Um espetáculo de força, resiliência e superação. Nas Paralimpíadas da França realizadas neste ano, o Brasil levou 280 atletas que competiram em 22 modalidades. A delegação brasileira conquistou nada menos do que 16 medalhas: seis de ouro, três de prata e sete de bronze, quebrando o recorde de pódios do país, alcançando 86 medalhas, superando os 72 de Tóquio 2020 e do Rio 2016.
Foi uma edição histórica, não só pelo fato de termos uma delegação com o mesmo número de homens e mulheres, alcançando a meta estabelecida pelo Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), mas também pelas conquistas inéditas, como a premiação no tiro esportivo. Destaque para a atuação impressionante de Carol Santiago, que conquistou dois ouros e três pratas, tornando-se uma das maiores medalhistas da história das Paralimpíadas Paris 2024.
A pernambucana Carol Santiago, de 39 anos disputou as competições de natação na classe S12 (baixa visão). Ela nasceu com a síndrome de Morning Glory, alteração congênita na retina que reduz seu campo de visão. Carol começou a nadar aos 4 anos de idade e competiu em nível nacional e internacional na natação convencional até 2018. A hexacampeã conta que foi preciso muita preparação mental para não sucumbir à pressão e conseguir conquistar três ouros.
A gente tem uma preparação que vem sendo feita há três anos atrás, e uma dessas preparações é a preparação psicológica, que me deixa completamente focada em todo o programa. Então eu tinha ali sete provas para fazer e era como se fosse uma prova por vez. Eu tinha que ir fazer a prova, ter os resultados que fossem, sejam eles bons ou ruins, encerrar aquele dia e ir para o dia seguinte, como se fosse o primeiro”, disse a nadadora ao site Olimpíada Todo Dia.
A multimedalhista também falou da responsabilidade de ser fonte de inspiração para outros jovens. “Eu acho que o nosso papel como medalhista, como mulher, como nordestina, como o que for que você olhe e se identifique, é poder ser algum tipo de exemplo mesmo, de referência, de comportamento, de treinamento, de dedicação, de chegar lá e você fazer aquilo que faz todos os dias e saber fazer tudo o que precisa fazer. A entrega ao programa, a entrega ao trabalho. Nada grandioso é conquistado sozinho”, completou a pernambucana.
Busca de patrocínio para se dedicar aos esportes
Neste domingo (22), o Congresso Nacional fica iluminado de azul em homenagem ao Dia Nacional do Atleta Paralímpico. O objetivo da data é reconhecer e divulgar o trabalho dos atletas paralímpicos brasileiros, que competem nos Jogos Paralímpicos, uma versão dos Jogos Olímpicos adaptada para pessoas com deficiência, como deficiências motoras, amputações, cegueira, paralisia cerebral ou deficiência intelectual.
A data é um marco significativo que celebra as conquistas e a ocupação dos atletas com deficiência. Estabelecida desde 22 de setembro de 1989, rememora a fundação do Comitê Paralímpico Internacional (CPI) que se destaca pelo compromisso e resiliência desses paratletas que superam barreiras físicas e sociais para competições de alta performance.
Esse dia é uma oportunidade para reconhecer e valorizar os atletas, além de promover a conscientização sobre a importância do paradesporto. Também serve para reforçar a necessidade de maior apoio e recursos para garantir que todos os atletas paralímpicos tenham as condições de se dedicar ao treinamento e de terem a possibilidade de participarem das competições”, explica a psicóloga, pedagoga e palestrante especialista em inclusão e diversidade Natalie Schonwald.
Por falar em superação, o atleta paralímpico encontra algumas dificuldades para exercer seu trabalho. Para Natalie, o principal desafio é conseguir patrocínio para poder se dedicar mais aos esportes e ter possibilidade de estar em competições. “Apesar da ajuda de programas governamentais, poucos têm acesso a este apoio financeiro, e isso muitas vezes impede que ele possa se dedicar exclusivamente aos treinos para alcançar um bom desempenho no esporte”.
Ainda de acordo com a profissional, a ampla cobertura dos veículos de comunicação desempenha um papel crucial para aumentar a visibilidade e importância das competições paradesportivas. Um exemplo notável disso, foi a transmissão do Jogos Paralímpicos em Paris. Nesta edição do evento o Brasil registrou recordes e terminou entre os cinco primeiros no quadro de medalhas, pela primeira vez.
Psicóloga que teve AVC aos 8 meses experimenta o surfe adaptado
Após um AVC com apenas 8 meses de idade, ela enfrentou um caminho de superação. Sua história é marcada não apenas pela adversidade, mas pela resiliência e conquistas que a transformou em fonte de inspiração, destacando a importância da inclusão e da diversidade em todas as suas formas. Como atleta, participou do mundial de adestramento paraequestre em 2003 e pratica esporte desde seus 9 anos.
Há um ano ela aderiu ao surfe adaptado e já vem conquistando resultados cada vez mais significativos. “Minha qualidade de vida se transformou em diversos aspectos positivos, o primeiro foi o psicológico, já que mais uma vez superei um desafio. Por consequência, voltei às sessões de fisioterapia com exercícios focados na categoria e a trabalhar com personal trainer”, conta Natalie.
Ela treina na escola Surfistas Para Sempre, que fica na praia de Pernambuco, no Guarujá, litoral sul de São Paulo, onde também é embaixadora da equipe feminina de surfe adaptado. “Além de me divertir muito, espero conseguir pegar algumas ondas, mas principalmente pretendo ter maturidade emocional para saber que poderei ter dificuldades, e que isso não quer dizer que fracassei”, explica Natalie, que tem ótimas expectativas.
Para deslizar sobre as ondas, a profissional utiliza uma prancha de Stand Up, no entanto, com o passar do tempo, existe a possibilidade de trocar o equipamento, para sempre alcançar uma evolução independentemente do tipo de prancha.
Nas questões motoras, estou retomando alguns movimentos da mão e o equilíbrio, além do ganho de força, pois nas aulas, a atividade de ajoelhar na prancha ajuda nessa parte. O lado cognitivo também melhorou, inclusive meu sono, e os exercícios físicos proporcionados com a prática do esporte ajudam no aumento da concentração, fazendo com que minhas atividades profissionais rendam mais”, explica Natalie.
Surfe adaptado: modalidade esportiva é grande aliada no desenvolvimento de PCDs
Embora o surfe adaptado não integre a lista de jogos das Paralimpíadas Paris 2024, sua importância para pessoas com deficiência (PCD´s) não pode ser diminuída, pois o esporte desempenha um papel significativo na vida desses indivíduos e proporciona benefícios que vão além da competição e busca desenvolver aspectos biopsicossociais de uma pessoa.
Atualmente, o surfe adaptado não tem o objetivo de buscar a perfeição, mas sim a diversão aliada às habilidades e capacidades de cada pessoa, o que o torna, assim, um instrumento de inclusão social e diversidade, deixando, de início, a competitividade em segundo plano.
No entanto, está se revelando cada vez mais profissional, sendo uma das modalidades cotadas para estrear nos Jogos Paralímpicos de Los Angeles em 2028. A procura pela versão adaptada vem ganhando maior visibilidade devido à divulgação do esporte em si, com os atletas brasileiros se tornando campeões mundiais e também por ser considerado um esporte olímpico.
Apesar de novo, desde 2015 já existem circuitos mundiais de surfe adaptado ou para-surfe. O nadador paralímpico Clodoaldo Silva, campeão com 14 medalhas em Jogos Paralímpicos, sendo seis de ouro e seis de prata, é um grande incentivador do esporte, que experimentou e aprovou a sensação de estar por cima das ondas, e não mergulhando, como se consagrou na natação.
Trabalhar o equilíbrio, enfrentar dificuldades, controlar a emoção e expandir o convívio social, além de estar em contato direto com a natureza estão entre os principais benefícios do surfe, um esporte sem restrições que busca desenvolver todos os potenciais de uma pessoa.
A atividade é completa, já que trabalha todos os músculos do corpo: membros superiores para remar e ficar em pé na onda; membros inferiores para o indivíduo se manter na onda; e os neurotransmissores, liberados durante os momentos de prazer, que melhoram a saúde mental, diminuem o estresse e aumentam o bem-estar e a sensação de felicidade.
Atleta começou na equoterapia aos 9 anos
A especialista em temas de inclusão e diversidade pratica esporte desde pequena. Aos quatro anos de idade, a profissional iniciou na equoterapia, um método terapêutico e educacional que utiliza o cavalo dentro de uma abordagem multidisciplinar e interdisciplinar, com a finalidade de buscar desenvolvimento biopsicossocial de pessoas com necessidades especiais. Aos nove anos foi para a modalidade de salto e começou, então, a aprimorar suas habilidades.
Em 2002 comecei a treinar adestramento paraequestre em Ibiúna, no interior de São Paulo. É importante lembrar que todo esporte deve ser supervisionado por treinadores capacitados, e o hipismo não é diferente. No hipismo os treinadores devem entender tanto das necessidades dos atletas, como do comportamento dos cavalos para evitar acidentes. O adestramento paraequestre ganhou espaço e promoveu competições nacionais e internacionais. Assim chegamos no Mundial na Bélgica, em 2003 e participei da primeira equipe brasileira de hipismo a alcançar um campeonato mundial. Na ocasião, conseguimos a carta-convite para a equipe brasileira ir para uma olimpíada”, explica Natalie.
Ainda de acordo com Natalie, ao obter o bom desempenho, o esporte passa a ser um agente transformador e ajuda no desenvolvimento da autoconfiança, dos aspectos cognitivos, físicos e psicológicos, o que reflete no dia a dia do atleta.
Quando alcançamos bons resultados, nos sentimos muito mais capazes, e isso nos proporciona segurança e autoestima. E sem contar que a convivência com o cavalo traz momentos de relaxamento, o que contribui, entre outros aspectos, para um trabalho de atenção e memória. Já fisicamente falando, um dos pontos trabalhados junto ao animal é o equilíbrio”, diz Natalie.
Equipamentos adaptados e segurança
Ao todo, 22 modalidades fizeram parte das paralimpíadas disputadas neste ano em Paris. Uma das atividades disputadas neste ano foi o adestramento paraequestre. Trata-se de uma modalidade do hipismo e que se rege pelas mesmas regras, tendo como o diferencial a classificação funcional que divide os atletas em cinco graus de acordo com suas deficiências, tornando uma competição justa entre eles. É um esporte em que cavaleiro e cavalo se tornam um só. As montarias são avaliadas pela precisão e qualidade da equitação, o comportamento dos cavalos em marchas e paradas, sutileza artística e outros aspectos de seu desempenho.
Para a prática do esporte, os atletas podem usar “ajudas compensatórias”, no entanto, não oferecem vantagens em relação ao cavaleiro (termo destinado a homem que monta a cavalo) ou amazona (nome destinado à mulher que monta a cavalo) sem deficiência, apenas compensam as deficiências apresentadas.
Podem ser a nível de encilhamento como, por exemplo, uma sela adaptada, rédea adaptada, entre outros, desde que não fixe a pessoa ao cavalo; ou a nível de órtese ou prótese para compensar a falta de um membro ou parte dele. Cada atleta, junto com a avaliação funcional, recebe orientação sobre essas ajudas compensatórias permitidas no caso específico”, explica Gabriele Brigitte Walter, presidente da Fundação Rancho GG – Centro de Treinamento Pesquisa e Ensino da Equoterapia, classificadora oficial para os paratletas daAssociação Brasileira de Criadores de Cavalo Quarto de Milha (ABQM).
E em relação à segurança do esporte praticado por Pessoas com Deficiências (PCDs), Gabrielle esclarece: “É fundamental que uma avaliação inicial seja feita para que se possa orientar sobre o cavalo mais adequado ao iniciante, pois quando for pensar em competição, talvez esse cavalo não seja o mais competitivo e, se for substituído, o mesmo cuidado deve ser tomado.
O treinador, tanto do cavalo como do atleta, deve ser uma pessoa habilitada para tal, com profundo conhecimento equestre e respeitador quanto à limitação do atleta e com humildade para escutar o fisioterapeuta e o classificador. O uso do encilhamento adequado e bem colocado, bem como o uso da vestimenta correta do atleta, incluindo capacete, são obrigatórios”.
Com Assessorias