Pode parecer algo comum, uma tosse que demora a passar, uma febre que insiste em voltar, um cansaço que chega sem explicação. Mas o perigo da pneumonia está justamente nos sinais sutis que muitas vezes não são percebidos até que a infecção já esteja avançada. Em um país onde é comum confundir sintomas respiratórios com uma gripe forte ou recorrer à automedicação, o descuido pode transformar um quadro simples em uma emergência médica.
A pneumonia ainda é uma ameaça global. Conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS), infecções respiratórias inferiores, incluindo a pneumonia, continuam entre as principais causas de morte no mundo. Em 2019, mais de 740 mil crianças menores de 5 anos morreram em decorrência da doença, o que corresponde a cerca de 14% de todas as mortes nessa faixa etária. Embora o número assuste, há outro dado que merece atenção: a pneumonia também figura entre as infecções mais graves em adultos e idosos.
O Dia Mundial da Pneumonia é celebrado em 12 de novembro e tem como objetivo de divulgar a relevância da doença, destacar a importância da prevenção, do diagnóstico e tratamento precoces. A pneumonia é uma infecção pulmonar que pode ser grave e representa uma das principais causas de morte no mundo, especialmente em crianças.
A luta contra a pneumonia também passa por fatores contemporâneos que transformam o cenário da saúde pública. O primeiro deles é o impacto das mudanças climáticas. A intensificação de ondas de calor, queimadas e poluição atmosférica tem aumentado a exposição a agentes irritantes que comprometem as vias respiratórias.
Estudos recentes da OMS e da revista The Lancet apontam que a má qualidade do ar está diretamente relacionada ao aumento de internações por pneumonia e doenças pulmonares crônicas.
A desigualdade como fator de risco para a pneumonia
Além de fatores clínicos, a pneumonia também é um marcador de desigualdade social. Ambientes domiciliares precários, falta de saneamento, poluição e dificuldade de acesso à atenção básica ampliam o risco de infecção e retardam o diagnóstico.
De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), crianças em comunidades de baixa renda têm até cinco vezes mais chances de morrer de pneumonia do que aquelas em contextos de melhor infraestrutura. “O desafio não é apenas tratar, mas garantir que as pessoas cheguem a tempo de serem tratadas”, afirma o Dr. Mora.
A combinação entre vulnerabilidade social e sobrecarga nos serviços de saúde faz com que muitos casos se agravem antes de receber assistência adequada. “Por isso, políticas públicas de prevenção, especialmente campanhas de vacinação e educação em saúde, são essenciais”, acrescenta.
Resistência bacteriana causada por uso abusivo de antibióticos
Outro obstáculo é a resistência bacteriana. O uso inadequado e prolongado de antibióticos tem tornado algumas bactérias mais resistentes, dificultando o tratamento de infecções respiratórias. Dados do Projeto Sireva mostram quem ao longo dos anos, a resistência do pneumococo aos antibióticos utilizados para tratamento só aumenta.
Isso afeta a escolha do tratamento empírico inicial dos casos de pneumonia e aumenta a chance de o paciente precisar de uma hospitalização para receber medicamentos mais potentes e de aplicação endovenosa. Entre os patógenos bacterianos relacionados a pneumonia, o GBD aponta o Streptococcus pneumoniae (pneumococo) como o mais frequente (28%). A comunidade médica e as pesquisas sobre pneumonias na infância buscam avaliar o comportamento do pneumococo e as melhores formas de prevenção e tratamento, visto esse ser o agente mais frequente.
Temos observado que casos antes facilmente controlados hoje exigem esquemas mais complexos e internações prolongadas”, explica o Dr. Mora. Essa tendência preocupa autoridades de saúde e reforça a necessidade de uso racional de medicamentos e de acompanhamento médico adequado.
Aqui no Brasil e em outros países da América Latina e Caribe, existe um acompanhamento dos pneumococos isolados em pacientes com doenças invasivas por esse agente, como meningites e pneumonias. O Projeto SIREVA existe desde 1991 e o grande colaborador na coleta desses dados no Brasil é o Instituto Adolfo Lutz.
Esse monitoramento é muito importante para avaliar quais os sorotipos de pneumococo estão circulando na nossa comunidade e, por exemplo, decidir qual a vacina mais indicada para os programas de saúde pública“, destaca o especialista.
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Novas vacinas contra pneumonia e VSR
Por outro lado, há boas notícias. Novas vacinas conjugadas pneumocócicas vêm sendo desenvolvidas com maior cobertura contra diferentes cepas da bactéria Streptococcus pneumoniae, principal causadora da pneumonia bacteriana.
Segundo o Ministério da Saúde, essas vacinas têm potencial de reduzir de forma expressiva os casos graves e as mortes associadas à doença, tanto em crianças quanto em adultos. Além disso, pesquisas sobre imunizantes universais e terapias respiratórias inovadoras indicam avanços importantes para os próximos anos.
Perigo em crianças e idosos
Mas o problema vai muito além da infância. A doença tem alta ocorrência entre idosos, fumantes, pessoas com doenças crônicas como diabetes, DPOC ou insuficiência cardíaca, além de indivíduos com baixa imunidade. No Brasil, um levantamento publicado no Jornal Brasileiro de Pneumologia apontou que a mortalidade hospitalar chega a 18% entre pacientes com menos de 65 anos e ultrapassa 23% entre os idosos.
A mortalidade por pneumonia no Brasil ainda é alta. Em 2024 houve cerca de 118 mil mortes por pneumonia e as faixas etárias mais afetadas sempre são idosos (acima de 80 anos) e crianças pequenas. Nos últimos anos houve um aumento preocupante no número de casos, da ordem de 30%, principalmente no Sudeste do país, com mais de 659 mil internações.
Informação que salva vidas
A pneumonia é uma doença tratável e, em grande parte dos casos, evitável. O ponto-chave é reconhecer precocemente os sintomas e procurar ajuda médica. “O tempo é um fator determinante. Quando o tratamento é iniciado rapidamente, a chance de recuperação completa é altíssima”, reforça o Dr. Mora.
Para o Dr. Pelegrini, o recado é o mesmo para todas as faixas etárias. “A atenção aos sinais e a busca rápida por atendimento salvam vidas. Em bebês e crianças, cada hora conta”, afirma.
Neste Dia Mundial da Pneumonia, os especialistas deixam uma mensagem direta: prevenir, vacinar e agir rápido são atitudes simples que fazem toda a diferença. Respirar é um ato involuntário, mas cuidar da respiração é uma escolha consciente.
Quase todas as mortes por pneumonia são evitáveis. As vacinas não conseguem acabar com a pneumonia infantil, mas podem evitas as pneumonias graves, que levam a internações”, explica Maria Helena Bussamra, responsável pelo Departamento de Pneumologia do Sabará Hospital Infantil.
Cuidados para identificar os sintomas
Segundo o médico Luis Mora, intensivista do Centro de Emergência Regional (CER) Ilha do Governador, “A demora para buscar ajuda é o que mais preocupa. Muitos chegam ao hospital apenas quando já há falta de ar ou queda de oxigenação, e isso muda completamente o desfecho clínico”, alerta.
Nos primeiros anos de vida, o sistema imunológico ainda está em amadurecimento, o que torna bebês e crianças pequenos mais suscetíveis às infecções respiratórias. Júlio Cesar Pelegrini, coordenador da UTI Neonatal do Hospital da Mulher Mariska Ribeiro, ressalta que o cuidado deve começar cedo.
Nos bebês, qualquer sinal respiratório deve ser levado a sério. Respiração acelerada, gemido ao respirar, recusa alimentar ou febre são motivos para procurar atendimento imediato”, pontua.
Ele reforça que a amamentação exclusiva até os seis meses é uma das principais defesas contra a pneumonia, já que o leite materno contém anticorpos que fortalecem o sistema imunológico. “A vacinação é outro pilar essencial, assim como evitar o tabagismo passivo e manter os ambientes ventilados. São atitudes simples, mas que têm impacto direto na prevenção”, diz o médico.
Além da vacinação, outras ações podem auxiliar na prevenção de pneumonia como o aleitamento materno exclusivo nos primeiros 6 meses de vida, responsável pelo fortalecimento do sistema imunológico, assim como alimentação saudável, prática de atividades físicas principalmente ao ar livre, que também contribuem para fortalecer imunidade e a redução da poluição do ar doméstico”, finaliza Miriam Eller, pneumologista pediátrica do Sabará Hospital Infantil”.





