Há décadas um inimigo quase invisível atormenta a vida de milhões de brasileiros. E se tornou quase invencível com o avanço das mudanças climáticas, fortalecendo-se a cada temporada, principalmente no Brasil. O combate ao mosquito Aedes aegypti, que transmite uma velha e conhecida doença dos brasileiros – a dengue – mobiliza uma verdadeira indústria no mundo todo, especialmente no Brasil.

A dengue é o exemplo mais drástico de uma doença infecciosa sensível ao clima. Seu aumento na expansão geográfica e maiores taxas de transmissão estão diretamente relacionados ao aumento das temperaturas e outras mudanças ambientais, e milhões de pessoas estão em risco”, afirmam os organizadores do Forecasting Healthy Futures, fórum global que acontece esta semana no Rio de Janeiro, para discutir os impactos das mudanças climáticas na saúde.

No Brasil, foram mais de 6,5 milhões de casos prováveis de dengue no ano passado e 5.872 mortes confirmadas até dezembro. Nos primeiros meses deste ano, São Paulo lidera os números, com 375 mil casos prováveis e 238 das 322 mortes confirmadas no país.

Diante deste cenário, a cada dia surgem novas ‘fábricas de mosquitos’ com a bactéria Wolbachia, capaz de combater a proliferação de insetos com o vírus da dengue e outras arboviroses que assustam os brasileiros, como zika, chicungunya e febre amarela urbana. O método Wolbachia é reconhecido mundialmente como uma tecnologia segura, sustentável e que comprovadamente reduz de forma significativa a transmissão da dengue pelo mosquito Aedes aegypti.

Mosquito é ‘estrela’ do fórum sobre saúde e clima no Rio

O mosquito da dengue se tornou um dos ‘personagens’ principais dos debates no Forecasting Healthy Futures Global Summit. A iniciativa, aliás, surgiu há quatro anos inicialmente para discutir soluções para o enfrentamento do mosquito e se expandiu para falar de doenças negligenciadas e tantos outros impactos da crise climática  para a saúde humana nos países que sediam anualmente os encontros COP.

Não à toa, o evento global que acontece  no Rio de Janeiro conta com apoio de empresas e instituições que desenvolvem novas tecnologias para prevenção e combate ao Aedes aegypti. Como a  Oxitec, uma das patrocinadoras do FHF Global Summit, e especialista em produzir mosquitos que não transmitem a dengue e outras doenças.

Presente no primeiro dia do fórum, Vida e Ação conversou com Natália Ferreira, diretora executiva da Oxitec – multinacional criada na Universidade de Oxford, na Inglaterra – que investe em Campinas, no interior de São Paulo, no que espera ser a maior fábrica para produção de mosquitos com Wolbachia do mundo.
A empresa se prepara para atender à demanda não apenas o Brasil, mas também de outras regiões afetadas pela dengue na América Latina e na região da Ásia-Pacífico.  Natália diz que a unidade terá capacidade para beneficiar até 100 milhões de pessoas anualmente. A meta é proteger da dengue mais de 1 bilhão de pessoas até 2040.

Tecnologia de Wolbachia de Substituição

Com o aumento dos casos de dengue a nível global, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou aos países que ampliem o acesso à Tecnologia de Wolbachia de Substituição (WRT, na sigla em inglês).

Diante deste apelo, a Oxitec lançou em 2024 a plataforma Sparks, que aproveita a infraestrutura moderna, os métodos de fabricação avançados e os sistemas de implementação em escala da empresa para acelerar o fornecimento e reduzir os custos. Sparks é como a Oxitec batizou seus mosquitos com a bactéria Wolbachia.

Especializada no controle biológico de pragas, a Oxitec é responsável por tecnologias já conhecidas como o ‘Aedes do Bem’, que ajudou a controlar a infestação de mosquitos nos estúdios do Projac, em Jacarepaguá, na zona oeste do Rio de Janeiro. Segundo a empresa, o sistema já está protegendo comunidades, empresas, escolas, hospitais e outros estabelecimentos no Brasil que buscam um controle eficaz de mosquitos.
Assim como fizemos com o Aedes do Bem, e uma vez que tenhamos a aprovação dos reguladores, começaremos a implantação pelo Brasil, fornecendo suporte confiável e rápido às cidades na linha de frente da crise da dengue”, afirma Natália.

Paraná também anuncia maior biofábrica de mosquitos do mundo

Biofábrica de mosquitos Wolbitos para combate à dengue em Curitiba (Foto: Gabriel Rosa/AEN)
No Sul do país, outra biofábrica construída em Curitiba deve entrar em operação em 2025, com uma expectativa de produção de cerca de 100 milhões de ovos de mosquitos por semana. A previsão é de que, ao longo de 10 anos de atividade, aproximadamente 140 milhões de brasileiros possam ser beneficiados com a implementação do método em diversos municípios do país, só com esta fábrica.
O objetivo é atender à demanda do Ministério da Saúde e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que elegeram o método Wolbachia como o mais eficiente e ambientalmente sustentável para combater a proliferação dos mosquitos no país. O exército de ‘wolbitos’ (como são chamados os mosquitos com Wolbachia pela Fiocruz) vai priorizar municípios com alto risco de dengue.
De acordo com informações da Agência Estadual de Notícias do Paraná (AEN), a nova unidade é considerada a maior do mundo e está localizada na área do Parque Tecnológico da Saúde, sob a responsabilidade do Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), vinculado à Fiocruz, e do World Mosquito Program (WMP).

No Paraná, desde que as biofábricas para soltura inauguraram, em julho de 2024, já foram soltos mais de 20 milhões de wolbitos em Londrina e Foz do Iguaçu. Atualmente, Joinville (SC), Presidente Prudente (SP), Uberlândia (MG) e Natal (RN), são os outros municípios selecionados pelo Ministério da Saúde onde o método é aplicado.

Bactéria do bem: conheça o Método Wolbachia

Wolbachia - solid

Mosquitos com Wolbachia são soltos em diversos locais no Brasil e no mundo. A Wolbachia é uma bactéria presente em aproximadamente metade dos insetos no mundo, inclusive em alguns mosquitos. No entanto, não é encontrada naturalmente no Aedes aegypti. Quando presente neste mosquito, a Wolbachia impede que os vírus da dengue, Zika, chikungunya e febre amarela urbana se desenvolvam dentro dele, contribuindo para redução destas doenças.

Desenvolvido na Austrália em 2011 e presente desde 2014 no Brasil, o Método Wolbachia consiste na liberação de Aedes aegypti com Wolbachia para que se reproduzam com os Aedes aegypti locais estabelecendo, aos poucos, uma nova população destes mosquitos, todos com Wolbachia. Não há qualquer modificação genética no Método Wolbachia do WMP, nem no mosquito nem na Wolbachia.

Programa Mundial de Mosquitos

O Brasil é um dos 14 países que compõem o Programa Mundial de Mosquitos – WMP (World Mosquito Program), uma iniciativa internacional sem fins lucrativos que trabalha para proteger a comunidade global das doenças transmitidas por mosquitos. Além de Austrália e Brasil, o método já foi implantado na Colômbia, El Salvador, México, Indonésia, Honduras, Laos, Sri Lanka, Vietnã, Kiribati, Fiji, Vanuatu e Nova Caledônia). 

No Brasil, o Método Wolbachia é conduzido pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com financiamento do Ministério da Saúde, em parceria com os governos locais. Testada inicialmente em Niterói (RJ), com resultados positivos, metodologia está presente atualmente nas cidades do Rio de Janeiro (RJ), Campo Grande (MS), Petrolina (PE) e em parte do parte de Belo Horizonte (MG). Seis novos municípios estão em fase de implementação: Foz do Iguaçu (PR), Londrina (PR), Joinville (SC), Uberlândia (MG), Presidente Prudente (SP) e Natal (RN).

Método Wolbachia é ‘ambientalmente amigável’

De acordo com a WMP Brasil, o Método Wolbachia é “ambientalmente amigável”. Em laboratório, pesquisadores identificaram que a Wolbachia, que é intracelular, não pode ser transmitida para humanos ou outros mamíferos. A Wolbachia também está presente naturalmente em outras espécies de artrópodes. Ou seja, ao se criar uma população de Aedes aegypti com Wolbachia, não haverá alteração significativa nos sistemas ecológicos.

“Com o tempo, a porcentagem de mosquitos que carregam a Wolbachia aumenta, até que permaneça estável sem a necessidade de novas liberações. Este efeito torna o método autossustentável e uma intervenção acessível a longo prazo. Três avaliações de risco independentes foram realizadas e apresentaram uma classificação de risco global “insignificante” (a mais baixa possível) para a liberação de mosquitos com Wolbachia”, explicam os pesquisadores.

Saiba mais – Para popularizar o método, foi criado o Wolbito, o Aedes aegypti com Wolbachia, mascote do WMP Brasil, que também é levado a comunidades e escolas. Acesse wolbitonaescola.org. Para mais informações sobre o Método Wolbachia, clique aqui.

Com informações da Oxitec e WMP Brasil e AEN (PR)

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