A frase ‘isso é coisa de adulto’ não se encaixa quando o assunto é enxaqueca, ainda mais em uma geração que faz uso excessivo de telas desde os primeiros anos de vida – o que pode acelerar um problema que, na maioria das vezes, tem origem na predisposição genética. O diagnóstico é bem mais comum do que muitos pensam.
A neurologista Idele Guimarães observa que cerca de 40% das crianças que são atendidas em seu consultório possuem enxaqueca. De acordo com ela, o uso de telas por longos períodos prejudica o ciclo sono e a vigília, o que desencadeia a dor. Mas ele não é a raiz do problema. Na maioria dos casos, o fator genético é a principal origem da enxaqueca infantil, mas pode ser evitada.
Segundo o neurologista infantil Marco Albuquerque, da Sociedade Brasileira de Neurologia Infantil (SBNI), a cefaleia também ocorre em crianças e adolescentes, sendo que cerca de 60% deles já apresentaram a dor pelo menos uma vez na vida.
Uma revisão no Jornal Paranaense de Pediatria de 2022 também registra que a migrânea (outro nome para a enxaqueca) é uma das cinco doenças crônicas mais prevalentes na infância, afetando cerca de 1,2% a 3,2% das crianças de três a sete anos e 4% a 11% de sete a 11 anos.
“Em estudo sobre a prevalência da cefaleia, foi relatado que cerca de 20% das crianças apresentavam episódios frequentes de cefaleia durante um ano. Muitas vezes, a dor de cabeça não é reconhecida como problema até começar a interferir no dia a dia da criança e também causando prejuízo na escola. Em geral, a causa é benigna, como infecções virais de vias aéreas superiores ou ainda pode ter uma causa primária como a enxaqueca”, ressalta o neurologista.
De acordo com a médica, caso haja algum histórico de enxaqueca na família, é preciso ficar alerta para tentar evitar crises nos filhos, o que, segundo ela, é possível eliminando alguns gatilhos, como: observar stress no ambiente familiar; evitar a exposição a telas de computador ou celulares; beber bastante água; incentivar brincadeiras e exercícios físicos e cuidar da alimentação, evitando excesso de doces, alimentos enlatados e processados.
Sintomas a partir dos 6 anos
As características mais comuns que trazem a um diagnóstico de enxaqueca são a dor pulsátil de média e severa intensidade, unilateral, que pode ser agravada por esforço como caminhar e subir escadas, com duração de quatro a 72 horas quando não tratada com medicamento, e, ainda, acompanhada com pelo menos um desses sintomas, que são náusea, vômito, fotofobia e fonofobia.
Porém, em crianças existem algumas variáveis, segundo informa a neurologista Idele Guimarães. “A enxaqueca infantil apresenta, além da dor de cabeça pulsante frequente, diarreia, cólica abdominal, tonturas, falta de apetite, mudança no comportamento e vômitos mais intensos que podem, inclusive, vir sem cefaleia. Por esse motivo que a criança, até ter um diagnóstico conclusivo de enxaqueca, já passou por diversos médicos, como oculista, gastro, entre outras especialidades, antes de chegar ao neurologista”, explica.
Normalmente, os sintomas costumam aparecer a partir dos seis anos de idade. Para o diagnóstico, é necessário realizar uma análise completa do paciente, onde é observado o estilo de dor de cabeça, o histórico familiar e os sintomas mais comuns, citados anteriormente. “É importante ficar atento a esses quadros e procurar um pediatra ou neurologista para avaliação. E também, e talvez o mais importante, é intervir nesses gatilhos ambientais que podem provocar a crise de enxaqueca. Com essa intervenção evita-se o uso de medicamentos e evita-se que a enxaqueca se torne crônica”, conclui Idele.
Segundo Albuquerque, os sintomas de cefaleia em crianças podem incluir dores de cabeça latejantes, pressão ou aperto na cabeça, náuseas, vômitos, sensibilidade à luz e ao som. É fundamental que os pais estejam atentos aos sinais e sintomas, buscando um diagnóstico adequado e um plano de tratamento individualizado para aliviar a dor e minimizar os impactos na vida da criança.
Além disso, é importante promover hábitos saudáveis, como uma boa higiene do sono, uma dieta equilibrada e a prática de exercícios físicos, que podem ajudar a prevenir e controlar as crises de cefaleia em crianças.
“Uma cefaleia frequente e não tratada pode levar a múltiplos prejuízos psicológicos e sociais: afastamentos da escola, retornos precoces para casa, proibição de atividades físicas. Tudo isso, leva ao surgimento de comorbidades como ansiedade e depressão, principalmente nos adolescentes”, explica Marco Albuquerque.
O especialista faz um alerta. “A automedicação nunca é o melhor caminho, inclusive existe um tipo de dor de cabeça causada pelo abuso de analgésicos”. Segundo ele, ao invés de tomar remédios por conta própria, é preciso procurar um neurologista para descobrir qual é o tipo de cefaleia, como tratá-la e como evitar os “gatilhos” relacionados com alimentação, estresse e outros fatores ambientais.
“Cuidar adequadamente da dor de cabeça é ganhar qualidade de vida, principalmente na infância”, completa o médico.
Com Assessorias