As taxas de sobrepeso e obesidade infantil estão subindo rapidamente no cenário mundial e vêm preocupando os pais e médicos a cada ano que passa. A Organização Mundial da Saúde estima que, em 2025, cerca de 75 milhões de crianças estarão obesas. No Brasil, atualmente, uma em cada três crianças de 5 a 9 anos estão acima do peso, de acordo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Notificações do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional, de 2019, revelam ainda que 16,33% das crianças brasileiras entre 5 e 10 anos estão com sobrepeso; 9,38% com obesidade; e 5,22% com obesidade grave. Em relação aos adolescentes, 18% apresentam sobrepeso; 9,53% são obesos; e 3,98% têm obesidade grave. Entre os adolescentes, os números também são preocupantes: 18% apresentam sobrepeso, 9,53% são obesos e 3,98% têm obesidade grave.
Os números são realmente preocupantes se pensarmos que estamos vivendo uma pandemia há um ano, com escolas fechadas, rotinas completamente diferentes e ansiedade alta. Além disso, com a dificuldade econômica, o acesso a uma alimentação mais equilibrada e saudável, também está mais difícil. Com a alta dos preços dos alimentos, muitas pessoas acabam substituindo alimentos ricos em nutrientes por opções industrializadas e com excesso de açúcar e gorduras.
Estamos vivendo um momento muito atípico no mundo, mas é importante alertar que a obesidade infantil é um problema antigo e que precisa de mais atenção tanto dos pais como dos nossos líderes políticos, com ações como merendas mais saudáveis e ricas em nutrientes, além de uma educação alimentar”, explica a pediatra Felícia Szeles.
O sobrepeso infantil apresenta riscos à saúde da criança e pode comprometer sua qualidade de vida na fase adulta, desencadeando problemas respiratórios, colesterol, enxaquecas, diabetes, entre outras complicações. Como prevenir e combater a obesidade infantil? A melhor forma ainda é a prevenção.
A prevenção está relacionada a diversos fatores, sendo um dos principais a amamentação. De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), no país, a amamentação exclusiva, dura em média 51 dias, ou seja, menos de dois meses. A recomendação é que seja realizada até os dois anos de idade, ainda que, muitas vezes, se introduza alimentação láctea já no primeiro ano de vida.
Na sociedade moderna, os profissionais de saúde infantil têm uma importante missão: o controle e a prevenção do excesso de peso e das dificuldades alimentares na infância e na adolescência”, destaca Tulio Konstantyner, Mestre e Doutor em Ciências Aplicadas à Pediatria pela EPM/UNIFESP e Coordenador Científico da Força-Tarefa Nutrição da Criança do ILSI Brasil.
Pediatra alerta para estilo de vida sedentário
Além da alimentação, outro fator importante para o sobrepeso infantil é o estilo de vida das crianças e adolescentes, que estão cada vez mais sedentários por conta do excesso de telas e poucos estímulos físicos na rotina familiar. Os tempos também são outros, isso é fato: a nova geração não brinca na rua como a geração de seus pais, que jogavam bola na rua, brincavam de pega-pega ou tinham que exercitar a mente com brincadeiras criativas para ocupar o tempo.
As telas são, sem dúvida nenhuma, um dos fatores que mais facilitam o sedentarismo e, consequentemente, a obesidade. E com a pandemia, isso só piorou, já que a maioria das crianças acorda e já vai para as aulas online ou para o desenho. O desafio para os pais é grande, mas é preciso impor limites pensando na saúde e qualidade de vida dos pequenos. Por mais chato que seja ver a criança chorar ou fazer manha querendo as telas, vale a pena segurar agora para garantir mais saúde e qualidade de vida para os pequenos”, ressalta a pediatra Felícia Szeles.
O papel fundamental das famílias
A alimentação tem papel fundamental em todas as etapas da vida, especialmente nos primeiros anos, decisivos para o crescimento e desenvolvimento da criança, quando são formados os hábitos alimentares.
Aumentar o aleitamento materno na infância e limitar o consumo de alimentos ricos em açúcar e gordura, como refrigerantes, biscoitos e fast food também é essencial para evitar que crianças se tornem obesas e para reduzir os níveis atuais da doença, alerta a Federação Mundial de Obesidade.
Para a a nutricionista Luanna Caramalac Munaro, especialista em adequação nutricional e comportamental, a família tem papel fundamental para poder mudar todo esse cenário e prevenir a obesidade infantil.
É necessário que a Educação Nutricional seja incluída nas famílias. Pais e mães que incentivam e promovem bons hábitos alimentares aos filhos contribuem para o desenvolvimento de bons costumes até na vida adulta deles”, diz
De acordo com a profissional, a família é exemplo e espelho às crianças. “Os pais devem privilegiar a alimentação saudável para eles e para as crinaças. É comum ver os pais cobrarem bons hábitos dos filhos, mas muitos deles não se alimentam bem. Antes de querer que o filho coma, é preciso da o exemplo. Via de regras os filhos seguem o padrão de comportamento dos pais na alimentação. Se os pais não têm uma alimentação saudável, dificilmente os filhos terão”, explica.
Também é essencial que a criança participe da preparação desses alimentos, isso ajuda a trazer consciência da importância de ter uma alimentação mais saudável. “Participar do processo e incentivar a criança a gostar fica menos impositivo e mais participativo. Esse contato com a preparação dos alimentos amplia a percepção dos bons hábitos”, finaliza a especialista.
Guia alimentar de bolso para crianças menores de 2 anos
Para apoiar pais e responsáveis nessa missão, o Ministério da Saúde lançou o Guia Alimentar de bolso para crianças menores de dois anos. A versão reduzida pretende facilitar o cuidado com a alimentação dessas crianças. O guia reúne as principais recomendações sobre aleitamento, introdução à alimentação complementar e escolha de alimentos saudáveis.
Os desafios do cotidiano na alimentação da criança pequena são abordados na publicação, que teve a edição completa lançada em 2019, voltada para orientar famílias, responsáveis e profissionais de diversas áreas sobre aleitamento materno e alimentação saudável. Ao acessar o conteúdo, o leitor também poderá conhecer mais sobre direitos relacionados à alimentação infantil, além de recomendações sobre habilidades culinárias.
Em janeiro, a pasta também lançou uma versão resumida do Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de 2 anos, disponível em formato eletrônico.
AMAMENTAÇÃO E OBESIDADE INFANTIL NO BRASIL
Apesar da prática da amamentação ter aumentado no Brasil, sua duração ainda está abaixo do recomendado. Um agravante é o fato de as crianças estarem sendo expostas muito cedo aos alimentos ultraprocessados, que prejudicam a saúde. A exposição a esses produtos tem ocorrido já nos primeiros anos de vida, com consumo de pouca variedade de alimentos saudáveis, como frutas e verduras ou minimamente processados.
A obesidade infantil traz sérios prejuízos à saúde, com desdobramentos na idade adulta. Além de aumentar os riscos futuros, crianças e adolescentes obesos podem apresentar dificuldades respiratórias, aumento do risco de fraturas, hipertensão, doenças cardiovasculares, diabetes, câncer e efeitos psicológicos, como baixa autoestima, isolamento social, transtornos alimentares, entre outros.
DIREITO À ALIMENTAÇÃO
A nutricionista Gisele Bortolini, coordenadora de Alimentação e Nutrição da Secretaria de Atenção Primária, do Ministério da Saúde, destaca que o novo formato convida a população a conhecer mais sobre alimentação saudável e a se apropriar da discussão sobre o direito à alimentação e incluir mais hábitos saudáveis na rotina alimentar das famílias com crianças menores de 2 anos.
O guia é um documento importante porque, no Brasil, a alimentação, assim como a saúde, é um direito. O guia alimentar tem como diretriz orientar sobre uma alimentação saudável e, a partir dela, espera tornar a fase da introdução da alimentação complementar, a partir dos 6 meses de vida, mais tranquila para pais, famílias, cuidadores e profissionais da área”, ressalta Bortolini.
Hoje, 60% dos brasileiros adultos têm excesso de peso. E essa condição está atrelada a uma complexa rede de determinantes, que inclui a alimentação inadequada. Por isso, a nutricionista reforça a necessidade de investirmos em ações de prevenção e controle da obesidade infantil.
O ambiente onde vivemos determina as escolhas alimentares, se eu vou comer algo saudável ou se eu vou conseguir fazer atividade física. Então, para prevenir todas as formas de má nutrição, precisamos de um conjunto de políticas públicas que garanta um alimento saudável desde a produção e o acesso até o consumo para todos os brasileiros”, afirma.
AÇÕES DE PROMOÇÃO DA SAÚDE
Ao investir na produção de publicações como os Guias Alimentares, o Ministério da Saúde reforça o compromisso com a promoção da alimentação adequada e saudável para a população brasileira e reafirma a aliança com pesquisadores para o desenvolvimento de políticas, ações e programas baseados em evidências científicas confiáveis e de qualidade.
A má alimentação está no topo do ranking dos fatores de risco relacionados à carga global de doenças que mais contribuem para a mortalidade, ocupando a segunda posição. No Brasil, os alimentos ultraprocessados contribuem com cerca de 15% das calorias consumidas, com destaque para industrializados, seguidos dos doces.
O tema é de interesse público. Por isso, a versão simplificada e gratuita, somada ao conteúdo de fácil navegação, facilita o acesso a um material de rápida leitura não apenas para profissionais, gestores e pesquisadores, mas também para a população em geral.
Hoje, quando optamos por desenvolver guias e manuais breves e resumidos, temos mais chance de alcançar um maior número de pessoas, pois o problema pode ser a falta de tempo na leitura e não de interesse”, ressalta Bortolini.
12 passos para alimentação saudável até 2 anos
1. Amamentar até 2 anos ou mais, oferecendo somente o leite materno até 6 meses.
2. Oferecer alimentos in natura ou minimamente processados, além do leite materno, a partir dos 6 meses.
3. Oferecer à criança água própria para o consumo em vez de sucos, refrigerantes e outras bebidas açucaradas.
4. Oferecer a comida amassada quando a criança começar a comer outros alimentos além do leite materno.
5. Não oferecer à criança até 2 anos de idade açúcar nem preparações ou produtos que contenham açúcar.
6. Não oferecer à criança alimentos ultraprocessados.
7. Cozinhar a mesma comida para a criança e para a família.
8. Zelar para que a hora da alimentação da criança seja um momento de experiências positivas, aprendizado e afeto junto da família.
9. Prestar atenção aos sinais de fome e saciedade da criança e conversar com ela durante a refeição.
10. Cuidar da higiene em todas as etapas da alimentação da criança e da família.
11. Oferecer à criança alimentação adequada e saudável também fora de casa.
12. Proteger a criança da publicidade de alimentos.
Pequenas atitudes que incentivam uma vida mais saudável
- Use e abuse dos alimentos coloridos. As cores estimulam as crianças, facilitando a ingestão de verduras, legumes e frutas;
- Ofereça água várias vezes ao dia, seu filho pode achar que está com fome e muitas vezes ele está com sede.
- Não dê suco de rotina. Mesmo os naturais são muito calóricos e possuem poucas fibras.
- Evite falar: “você tem que comer isso”. No lugar, coloque no prato de todos da casa e coma junto, o exemplo vale mais que mil palavras;
- Sempre introduza novos alimentos – pode ser tipo ou forma de preparo -isso favorece a aceitação e dificulta a seletividade ;
- Faça da refeição um momento agradável. Comer sempre que possível em família e respeitar os sinais de saciedade de cada criança. Lembra-se que a quantidade que você acha ideal pode ser muito para seu filho;
- Leve seu filho à feira, deixe ele conviver com aquela variedade linda de cores e sabores. Deixe ele escolher o que quer experimentar, cheirar, tocar. Se sentir útil e importante já é meio caminho andado;
- Limite horários para as telas, evitando pelo menos duas horas antes de dormir. Dormir bem também é importante no combate à obesidade;
- Reserve um tempo para brincadeiras mais ativas, em pé, correndo, dançando ou fazendo algum esporte. Faça também alguma atividade física, atitudes saudáveis inspiram e estimulam;
- Insira a criança em rotinas da casa, como por exemplo: peça ajuda para guardar os brinquedos, arrumar a cama ou mesmo lavar as frutas e saladas;
- Não faça estoque de bolachas, refrigerantes e doces. É muito mais fácil falar que não tem do que não pode;
- Evite ao máximo o consumo de frituras
Como evitar as consequências na vida adulta?
Quais são as estratégias para combater a doença, que pode gerar graves consequências para a saúde também na vida adulta? A nutricionista Ana Paula Black Dreux ressaltou que a atuação de seus colegas de profissão é realizada em ações multivariadas, com profissionais de saúde e governo, levando em consideração, também, a influência do ambiente escolar, da qualidade do sono e dos hábitos dos pais e/ou criadores.
Condutas na melhora da alimentação e estilos de vida dos progenitores podem, também, ser vistas como uma oportunidade para mudança dos hábitos familiares como um todo, inclusive, na introdução de alimentos saudáveis, preferencialmente, in natura para a criança”, recomendou a Dra. Ana Paula.
Qual é o consumo ideal de alimentos lácteos?
Ainda como forma de prevenção da obesidade infantil, a introdução da alimentação láctea para crianças deve ter acompanhamento de um profissional da saúde. Em julho de 2020, a Associação Brasileira de Nutrologia (Abran) publicou um consenso sobre consumo de alimentos lácteos de crianças com idades entre 1 e 5 anos.
Neste documento, a associação concluiu que as recomendações brasileiras atuais sugerem o consumo de três porções de produtos lácteos por dia para crianças com idade entre 1 e 3 anos e reconhecem a importância desses alimentos para a saúde nutricional. Entretanto, não há regulamentação específica no Brasil para produtos lácteos para esta fase da vida.
Ainda de acordo com o documento, é justamente na fase da pré-escola em que há uma maior prevalência da obesidade, sendo um dos fatores contribuintes para este aumento, o consumo excessivo de proteínas e calorias.
Segundo Tulio Konstantyner, “o consumo alimentar equilibrado nos primeiros cinco anos de vida, com a ingestão de nutrientes como: cálcio, ferro, zinco, vitaminas A e D e ácidos graxos poli-insaturados, de acordo com as recomendações diárias, é uma das estratégias para reduzir as taxas de obesidade e de erros alimentares e suas consequências a longo prazo” .
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