A mastectomia é a retirada da mama, de forma parcial ou total, para remover ou prevenir o câncer de mama. A cirurgia extremamente invasiva e mutiladora pode ter suas cicatrizes minimizadas por uma cirurgia plástica, a chamada reconstrução mamária. Esse procedimento é garantido por lei desde 2013 para mulheres submetidas a mastectomia por causa do tumor. No entanto, essa cirurgia ainda não é realidade para boa parte das brasileiras que passaram pela doença. Apenas um terço delas consegue reconstruir a mama.
Monitoramento realizado por pesquisadores da Rede Brasileira de Pesquisa em Mastologia, em parceria com a Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), revela que, na última década, mais de 110 mil mulheres brasileiras foram submetidas à mastectomia pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em todo Brasil, como parte do tratamento do câncer de mama. Paralelamente, nesse mesmo período, aproximadamente 25 mil delas foram submetidas à reconstrução mamária, um crescimento em número absoluto até 2014.
A partir daí, no entanto, houve uma discreta redução até 2017. E se a queda já vem se mantendo nos últimos anos, em 2020, o impacto foi ainda maior por conta da pandemia, o que agrava ainda mais o cenário. Neste momento, em que se completa oito anos da Lei 12.802/2013 – que garante reconstrução mamária a mulheres mastectomizadas por câncer de mama – , vale o alerta para as autoridades.
Crise da Covid-19 impactou reconstrução mamária
De acordo com Ruffo de Freitas Junior, que está à frente das pesquisas e monitoramento da Rede Brasileira de Pesquisa em Mastologia, o principal motivo para essa queda pode ser atribuído às dificuldades financeiras que o país passou, impactando negativamente no número de cirurgias oncológicas e nas reconstruções mamárias. As cirurgias de mastectomia, por exemplo, caíram aproximadamente 30% na última década.
Por outro lado, o percentual da taxa de reconstrução mamária (razão de reconstruções pelo número total de mastectomias, multiplicados por 100, a cada ano), que em 2008 foi de 14,9%, continuou estável até 2012; em 2014 era de 29,3%; e passou a aumentar a partir da implantação da Lei de Reconstrução Mamária, em 2013. Em 2017, aproximadamente 34% das mulheres em 2017 realizaram a reconstrução mamária.
Segundo Ruffo, o percentual passa a subir consideravelmente de modo que, em 2017, já totalizava mais do que um terço das mulheres submetidas à mastectomia tendo realizado a reconstrução mamária. “Em outras palavras, aproximadamente 34% das mulheres em 2017 realizaram a reconstrução mamária”, explica Ruffo.
Mas esse número poderia ser melhor se não tivesse ocorrido queda das cirurgias oncológicas. “Se não fosse a diminuição dessas cirurgias, a taxa de reconstrução poderia estar em aproximadamente 44%”, completa o médico, acrescentando que, embora ainda não haja dados compilados, certamente a necessidade do isolamento social e as constantes suspensões de cirurgias ao longo da pandemia pesou para acentuar essa queda.
Presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia, Vilmar Marques acrescenta que é primordial que as pacientes continuem sendo atendidas e não interrompam o seu tratamento. Ele lembra que, enquanto o governo segue a passos lentos em relação aos investimentos para o tratamento do câncer de mama, como é o caso das cirurgias, entidades como a SBM e SBCP vêm realizando ações para que seja possível aumentar a taxa de reconstrução. “Há ainda um longo caminho a ser percorrido para que a lei seja implementada na sua totalidade e todas as pacientes sejam contempladas”, concluiu.
Femama: ‘reconstrução não é cirurgia eletiva’
Em abril, a Lei da Reconstrução Mamária, que prevê o direito a cirurgia reparadora após a retirada total ou parcial da mama devido ao tratamento de câncer, completou oito anos de vigência. A Lei nº 12.802, de 2013, declara que a paciente tem direito a realizar o procedimento através do Sistema Único de Saúde (SUS) imediatamente após a retirada da mama com câncer, na mesma cirurgia, se houver condições clínicas, ou assim que a paciente apresentar os requisitos necessários.
Mas, ao fazer aniversário, a lei também sofreu com o impacto da pandemia da Covid-19. Na avaliação da médica mastologista Maira Caleffi, presidente da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), a chegada da Covid-19 ao Brasil, em 2020, adicionou uma variante problemática a essa equação pois diminuiu a possibilidade de cirurgias eletivas, aumentou dificuldades já antigas e ampliou a desigualdade no acesso.
“Enquanto há pacientes do sistema privado de saúde conseguindo fazer a reconstrução imediatamente após a mastectomia, há outras no SUS em que essa possibilidade nem é oferecida, afetando sua autoestima e, muitas vezes, fazendo com que a mulher nem consiga se olhar no espelho”, afirma a especialista.
Entenda a Lei da Reconstrução Mamária
A médica mastologista Maira Caleffi diz que a lei é uma conquista da Femama e suas associadas para contemplar esse procedimento imediato, sempre que possível por meio de alteração na Lei nº 9.797/1999, que determinava que pacientes mastectomizadas tinham direito à cirurgia reparadora na rede pública de saúde, porém sem prazo especificado.
“Imediata ou não, a cirurgia de reconstrução é um direito de toda paciente de câncer de mama que passou por mastectomia durante o tratamento da doença. Essa cirurgia plástica não pode ser considerada um procedimento eletivo (sem urgência), e sim parte do tratamento do câncer de mama, nem em tempos de pandemia por coronavírus”, reafirma a presidente da Femama. Segundo ela, esse acompanhamento e orientação médica são muito importantes.
“Esse direito deve ser exigido junto ao SUS e aos planos de saúde e discutido com o médico antes da realização da cirurgia ou a qualquer momento após o procedimento de retirada do tumor, no caso de uma reconstrução tardia. A cirurgia devolve para a mulher a imagem corporal e a autoestima”, comenta Dra Maíra, que é presidente voluntária da Femama.
Só 27% das mastectomizadas conhecem lei
Mesmo considerando que fazer a reconstrução mamária é uma decisão unicamente da paciente, há um desconhecimento dessa possibilidade garantida por lei, de maneira geral. De acordo com pesquisa da Femama, realizada em 2018, em parceria com o Hospital Moinhos de Vento, a Johnson & Johnson Medical Devices e o instituto Ideafix, somente 27,6% das mulheres que passaram pela mastectomia afirmaram conhecer bem a Lei da Reconstrução Mamária.
Dessas que conhecem a lei, 71,9% optaram por passar pelo procedimento, enquanto entre as que nunca tinham ouvido falar da legislação, essa taxa ficou em 38,9%. O DataSUS aponta que a proporção é de apenas uma cirurgia de reconstrução a cada 7,5 mastectomias realizadas, em média, nos últimos anos.
Há ainda outros direitos mais recentes, como a Lei 13.770/2018, que permite também realizar o procedimento de simetrização da outra mama e a reconstrução do complexo aréolo-mamilar.
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Para o cirurgião plástico Luís Felipe Maatz, especialista em Reconstrução Mamária pelo Hospital Sírio-Libanês e MS, já no início de 2021, os sinais de recuperação na procura por cirurgias de reconstrução mamária foram perceptíveis, com um aumento de quase 50% na procura por procedimentos, em comparação com o mesmo período do ano passado.
“A mama é uma das principais marcas externas da feminilidade, e a sua perda, parcial ou total, traz prejuízos na imagem corporal e no psicológico. Quando o cirurgião plástico realiza a reconstrução mamária, atua de maneira significativa na melhora da autoestima da mulher”, afirma Maatz, que é membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP).
O médico explica que, após a mastectomia, a reconstrução mamária é realizada através de várias técnicas que tentam restaurar a mama, considerando forma, aparência e o tamanho. Segundo ele, a reconstrução envolve vários procedimentos realizados em múltiplos estágios. Saiba como são as etapas, de acordo com as normas da SBCP:
Etapa 1 – Anestesia
Medicamentos são administrados para o seu conforto durante o procedimento cirúrgico. As opções incluem sedação intravenosa e anestesia geral. Seu médico irá recomendar a melhor opção para você.
Etapa 2 – Técnicas de retalhos com músculo, gordura e pele próprios da paciente para criar ou cobrir o local da mama
Às vezes, a mastectomia, ou o tratamento com radiação, podem deixar tecido insuficiente na parede torácica para cobrir e sustentar o implante mamário. O uso de implante mamário para reconstrução exige quase sempre uma ou demais técnicas de retalho ou expansão de tecido.
O retalho TRAM usa como doador músculo a gordura e a pele do abdômen da paciente para reconstruir a mama. O retalho pode permanecer com o suprimento sanguíneo original e ser tunelizado (criar um acesso) para ser posicionado na caixa torácica ou ser completamente separado para formar a nova mama.
Como alternativa, o cirurgião pode escolher o DIEP, ou técnicas de retalhos SGAP, que não usam músculo, mas tecido do tórax posterior ou da nádega. O retalho do latissimus dorsi utiliza músculo, gordura e pele tunelizados no local da mastectomia, permanecendo com seu suprimento sanguíneo original.
Ocasionalmente, o retalho pode reconstruir a mama, mas, muitas vezes, fornece o músculo e o tecido necessários para cobrir e sustentar o implante mamário.
Etapa 3 – Expansão da pele saudável para dar cobertura a um implante mamário
Reconstrução com expansão do tecido permite recuperação mais rápida que os procedimentos utilizando retalhos. No entanto, é um processo de reconstrução mais demorado. Este procedimento requer muitos retornos ao consultório, por 4 a 6 meses, após a colocação do expansor, para enchê-lo através de uma válvula interna e expandir a pele. Um segundo procedimento cirúrgico será necessário para substituir o expansor, que não é concebido para servir como implante permanente.
Etapa 4 – Cirurgia de colocação do implante mamário
O implante mamário pode ser um complemento ou uma alternativa para técnicas de retalhos. Implantes de silicone estão disponíveis para a reconstrução. O cirurgião irá lhe ajudar a decidir qual alternativa é melhor para você. Reconstrução com implantes geralmente requerem expansão de tecido
Etapa 5 – Enxertos e demais técnicas especializadas para criar o mamilo e a aréola
A reconstrução da mama é finalizada através de uma variedade de técnicas para reconstruir o mamilo e a aréola. Os resultados finais da reconstrução pós mastectomia podem ajudar a minimizar o impacto físico e emocional da mastectomia. Com o tempo, certa sensibilidade na mama pode voltar, e as cicatrizes tendem a melhorar, embora nunca desaparecerão completamente.
“Há algumas limitações, mas a maioria das mulheres acha que são pequenas em comparação à melhoria em sua qualidade de vida. Monitoração cuidadosa da saúde da mama através do autoexame, mamografia e demais técnicas de diagnóstico é essencial para sua saúde a longo prazo. Vale lembrar que, antes de decidir realizar a reconstrução mamária, é fundamental buscar sempre um médico comprovadamente qualificado, experiente e que seja membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica”, finaliza Dr. Luís Felipe Maatz.
Com Assessorias
Boa tarde .Fiz mastectomia da mama esquerda fica muito maior que a outra vai fazer uns seis meses ainda sinto muita dor na mama e no obdome .Poderia optar por prótese depois de feito a reconstrução
Fiz a reconstrução mamária há 2 anos , agora está dando necrose por dentro ,já fiz vários procedimentos e não deu resultado,o médico não quer fazer a retirada,tem algum outro procedimento para isso?