, mas não é integrado ao Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido, o NHS, que não é universal como no SUS. Estão em um estágio de crescimento do projeto e da estratégia. O que estou fazendo é trazer minha maior parte dos dias é de trabalho de campo, junto com os CHWWs para entender, anotar e comparar”, conta o ACS Bernardo Xavier.
A professora do Imperial College London, Connie Junghans-Minton, que coordena o projeto pelo lado britânico junto com Mattheus Harris, já visitou unidades básicas de saúde no Rio de Janeiro e conversou com agentes comunitários. A partir deste contato, a Secretaria Municipal de Saúde do Rio (SMS) passou a integrar a comitiva da Fiocruz.
A primeira atividade de intercâmbio teve ênfase na APS. Estudos recentes destacam a importância da Atenção Primária no desenvolvimento de habilidades de antecipação, monitoramento e aprendizado. Outros movimentos focados em diferentes níveis de atenção devem ser desenvolvidos no futuro.
Em relação a esse projeto, sinto que traz luz e reconhecimento ao nosso trabalho. Os britânicos estão se inspirando muito na APS e no SUS, em geral. Demonstra que nós somos os profissionais de saúde pública de excelência no mundo”, destacou Bernardo.
Seleção entre 30 agentes comunitários
A experiência é nova para o agente comunitário de saúde atuante da Clínica da Família Bárbara Mosley de Souza, no Anil, inaugurada em 2016. É a primeira vez dele fora do Brasil, representando a SMS-Rio num projeto científico. Para chegar a essa distância, de mais de 11 horas de voo entre o Brasil e Londres, Bernardo passou por um processo seletivo extenso com 30 candidatos de todo o município. O primeiro critério era de um ACS que falasse e entendesse inglês.
A relação com a área da saúde começou em 2007, quando sua mãe iniciou no Programa de Saúde da Família Canal do Anil, que anos depois passou a ser reconhecido como Estratégia Saúde da Família, modelo de cuidado da APS. Morador do Jardim Anil, na zona oeste do Rio, foi nessa época que Bernardo começou a testemunhar, ainda que indiretamente, os serviços da SMS.
A mãe de Bernardo, Maria Auxiliadora, atuou nesta função por 12 anos, até 2019, até se aposentar. Em 2021, Bernardo seguiu os seus passos e começou a trabalhar na saúde. Com saudades da mãe, ele não vê a hora de estar pessoalmente com ela e contar tudo que aconteceu em Londres.
Rio conta com 7.580 agentes comunitários
Ao todo, 7.580 agentes comunitários de saúde atuam no município do Rio. O ACS é o profissional responsável pelo contato direto entre o usuário e a sua unidade básica de saúde de referência. É ele quem cria um vínculo com o paciente, que vai de porta em porta e mantém uma relação próxima de estar disponível para qualquer orientação, é quem vai identificar as necessidades da população, orientar e incentivar a busca por atendimento em saúde quando necessário.
Para a coordenadora de Atenção Primária da região de Jacarepaguá, Barra e Recreio, Patrícia Vaz, o empenho deste trabalho exercido na região da Zona Oeste traz melhores resultados no acompanhamento em saúde e na prevenção de doenças, sendo um importante mobilizador social.
Bernardo é um ótimo exemplo da potência do trabalho dos agentes comunitários de saúde, como protagonistas que são no processo de vigilância, cuidado e comunicação com seus usuários. Não foi por acaso que ele foi selecionado para representar a APS carioca em Londres, na discussão do papel dos ACSs nos sistemas de Saúde no mundo. Isso é motivo de muito orgulho e inspiração para todos nós. Tenho certeza que ele trará na bagagem muito conhecimento e deixará lá sua contribuição”, compartilhou a coordenadora Patrícia Vaz.
Bernardo retornou ao Brasil nesta segunda-feira (11). Ele vê a oportunidade de ser parte de um projeto de pesquisa como um trampolim na carreira:
Espero chegar com toda a bagagem que estou adquirindo aqui e poder enriquecer o trabalho dos colegas, que eu consiga passar a mensagem de que nosso trabalho é de uma magnitude enorme. Só quero que todos tenham consciência que somos muito importantes e necessários na Atenção Primária e no SUS”, conclui.
Fonte: SMS-Rio