O Dia de Combate à Poluição por Agrotóxicos, lembrado neste 11 de janeiro, chama atenção para a conscientização sobre os impactos que o seu uso pode provocar para a saúde humana e o meio ambiente. Dados do “Atlas dos Agrotóxicos” – divulgados em dezembro de 2023 pela Fundação Heinrich Böll – mostram que esses produtos são associados ao risco aumentado para câncer de fígado e de mama, diabetes tipo 2, asma, obesidade, entre outras doenças.

Um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo, o Brasil, desde o ano de 2016, tem batido consecutivos recordes na série histórica de registro de agrotóxicos, que teve início em 2000. O “Atlas dos Agrotóxicos” revela em 2022, foram 652 agrotóxicos liberados, sendo 43 princípios ativos inéditos. E a expectativa é de que esse número aumente, como alerta a Fundação Heinrich Böll.

No último dia 28 de dezembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei que flexibiliza o registro de novos agrotóxicos no Brasil. O texto original, conhecido como PL do Veneno, sofreu alguns vetos pelo presidente, entre eles sobre a exclusividade do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) para coordenação das reanálises dos riscos dos pesticidas.

Com o veto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) permanecem responsáveis, junto ao Mapa, sobre esses pedidos técnicos de reanálises. (Veja mais informações sobre o “Atlas dos Agrotóxicos” neste link).

Agrotóxicos contribuem para perda da biodiversidade mundial

A publicação apresenta ainda fatos que indicam que o uso de agrotóxicos foi identificado como uma das causas da deterioração rápida e desastrosa da abundância de diversas espécies animais e vegetais. Pesquisadores e estudiosos são categóricos ao afirmar que os agrotóxicos desempenham um papel significativo na perda direta e indireta da diversidade biológica mundial.

O controle de ervas daninhas por herbicidas de amplo espectro, como o glifosato, leva à dizimação de flores e brotos e, portanto, à escassez de alimentos para insetos que se alimentam de flores e ervas silvestres. Em 2017, as vendas totais de glifosato foram estimadas em mais de 46 mil toneladas em toda a União Europeia. No mesmo ano, no Brasil, 173 mil toneladas do ingrediente ativo foram vendidas.

Como as espécies de plantas selvagens nos campos são fontes importantes de néctar e de pólen, seu declínio como resultado do manejo intensivo com herbicidas também pode gerar um enorme impacto na diversidade e abundância de insetos na paisagem agrícola dominada por terras aráveis.

O declínio acentuado de insetos em áreas agrícolas foi documentado por muitos estudos. Um deles, publicado em 2017 encontrou agrotóxicos no mel do mundo todo e revelou que 75% de todas as amostras continham pelo menos um neonicotinoide, considerado muito tóxico para insetos polinizadores como as abelhas.

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Outro levantamento, realizado pela organização alemã BUND, revelou que mais da metade das amostras apresentavam resíduos de agrotóxicos como acetamiprido ou tiacloprido. Com base nos dados disponíveis, o tiacloprido foi classificado como provavelmente carcinogênico em humanos.

Baseando-se em reportagens publicadas entre 2022 e 2023, o “Atlas dos Agrotóxicos” mostra que o uso dos pesticidas pode ter provocado a morte de mais de 300 milhões de abelhas, ameaçando a polinização natural das plantas e, consequentemente, das plantações. Responsável pela publicação, a Fundação Heinrich Böll mostra que, com a perícia, ficou constatado que, na maioria dos casos, o contaminante foi o agrotóxico fipronil.

As variações de agrotóxicos têm impactos diferentes sobre os insetos. Embora sejam usados para “proteger” as plantas de pragas, os agrotóxicos prejudicam todos os insetos, incluindo os benéficos. Como esses produtos químicos matam os inimigos naturais das pragas agrícolas (joaninhas, moscas voadoras e crisopídeos, por exemplo), pragas como os pulgões se recuperam mais rapidamente.

No entanto, uma única joaninha pode comer cerca de 50 pulgões por dia e cerca de 40 mil em toda a sua vida. Esses insetos chamados benéficos reduzem a necessidade do uso de agrotóxicos caros e horas de trabalho dos agricultores.

Os agrotóxicos representam uma ameaça não só para os insetos, mas também para a economia: os serviços de polinização prestados por eles equivalem a 153 bilhões de euros por ano. Dentre a perda de colheita ameaçada pela ausência de polinização por animais destacam-se a abóbora, melancia, cacau e castanha do Pará, amêndoa, pepino, cereja, maçã e ameixa.

Palavra de Especialista

Fertilizante e agrotóxico são a mesma coisa?

Por Valter Casarin*

Em 28 de dezembro, quando o Presidente da República realizou alguns vetos na nova Lei dos Agrotóxicos, aprovada no Senado, a Nutrientes para a Vida (NPV) recebeu diversas mensagens sobre como ficará a situação dos fertilizantes no Brasil. Mas o primeiro e importante esclarecimento, é entender que fertilizante não é um agrotóxico. Estamos tratando de dois importantes produtos usados na agricultura, mas que possuem funções diferentes.

O registro de um fertilizante é realizado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), enquanto os agrotóxicos têm seu registro regulamentado por 3 órgãos: Mapa, Ministério do Meio Ambiente (representado pelo Ibama) e Ministério da Saúde, representado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

De maneira bem simples, o agrotóxico é usado para eliminar, prevenir ou controlar tudo que impede o crescimento de um vegetal. Por outro lado, os fertilizantes, ou adubos, favorecem o crescimento dos vegetais, permitindo melhores produções. Assim, podemos colocar esses dois produtos em lados opostos, com funções totalmente diferentes.

De fato, os agrotóxicos consistem em destruir tudo que pode prejudicar o desenvolvimento de um vegetal, como é o caso dos insetos, das plantas daninhas e de doenças fúngicas e bacterianas. Para tanto, são usados os herbicidas (contra as ervas que competem com as culturas), os inseticidas (contra insetos) e os fungicidas (contra os fungos).

Isso se assemelha como as mesmas situações que encontramos em nosso cotidiano, onde controlamos os insetos dentro de casa usando inseticidas contra o pernilongo (transmissor da dengue, zika e chikungunya) ou prevenimos doenças com o uso de vacinas (gripe, febre amarela e mais recentemente o Covid).

No que concerne aos fertilizantes, ou adubos, eles têm um objetivo totalmente diferente dos agrotóxicos, pois sua função é favorecer o crescimento das plantas, fornecendo os nutrientes que permitem o seu crescimento e desenvolvimento. Além disso, os fertilizantes permitem igualmente proteger as plantas contra certas doenças. Se fizermos uma analogia com os seres humanos, os fertilizantes são o alimento, pois é através dele que obtemos os nutrientes necessários para o nosso crescimento e nossa saúde.

A utilização de fertilizantes permite um melhor crescimento das culturas agrícolas e, consequentemente, uma maior produção de alimentos. Por outro lado, os agrotóxicos reduzem os fatores de riscos de perdas da produção, como é o caso dos insetos e plantas daninhas e, igualmente, como um medicamento contra doenças.

Principais diferenças entre agrotóxicos e fertilizantes

  • Os agrotóxicos são produtos químicos utilizados para matar ou controlar pragas e doenças, enquanto os fertilizantes são substâncias utilizadas para enriquecer o solo com nutrientes;
  • Os agrotóxicos são usados ​​para proteger as plantas dos danos dos insetos e doenças, enquanto os fertilizantes são usados ​​para ajudar as plantas a crescer;
  • Os pesticidas podem prejudicar o meio ambiente e a saúde humana se não forem usados ​​corretamente, enquanto os fertilizantes são geralmente seguros quando usados ​​de acordo com as instruções;
  • Os pesticidas podem basear-se na sua química, atividade toxicológica e penetração, enquanto os fertilizantes são compostos inorgânicos e orgânicos, naturais ou sintéticos, que fornecem ao solo nutrientes necessários para o desenvolvimento das plantas;
  • Aplicação de agrotóxicos exige o uso de EPI (Equipamento de Proteção Individual), ou seja, o uso de máscaras protetoras, óculos, luvas impermeáveis, chapéu impermeável de abas largas, botas impermeáveis, macacão com mangas compridas e avental impermeável. A aplicação de fertilizante não exige o uso de EPI.

Segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária, o país é responsável por cerca de 8% do consumo global de fertilizantes, ocupando a quarta posição, atrás apenas da China, Índia e dos Estados Unidos. Soja, milho e cana-de-açúcar respondem por mais de 73% do consumo de fertilizantes no Brasil.

*Valter Casarin é coordenador geral e científico da NPV – Nutrientes para a Vida

 

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